Dois
Sarah
Droga... Quando eu fui dormir na noite anterior, jamais imaginaria que o destino disfarçado de despertador que para de funcionar no meio da noite; estava conspirando contra mim. Mas ele estava e fez isso enquanto eu sonhava com o Henry Cavill. Como poderia prever tamanha tragédia enquanto era beijada pelo Homem de Aço? E lógico, devo ressaltar que não sou esperta o bastante para confiar no meu celular. Irei rever esse conceito à partir de hoje.
Então, enquanto me espreguiçava de manhã, me sentindo tão feliz após sonhar com o homem mais lindo do mundo, eu tive um pequeno ataque cardíaco ao descobrir que estava realmente muito atrasada.
Um lindo começo de semana, eu diria, sair correndo de casa com o sapato na mão, parecendo uma louca, cujo cabelo nem foi penteado. Quanta alegria!
Eu sei que me atrasar por vinte minutos, na primeira reunião de pais da minha turma, não causa a melhor impressão. Eu mesma odeio atrasos. Por isso a minha preocupação é enorme. Esse emprego significa muito para mim, não quero que nada estrague minha chance de conseguir uma vaga permanente, já que agora estou substituindo a professora Marcy, que saiu para sua licença maternidade.
Tenho seis meses para me fazer eficiente e conseguir uma vaga. Eu vou conseguir, preciso conseguir.
Não posso negar o quanto amo meu trabalho, eu realmente amo, de todo o coração. Algumas pessoas achariam estressante cuidar de uma classe com 32 crianças de 4 anos, cheias de vida e muita energia.
Crianças que questionam tudo, o tempo todo.
Elas nunca se cansam, nunca.
Mas eu acho incrível, é o que me traz paz, me sinto viva e sei que posso significar algo na vida de alguém.
As crianças sabem valorizar o amor, elas são gentis, singelas e tão sinceras. Elas sempre me fazem rir.
Me pergunto por que alguns de nós simplesmente se esquecem que foram criança um dia. Eu nunca me esqueço, principalmente quando tenho que correr pelo estacionamento da escola, tentando me equilibrar nos saltos que teimosamente insisto em usar para trabalhar e não deixar o meu material escolar cair. Além de afastar o meu cabelo do rosto, já que ele se desprendeu da presilha que coloquei enquanto dirigia.
Estou muito próximo a porta, posso enfim dizer ao meu coração para voltar a bater em um ritmo humanamente saudável. Eu cheguei e foram apenas quinze minutos de atraso, posso inventar uma desculpa qualquer e torcer para que todas compreendam. Digo "todas", porque dificilmente um pai vem a uma reunião escolar, gostaria de mudar essa realidade; embora eu não possa reclamar porque as famílias das minhas crianças, estão sempre envolvidas com a educação delas.
Minhas crianças... Isso me traz um orgulho imenso, uma gigantesca felicidade. Eu não me imagino fazendo mais nada ao longo da vida, senão olhar para esses rostinhos sorridentes e com os olhinhos mais brilhantes do mundo; por todas as manhãs.
À poucos metros da entrada, eu diminuo o ritmo da minha corrida para passos mais contidos. Meus olhos estão agora curiosos no homem parado em frente à porta. Ele me olha com insistência, me encara seria a definição mais adequada. A forma como ele faz isso, me obriga a buscar em minha mente alguma lembrança dele. Será que eu o conheço? Já o encontrei antes?
Ele é muito bonito. Seguramente o homem mais lindo que já coloquei os olhos. Infelizmente minha vida é um pouco monótona e não tenha a oportunidade de ver muitos homens bonitos assim. Tudo bem, eu sei que esse pensamento é absolutamente inadequado, ele pode ser o pai de um dos meus alunos.
Em minha defesa eu diria que nesses dois meses em que estou lecionando aqui, já conheço todos os pais, mesmo os que são separados e eu nunca vi esse homem aqui... Estou curiosa. Talvez ele seja pai do Javier, o garoto novo que chegou há três dias, eu conheci apenas a sua mãe até agora.
— Você está entrando? — eu pergunto ainda ofegante da minha corrida e aponto para a porta.
Ele me olha com insistência enquanto eu espero a sua resposta. Parece que milhões de coisas passam por sua mente enquanto faz isso.
— Olá... Você está entrando na escola? — eu insisto, sorrindo com gentileza — Pode me deixar passar, por favor? Estou com um pouco de pressa.
Ele ainda não responde e durante alguns segundos apenas me olha, com os seus intensos olhos castanhos; então balança a cabeça e solta a maçaneta em um impulso, quase me assustando. Talvez ele não seja americano, talvez ele não tenha me entendido.
— Precisa de alguma ajuda? Está perdido? — eu pergunto, passando por ele, depois de precisar empurrá-lo para o lado — Sim?
— Não. — ele finalmente responde e mesmo que tenha sido em um sussurro, não noto nenhum sotaque diferente em sua voz.
— Ok, tenha um bom dia. — eu me despeço, correndo pelo longo corredor vazio.
Eu não volto a olhar para o homem misterioso, mas posso sentir o peso do seu olhar em mim e tenho certeza de que ele ainda nem se mexeu. Eu não posso me preocupar com isso, muito menos deixar a minha curiosidade e imaginação correrem soltas agora. Tudo o que eu quero é chegar logo a minha sala. Felizmente ela fica logo no fim do corredor, virando à esquerda.
Diferente dos outros dias, a sala está silenciosa já que as crianças não estão aqui hoje. Sinto-me péssima, mas abro a porta com o sorriso mais casual que consigo colocar no rosto, embora não seja a melhor atriz; posso fingir que não estou morrendo de vergonha ao me deparar com as mães dos meus alunos. Algumas estão sorridentes, outras não disfarçam a impaciência e o descontentamento com o meu atraso. Eu caminho apressada até a minha mesa e deixo a minha bolsa e o material escolar sobre ela. Meus saltos ecoam pelo piso, quando ando até o centro da sala e deixo as minhas mãos descansarem em uma das cadeiras pequenas.
— Bom dia. Infelizmente eu tive um pequeno transtorno hoje de manhã e me atrasei um pouco. — Falo para justificar minha ausência e nesse momento meus olhos vagueiam pela classe.
Tenho um pequeno sorriso no rosto, ao me deparar com os desenhos que as crianças fizeram na sexta-feira antes de irem para a casa. Faz apenas dois dias e eu já sinto a falta delas. O cachorro azul da Chloe se destaca entre eles... Ela adora azul e adora animais.
— Como eu disse. — continuo a falar; desviando os meus olhos dos desenhos — Me perdoem pelo atraso. Mas não quero fazê-las esperar mais.
Eu volto para a minha mesa, buscando na minha pasta as folhas com o cronograma escolar. Todos os passeios e atividades que faremos fora da escola, quando alguém na porta me chama a atenção. Foi somente por uma fração de segundos e eu já me pergunto se não foi a minha imaginação, pois ao olhar de novo não vejo ninguém. Deixo o meu material sobre a mesa e caminho até a porta, abrindo-a rapidamente. Fico surpresa ao encontrar o estranho que vi há minutos, encostado à parede, como se tudo o que ele quisesse fazer agora é fugir.
— Olá... Você é o pai do garoto novo, o Javier? — eu pergunto, inclinando o meu rosto ao esperar a sua resposta. Ele não se parece com o Javier... Talvez seja o seu padrasto.
— Não. — ele responde simplesmente, como fez há minutos.
— Ainda acho que você está perdido. — eu digo, não contendo uma risada — A secretaria fica do outro lado, três corredores à direita.
— Sou o tio da Chloe. — ele finalmente diz algo além de "não", antes que eu feche a porta novamente — Adam sou o Adam.
— Ah. — eu murmuro, quando essa informação por fim faz sentido — O tio Adam, a Chloe fala muito de você. Só coisas incríveis, preciso enfatizar.
— Obrigado.
— Entre, escolha um lugar e se sente. — eu digo, abrindo um pouco mais a porta para deixá-lo entrar e gesticulando para a sala — Como você sabe eu também me atrasei e ainda nem comecei a reunião. Então fique à vontade.
Ele me devolve o sorriso e parece muito confuso ao olhar para as pequenas cadeiras ao redor da sala. Acho que foi exagero da minha parte dizer a ele que escolhesse um lugar. Se ele se sentar em alguma delas, fatalmente a quebrará.
Volto para a minha pasta e distribuo o cronograma para todas as mães, deixo o meu estranho por último. Dou-lhe um sorriso tímido ao estender a folha para ele e ganho um lindo sorriso e um — obrigado — como resposta. Ele é alto, se elevando com facilidade sobre os meus 1,65, 1,72 se eu contar os meus saltos e, bem construído fisicamente, não de forma exagerada, mas consigo ver sua boa forma sob sua camisa branca. Ele me olha de forma curiosa quando percebe que estou fascinada e eu me encanto ainda mais, quando vejo que seus olhos parecem um pouco mais escuros agora.
Balanço a cabeça. Totalmente inadequado Sarah; mulher estúpida.
Eu finjo que ele não está na sala, acompanhando cada movimento meu, enquanto eu desenrolo e abordo todos os tópicos da reunião. Poderíamos pensar que iríamos apenas discutir sobre os rabiscos das crianças, ou suas colagens com papel crepom. Mas hoje em dia, o jardim de infância é apenas a sementinha no alicerce da educação, tudo começa aqui; inclusive o amor que cada criança terá pelos estudos e pela escola. Tem tanta coisa que podemos fazer pelo desenvolvimento de um aluno e para mim, cada criança é única. Cada criança é um universo imenso, cheio de magia e possibilidades.
Depois de vinte minutos, eu falo individualmente com cada mãe e tenho um imenso sorriso estampando o meu rosto; cada vez que conto algo de especial sobre a criança em questão. Formei-me há três anos e desde então tenho apenas substituindo outras professoras em diversas escolas.
Essa é a primeira oportunidade de ficar tanto tempo com uma turma, uma experiência pela qual ansiei por muito tempo. Eu sempre soube que amaria as minhas crianças, sou uma pessoa extremamente afetiva; mas o amor que eu sinto por cada um em apenas dois meses, é quase assustador. Eu ficarei arrasada ao dizer adeus e sei que o que me consolará, será saber que deixei uma marca na vida de cada um.
Despeço-me da última mãe, então me dou conta de que estou sozinha com o estranho, não tão estranho assim; tio Adam. Adam... Eu gosto da simplicidade do nome, se comparado a quanto o seu dono chama a atenção. Agora aqui perto, é como se ele ocupasse todo o espaço ao redor e os seus olhos são tão vívidos, nunca abandonando o meu rosto. Isso me incomoda um pouco. Talvez me incomode muito.
Ele sorri, passando a mão em seus cabelos e eu aproveito para olhar os seus dedos; nenhuma aliança. Não que eu me importe.
— Olá. — eu repito, encostando-me à minha mesa e cruzando as mãos em frente ao corpo — Vamos falar sobre a Chloe?
—Claro, estou ansioso para isso. — ele diz, parecendo um pouco mais à vontade agora.
— Sou a senhorita Martinez. — falo, caminhando até o armário para pegar a pasta de Chloe e me viro para acrescentar — Mas isso você já deve saber.
É claro que ele sabe sua boba; o seu nome está na porta.
—Eu adoro a Chloe. — digo com alegria, ao caminhar para a minha mesa outra vez — Ela é um amor de criança.
— Ela é sim. — ele ri, colocando as mãos sobre a mesa para me olhar com atenção — Ela é muito especial e gosta muito de você.
— Isso só me faz a pessoa mais feliz do mundo. — falo, voltando a me concentrar na Chloe.
A Chloe, que é o único motivo para ele estar aqui; completo em pensamento. Ele está cada vez mais próximo e o seu perfume flutua no ar, fazendo com que eu me enrosque ao falar algumas vezes.
Eu só tenho maravilhas para falar sobre a Chloe, ela é uma doce menina, todas as minhas crianças são. Eu tenho muita sorte. Mas a Chloe é especial, isso é algo que se reflete facilmente em seus olhos.
Ela é esperta e participativa, tem uma bondade nata e está sempre disposta a ajudar um amigo. Acho que isso vem, em grande parte, da família linda que ela tem. Isso é definitivamente muito importante para qualquer criança. Ela está fascinada com o irmão e fala dele com o maior amor do mundo. Não posso conter o sorriso, quando me lembro dos seus relatos sobre o pequeno Noah. Estou ansiosa para conhecê-lo.
— Chloe está se desenvolvendo perfeitamente. Na verdade, ela tem uma grande habilidade social, é muito inteligente e falante. — digo, me encostando à lousa para cruzar os braços — Isso me surpreende, já que me disseram que ela era muito tímida há um ano.
— Ela era realmente. — ele me diz, colocando as mãos no bolso — Mas a convivência com a minha mãe a deixou mais falante que um radialista e conviver comigo, também pode ter ajudado.
Isso também me surpreende, porque ele parece muito tímido para mim, mas talvez ele apenas se sinta deslocado agora. O tio Adam sobre o qual a Chloe fala insistentemente, é muito engraçado e confiante. A sensação que eu tinha antes de conhecê-lo é de que ele fosse um fanfarrão, com um ego gigante. Porém o homem à minha frente parece ser tudo, menos isso. Embora ele não se importe nem um pouco em me olhar com intensidade, como se enxergasse a minha alma, a mesma alma que eu fiz de tudo para deixar bem escondida quando o assunto fosse o sexo oposto.
— Tem algo mais sobre o que queira falar? Quer perguntar alguma coisa? — eu pergunto a ele, enquanto fixo o meu próprio olhar em um ponto na lousa ao fundo.
— Não. — ele responde de forma sucinta, a voz soando um pouco mais rouca agora.
— Então é isso. — tento sorrir quando volto a olhar para ele — Foi um prazer, mande um beijo para a Chloe.
Ele não responde, apenas digitaliza todo o meu rosto e tenho a sensação quase insana que a palavra beijo o deixou um pouco corado. Eu me pergunto que cor estão os meus olhos agora. Verdes ou castanhos?
Provavelmente verdes, já que minha mãe sempre me disse que eles ficam verdes, quando eu me sinto nervosa ou tímida. Talvez as minhas bochechas também estejam vermelhas. Ele não para de me olhar, ele não se mexe; parece que nem mesmo respirou nesses últimos segundos. Esse seria o momento em que eu jogaria o meu charme, ele parece interessado o bastante. Mas, eu sou péssima para paquerar, essa não é uma das minhas habilidades naturais e saber que aqui não é nem a hora, nem o local adequado para isso; deixa-me ainda mais travada.
— Então tchau. — falo enquanto praticamente o empurro até a porta, isso aconteceu muito desde que nós vimos pela primeira vez.
— Tchau. — ele para em frente à porta aberta e segura a pasta com os trabalhos escolares da Chloe.
Tento sorrir uma última vez antes de fechar a porta, mas estou perturbada demais para isso. Eu não sei o que aconteceu aqui, mas não foi normal e eu espero nunca mais vê-lo novamente. Não posso gostar de alguém que não para de me olhar e me faz agir feito boba assim.
— Como é o seu nome? — ele pergunta baixinho, como se estivesse sussurrando para mim através da porta fechada.
Eu encosto a testa na madeira, enquanto penso se devo ou não responder. É um dilema, embora eu não veja nenhum problema em sua pergunta. A questão mais importa é; por que ele quer saber?
— Sarah. — digo, soltando lentamente o ar dos meus pulmões — Meu nome é Sarah.
— Lindo nome, Sarah. — ele diz e mesmo sem vê-lo, posso imaginar o sorriso em seu rosto.
Eu ouço os seus passos sumirem no corredor vazio e mesmo assim não me mexo. Talvez eu me atrase amanhã novamente, mas posso garantir que não será culpa do Henry Cavill, acho que meus sonhos terão outro herói a partir de agora e isso é totalmente inadequado.
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