15
"Até!"
O verão chegava ao fim e a brisa morna ia abriando espaço para os ventos gelados. Nesse meio tempo acabei me aproximando bastante de Elizabeth, e quanto mais conversávamos mais nossa amizade crescia. Suas idas até a loja diminuiam conforme sua saúde melhorava, agora ela não se queixava mais do cansaço e sua pele antes pálida havia ganhado a cor rosada do sangue que fluia em suas veias a tornando ainda mais bela.
—Dessa vez eu acho que acertei!
A vi colocar uma bandeja na mesinha de centro com bolinhos de chuva salpicados em açúcar refinado. O cheiro fazia meu estômago roncar.
—Parecem ótimos! — Disse enquanto retirava algumas tortinhas de morango de dentro da minha cesta — Foi difícil ficar com elas na loja, os clientes sempre perguntavam de onde vinha o cheiro doce de morango e açúcar.
—Pelos céus Sofia! Que lindas!
Seus olhos azuis brilhavam de admiração me arrancando um sorriso.
—Você tem mãos de fada!
Não segurei o riso. De certa forma eu havia tido a ajuda de uma.
—Minha avó dizia a mesma coisa quando eu acertava uma das milhares de receitas dela.
Elizabth me ofereceu uma xícara de café.
—Mas sendo sincera, eu jamais cheguei a aprender tudo o que ela sabia.
—Tenho certeza que sua avó está orgulhosa dos seus pratos Sofi — a vi pegar uma das tortinhas — Pelo menos dessas aqui ela não teria o que reclamar.
Rimos juntas antes de nos servimos dos quitites. Ao redor, não pude deixar de notar que uma pintura havia ganhado espaço na mesinha de centro. A imagem retratava uma garotinha de olhos castanhos e cabelo cacheado, assim como Elizabeth ela possuia um par de chifres, só que bem menores.
—É a minha irmã caçula.
—Ela é igualzinha a você.
—Você acha?
—Sim, possuí o mesmo semblante delicado e olhos amáveis.
—Você é um doce, assim como suas tortas.
Elizabeth mordeu a tortinha. Aproveitei para perguntar mais sobre a imagem.
—Quem fez a pintura?
—Provavelmente meus pais, eles são grandes artistas.
—Devem sentir muito a sua falta.
Um curto silêncio recaiu sobre nós, imediatamente me senti mal, no entanto, Elizabeth logo deu uma resposta.
—Sim, mas eles virão me ver em breve!
Fiquei mais aliviada.
—Você deve estar ansiosa.
—Um pouco, mas e você Sofie? Pretende voltar para sua cidade? Já se decidiu sobre isso?
—Para ser sincera, ainda não...
Senti os olhos bondosos sobre mim.
—Gart parece gostar muito de você.
Ouvir aquilo fez minhas bochechas queimarem.
—Ora! Que idea...
—É sério! — ela sorriu — Dá para ver a preocupação dele quando olha para você.
—Gart realmente anda preocupado esses últimos dias — falei pegando outro bolinho de chuva — Mas não conversamos muito...
Todas as vezes que iniciava uma conversa Gart sempre tentava falar sobre Elizabeth, mas quando insistia em saber o motivo para permanecer lomge ele simplesmente ficava em silêncio. Desde então nossas conversas vêm se limitando ao básico.
—Um homem como ele parece não saber lidar muito bem com os próprios sentimentos — Elizabeth se inclinou mais para frente colocando uma das mãos ao redor da boca, como uma concha — Tenho certeza que ele viria correndo por você caso corresse algum perigo.
Ao ouvir aquilo senti algo se remexendo no meu peito. Enquanto procurava algum lugar para enfiar a cara Elizabeth havia pegado novamente sua xícara.
—Tenho certeza que, caso escolha ficar, vocês seriam muito felizes juntos.
—Não somos um casal Eli...
—Vocês moram juntos, trabalham juntos, e o jeito que ele te olha quando você não vê...
Ela suspirou.
—Impossível não perceber.
—Bom, eu não percebo nada.
Seu sorriso doce era encantador, se quisesse Elizabeth não preciva falar uma única palavra para ser compreendida.
—Que tal levar algumas das minhas receitas e fazer para vocês dois?!
Sem que eu pudesse ter tempo de pensar em uma resposta ela ja havia se levantado buscando um livro de capa verde com tiras de couro.
—Não posso aceitar...
—Realmente não pode, deve! Vamos, tenho certeza que vai fazer coisas deliciosas!
Vasculhei as folhas vendo os rabiscos finos e delicados. Nix teria que me ajudar a decifra-lo.
—Nem sei como agradecer...
—Que tal um abraço?!
—Acho que isso não chega a ser suficiente...
—Não seja boba! — ela contornou a mesa jogando os braços em volta de mim — Nesse tempo você têm sido uma grande amiga para mim, a melhor amiga eu diria.
Retribui o gesto com o coração quentinho.
—Obrigada Elizabeth, também criei muita afeição por você nesse tempo.
Ficamos abraçadas por alguns segundos até eu me dar conta das horas.
—Está ficando tarde, é melhor eu ir — fui até a porta pegando minha capa, lá fora os ventos estavam frios — Hoje mesmo vou tentar fazer alguma coisa. Amanhã você vai na loja né? Se não me engano falta apenas um frasco da poção.
—Isso! Vou sim!
—Então vou levar o que eu fizer para a loja! Gart precisa da minha ajuda para repor alguns estoques então não vou conseguir vir amanhã a tarde, mas prometo levar algo para você!
Já estava do lado de fora quando vi os olhos de Elizabeth sorrirem para mim.
—Você é realmente uma pessoa incrível sabia!
—Deixa disso!
Acenei enquanto seguia em direção as ruas.
—Até amanhã Elizabeth!
—Até, Sofia!
...
Eu organaziva alguns frascos no fundo da loja. Em um canto separado estava minha cesta com algumas pamonhas, havia sido difícil explicar para Nix o que era um milho, mas no final das contas consegui fazer o quitite.
—Sofia, você já organizou as gavetas lá de cima?
—Já!
—Limpou a poeira?
—Sim.
—Separou os frascos por...
—Tamanho, cores e formatos? Já!
Sentia seus olhos sobre mim.
—Não se preocupe Gart, fiz tudo certinho, nada pela metade! — olhei para ele sorrindo — Só quero terminar aqui o quanto antes para ir ver a Elizabeth, passei horas tentando fazer as pamonhas, e não se preocupe que também tem para você.
—Sofia...
O vi se inclinar na minha direção, no entanto o tilintar dos sininhos na porta nos distraiu.
Deve ser ela!
Larguei os frascos vazios em um caixote correndo até à frente da loja, no entanto não era Elizabeth que entrava e sim um homem de meia idade, seus cabelos eram brancos como algodão, vestia um sobretudo beje e calças cor creme, em seu pescoço estava um colar onde uma pedra verde reluzia fracamente, mas em sua figura o que mais chamava atenção eram os dois crifres retorcidos.
—Bom dia, posso ajudar?
Seus olhos castanhos me observaram por de trás dos oculos retangulares. Uma cordinha estava presa a eles.
—Bom dia senhorita, gostaria de falar com Gart.
—Sofia...
No mesmo instante Gart apareceu com um olhar preocupado.
—Por favor, vá lá para cima.
—Mas porquê?
Antes que ele tivesse tempo de falar o homem deu um passo à frente.
—Sofia? Por acaso você seria a amiga da Lady Elizabeth?
Lady?
—Sim, eu mesma, quem é o senhor?
—Me chamo Evril, sou o mestre da família...
Aquela conversa não estava agradável, havia algo estranho no ar. Automaticamente senti a presença de Gart ao meu lado.
—Não estou entendo — disse encarando os olhos por detrás das lentes — O senhor veio buscar o remédio da Elizabeth?
—Não minha jovem...
Ele fez um curto silêncio. Suas mãos foram até um bolso dentro do sobretudo na qual retirou um envelope. Ao ver aquilo meu sangue gelou.
Não...
—Lamento dizer-lhes isso...
A voz do homem estava distante.
—Mas Lady Elizabeth...
Não...
—Infelizmente...
Não, não...
—Faleceu ontem a noite.
Não, não, não, não, não!
Tudo ao meu redor não passavam de borroes. Ao longe conseguia ouvir algumas vozes, mas todas eram incompreensíveis. O único som audível eram as batidas incessantes do meu coração.
Elizabeth!
Antes que eu me desse conta o mundo havia ganhado novamente suas formas enquanto eu disparava em direção a saída. Conseguia ouvir a voz de Gart gritar por meu nome, mas apenas pelo tempo em que a porta da loja ficou aberta até que eu sumisse em meio as lojas e barracas coloridas.
—Sofia!!
Ignorando as pessoas ao meu redor avancei pela massa de corpos e tecidos.
Isso é mentira...
Dizia a mim mesma enquanto afastava as pessoas que apareciam na minha frente.
Só pode ser mentira...
Assim que alcançei a rua dos sobrados meus pés pararam. Em frente a casa de aspecto europeu uma pequena multidão se reunia.
Rimos ontem...
A passos lentos me aproximei abrindo espaço entre as pessoas.
Você estava bem...
O olhos azuis e o sorriso doce invadia meus pensamentos.
Eu fiz as receitas...
Alcancei a entrada do sobrado. De dentro deles dois homens carregavam uma espécie de maca. Sobre ela, um longo tecido branco ocultava o corpo frágil e delicado da minha amiga.
"Até, Sofia"
—Elizabeth!!
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