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Capítulo 26 "Não te ataquei...William"

Julieta

Os quadros na parede estão torto. Os meus pés estão frios. A televisão está demasiado brilhante e a minha cabeça está uma feita numa sopa. Bato com a cabeça na almofada e viro-me de lado. Os meus lábios estão dormentes com a memória de William e o meu peito dói com as memórias do Harry. Esfrego a cara e rolo na cama, não consigo dormir.

William

O livro que estou a ler não faz nem sequer metade do trabalho que deveria neste momento, tudo aquilo que o meu cérebro irritante consegue fazer é projetar a irascível Miss.Cross a atirar-se para cima de mim e a beijar-me como se estivesse a tentar tirar algo doloroso d dentro dela. Poiso o livro e penso no que será que ela esconde de tão grave que nem bêbada me consegue dizer... encosto a cabeça á cabeceira da cama e olho para a janela. Detesto e adoro a maneira como ela me deixa, os meus instintos dizem-me que isto vai correr mal especialmente porque ela é muito temperamental, no entanto cada vez que pondero mandá-la embora algo mais forte impede-me. Espero não estar a pensar com a cabeça de baixo.

Harry

Megan está deitada ao meu lado e passo as mãos pelo cabelo. Que merda é que ando a fazer? Sinto que ela me está a escapar pelos dedos, cada vez que olho para ela está mais e mais distante, desde que começamos a trabalhar cada dia que passa ela está mais de um lado, um lado que não é o meu. O corpo de Megan vira-se ele mete a mão em cima do meu peito vestido. Com cuidado para não a acordar poiso a sua mão na almofada e levanto-me. Vou até á janela e sento-me num dos sofás. Não era suposto ser a Megan ali, era suposto ser a Julieta, era suposto eu acordá-la a meio da noite, dizer-lhe que amo e tentar a minha sorte mais uma vez, e mais uma vez até que o sol se levantasse e nos fizesse bocejar de cansaço. Ela quer-me, eu sei que sim, está só traumatizada, precisa que eu a vá buscar onde quer que esteja escondida e em vez disso eu estou a dividir a cama com uma mulher que ela detesta. Pensei que se lhe desse a ilusão de estar a seguir em frente a fizesse perceber que o que tivemos é especial, em vez disso só lhe deu mais certezas de que precisa de me deixa ir, como se eu precisasse dela para decidir isso por mim.

Dois dias, dois malditos dias e ele nem sequer mencionou o beijou vergonhoso uma única vez, sei que uma parte de mim devia estar muito feliz por isso, mas em vez disso encontro-me a stressas, e se ele me denunciar? Quer dizer eu beijei-o em território proibido, ele estava em minha casa quando fez avanços. Será que estou a exagerar? Uma parte de mim acha que não, mas outra sabe que sim, as pessoas beijam-se é normal, se ele se estivesse a engasgar com um pedaço de comida eu teria que o agarrar e fazê-lo cuspir aquilo, se ele se estivesse a afogar no mar por causa do surf ia ter que fazer-lhe respiração boca a boca e isso é quase um beijo. Não foi assim tão idiota...

-Um de vocês vem comigo á reunião sénior por favor com um bloco de notas ou qualquer coisa em que possa escrever?

A voz dele acorda-me e vejo que a Sam está a ocupada a olhar para um papel plastificado e Samuel a escrever furiosamente no computador. Samuel aponta para mim com o queixo.

-Vai tu.

Não.

Não vou nada.

-Não acho que...

Mr.Pella passa para o elevador e carrega no botão.

-Não tenho tempo para isto Julieta, despache-se.

A voz dele tem uma nota de desprezo e eu quero mesmo tenha um terrível acidente esta noite, que bata com o dedo mindinho no canto de um móvel caro qualquer que tenha em casa. Levanto-me com o bloco na mão e uma caneta e vou atrás dele. No elevador ele começa a explicar-me.

-Não se assuste com o que ouvir, mas...

-Essa é a ultima coisa que se diz a alguém quando não se quer passar a ideia de medo. - Respondo sem realmente pensar.

Ele ri-se e depois aproxima a cara de mim, tanto que penso que me vai beijar outra vez. Uma parte de mim quer mesmo que ele se afaste e a outra está a pergunta-se porque é que ele tem tanta roupa?

-Estás mesmo a ficar paranoica não estás?

Abro a boca em espanto, então era este o plano dele? Deixar-me maluca. Quando lhe respondo a porta abre-se.

-Muito bem, como eu estava a dizer estamos a pensar em construir um novo edifício de raiz, mais perto da baixa, temos uma arquiteta que veio de Nova York, mas tudo o que vai ser discutido ainda não é certo por isso nem uma palavra disto a ninguém... agora que penso nisso devia ter trazido a Samantha, ela é muito menos tagarela.

Como é que ele pode passar de um homem sensual para um homem de negócios em menos de dois nano segundos?

-Porque é que não se pode dizer?

-Porque não temos a certeza de como vão correr as coisas, não podemos instaurar o borburinho, nem uma palavra senão haverão consequências.

Ele diz a palavras "consequências" num tom tão escaldante que tenho a certeza que o lado esquerdo das minhas cuecas se começou a derreter. Abre-me a porta e eu entro. O pai dele está a falar com uma mulher e o resto dos homens estão sentados. Ele puxa uma cadeira e senta-se e eu encosto-me ao móvel.

O pai dele vira-se e sorri-me, sorrio de volta e tanto ele como a Americana se sentam, ela é linda e tem uma aura bondosa á sua volta, o facto de estar aqui a negociar com todos estes homens deixa-me impressionada.

-Bom dia senhoras e senhores, como sabem hoje estamos a dar um passo em direção ao futuro por isso gostaria de vos apresentar a arquiteta e a sua equipa, Sophia Black e Adam Pettersson.

Oiço o que eles dizem e fico espantada com as quantias de dinheiro de que estão a falar, são quase ridículas e fazem-me pensar que ainda há dois dias estava a chorar pelas cinquenta libras que gastei numa estante. Para que é que querem um edifício novo? Este é claramente perfeito, talvez não o mais novo mas pelo menos é perto de casa, eu demoraria muito mais tempo a chegar à empresa se esta fosse no centro...isto se ficar com o trabalho. Miss.Black fala de uma forma calma e explica o que tem em mente, ela parece muito nova para estar a comandar um projeto deste calibre, mas talvez seja mesmo boa no que faz. Tento acompanhar o que acho mais importante e escrevo tudo sem sequer olhar para o papel. No final da reunião todos se levantam e saem, no entanto William, o irmão e o pai estão a falar com Miss.Black. Penso que talvez seja melhor ir para baixo, no entanto fico parada a olhar para Mr.Pella que estende a mão para que me aproxime e lhe mostre o que tirei da reunião. Ele espreita e ri-se.

-A sua caligrafia é péssima. - Sussurra.

-Vou passar a computador. - Mordo de volta.

-Ótimo...isto se perceber o que escreveu.

Posso concordar que está tudo meio estranho, mas para ser sincera Deus escreveu direito por linhas tortas e eu fiz o mesmo, só que está mesmo tudo muito torto.

-Sophia, esta é a Julieta uma das nossas novas estagiárias. - O pai de Mr.Pella apresenta-me e aperto-lhe a mão.

-É um prazer Julieta, a minha filha tem um nome muito parecido, vi que estava muito atenta, especialmente aos números.- Ela ri-se.- Geralmente faço o mesmo quando o meu marido começa a desbocar números astronómicos.

-Oh mas o teu marido é o génio dos negócios. - O irmão de Mr.Pella diz-lhe.- Como estão as crianças?

Crianças? Ela tem filhos? Parece muito nova para ter filhos, no plural.

-Bem a Juliette está a adaptar-se ao novo irmão e eu também.

O telemóvel dela toca.

-Desculpem-me senhores, parece que o meu homem não pode ser deixado sozinho.

Ela afasta-se e depois viro para Pella.

-Posso ir para baixo?

-Podes, já lá vou ter.

Quando desço vejo Sophia encostada á parede com um sorriso gigante na cara, ela parece incrível e se já tem filhos e consegue manter uma carreira é impressionante. Aceno-lhe antes de abrir a porta da escadas e descer até ao meu piso onde Sam está ocupada a teclar furiosamente.

-O que é que estão a fazer?- Ambos, ela e Samuel se assustam.

-Que merda Julieta! Pensávamos que era o ele...

-Então? O que é que estão a fazer?

Eles reviram os olhos.

-A jogar, mas caluda... ele vem ai?

-Não, está a falar com... o pai?- Não posso dizer-lhes nada, de repente sinto que teria sido muito melhor se um deles tivesse ido no meu lugar.

Sento-me e ele aproxima-se de mim, Sam protesta e diz-lhe que ganhou porque ele parou de jogar.

-O que foi essa reunião?

-Nada de especial, mostraram um power point.- Digo rindo-me da maneira comos os números saltavam no ecrã.

-As reuniões são sempre uma seca, quando te fores embora vamos ter de voltar a trabalhar. - Ele queixa-se a rir.

-Esperem, vocês estão a aproveitar-se de mim?

Sam inclina a cabeça para trás a rir.

-Existe outra função para os estagiários?

Abano a cabeça e reviro os olhos.

-Querem café?- Pergunto num tom submisso.

-Não querida, não te incomodes.

As portas do elevador abrem-se e Mr.Pella sai a apontar para mim.

-Meia hora para ter isso no meu email.

-Sim senhor.

Ele gargalha e depois fecha a porta do gabinete. Volto a olhar em frente e vejo que tanto Sam como Samuel estão a franzir o nariz.

-O que foi?

Eles abanam a cabeça meio mudos.

-Foi impressão minha ou ele estava tipo a rir? Acho que nunca o tinha visto a rir-se. Devem ter feito um belo de um acordo lá em cima.

Mantenho-me calada e começo a passar a porcaria das notas para o computador, é um trabalho mais lento do que pensei que seria, ele tinha razão não percebo nada do que escrevi e tenho que virar duas vezes o bloco de notas para baixo para entender uma letra ou duas. Imprimo o que escrevi e depois envio por email. Sam espreita pela porta dele.

-Mr.Pella tem o seu pai ao telefone...vou passar.- Ela volta para trás e senta-se, o cabelo dela está pintado num tom claro de cor de rosa e adoro.

-O teu cabelo está muito bonito.- Elogio.

-Obrigada, podes levar isso lá dentro? Ele disse que não recebeu o teu email.

Franzo o sobreolho e verifico o email que enviei. Tenho quase a certeza de que foi o endereço certo. Pego nos papeis e bato à porta, ele está a falar ao telemóvel e aponta para o espaço na sua secretaria, quando me apróximo o suficiente e deixo os papeis em cima da mesa o braço dele engacha a minha perna e arregalo os olhos com a brusquidão do movimento. Ele puxa-me mais para ele e desliga a chamada.

-Depois falamos pai.

Ele ergue a cara e sorri-me.

-Tiveste tempo para pensar e ter um ataque de pânico?- Ele sussurra e eu tento afastar-me no entanto ele não me larga e dou por mim a sorrir.

-Pensar sobre o quê?

-Sobre o teu ataque.

-Não te ataquei...William.

-Oh eu acho que sim Julieta, e acho que não tenho doze anos para andar a jogar este jogo contigo.

Abano a cabeça.

-Por muito tentador que tudo isto seja é errado e não vou arriscar o meu emprego por...

-Por? Porque sentes isto não é? – Ele abana o braço e por consequência eu abano também. A minha pele arrepia-se onde o braço dele toca e a minha saia sobe.

-Sabes uma coisa?- Pergunta-me.- Quando te estava a levar para casa puxei-te pelo vestido e tu disseste-me para eu não olhar.

Olho para ele como quem pede a uma criança que continue.

-Mas eu olhei, tinhas umas cuecas de renda brancas fantásticas e agora só consigo pensar nelas.

Os olhos azuis dele fitam-me com tanta intensidade que tudo dentro de mim se contorce e humedece. Uma parte de mim quer tanto ver onde é que esta estrada vai dar, no entanto a outra têm demasiado medo de viajar por caminhos antigos. Num ato de coragem passo-lhe os dedos pelo cabelo escuro e ondulado.

-Digamos que eu aceito... o quer que isso seja em que posição é que tu vais ficar?

Ele sorri como um miúdo.

-Por cima, gosto de ficar por cima.

Reviro os olhos.

-Para além de chato e mal-humorado também dizes piadas como um miúdo de dezasseis anos.

Os dedos dele sobem-me pela coxa e reteso-me. Engulo em seco quando o sinto perto o suficiente para me tocar por cima das cuecas.

-Faltam meses até que precise de descobrir isso.- Acaba por me dizer.

-Não, não faltam, tira a mão daí.- Puxo-lhe o braço para baixo e afasto-me.- Isto é muito importante para mim, entendo que para ti seja só mais uma idiota do trabalho que te caía aos pés, mas eu não sou assim, eu não sou a Ellen mal educada.

Ele parece pensativo e depois levanta-se, a porta está mais ou menos encostada e ele fecha-a.

-Não me sinto dessa maneira, como se fosses mais uma.

-Conversa de "és a única" não caio nessa, esses anos já lá vão.

-Uma relação de exclusividade, portanto?

-Mas quem é que está a falar numa relação? - Levanto os braços.

-Não te entendo, beijas-me, depois eu digo-te que te quero para mim e depois fazes-te de difícil.

-Não me estou a fazer difícil. Não me disseste que me querias.

-Estás sim.- Ele ignora o que eu disse.

-Não vou andar pelos cantos da empresa a fazer-te favores sexuais.- Quero que isso fique bem esclarecido.

-Não queria que o fizesses...

-Mentiroso.

Ele revira os olhos e depois chega-se à frente, é como se tivesse delineado um novo plano de ataque.

-E se eu te levasse a sair?

-Não.

-Sim.

-Não.

-Sim.

Ele comprime os lábios e depois solto um som de exasperação.

-Onde?- Sou tão fraca.

-Posso escolher?

-Desde que me digas.

-Não és nada divertida.

Nenhum de nós diz e quando ele se inclina tão lentamente para cima de mim que sei que me vai beijar Samuel chama-me.

-Preciso de ajuda com a impressora.

-A impressora que se foda.- William diz e puxa-me para ele. Os seus lábios são lava nos meus e sinto-me derreter quando ele nos gira e me senta no aparado que tem perto da porta. Beijo-o de volta até perceber que esta porta é meio fosca, empurro-lhe os ombros ele resmunga qualquer coisa.

-Vou já.- Grito de volta e toco nos lábios com as costas da mão. 

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