11. Conversas e Conflitos
No dia seguinte, trabalhamos muito. Limpamos os tapetes, lavamos muitos, mas muitos lençóis. Comigo eram dez meninas, lavando e pondo para secar em um grande varal em um terreno com muros bem altos. Lá em cima, eu via os eunucos, passando para lá e para cá. Meu cesto estava vazio, estendi a maioria dos lençóis, mas lá atrás, tinha um grande amontoado de roupas lavadas, prontas para serem estendidas. Respirei fundo, pois nem lembro de quantas vezes já peguei o cesto cheio hoje, andei em direção aquela montanha de tecidos coloridos. Enquanto me dirigia até as roupas, eu me lembrei da máquina de lavar que minha mãe havia comprado dois meses antes de viajarmos para Istambul, me recordava do som dela enquanto ela lavava e centrifugava as roupas, aquele cheirinho de amaciante, que minha imaginação puxava de longe. Enquanto fazia meu trabalho, eu percebi uma garota me encarando, eu escolhia os lençóis, tentando me concentrar na minha tarefa, mas ela dobrava os lençóis, me olhando com um ar sério, analisando meus gestos. Ela tinha a minha altura, cabelos castanhos e um pouco cacheados, olhos pretos e pele morena, era corpulenta, não gorda, mas era muito bonita em termos físicos. Eu desviei meu olhar, até quando ela falou.
— Além dos príncipes você chama atenção de Iskender também? — Ela falou com muita raiva, jogou até as roupas de volta no amontoado.
— Como é? — Franzi a testa, tentando entender.
— Ah meu Deus, é surda também?
— Não sei do que está falando! — Ela riu, mas não de graça, e sim de deboche. Senti-me incomodada e desrespeitada por ela, não sei o que ela imagina, mas acredito que me causará problemas.
— Ayla! Deveria estar fazendo seu serviço, e não gritando por aqui. — Dilara se aproximou de nós, mostrando sua autoridade. A menina logo se calou, depois ficou encolhida, quieta quando Dilara a encarava igual a um cão de guarda. Com certeza essa daí me trará problemas.
Mais tarde, fui me encontrar com o Senhor Devrim. Eu tinha que ver como estava minha mão. Duas semanas se passaram, e meu tornozelo estava muito melhor, minha mão já estava curada. Eu ia mais para espairecer, conversar com alguém do "meu tempo", me ajudava a me manter ali sendo cautelosa. Confesso que ir lá era um certo tipo de conforto para mim.
— Ah, sua mão está melhor. Os arranhões estão cicatrizados. — Ele tirou as ataduras e deu leves tapinhas na minha mão curada. Aproveitei para mudar de assunto.
— Senhor Devrim. Andei pensando na minha vinda através do tempo. Eu penso que há algum portal, que nós possamos voltar.
— Sim. Tem um portal, mas não sei onde encontrar.
— Pela sua conversa na última vez, eu lembrei do que o senhor havia me dito como chegou aqui. Eu vim pelo mesmo portal que o senhor, a construção antiga, em um sítio arqueológico na cidade.
Ele olhou para mim pensativo.
— A senhorita esteve lá?
— Com certeza lá, deve ser o local de volta para casa.
— Mas senhorita, eu tentei ir lá uma vez, antes de ser médico do palácio e não consegui voltar. Vi o poço antigo, mas nada me levou de volta.
— Então, o senhor pensa que só poderíamos passar se algo acontecesse?
— Acho que sim, mas não tenho ideia do que seja. — Na mesma hora, um pensamento de longe me fez lembrar um comentário do meu colega da faculdade, o Tomás. Um alinhamento dos planetas.
— Senhor Devrim, acredito que possamos voltar para casa ainda. Quando eu vim parar aqui, aconteceu um alinhamento astronômico, de todos os planetas. Mas não sei dizer ao senhor quando vai acontecer novamente, como sabe, não sou boa com astronomia.
— Muito menos eu senhorita. — Ele riu com muita simpatia, mas logo em seguida seu rosto se tornou sério.
— Acha que podemos voltar? Digo...estou aqui a quarenta anos, e até agora não sei como voltar. E encontrar informações nesses tempos, é cada vez mais escasso.
— Vamos acreditar na esperança senhor Devrim. — Eu coloquei minha mão em seu ombro, e mesmo temendo não encontrar o caminho de volta para casa, eu decidi acreditar, mesmo estando confusa. De alguma forma, a palavra "esperança" me dava um conforto, em um lugar desconhecido e hostil, era tudo o que eu tinha. Ele sorria para mim, e colocou sua mão na minha, me apoiando. Isso já me dava uma alegria e uma possibilidade de poder encontrar o caminho de casa.
Voltei para a residência dos príncipes, já fazia um ano que eu estava aqui, eu ficava bem ansiosa em pensar nas formas de voltar para casa. Cada dia minha mente ficava mais confusa. De longe avistei o príncipe Murad, vindo em minha direção. Fiquei feliz de ver um rosto amigo.
— Olá senhorita. Como está?
— Muito bem, vossa alteza. — Eu olhei para ele mas depois baixei meu rosto, já que pelas regras que eu recebia, não podíamos olhar diretamente para a família real.
— Fiquei sabendo que a senhorita foi atacada no mercado? A senhorita está bem?
— Sim, graças a Alá nada aconteceu. O capitão Iskender e seus homens chegaram a tempo.
— Ah sim... Iskender.
— Algo de errado?
— Não, claro que não. — Ele sorriu timidamente. — Vou encontrar com o meu irmão Bayezid. Preciso tratar alguns assuntos.
Abri espaço para ele passar, passando por mim, senti um perfume de sândalo, que me fez respirar profundamente para sentir mais. Sem querer abri um sorriso. O rosto dele não saia da minha mente, uma face que trazia paz, seus cabelos escuros e olhos azuis, me fizeram lembrar de quando ele me salvou na piscina. Ele é muito gentil, sempre que o vejo me desperta algo diferente. Será que é paixão?
À noite, eu e outras servas estávamos terminando de organizar alguns tapetes que tínhamos lavado e estávamos prontas para irmos ao banho, e após isso, dormir. Eu andava em tantos corredores que já decorava todos os caminhos de todas as salas. Eu segurava alguns tapetes menores, e estava indo em direção a um dos quartos, mas ouvia uns sussurros estranhos. Duas vozes. Em uma parede falsa, havia uma abertura escondida, quando me aproximei eu vi que tinha uma portinha de madeira, e como era velha, tinha umas frestas, que davam para ver razoavelmente duas pessoas, pois o quarto era escuro e mesmo com pouca iluminação das velinhas, eu vi que eram Iskender e Ayla. Estavam discutindo, mas sussurrando.
— Me diga Iskender! Por que não quer se deitar comigo?
— Ayla, eu já te falei. Estou cansado.
— Então ultimamente você anda muito cansado? Lembro-me de você mais cansado do que isso e fazíamos muito bem.
Pela expressão do Iskender, ele estava pensativo, nervoso, mas mantinha a postura. Ele estava sentado na cama, e ela em pé na sua frente.
— Vá embora Ayla. A senhora Dilara deve estar procurando você. — Ele tinha sua mão no queixo, dois dedos cobriam sua boca, e seus olhos fitavam o chão.
— Iskender... — Ayla começou a se despir, tirando bem devagar sua capa, e em seguida jogava seus cabelos longos para trás dos ombros, e ela se mostrou para ele. O corpo dela era lindo.
— Olhe para mim! — Ela falou com a voz trêmula. — Ele olhou, mas não deu importância. Pegou a roupa dela, e cobriu, pondo a capa nos ombros dela.
— Vá embora, por favor.
Eu imediatamente saio da li e me escondi em uma coluna próxima, mas eu não me mostrava visível. Ela saiu correndo, chorando e segurando a capa. Estava magoada, entendi agora o porquê ela estar com muita raiva da aproximação dele comigo. Poucos segundos depois, sinto uma mão em meu ombro, e senti um calafrio na espinha. Droga, fui descoberta! Era Iskender, com o seu ar sério.
— Ah, pois não capitão?
— Escutou a conversa toda?
— Toda em que sentido? Digo, não ouvi nada, eu estou apenas passando e preciso levar os tapetes para outras salas. O ambiente tem que ficar "bonito" sabe? — Fui falando coisas ridículas e meio nada a ver, mas eu tinha que inverter a atenção dele de me achar bisbilhoteira. Ele deu um meio sorriso e me puxou para o quarto.
— Venha aqui.
— Não, você é doido?
— Preciso conversar.
— Ah mas agora? — Ele nem me ouviu. Pegou meu braço e fomos para o quarto, por mais que eu estivesse receosa, lembrando do que aconteceu comigo, eu por algum motivo que não conhecia, eu confiava em Iskender. Eu sinto que ele não faria mal a mim.
— Não pode contar isso para ninguém.
— Sério? Por que acha que eu iria contar? Desculpe, preciso levar os tapetes.
— Eu sei que não, mas entenda, ninguém pode saber.
— Por que tanto medo? Se sabe que é perigoso aqui no palácio, deveria tomar cuidado em se encontrarem aqui.
— Você tem razão, mas Ayla é complicada. — Ele sentou na cama e cobriu o rosto com as duas mãos.
— Sim, eu percebi. Ela não gostou quando você me trouxe do mercado para o palácio.
— Ela me falou sobre isso. Ela pensa que temos algo. — Ele deu uma risada de leve falando essas palavras, depois direcionou seus olhos para mim. Fiquei encantada por alguns minutos, mas depois hesitei e cortei o clima.
— Mas por favor, é sério. Não fala para ninguém. — Eu estranhei o medo dele, todo mundo aqui parecia saber da reputação dele. Mas acho que é pela segurança de Ayla.
— Bem, se já terminou eu vou embora agora. — Dei meia volta e passei a porta, supervisionando se não tinha ninguém me olhando. Iskender saiu em seguida, e ficou me observando de longe.
Agora essa, preciso parar de me meter tanto nesses conflitos. Cada vez mais, esses momentos inoportunos acontecem. Mas admito, minha vida aqui é mais agitada do que antes. De vez em quando, se olhar para o outro lado, é divertido.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro