Capítulo 4
Da sala de estar, olhei para a sala de jantar. Vi minha mãe e algumas mulheres conversando sobre algum assunto empolgante, afinal, não se davam conta de que seus maridos, muito próximos delas, falavam sobre a última Playboy lançada.
- Desculpe, eu não me apresentei... Saulo - Estendi a mão para Marina que continuava sentada.
Ela se levantou, ignorando minha mão suspensa.
- Eu sei - disse. Franzi o cenho.
- Marina, não é?
- Sim.
Percebi que Marina era de poucas palavras. Olhei para cozinha onde estava Mr. Skipp, Gus e agora Carla. Eu ri, vendo Gus mantendo uma distancia considerável de Carla, enquanto ela tentava falar com ele. Queria muito saber o que falavam.
- Quer beber alguma coisa?
- Claro. - Marina sorriu.
Caminhamos até a cozinha e pegamos uma parte da conversa de Gus e Carla.
- Fiquei sabendo que está namorando, Gustavo.
- Sim. Já fazem sete meses.
- O tempo passa bem rápido. Parece que foi ontem que você bebeu todas e se declarou pra mim num show do Capital Inicial, quando você ainda era apaixonado por mim.
Pigarrei antes que aquilo se tornasse ainda mais constrangedor.
- Mr. Skipp, prepara quatro daquele seu famoso drink com martini - falei.
- Claro, senhor - Mr. Skipp começou a preparar.
- Três, Mr. Skipp - interrompeu, Gus. - Eu já estou de saída.
- Qual é, Gus? Um drink não faz mal à ninguém, e agora são... - olhei para o relógio chinês que ficava preso na parede, acima da porta. - Dez horas. Você ainda tem alguns minutos.
- Vou dirigir, não posso beber.
- Eu te empresto meu motorista. Se importa, Mr. Skipp? Não vai fazer tanta falta por alguns minutos...
- De maneira alguma, senhor.
- Seu carro não estava no mecânico? - indagou Gus.
- Estava até hoje à tarde.
Gus revirou os olhos, se encontrando sem mais desculpas.
- Qual é, não faria essa desfeita, faria? - reprimi meu sorriso sarcástico.
Ele demorou um pouco pra responder, mas no fundo sabia que eu não o deixaria em paz.
- Ok. Apenas um.
Dessa vez deixei escapar meu sorriso.
Fomos até a varanda, e é claro, as garotas vieram junto. Gus sentou isoladamente numa poltrona de vime, visivelmente desconfortado; olhava ao relógio de pulso a cada meio minuto.
Então, enfim, Mr. Skipp chegou com nossos drinks.
Carla e Marina estavam dividindo um silêncio suspeito, o qual me deixava um pouco inquieto.
Assim que Gus pegou seu drink, tirou uma pimenta dedo-de-moça que o enfeitava e bebeu como se fosse água.
Ergui as sobrancelhas, surpreso. Para alguém fraco para bebidas alcoólicas como Gus, aquilo seria divertido... ou não. Mas é claro que Gus estava apenas pensando em sair logo dali.
Demorou mais alguns minutos sentado, e então se levantou de repente.
- Preciso ir - disse. Notei uma leve bambeada ao se levantar.
- Mal degustou o drink - falei. - Calma, Gus. Aurora não irá sair de lá. Mr. Skipp chega na Etec dentro de cinco minutos.
- Saulo, está tentando me meter em encrencas?
- Eu? Não faria isso. Aqui é uma casa de família, meus pais estão aqui. Não faz sentido dizer isso.
Ele limpou uma gota de suor que se formava em sua testa, estava ficando um pouco vermelho; o álcool já estava fazendo efeito.
- Mais um apenas, e pode ir buscar sua donzela.
- Não quero ficar com o cheiro.
- Meu amigo, você já está com o cheiro.
Ele franziu o cenho e se jogou na poltrona, vencido. Fiz um sinal para Mr. Skipp trazer mais drinks.
Gus era tão fácil de ser manipulado. Não que eu sentisse prazer nisso, mas ele estava precisando de um pouco de diversão; ultimamente andava tão monótono, nem parecia ser o meu velho amigo.
Mr. Skipp chegava, segurando uma bandeja com outros drinks em cima, pela quarta ou quinta vez.
As garotas riam de qualquer coisa que falássemos, Marina ao meu lado, não parava de encostar em mim, como se fosse atraída por uma força maior. E Carla, como já era de se esperar, estava ao lado de Gus. Ali não havia mais lugar para sentar, mas o braço da poltrona já era o suficiente pra ela.
Gus falava algo sobre a primeira vez que andou à cavalo, como havia sido um desastre, e eu estava lá naquele dia.
- Senhor, perdoe-me pela intromissão, mas não acha que os senhores estão exagerando?
- Mr, Skipp, só vamos parar quando eu quiser.
- Me desculpe, senhor. - Se retirou antes que eu pudesse dizer mais alguma coisa.
- O cavalo disparou comigo em cima! - Gus ria ao contar. - Eu não sabia se eu pulava, se eu rezava ou se sentia ódio por ver Saulo rindo lá de longe, sabendo que tinha sido ideia dele!
- Cara, não foi tão ruim assim. - Eu ria junto.
- Não pra você! Não me lembro de ter sentido tanto medo! Quando desci do cavalo, fui direto ao banheiro!
As garotas gargalhavam, e eu também não pude evitar.
- Não fale isso perto das meninas, é broxante!
Rimos novamente, como se só pudéssemos fazer isso. Eu não estava tão alterado quanto os outros, mas fazia tanto tempo que não via Gus se divertindo assim, que talvez pra mim estava sendo mais divertido do que pra ele.
Gus tentou se levantar para pegar outro drink na mesinha ao lado. Deu uma leve cambaleada e pra não cair, se apoiou na coxa avantajada e exposta de Carla. Ela olhou sem reação, mas sei que no fundo gostou. Gus, ao perceber a gafe, imediatamente retirou a mão dali e fingiu que nada havia acontecido ao se sentar novamente à poltrona.
Percebi que ficou nervoso, então bebeu o drink todo em dois goles.
Um celular começou a tocar, Gus começou a apalpar o bolso da calça, mas estava tão esmorecido que não conseguia pegar.
- Deixa que eu te ajudo - Carla se prontificou.
Ela colocou a mão dentro do bolso de Gus e pegou o celular. Iria atender, quando lembrei-me que poderia ser Aurora, e Gus não me perdoaria por isso. Uma coisa era Carla estar ali, outra coisa era Aurora ficar sabendo. Olhei para o relógio e já era 22:55.
Levantei-me rapidamente e tomei com ímpeto o celular da mão de Carla.
- Saulo! - Ela reclamou com a cara fechada.
- Shh!! - Sibilei, vendo que Carla já havia atendido.
- Saulo? - Ouvi a voz irritante de Aurora sair de dentro do celular.
Com a outra mão, amassei minha cara. Pensei em desligar, mas de nada adiantaria, ela já havia escutado meu nome, maldito nome incomum.
- Fala comigo, garoto! - Além de irritante, estava irritada.
Droga! Iria ter que inventar alguma desculpa. Sai da varanda e fui até o jardim, sem nem mesmo Gus perceber.
- Oi...
- Aonde está o meu namorado? O que está fazendo com o celular dele? E quem é essa garota?
- Estou ocupado e só tenho tempo pra responder uma pergunta, escolha.
Ela suspirou, agora muito irritada.
- Saulo, passe o celular para o Gus agora - ela disse devagar, talvez tentando manter a calma ou talvez achava que eu era um retardado.
- Ele não pode atender.
Fez-se silêncio do outro lado da linha.
- Eu quero falar com o meu namorado! - bradou enraivecida.
- Desculpe, Aurora. Ele realmente não pode atender, não está passando bem.
- O que você fez com ele?
- Nada! Eu falei pra ele não misturar champanhe com sashimi. Minha mãe deu um remédio a ele... que talvez dê um pouco de sono...
- Me deixe falar com a sua mãe.
Mas que garota abusada! Não seria mais fácil aceitar e se calar?
- Ela está limpando o vômito do seu namorado! Amanhã você fala com ele, Aurora!
- Não acredito em você. Mas ok, amanhã eu falo com o Gus, e certamente ele não irá mentir pra mim.
Desligou.
- Veremos - falei comigo mesmo.
Volte à varanda e Gus estava pior do que à cinco minutos atrás.
- A festa acabou, meninas.
- Como assim? Agora que está começando - Carla passava a mão nos cabelos de Gus, que já estava praticamente dormindo na poltrona.
- Outro dia a gente continua. - Peguei Gus, apoiei um braço dele em cima de meu ombro e o levei até o quarto de Mr. Skipp, deixando as garotas sozinhas na varanda; não podia subir as escadas carregando um zumbi, meus pais não poderiam ficar sabendo.
Antes de chegar no quarto, peguei um balde que estava no caminho e deixei ao lado da cama. Gus já não estava mais consciente.
Lembrei de Aurora na Etec, seria muita maldade deixá-la sozinha; Gus também não me perdoaria por isso. Pensei em pedir para que Mr. Skipp a buscasse, mas definitivamente ele não sabia mentir. No caso, só sobrava eu para fazer o serviço.
Peguei a chave do Bravo e fui até a garagem; no caminho vi Marina se despedindo de seus pais. Droga, eu estava tão perto... Embora, oportunidade não fossem me faltar, eu odiava empecilhos.
Dirigi até a Etec, e avistei Aurora sentada num ponto de ônibus, abraçando sua mochila. Parei o carro em frente e abaixei o vidro do passageiro.
- Entre, eu te levo.
Ela me encarou, dentro dela ainda cultivava a raiva que crescia sobre mim até aquele momento.
- Estou te fazendo um favor. No mínimo deve aceitar.
- Estou tentando me lembrar quando foi que pedi - retrucou.
Abusada...
- Quer ser assaltada? - indaguei. - O ônibus vai demorar pra chegar, tem dois trombadinhas numa esquina antes daqui.
- Por que está fazendo isso? Não provém de você.
- Apenas entre, ok?
Ela olhou para o relógio de pulso e viu que o ônibus realmente demoraria; olhou para os lados e a rua estava deserta. Era mesmo arriscado continuar ali. Ela era orgulhosa, mas não era burra. Levantou-se, abriu a porta do carro e entrou.
Dei a partida e segui até sua casa. Estava calada, devia estar pensando que aquele ato era peso na consciência, mal ela sabia que sou patente alta em desencargo de consciência.
Com o canto dos olhos, vi que ainda abraçava sua mochila e tremia um pouco, embora já tivesse fechado o vidro. Liguei o ar quente, o que me faria soar, pois eu estava com blusa de moletom.
Ela olhou torto e desconfiada pra mim.
- Não precisa fingir gentileza - resmungou.
Revirei os olhos.
- Ok. - Mudei o ar para gelado.
Imediatamente ela fechou a cara. Sim, mais do que já estava.
Eu queria rir, mas achei melhor desligar.
Dirigi por mais alguns quarteirões e então parei em frente à sua casa. Aurora olhou pra mim.
- Gus está na sua casa?
- Sim. Está dormindo.
Ela assentiu uma vez. Não estava mais brava, nem irritada, agora estava apenas preocupada.
- Quando ele acordar, peça que me ligue.
- Ok.
- Obrigada... também pela carona - disse e saiu do carro. Esperei que entrasse em sua casa antes de ir embora, apenas pra me certificar de que nenhum meteoro caísse sobre ela e a culpa caísse sobre mim.
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