Capítulo 25
"O luto tem várias fases: as mais difíceis, as que você começa a superar e as que você quer fingir que nada aconteceu. Talvez eu tenha parado em uma delas. Simplesmente acontece."
— Rafaella Portilla
Pov Cassie
Falta apenas um dia para o torneio. Um dia. Mas, ao mesmo tempo, pare uma eternidade. As horas estão passando devagar, como se o tempo estivesse se arrastando, esperando que eu tomasse uma decisão que não sabia se estava preparada para fazer. O peso no meu peito não diminuía, e a expectativa do que estava por vir me deixava inquieta, com o estômago em um nó constante.
Estou indo buscar nossas roupas na loja. Harry teve um trabalho importante e depois vamos nos encontrar para fazer a prova final do figurino.
Entro na loja, o som da campainha toca levemente quando a porta se abre. O lugar é pequeno, mas aconchegante, com tecidos coloridos espalhados pelas prateleiras e o cheiro de alfaiataria no ar. Meus olhos percorrem o ambiente, procurando por ela. A costureira me avisa, lá do fundo, que as roupas estão prontas.
Mas, antes que eu possa dar um passo em direção ao balcão, uma presença se faz sentir atrás de mim. Uma voz feminina, fria e cortante, quebra o silêncio.
— Veio buscar isso aqui?
Sorrio sem querer, achando que é a costureira trazendo as roupas. Mas, ao me virar, meus olhos encontram uma mulher elegante, segurando a peça que eu tanto esperava, mas o que me faz parar no lugar não é a roupa. É o olhar dela.
A expressão dela é dura, fechada, como se estivesse em guerra com o mundo e, naquele momento, era exatamente isso que parecia estar acontecendo. A mulher à minha frente não é ninguém mais, ninguém menos, que a mãe dele.
O choque me atinge como uma onda. É impossível esquecer aquele rosto, mesmo com as poucas vezes que o vi. As lembranças dela, chorando no julgamento, clamando por justiça pelo seu filho, me invadem a mente como um furacão. Sinto meu corpo gelar, e o ar ao meu redor se torna rarefeito.
Ela me observa de cima a baixo, o desprezo estampado em cada linha de seu rosto.
— Acabar com a vida de um dos meus filhos não foi suficiente para você? — ela diz, o tom ácido em suas palavras fazendo meu estômago revirar. — Você achou que eu nunca iria descobrir, que poderiam participar dessa competição ridícula sem ninguém saber? Eu não sei o que você fez para hipnotizar meus dois filhos, mas isso vai acabar agora.
Engulo em seco, tentando controlar a tremedeira nas minhas mãos, mas a pressão de suas palavras me sufoca. Eu não sabia o que dizer. Não tinha o que dizer.
— Quatro anos atrás, eu estava aqui, nesse mesmo lugar, buscando essas roupas. Eu estava extremamente feliz. Finalmente, meu filho estava feliz, com uma garota que ele amava. — Ela joga a roupa em minha direção com um movimento brusco, e se aproxima ainda mais, como se quisesse me esmagar com sua dor. — Sabe qual foi a última coisa que ele me disse?
Eu nego com a cabeça, meu coração batendo forte no peito. Não tenho coragem de responder.
— Ele me disse que nunca esteve tão feliz na vida, que estava completamente apaixonado, e que aquele seria o dia mais feliz de sua vida. Ele se preparou para aquela competição a vida toda.
Cada palavra dela me cortava como uma faca, reabrindo feridas que eu já estava tentando cicatrizar. As lembranças daquele dia, o acidente... Tudo voltava à tona de uma maneira que eu não queria reviver. Mas não havia como escapar. Eu estava ali, diante dela, e o peso da culpa parecia me afundar ainda mais.
— Você acabou com minha família, Cassie — ela começa a chorar. — Eu tento ser forte para o Harry, mas nem ele consegue seguir em frente. E hoje eu descubro que vocês estão escondendo que vão participar juntos do torneio, que era o sonho do Henry, antes de você tirar a vida dele. — Suas palavras entram como uma facada em meu peito. — Eu confiei a vida de um dos meus filhos a você uma vez, mas não cometerei esse erro novamente. Você vai ficar longe do Harry e não vai dizer nada para ele. Vai pegar o primeiro voo amanhã para o lugar mais distante possível daqui e não vai dizer a ninguém para onde vai.
— Não — nego. Não posso fazer isso com ele. — Eu vou embora depois da competição — ela sorri, balançando a cabeça.
— Você não vai competir. Você não vai ver mais meu filho, nunca mais. Ou eu juro que faço o que deveria ter feito há muito tempo, acabo com sua vida. Estou te dando uma chance de recomeçar longe daqui.
— Por favor, não faça isso — imploro.
— Eu não posso perder o Harry também. Não suportaria. — Ela retira alguns fios de cabelo que estão grudados nas minhas lágrimas. — Vá atrás da sua felicidade, Cassie. Tenho certeza de que meus dois filhos gostariam disso. Esqueça essa cidade, minha família. Vá viver sua vida.
Balanço a cabeça, negando.
— Aceite isso e desapareça.
Olho para o cheque em sua mão, mas minhas pernas não se movem. Ela percebe minha hesitação, o que a faz apertar os lábios com mais desprezo.
— Isso é para você se manter até conseguir um emprego em outra cidade — ela diz.
— Com todo respeito, senhora Montgomery, mas não quero seu dinheiro. Nunca quis. Eu sinto muito pelo Henry, mas nunca quis machucá-lo. Eu o amei, e amo o Harry. Eu nunca planejei ficar em Londres, apesar de amar o Harry, sei que nunca poderemos ficar juntos.
— Você vai precisar...
— Eu sinto muito por ter destruído sua família, senhora. Eu sinto muito mesmo, e saiba que eu os amei mais do que tudo em minha vida. Eu não vou competir amanhã. Estarei indo embora amanhã cedo, e nunca mais nenhum de vocês ouvirá falar de mim. — Pego minha bolsa e a roupa que usaria na competição, saindo, deixando-a sozinha.
O ar parece desaparecer, e meu corpo congela, incapaz de reagir. Maggie está disposta a tudo para me afastar de Harry, e não tenho dúvida de que ela faria isso. O medo, a culpa e a dor se misturam em mim, mas o que mais dói é a ideia de deixar Harry.
É, Cassie, acabou...
Volto para meu apartamento. Preciso me despedir de Gail e arrumar minhas coisas. Não faço ideia do que vou fazer. Com os treinos, não consegui fazer horas extras, então o dinheiro que consegui nesses dois meses mal vai dar para as passagens. Mas não me importo se precisar ficar na rua. Eu já deveria ter feito isso há muito tempo, antes mesmo de deixar ele se aproximar de mim.
— Você não pode ir assim, garota — diz Gail, com uma expressão preocupada.
— Eu preciso, Gail. Não posso continuar aqui — deixo uma lágrima cair.
— Você vai voltar? — Balanço a cabeça, negando.
— Eu não posso, não aguentaria ficar longe dele estando tão perto. — Ele suspira, triste.
— Você não deveria fugir tanto. Às vezes, enfrentar as situações de frente é a única solução.
— Não tem como... — Abraço-o forte. — Não tenho mais forças para isso.
— Pegue — ele pega a carteira e tira algumas notas de dentro. — É pouco, mas dá para se manter por uns dias. Depois posso te mandar mais.
— Não vou precisar de dinheiro, Gail. Não se preocupe, estou bem.
As palavras da mãe de Henry continuam ressoando na minha mente. Cada passo parece mais pesado do que o anterior, como se o próprio peso da minha culpa estivesse me puxando para baixo. Não importa o quanto eu queira fugir disso tudo, a realidade me alcançou de uma forma que não posso mais ignorar. O medo, a dor, a culpa – tudo se mistura dentro de mim, mas o que dói mais é a ideia de deixar Harry. E é exatamente isso que estou fazendo.
Quando chego no meu apartamento, a primeira coisa que vejo é a mochila que preparei, ainda esperando para ser arrumada. Eu sei que o tempo está se esgotando e que não tenho mais outra escolha. Meu coração aperta só de pensar em deixar tudo para trás, mas não posso mais mentir para mim mesma. Não posso continuar me escondendo, vivendo algo que nunca seria possível. Não sou boa o suficiente para ele. Nunca fui.
Começo a arrumar minhas coisas com uma rapidez quase automática. Coloco as roupas dentro da mochila, as lembranças que tenho de Henry, de Harry, de tudo o que vivemos. Cada item parece carregar uma parte de mim, e, ao mesmo tempo, é como se fosse um adeus. Já não sei mais o que fazer com as emoções que me invadem. Meu corpo está pesado, exausto, mas minha mente não consegue parar.
Quando termino de arrumar tudo, olho ao redor do apartamento, um local que agora me parece tão distante e frio. Não há mais espaço para mim aqui. Não aqui, nesse lugar que me lembra de tanto o que perdi. Olho para o telefone, hesito por um momento, e depois o apago. Não posso mais ficar com Harry. Eu preciso ir.
Sinto uma lágrima escorrer pelo meu rosto, mas não me importo. Deixo a dor sair, porque sei que é a única forma de seguir em frente. Coloco a mochila nas costas, pego o cheque que Maggie me deu, embora tenha recusado, e saio pela porta, sem olhar para trás.
O coração dói de uma forma insuportável, mas, ao mesmo tempo, sei que estou fazendo o que é certo. Já não tenho mais forças para enfrentar a dor de estar tão perto dele, sabendo que não podemos ficar juntos. Fui egoísta demais por tanto tempo.
Decido que vou me despedir de Harry. Não posso deixá-lo sem um adeus, sem uma explicação. Preciso ver seus olhos mais uma vez antes de ir embora. Talvez seja a última chance de me despedir de tudo o que poderia ter sido.
Com o coração apertado e a cabeça cheia de incertezas, caminho pelas ruas até o local onde sabemos que ele estará. O tornei impossível de evitar. Mas, de algum modo, talvez esse seja o último passo que preciso dar para encontrar minha paz.
Assim que chego no nosso lugar, paro por um momento, sentindo a dor do adeus a cada segundo que passa. Não sei como isso vai terminar. Mas sei que preciso dizer tudo o que nunca consegui dizer.
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