Parte 2
— Cara, isso é loucura.
Reclamava Marco, enquanto escalava pedreira a cima, por uma espécie de trilha em formato de escada, esculpida nas pedras molhadas.
— Loucura foi você ter jogado meu anel na caverna — retrucou Caio.
— Mas eu ofereci te pagar outro, você que não quis — rebateu o garoto gordinho com dificuldades, mesmo não sendo uma escalada difícil —, você é muito apegado aos bens materiais, o que tem de tão especial nesse anel?
— Ele é especial, porque fui eu que fiz, valor sentimental que se chama.
— E se morrermos por um anel idiota?
— São só lendas, cara, você é o mais velho aqui, não deveria acreditar nessas coisas — respondeu Caio. — Além disso, as lendas dizem que eles odeiam luz, se estiver com seu celular aí é só ligar a lanterna.
— Não vai precisar, ele deve ter caído bem na entrada — comentou Marco se surpreendendo ao alcançar a entrada da caverna. — Mas, que droga!
Tratava-se de uma descida, a caverna era um buraco em diagonal. Marco ligou a lanterna de seu celular para procurar onde estava, antes de ter que descer, mas não encontrou o anel, com isso, tiveram de descer.
Como a maioria das cavernas, era frio, úmido e muito escuro. A cada passo para dentro daquele lugar, o medo e frio aumentava, Marco olhava de um lado para outro, tremia, respirava com dificuldade. Seus passos não eram mais rápidos e espertos, naquele momento ele se tornou cauteloso. Caio também sentia medo, mas a vontade de recuperar o anel era maior, e isso o dava força para continuar sem a tremedeira.
Na descida, havia muitos ossos, não dava para saber do que, e eles nem queriam mesmo saber, pois, não importava que ossos eram aqueles, de qualquer forma eram aterrorizantes.
— Isso é loucura, não faz sentido — disse Marco parando de caminhar —, já descemos uns cem metros, se não achamos até agora, não se acha mais isso, vamos logo embora! — Bradou se virando.
— Não, espere — disse Caio segurando o valentão pelo braço —, aponta a lanterna para lá — indicou o caminho a frente —, parece que vi um brilho.
Marco então se virou e apontou para o fundo da caverna, que daquele nível para frente ficava mais íngreme. Marco não conseguia ver nada, mas Caio dizia para ele forçar a vista, e propôs:
— Vamos só até aquele lugar ali, porque eu estou vendo um brilho, fraco, mas estou, se não estiver lá, nós voltamos.
Marco foi relutante, mas após insistências do menor, ele aceitou o trato e foram mais um pouco abaixo. Quando iam se aproximando do lugar, viram algo se mexendo, estava de costas e mais parecia um animal comendo algo.
— Puta merda! — Sussurrou Marco perplexo pela cena. — Bora! Vamos voltar, tem uma coisa ali.
— Shiu! — sussurrou Caio, pedindo silêncio —, olha lá, meu anel! — Indicou o objeto que estava realmente brilhando com a luz, um pouco mais atrás do ser que se alimentava de algo.
— Nem a pau que eu vou chegar perto daquele bicho.
— Não precisa cara, eu vou, até porque eu sou bem mais rápido que você — disse Caio —, você só tem que ficar aí apontando a luz da lanterna para lá, eu vou com cuidado, pego e saio correndo, daí você corre também?
— Isso é loucura!
— Mas é preciso, ok! — Esbravejou Caio em sussurros. — Eu tenho que recuperar aquele anel, isso é importante para mim.
Marco novamente hesitou, mas por fim deixou que o garoto fosse. Caio, caminhou semelhante a um felino, como diria os antigos, "pé por pé", e com muito cuidado se aproximava do alvo, mas sem querer pisou em um pedaço pequeno de osso, que se quebrou fazendo um som ecoar pela caverna.
— Eita! Merda! — murmurou Marco.
O ser que comia, parou de comer e levantou a cabeça, estava um pouco mais longe do anel do que se dava para ver de onde Marco estava, para Caio, era como se estivesse um pouco mais perto. Este, cessou seus passos, ficou imóvel apenas encarando o ser que se virava devagar.
Marco até pensou em correr, mas não seria certo deixar o garoto sozinho, afinal, pensava que tudo era sua culpa. Pensou em abaixar a lanterna, mas logo viu que seria uma péssima ideia, pois Caio precisaria da luz para se guiar, contudo, ver o ser se virar lentamente foi uma cena torturante.
Para Caio, que estava mais perto da criatura, foi ainda pior. Tinha pelos pelo corpo, porém, ralos, como um senhor sendo atacado pela calvície. Os chifres eram maiores que o garoto havia imaginado pelas lendas, não tinha quatro olhos como diziam, na verdade, não tinha nenhum, no rosto havia apenas uma boca que ocupava boa parte do espaço. Não enxergava nada, porém, tinha uma ótima audição, e ao notar a presença dos garotos, abriu a bocarra com camadas e camadas de dentes, grunhiu alto e pôs-se a correr em direção a Caio.
— Que merda! — disse balançando a cabeça como se desaprovasse o que estava prestes a fazer, correu de encontro a criatura com a maior velocidade que conseguiu.
— Eu não acredito — murmurou Marco, surpreso com a coragem de Caio —, não faz isso, volta! — Gritou.
Mas Caio o fez, continuou a correr até chegar perto do anel, o pegou e correu de volta, em direção à saída. A criatura estava bem perto, mas não era muito rápida, o que facilitava na fuga do garoto, mas num infeliz contratempo, tropeçou e foi ao chão.
— Merda, levanta molenga! — gritou Marco, pensativo se ajudava ou não o garoto.
O valentão deu alguns passos rápidos em direção a Caio, mas vendo que esse se levantou, e com um pedaço longo de osso em uma das mãos, voltou a correr. O garoto gordinho, amedrontado, se virou e começou a correr o mais rápido que pode, mas como Caio havia dito, ele era bem mais veloz, de tal modo que logo alcançou Marco, mas antes de ultrapassá-lo disse:
— Ele não vai parar, e deve ter mais vindo, tá ouvindo o barulho.
— Por isso só corre! — Disse Marco, encarando a saída que ainda estava a uns setenta metros.
— Não vai adiantar, e quando saímos eles vão atrás da gente, vão devorar a Ana, eu sinto muito.
— Sente muito? Por quê? — Marco questionou, e logo descobrindo a resposta.
Caio golpeou o grandalhão nas costas com osso que havia pegado do chão, e em seguida desferiu outro golpe no peito do rapaz, pois faltou coragem de bater no rosto. Marco tentou falar, mas não conseguiu.
Estava apavorado, suava mais e mais, tremia e chorava, era como se ouvisse ou sentisse cada passo do predador que se aproximava. Caio, entretanto, não derramou uma lágrima, não tremia mais, e nem sentia mais medo, outra vez se desculpou, e disse ser necessário, apenas pegou a lanterna e caminhou rumo a saída da caverna.
— Esses bichos fogem da luz, é uma porra! — murmurou Caio, se virando sem parar de caminhar.
Queria apenas ver o que estava acontecendo, e lá estava a criatura se aproximando de Marco, que se arrastava pelo chão, ainda sem fala, mas logo fora arrastado para o fundo da caverna, para perto dos ossos. Caio ouvia apenas o som das mordidas, e dos gritos abafados de Marco, mesmo assim, o garoto que segurava o anel com toda força, caminhou para fora da caverna.
— Socorro! — Gritou ele ao chegar próximo da saída. — Ajuda!
Bily, sem pensar duas vezes, apressou-se a subir a pedreira, encontrando-se com Caio antes do mesmo sair.
— Cadê o Marco?
— Ali embaixo, ele escorregou e ficou para trás — respondeu Caio cinicamente.
— Droga, eu disse que era uma péssima ideia! — Disse Billy descendo pela caverna com sua lanterna do celular ligada.
Caio não esperou para saber o que aconteceria, apenas desceu, e foi até Ana, que questionou o que aconteceu, onde estavam os garotos. Mas Caio não respondeu, disse apenas que Bily foi buscar o irmão.
— Eles devem estar bem — ele disse, pegando a mão direita da garota —, mas olha só, recuperei o anel.
— Ah, que bom! — Alegrou-se novamente a garota, focada na pedra.
— Deixe-me colocar em seu dedo — falou Caio, executando.
No momento em que colocou o anel no dedo de Ana, a garota estremeceu as pernas, e seus olhos brilharam no mesmo vermelho da pedra, ela encarou o anel em no dedo por alguns segundos, e logo abraçou o garoto.
— Eu te amo! — Ela disse, apertando-o. — Muito, te amo muito.
— Eu também — respondeu Caio —, promete que nunca vai me deixar? – perguntou, como um garotinho carente que não quer deixar a mãe ir para o trabalho, pois teme ficar sozinho.
— Mas é claro, meu amor, eu não vou a lugar nenhum! — Respondeu ela sorrindo e beijando o rapaz.
O Garoto não disse nada, mas sorriu de canto, lembrando-se de Marco perguntando o que tinha de tão especial naquele anel. O que o valentão não imaginava era que a peça estava sobre uma espécie de encantamento feita especialmente para Ana, o que fez com que a garota confundisse os sentimentos que sentia por Caio, passando a crer que o amava.
Caio pegou a mochila no chão e colocou-a de vola no ombro, catou o celular de Merco e jogou-o de volta para a caverna. Deu a mão para Ana e continuaram a caminhada de volta para casa, enquanto ouviam os gritos de Bily.
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