Capítulo 16 - HENRIQUE SOARES
A porta do quarto abre e Jaime entra.
Em poucos minutos eu havia superado a rejeição da Catarina quando uma enfermeira boazuda entrou para trazer a medicação e me deu seu número de telefone por debaixo do lençol. Nada sexy.
— Jaime, aquela cretina divulgou meu prontuário!
Jaime caminha até a pequena varanda e abre um pouco a janela, olhando para o horizonte.
— Jaime!
Ele enfim me olha e presta atenção.
— O que está havendo? Viu o passarinho verde?
— Verde? — Ele anda até a poltrona e cai sentado, batendo as palmas das mãos nas pernas. — Colorido, meu irmão, colorido.
Torço a boca.
— Caralho, que merda é essa? O que aconteceu, Jaime? Compartilha coisa boa porque está foda!
— Ela me beijou.
— Quem?
— Como quem? Catarina.
Como é que é?
Vadia! Aquele papinho de que poderia sair desse quarto e beijar o primeiro homem que encontrar, era verdade. Que mulherzinha filha da mãe!
— Ela que te beijou? — pergunto transtornado.
— Bom, acho que ela percebeu que eu... enfim, nós temos um encontro.
— Encontro?
— Que merda, Henrique. Dá para ficar feliz por mim, cara?
Não. Não dava. Eu estava revoltado. Como ela não quis me beijar e beijou Jaime?
— Eu sei bem o que ela quer...
— E o que ela quer, Henrique? — Ele revira os olhos, cruzando os braços. — Vamos, fala logo a sua teoria da conspiração.
— Põe conspiração nisso. Ela quer ficar perto. Quer notícias, quer se dar bem com a gente...
— Puta merda, Henrique. Você está querendo dizer que ela está me usando?
Levanto os ombros. Achava.
— Talvez.
— Ela veio até aqui com a filha, saber como você estava. Fez de tudo para não chamar a atenção e conseguiu. Ela é jornalista, e daí? Não seria a primeira que você briga. Algumas delas você até levou para a cama.
Torço a boca novamente, meu ego levanta. Adoro isso.
— Aquela jornalista só queria se aproveitar de mim.
— Sim. A jornalista australiana queria se aproveitar do seu corpo e você nem gostou, não é?
Sorrio. Ele sabia que eu tinha gostado. Ainda me lembro daqueles peitões no meu rosto. Eu tentei o truque do galã com Catarina, mas ela não caiu na minha lábia e eu estava muito furioso com isso.
— Cara, o que você viu nela? Ela quer me ferrar! Tenho certeza de que foi ela que divulgou meu prontuário!
— Prontuário? — Jaime pergunta, surpreso.
— É bom evitar saberem que é por causa do camarão, blá, blá, blá... — debocho imitando o que ele disse — Não adiantou nada! Foi parar no jornal.
Para minha surpresa Jaime começa a rir.
— Você está de sacanagem?
O seu celular começa a tocar e ele retira do bolso. Jaime sai um pouco de perto falando um espanhol perfeito e gesticula bastante.
Filha da mãe da Catarina! Ela vem aqui, me enfrenta, divulga minha vida pessoal e agora seduz meu irmão? Jaime é um pamonha mesmo! Ela queria me beijar, eu sei que queria, mas preferiu ir atrás dele.
Relembro dos seus olhos, seu cheiro, sua pele encostada na minha. Essa porra já fazia parte dos meus pensamentos. Sua rejeição também. Essa mulherzinha tocou em uma ferida muito sensível. Ela vai ver só!
Pego meu celular na mesinha ao lado para parar de pensar naquela cretina e vejo algumas notificações do Instagram, mensagens no WhatsApp e respondo em alguns grupos que estou bem.
— Era Rosenberg — diz Jaime, guardando o celular.
— O que o dirigente do clube queria? — Eu já sabia a resposta, só queria ter certeza.
— Está preocupado. Queria que você voltasse para a Espanha e que refizesse a bateria de exames por lá.
— Ele sabe o que é alergia?
— Não deboche, Henrique. Sabe como são. Isso poderia ter te matado!
— Imagina o prejuízo deles, não é? Custei tão caro para no final ficarem sem os meus belos pés de ouro.
— Consegui deixá-lo tranquilo, mas nada de estripulias. Nem pense em voltar para o hospital na próxima década.
— Sim, comandante.
— Agora eu posso pensar um pouco em mim?
Eu sabia o que ele queria dizer com isso.
— O que quer?
— O endereço dela.
— Da mulherzinha que quer me ferrar? Cara, caí fora! Sou seu irmão e isso é traição!
— Sem idiotice, Henrique. Você disse que iria me ajudar. Isso não é ajudar! Vamos! Eu falei para ela que iria pegar o endereço com você.
— Me recuso! — digo e ele arregala os olhos, cruzando os braços. Não sabia ao certo porque estava fazendo isso. Jaime não poderia ficar com ela. Não mais.
Pego a gelatina que a enfermeira trouxe, abro o potinho e com a colher coloco um pedaço grande na boca.
— O que é? Não estou te entendendo, cara! Você sabe que é raro uma mulher me conquistar, e ela fez isso.
Sinto as pálpebras tremerem e engulo com certa dificuldade. Ele estava certo. Eu não poderia impedi-lo por causa do modo como ela andava me enfrentando.
— Henrique, ela não é má pessoa. Se fosse, já teria divulgado suas fotos.
Era verdade. Depois de ver a forma simples com que vive com a sua filha, uma foto como aquela elevaria seu padrão em um piscar de olhos. Por que ela não divulgou? Ela nem me conhecia! Por que me ajudou no dia que eu estava preso na cama? Que compaixão essa mulher criou que resolveu me poupar de tamanha vergonha?
Ela poderia ser uma boa pessoa e Jaime havia percebido isso mais cedo do que eu.
— Está na minha carteira — digo e ele dá tapinhas nas minhas pernas.
— Eu sabia que você iria me ajudar.
— Cara, prepare-se para voltar às raízes. Ela mora em Caxias.
— Sério? — Ele sorri. — Acho que é por isso que a nossa ligação foi imediata.
— Ah, cara, sem boiolagem! Só não se amarra, beleza?
— Mas é isso que eu quero — diz, pegando minha carteira, e logo me arrependo. Tento disfarçar meu desagrado colocando outra colher de gelatina na boca.
— Vai fazer o quê? Programinha de viadinho?
— Vou levá-la para jantar.
— Já sei... .
— Não. Sofisticado demais. Quero ficar à vontade. Talvez o Aprazível, em Santa Tereza.
Eu ia falar que era uma excelente escolha, que seria a cara da Catarina, mas fico quieto.
Rodar restaurantes refinados era um dos nossos hobbys favoritos, tanto aqui no Rio quanto no mundo inteiro. Era bom juntar os amigos, levar a peguete do dia para um bom restaurante.
— Quando?
— Sexta.
— Ela aceitou? Assim tão fácil?
— Ela me beijou! O que acha?
— Esqueci desse pequeno detalhe — Mentira! Não havia esquecido sua rejeição.
— Bom, acho que ela gostou de mim também. Depois daquele beijo... — ele arfa.
— Ah! Já deu de papo meloso! Agora me diz, quando vou sair desse lugar e voltar a aproveitar as minhas férias? Eu acabei de ver no meu prontuário que são dois dias. — Aponto para a televisão. — Estou com abstinência de sexo, irmão! Esqueceu que Luciana me deixou na mão?
Eu queria mudar mesmo de assunto. Chega de Catarina por hoje. Chega de lembrar aqueles olhos castanhos e aquele rosto de menina.
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