Capítulo 24 - HENRIQUE SOARES
Espreguiço-me na cama sentindo frio na barriga. É hoje. A assessoria do jornal confirmou ontem à noite a entrevista que cederei a jornalista Catarina Mendonça no hotel Copacabana Palace.
A entrevista foi marcada para a tarde e eu tinha um problema para resolver antes desse encontro: Jaime. Ele ainda não sabia da entrevista e explicar o motivo e a exigência era mais um dos meus desafios.
O que eu estou fazendo com as minhas férias? Arranjando sarna para me coçar.
Levanto da cama, sem ficar lamentando o que não tem solução. Tomo um banho demorado, visto uma calça jeans e uma blusa preta. Coloco a minha loção mais cara e desço as escadas, animado.
Assim que chego na cozinha vejo Jaime, que me observa.
— Acordou cedo para um domingo.
— Tenho compromisso.
— E pelo visto não é na praia. Pode me contar que compromisso é esse? — pergunta, largando seu celular na bancada.
— Acho que você não vai gostar.
— Ah, não — Seu olhar é de reprovação. — Não me diga que está indo atrás da Luciana! Eu já te falei várias...
— E eu sou homem de ficar atrás de mulher?
Engulo em seco. Eu não era.
— Vou te falar uma coisa, eu aviso uma vez, duas vezes, mas na terceira, pego uma cadeira, sento e apenas assisto a merda se formar. Isso já aconteceu algumas vezes, você sabe.
— Não basta se foder, não é? Tem que ter alguém para te dizer: eu te avisei.
— É isso mesmo.
Reviro os olhos. Jaime às vezes era irritante. Pego uma maçã em cima da mesa e vou saindo devagar da cozinha.
— Henrique!
Merda!
— O que foi, Jaime? Estou com pressa.
— Aonde você vai? Não respondeu a minha pergunta.
Mordo a maçã e engulo antes de responder. Preciso pensar em algo para escapar sem contar a verdade.
— Engraçado essa parada de querer ficar sabendo o que eu vou fazer! Ontem mesmo eu te liguei e você saiu sem dar explicações. Me poupe, Jaime!
— Era para você imaginar o que eu estava fazendo.
Sua resposta é vaga, embora eu soubesse exatamente do que ele estava falando. Jaime tinha ido visitá-la.
— Que bom que você se sente melhor fazendo isso.
Viro novamente para sair, mas Jaime intervém.
— Não quer saber como ela está?
— Ela está confortável na clínica mais cara do Brasil. Está faltando algo para ela? Não, né? Então, por favor, não me cobre nada. Esse é o limite do que posso fazer.
— Às vezes sua atitude me assusta. Não é possível que não sinta saudade.
— Não — rebato rapidamente. Jogo a maçã mordida para o alto na sua direção e ele pega ainda no ar. — Perdi a fome.
Jaime bufa. Ele sabe que eu não quero falar sobre isso. Esse era um fato da minha vida que eu mantinha oculto. Nada era relevante e eu me recusava a destinar meus pensamentos para essa história.
Saio e ligo meu carro, coloco meu ray-ban, pronto para ver Catarina. Assim que o portão automático de casa abre, um carro de luxo, parado na porta me bloqueia. Mas que porra é essa agora?
Olho para o retrovisor central do meu carro e a porta do motorista se abre, revelando o cabelo loiro e as longas pernas: Luciana.
Ninguém vai acabar com meu humor hoje! Ninguém!
Ela caminha, passa por baixo do portão e entra no meu carro, sentando no banco do motorista.
— Olá, sumido.
— Oi, Luciana. Hum... sinto muito, mas sua visita terá que ser rápida. Como reparou, estou de saída.
Faço uma cara amistosa, afinal com Luciana tinha que saber lidar.
— Ora, ora, Henrique. Você anda tão ocupado que nem procurou saber como eu estava depois daquelas fotos horríveis irem parar na mídia — diz, cruzando a perna e esbanjando o que ela tinha de melhor, sua sensualidade.
— Eu gostaria muito de dizer que você mereceu, depois de ter me deixado daquela forma.
— Eu não tive escolha.
— Ah, você não teve escolha? Aquilo não se faz, cara!
— Eu só queria entender como uma festa tão selecionada — Ela gesticula aspas. — Tinha alguém escondido tirando essas fotos.
Não respondo e apenas passo a mão no rosto completamente revoltoso com essa conversa. Estou atrasado, caramba!
— Você por acaso sabe quem foi o jornalista que tirou aquela foto?
— Não sei. Sinto muito.
— Sentiria mais se fosse você. Aliás, você sabe quantas campanhas publicitárias eu perdi por conta daquela foto?
Eu imaginava. Esse tipo de situação era muito difícil de ser revertida. Passei por isso.
— Sei exatamente o que você sente.
— Você é homem! Isso só mostra a sua masculinidade, enquanto eu passei a ser vista como a depravada da televisão.
Torço a boca. E não era?
— Não me olhe com essa cara, Henrique! Eu estou perdida. — Ela balança a cabeça, mostrando o seu transtorno. — Cortaram cenas minhas da novela e todos me olham torto nos corredores da emissora.
Até sinto uma pontada de pena.
— Isso não deveria acontecer, Lu. O povo é careta demais.
— Isso não deveria mesmo acontecer, Henrique! Mas acho que você está esquecendo que eu tenho namorado. Ou melhor, eu tinha. O cachê dele só aumenta enquanto banca o coitadinho enganado...
— Corno — digo, sem pensar duas vezes.
— Muito engraçadinho. Esse papel eu já fiz várias vezes enquanto estávamos juntos, esqueceu?
— Namoro é coisa séria. Como sou muito engraçado, optei por ser solteiro. E não me venha com esse papo, não. Você também bancava a pobre coitada. Vamos parar com esse melodrama todo, ok?
— Melodrama? Estou perdendo trabalho! Dinheiro, Henrique! Mas isso não vai ficar assim! Eu vou descobrir quem é esse jornalista de merda e acabar com a raça dele. Chumbo trocado não dói, não é mesmo?
Meu coração aperta. Eu sabia o quanto Luciana poderia ser vingativa e maldosa. O lado fraco sempre é o mais atingido e Catarina era o lado fraco.
— Cara, para com isso. Sinto muito que essa foto tenha sido divulgada, mas esse é o trabalho deles!
Ela me olha surpresa. Seu decote enorme sobe e desce rapidamente.
— Como é?
— Ué, isso não é trabalho? Muitos precisam disso para se sustentar sabia? Eles têm famílias, filhos...
— Você sabe quem é! É claro que sabe! Está calmo demais. Cadê toda aquela revolta de jornalistas sensacionalistas? E aquela revolta toda que acarretou os processos na justiça que entrou contra os que filmaram naquele vídeo? — Ela acusa quase gritando. — Não é só o meu nome. Estão especulando que é você, mesmo que não tenha aparecido sua carinha bonitinha naquela foto!
Nego rapidamente. Várias vezes.
— Nada disso. Você está equivocada!
— Eu te conheço, seu safado! Por isso está tão tranquilo!
— Você está louca?
— Podemos ter ficado poucos meses juntos, mas foi o suficiente para decifrar cada mentira no seu rosto.
— Não vai adiantar nada. Agora me deixe ir que tenho uma entrevista para dar.
— Ah! Entrevista nas férias, Henrique Soares? Sr. Não falo sobre a minha vida pessoal na mídia? Quem é?
Ela estava debochando novamente.
— Chega, Luciana! Agora é tentar esquecer que logo as pessoas também irão.
— Como esqueceram o seu vídeo pornô?
Respiro fundo. Não. Eles não esqueceram! Ela estava debochando e eu tentando ter uma paciência surreal, mas ela não está cooperando.
— Estou falando sério. Para mim essa conversa acabou. Se me der licença, eu preciso que você saia agora mesmo do meu carro.
— Mancomunado com o inimigo, Soares. Quem diria!
— Tchau, Luciana — digo novamente, louco para ela sair e me deixar em paz.
Ela sai bufando de raiva. Antes de partir para o seu carro, ela para rente ao vidro do carona e me olha.
— Estou vendo que você não vai delatar seu amiguinho jornalista e eu daria qualquer coisa para descobrir o motivo desse mistério.
— Luciana... eu...
— Ou talvez seja uma jornalista. É claro, não é, Henrique? Tinha que ter uma chave de boceta para você ficar quietinho desse jeito. Agora te digo uma coisa, sua conquista barata está fodida na minha mão.
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