21. Nós dois
O príncipe Murad havia viajado alguns dias para o enterro de seu irmão Ahmed, mas logo estava voltando. A sua esposa, ficava cada vez mais cansada. Eu tentava levar ela para passear pelo menos no castelo, mas sua saúde não permitia mais. Ela estava fraquinha. Todas as tardes nós conversamos sobre a infância dela e também a minha, claro sem explicar sobre o futuro de onde eu vim, mas relatei vários detalhes da minha convivência com o meu pai. Falávamos de preferencias pessoais e tudo mais. Isso só acontecia quando ela estava acordada, por que o restante do dia ela dormia muito. Nesse tempo, os eunucos ficavam vigiando seus aposentos, e ela havia deixado claro que eu poderia sair enquanto ela dormisse, mas claro, indo para lugares bem próximos. A sua barriga estava enorme, e logo ela dará a luz. Seus pés e suas pernas estavam inchados há um tempo. Eu sempre fazia massagem com algum óleo especial, como jasmim ou lavanda, para poder aliviar as dores. Enquanto ela dormia, eu saio para ir até a praia e caminhar um pouco.
É tarde, o sol está alto, mas não está calor. Fico aliviada pelo vento frio refrescante estar ao meu favor. Fiquei admirando aquelas ondas de longe, e a sombra das nuvens sendo refletidas nelas. Sento-me na areia para contemplar o silencio e a natureza e começo a pensar na minha mãe, em como ela deveria estar e o que poderia estar fazendo. Relembrei das nossas tardes de sábado tomando sorvete e fazendo pipoca enquanto assistíamos séries e filmes. Era o nosso passatempo favorito. Saudades de ir papear na casa da Leila. Algumas vezes eu passava um final de semana com ela na casa de campo de sua família. Sempre tiveram condições, mas ela sempre se sentia sozinha, então eu acompanhava. Fico imaginando como todos estão agora, e como seria se eu voltasse para o futuro. Depois de pensar nisso, escutei passos de alguém, olhei ligeiramente para trás e Iskender se aproximava.
— Está aqui sozinha?
— Não mais. — Eu disse. Ele sorriu para mim e se sentou ao meu lado.
— Eu não perguntei antes como está a sua vida na província. Como está?
— Melhor do que na capital. Praia não é um lugar que eu sonho em estar sempre, mas eu gosto bastante daqui. — Ele não parava de me olhar meio admirado, então pigarreei e mudei de assunto. — E Ayla, deu alguma notícia pra ela?
— Não. Desde que vim para cá não tive notícias dela.
— Acha que o que tem entre nós pode piorar a situação dela? — Ele observava minhas expressões e pensou antes de falar.
— Ela tinha ciúmes de qualquer mulher que chegava perto de mim. Mas uma hora ela vai entender que não a quero.
— Mas... enquanto a nós aqui? Eu e você?
— Eu sou um janízaro e pela lei não posso me casar. Apenas posso ter você, mas nada, além disso. Mas não vou negar que meus pensamentos sempre estão em você e anseia por algo mais.
Fiquei atenta a cada palavra, quero ter certeza do que ele pensa e o que quer de mim. Assim irei ter certeza do que há entre nós. Mas aqui os tempos são outros, e as oportunidades também, então não devo esperar muito.
— Se eu pudesse — Ele pegou na minha mão. — Eu me casaria com você e ficaríamos juntos, bem longe daqui. Mas se eu abrir mão de tudo aqui, não vou ter nada e serei dado com um traidor do império.
— Eu sei. — Uma conformidade dolorida, triste e ardente estava em meu peito.
— Mas saiba que eu vou te proteger. Não deixarei que nada te aconteça. — Ele segurava minha mão firmemente e olhava nos meus olhos, transmitindo a verdade. Fiquei muito satisfeita por encontrar mais alguém para confiar.
— Não vai me dar um beijo? — Eu soltei uma grande gargalhada, acabando com o clima.
— Muito atrevido você.
— Ah. Bom, então a senhorita me permitiria beijá-la?
— E no quartel vocês aprendem a serem românticos com as mulheres?
— Sim. — Ele se aproximou bem perto do meu rosto e pôs o polegar no meu queixo. — Aprendemos não só como guerrear, mas aprendemos a flertar, principalmente mulheres bonitas. — Nos beijamos, ele segurou meu rosto acariciando. Seus beijos eram leves, mas bem seguros, me tocavam com bastante delicadeza, selando meus lábios. Depois nos deitamos na areia, ele levemente veio por cima de mim, colocando uma das suas pernas entre as minhas. Fiquei mais entregue quando nos beijamos com mais vontade, ao invés de beijos mais simples. Iskender estava mais voraz, e nós nunca tínhamos oportunidade de nos sentir mais. Meus momentos com ele se tornava cada vez mais profundos. Eu acariciava seu rosto lentamente, ele deixou cair sua zarcola e eu pude agarrar seus ombros firmes e sua nuca. Ele passou sua mão firmemente em minha cintura e depois minha barriga. Eu fechava meus olhos e me permitia sentir aquilo. Em seguida, seus lábios correram sobre meu pescoço, atiçando-me inteiramente. Sua mão esquerda subiu sobre meus seios, apertando-os, depois beijou meus lábios. Resolvemos parar quando escutamos passos se aproximando.
— Droga. — Eu larguei logo e tratei de me arrumar, tirar a areia que estava na roupa. Iskender colocou a zarcola e se afastou um pouco, ficando em posição. Os janízaros e o príncipe Murad haviam chegado. Murad estava sério assim que nos viu juntos.
— Por que estão aqui?
— Ah. — Eu me pronunciei primeiro. — Eu estava caminhando na praia. Iskender veio me acompanhar assim que me viu.
— Moça, é melhor voltar para os aposentos de minha esposa. E Iskender, volte para o seu posto.
Nos curvamos e obedecemos, eu sai sem mesmo levantar minha vista. Murad estava de mau humor, então preciso cooperar. Preciso ficar atenta aqui também, com a esposa do príncipe com quase 9 meses, devo prestar mais atenção. Faz três anos que estou aqui, e momentos mais a vontade como esse, me parece impossível enquanto eu estiver aqui e na posição em que estou.
No castelo, a senhora Vaisa não estava acordada, pedi para que os eunucos verificassem se estava tudo bem. Ela estava apenas dormindo. Murad havia chegado à porta dos aposentos da princesa, mas como ele foi notificado que ela estava descansando. Ele veio ate mim, e pediu para conversar comigo. Fomos a um quarto reservado, bem próximo da li.
— Nadira, perdoe-me pelo meu comportamento mais cedo. Eu não estou bem, como já sabe. Mas de maneira alguma eu queria ser grosseiro com você.
— Não se incomode com isso vossa alteza, está tudo bem. — Dei um sorriso para transparecer a confiança.
— Mas fiquei surpreso de ver você e Iskender juntos. Há algum tempo, ele te olha diferente. Mas não imaginei que ele chegaria tão perto.
— Sua alteza, eu não entendo de que forma isso pode te incomodar. — Fiquei surpresa, não pensava que prestasse atenção no que Iskender fazia.
— Você é a escrava mais preciosa que temos. Minha esposa precisa de sua atenção agora.
— Nunca deixei de atender a sua esposa, senhor. Ela é como uma amiga, uma mãe para mim. Jamais recebi tão grande carinho. Mas não pense que o que o senhor vê ou acha, pode mudar sobre mim aqui nesse lugar. Serei fiel e grata a vocês, mas eu sei que não passa na sua consciência de que eu infringiria regras. Iskender é alguém que estimo e me sinto bem próxima dele, nada vai atrapalhar.
Ele calou a boca quando ouviu isso, suspirou e disse.
— Tudo bem. Eu confio em vocês.
O sentimento que eu tinha antes por Murad, meio que se despedaçou um tempo para cá. E foi bom, apenas vê-lo como alguém que pode me ajudar, é melhor do que criar fantasias.
— Fico feliz alteza. Mas se me permitir, como foi na capital?
— Meu ficou abalado. Todos nós. Mas o que se esperar se um rapaz jovem daquele que amava o nosso irmão, não faria uma loucura dessas? Que Alá tenha piedade daquele menino.
— Meu Deus.
— O pior é que tudo foi causado por aquela mulher. Ela está por trás de tudo, pois morre de medo de ficar sem sua posição e seus filhos serem mortos.
— Imagino o quanto deve ser difícil ficar nessa situação, ver uma pessoa da sua família ser morta por provocações de outra.
— E o pior é que o meu pai não faz nada. A situação é de mal a pior. Selim e Bayezid estão em guerra. Lutam pela sucessão.
— O senhor não se imagina como um sucessor do império também?
Ele olhou para mim intrigado, se sentou na cadeira refletindo minha pergunta. Eu tinha curiosidade se ele havia pensado de tomar o trono alguma vez.
— Eu nunca sonhei em ser sultão. Em ser o imperador do mundo. Sou filho de uma concubina de posição baixa. Minha mãe se chamava Gülfem. Não tinha tanto status como Rourem ou Mahidrevan. De qualquer forma, se eu criasse uma rebelião eu seria enforcado. Gosto desse lugar aqui. Me trás paz e liberdade. Não serviria de nada eu viver em Topkapi com assuntos administrativos, descobrir conspirações e qualquer outra perturbação.
Sim, ele permanecerá livre dos irmãos, mas será vigiado. Mortes continuaram no império. Ele interrompeu meus pensamentos se pronunciando novamente.
— Estou preocupado com minha esposa. É a quarta vez que ela fica grávida, e a situação é a mesma. Mas não nego minha felicidade de ver sua barriga crescer e de imaginar uma criança entre nós. Sempre fui conformado com isso, mas não nego que sonho em ser pai. Não me sinto solitário, pois tenho ela. Mas ainda sinto que não sou um homem completo.
— Eu sinto muito alteza. Mas vamos pensar positivamente, ela sairá dessa situação e tudo vai ocorrer bem. Esperamos que ocorra.
Ele assentiu com a cabeça e me dispensou. Ele estava perturbado, mas foi uma maneira dele desabafar. E fico feliz que ele tenha confiança em mim e poder falar o que pensa.
Depois de algumas semanas o príncipe cada vez mais ficava presente da princesa. Ela estava muito debilitada, mas sorria sempre quando podia. O príncipe saiu para resolver assuntos administrativos com os conselheiros, eu e Vaisa estávamos juntas conversando. Ela sentada em sua cama e eu do seu lado. Ela perguntou o que eu e Iskender temos.
— Se eu disser que somos apenas amigos... A senhora não acreditaria.
— Não porque eu sei que ele gosta de você não só como amiga. Vamos, me fale.
— Acho que sentimos algo um pelo outro. — Fiquei envergonhada em dizer isso, já que ninguém sabia. Mas a senhora Vaisa era alguém confiável e que eu poderia contar. Então deixei a vergonha de lado.
— Eu e Iskender nos beijamos. Ele disse que se pudesse casaria comigo, mas por conta da lei ele não pode. Mas sabe aos poucos o sentimento se mostra, e eu não acreditava nisso, ou nele. Minha atração por Iskender, aumenta cada vez que nos vemos. Mas creio que isso é impossível para nós.
— Por que vocês são escravos eu sei. Ah mas Nadira, isso é tão lindo. — Ela pegou a minha mão e segurou firme. — Parece aqueles romances impossíveis.
— Bem impossível mesmo.
— Querida, nesse mundo nada é impossível. Sempre há um jeito.
— Mas se podemos ficar juntos, na verdade há os empecilhos, não somos livres e nem podemos ser contra a nada disso.
— Então tenha paciência. Se de fato é para dar certo, com certeza dará.
Sempre ouvi essas palavras, mas nunca fez sentido. O que justifica "se der certo, com certeza dará?" Para mim não havia resposta concreta para isso, então eu acredito em ações, se fizermos algo que provoque uma reação então se concretizará. E nesse caso, infelizmente nem ação e reação pode dar andamento entre eu e o Iskender.
— Por mim o que eu puder fazer por vocês dois eu faço. Faço questão.
— Às vezes me admiro de sua bondade senhora. Como pode ter um coração tão lindo?
— Não sei, mas ninguém merece viver triste nesse mundo. Um dia a felicidade chegará. Acredite. Um dia você vai lembrar essas palavras.
Claro que sim. Ela sempre será guardada em um lugar especial no meu coração.
Sai do quarto e andei pelos corredores, fiquei criando esperanças na minha cabeça, e imaginando mil maneiras até de fugir de Alânya. Imaginei até Iskender vivendo comigo no futuro, conhecendo prédios, cidades, as ruas largas... Puro sonho.
— Ah, você está aqui.
Uma voz reconhecível me provoca atrás. Viro-me rapidamente e é Iskender. Sinto o meu corpo aquecer quando estou na presença dele. Ele pega minha mão e fomos até a sacada de uma torre.
Estávamos na torre mais alta do castelo de Alânia, e podíamos ver o mar e um estaleiro naval logo abaixo, ao lado da torre. Essa construção era um pouco diferente das outras, e maior também. Ele começou a me beijar vorazmente, já que não tinha ninguém por perto então resolvemos aproveitar. Quando paramos de nos beijar, certifiquei-me de apreciar a vista do alto da torre.
— Nunca vi esse lado do castelo.
— Aqui tem uma história interessante. Essa construção se chama Torre Vermelha e foi construída por um sultão. — Iskender apoiou seus braços nas pedras que erguiam a torre em que estávamos.
Hum, histórias. Adoro. Fiquei atenta a escutar o que Iskender queria me falar.
— Um sultão chamado Coicobado I, do sultanato de Rum mandou construir essa torre, que pelo nome você já sabe, a cor avermelhada. Aqui era apenas uma construção bizantina e romana, então os turcos de Rum, vieram e construíram essa fortificação e aqui era onde o sultão passava o inverno. Aqui era uma região muito hostil, mas há séculos está pacificada.
— Hum. Você aprendeu essa história a onde?
— Todos nós sabemos disso aqui. Isso aqui foi tomado depois por Mehmed II.
— E foi assim que o império do mundo nasceu.
— Sim. — Pronunciei. — Suleiman acredita que ele governa a terra. Mas o mundo é muito maior do que ele já viu. Há nações mais poderosas no mundo, que surgirão uma derrubando a outra. Até mesmo o império otomano vai ruir um dia.
— Impossível! Não há nação mais poderosa que a nossa. Alá está conosco.
— Iskender, não se trata de religião, fé ou Deus. É a evolução da sociedade, das pessoas e até do mundo. O homem faz a mudança na terra. Nasce uma nação e depois a derrubam para formar outra. Sempre haverá isso. — Ele me olhou confuso, me analisando. Percebi que a mente dele embolou quando falei isso. Tudo bem.
— O que quero dizer é que o mundo sofre mudanças mais cedo ou mais tarde. — Ele ficou olhando para o mar, refletindo as minhas palavras.
— Acho que tem razão. Mesmo eu acreditando que o nosso exército é mais que qualquer coisa que possa nos atingir.
— Continue acreditando em suas espadas. Uma hora elas deixarão serão úteis.
Passaram-se alguns minutos e admiramos a vista do mediterrâneo. Achei que os janízaros montariam guarda por aqui, mas só havia nós. Resolvi falar com Iskender sobre nós naquela situação do palácio.
— O príncipe não acha interessante nós ficarmos juntos. — Encarei o seu rosto, esperando ver sua reação.
— Ele disse o motivo?
— Acho que ele não confia em você. Não sei. Talvez tenha medo que eu não cumpra minhas obrigações de cuidar da esposa dele. Estamos ficando cada vez mais preocupados.
— Ele já passou por isso outras vezes. É um homem solitário, e a esposa é a única ligação às coisas boas que ele conhece.
— Então, o príncipe Murad nunca foi daquele jeito? Digo, ele antes não era um homem doce e compreensível?
Iskender deu um suspiro como se fosse contar uma longa história.
— Ele e a sua mãe sempre sofreram muito no palácio do sultão. A mãe veio de uma hierarquia de concubinas mais baixas então não era favorecida por Suleiman. Murad também não era. Quando tinha quinze anos foi dada essa província para ele administrar.
— Aqui é o melhor lugar para ele. Deve ter sido difícil passar todos esses anos longe do pai e sendo exilado.
— Espero que tudo ocorra bem para ele. — Ele pegou a minha mão, encerrando o assunto. — Mas, — disse ele. — Vamos voltar par ao castelo antes que nos peguem.
— Achei que não tinha medo. É um soldado janízaro que usa espadas e tem muita, mas muita coragem.
— Está zombando de mim moça?
— Não. Apenas admirando sua conduta de soldado que segue as regras, e de vez em quando sequestra uma serva do palácio. — Iskender expandiu um lindo sorriso em meio a sua barba e me deu um beijo em minha bochecha. E voltamos para o palácio antes que dessem por nossa falta.
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