Capítulo 15
Nunca as duas irmãs Kimberly e Kristen ficaram tanto tempo sem falar uma com a outra. Apesar de todas as brigas e diferenças, ambas nutriam um amor genuíno que falha nenhuma conseguia dizimar. Mas já não era mais assim. Kristen sentia-se traída e Kimberly já não podia mais contar com sua amizade. Quando a irmã a procurava para lhe contar sobre qualquer fato do seu dia, Kristen fazia-se de surda e limitava-se a responder com um erguer das sobrancelhas e um gemido, mantendo sempre a expressão impassível. Aquela frieza estava fazendo com que Kimberly começasse a se sentir solitária.
Além de tudo, Jeremy e Kristen haviam descoberto que tinham muito em comum e era, para ambos, extremamente agradável estar na companhia um do outro. Ele demonstrava por ela um interesse que parecia ir além de uma amizade e era bastante visível para Kimberly aquele evidente interesse, o que fazia com que ela se sentisse muito pior, pois acalentava esperanças de um dia vir a ser pedida em casamento pelo jovem.
Naquela manhã, enquanto descia às escadas, uma das criadas a interceptou. Inclinou-se numa vênia e entregou-lhe uma carta de Frederick. Não era a primeira carta que Kimberly recebia dele. Na verdade, aquela era só mais uma de várias que ele enviara durante aqueles dois longos meses.
Ela agradeceu a criada e dispensou-a. Caminhou pelos corredores da casa à procura de Kristen na sala de música. Encontrou Jeremy estendendo um ramo de flores para a irmã e aquela cena despertou-lhe grande ciúme.
Decidiu que responderia a Frederick. Não importava que ele não fosse aquilo que ela desejava para si. Ele era o único que a compreendia e, naquele momento, ela precisava de alguém que a entendesse e a apoiasse.
Mesmo sabendo que o recinto era um lugar exclusivo e particular, caminhou até o escritório de Edward. Sobre a mesa, avistou pena e papel. Sentou-se na cadeira do cunhado e começou a escrever sob a claridade dos raios solares que exalavam pela janela. Observou que poderia haver alguém no jardim e levantou-se para fechar as cortinas, em seguida voltou para onde estava e continuou a redigir a carta sem mais receios.
Desabafou os sentimentos relatando ao amigo o quanto sua irmã estava sendo má, justificando que a ausência de suas palavras fora apenas para amenizar as coisas que estavam acontecendo a ela e lamuriou-se de como a vida andava chata e tediosa. Contou como todos ficaram contentes com o noivado de Edward e Jane e que logo se casariam. Que ambos pareciam dois bobos apaixonados. Aproveitou para fazer elogios a Frederick, dizendo que ele era a melhor pessoa que ela já havia conhecido e sentia enorme estima por ele. Prometia visitá-lo e pediu que ele fizesse o mesmo assim que pudesse. Queria saber de tudo e todos, como estavam os ânimos em Chesterfield. Sentiu saudades das lembranças que invadiram sua mente. Mas tratou de espantá-las. Não gostaria de voltar àquele lugar nunca mais, tendo tudo que tinha em Worthen.
Após terminar a missiva, releu com admiração as próprias palavras e, satisfeita, dobrou a carta. De súbito ouviu as vozes de Edward e Helen no hall. Surpresa, pois não imaginou que Edward estaria em casa tão cedo, Kimberly ficou sem ação. Ela sabia que ele não ia gostar de vê-la no local onde ele cuidava de seus negócios, o único cômodo que não era conveniente aos demais. Mesmo que ele jamais as tivesse proibido de adentrar ali, todos sabiam que era assim.
Com receio de ser encontrada onde não devia estar, Kimberly saiu sem apanhar a missiva, deixando-a em cima do móvel ao lado da pena. Quando caiu em si que não estava com a carta, já era tarde para voltar, Edward já a tinha visto e ela, sem demonstrar o nervosismo, o cumprimentou e fez menção de continuar subindo para o quarto.
- Srta. McCarthy - chamou Edward antes que ela desaparecesse, mas ela continuou a subir. - Kimberly - chamou-a pelo nome, tentando fazer com que ela se voltasse para ele.
Ela não teve como fingir que não tinha ouvido que ele a chamava. Virou-se com o semblante aflito, mas esperou que Edward dissesse algo antes de se justificar.
- Sabe onde Jane está? - A moça fez que não, completamente muda. - Obrigada - ele agradeceu e franziu o cenho como se estivesse preocupado.
Não totalmente aliviada, Kimberly subiu até seu quarto e ficou por lá por um bom tempo, pensando em como resgataria sua carta, esperando com aflição que Edward não a notasse.
❀
Foi inevitável para Edward não ficar andando de um lado ao outro da sala, enquanto esperava por James Aberdeen. O advogado estava atrasado apenas alguns minutos, mas para ele pareciam horas.
Logo que James chegou, Edward pediu a Helen que avisasse a quem quer que fosse que não poderia interrompê-lo. Ele estaria muito ocupado.
James colocou a pasta de couro sobre a mesa. Naqueles meses em que tudo mudara na vida de Edward nada havia sido alterado naquela sala, nenhum móvel, nenhum enfeite, nem a disposição das cadeiras e da mesa. Estava tudo igual como quando o advogado dera a Edward a carta que dizia que ele deveria cuidar das irmãs McCarthy.
E, ainda que fisicamente tudo permanecesse como sempre, James reconheceu que o homem à sua frente não era o mesmo. O semblante antes tão sério, agora possuía um ar mais relaxado, ameno, alegre, embora o advogado pudesse ver algum resquício de culpa naqueles olhos verdes.
- Está aqui a condição - disse e depositou o papel sobre a mesa.
Distraído com o temor irracional de que Jane entraria a qualquer momento e descobriria sobre tudo, Edward mal olhou a carta. O advogado colocou sua pasta por cima dela e retirou o documento que dava a Edward o poder de usufruir da totalidade de sua herança, pois o acordo logo iria expirar.
- Você terá terras até na Irlanda. Sorte a do seu pai nunca ter pensado em plantar batatas - observou o advogado.
- Ele odiava batatas - brincou Edward, mas não conseguiu sorrir ao se lembrar das circunstâncias em que o país estava. A praga da batata, como era denominada aquele tifo que se espalhara pelas ilhas, estava levando muitas pessoas à morte.
- Bem, aqui está - disse Aberdeen entregando-lhe o documento. - Esses papéis lhe garantirão dentro de alguns dias o direito sobre todas as terras que foram de seu pai. Estará tão rico que acho até que a rainha poderá lhe conceder um título!
- A um médico? - Edward riu, incrédulo.
- Você sequer exerce sua profissão - lembrou-lhe o advogado. - E é um homem muito respeitado - salientou.
- De qualquer forma, o que eu faria com um título? Já tenho responsabilidades demais sendo apenas quem sou.
Edward não almejava títulos. Agora, nem mesmo sua herança lhe parecia tão interessante.
- O que fará com os termos? - quis saber James.
- Queimarei - respondeu sem hesitar. - Onde está? - inquiriu, correndo os olhos sobre a mesa.
Edward pegou a carta ao lado da pena e amassou-a. Não suportaria ler aquelas palavras novamente. Precisava se livrar delas de imediato. Tratou de acender uma vela e queimou a missiva até que se tornasse apenas cinzas. Aproveitou para queimar também os restos da carta que Annabelle havia lhe mandado. Não queria nenhum papel assombrando-o.
- Nunca irá contar a ela, Radford?
- Sinto desapontá-lo, Aberdeen - Edward lançou ao advogado um sorriso pesaroso. - No entanto, não sou capaz de revelar nada a Jane. Não sou capaz de enfrentar o possível desprezo que ela me daria se soubesse sobre isso. Ela nunca se casaria comigo.
James fitou o amigo com o olhar firme.
- Você a ama verdadeiramente e talvez ela consiga perdoá-lo e compreendê-lo, porque também o ama. Ela o ama, Radford.
- Eu sei, Aberdeen - concordou Edward ainda com aquele sorriso pesaroso. - E me sinto um canalha, mas simplesmente... não consigo.
❀
Depois que saiu do escritório, Kimberly não conseguiu conter a aflição que se apossou de todo seu ser. Céus, por que fora falar aquelas coisas sobre Jane e Edward? Não que para ela não fossem verdades, mas eles ficariam bastante irritados, ela tinha certeza.
A cada dez minutos, Kimberly não conseguia resistir ao impulso de verificar se Edward já havia abandonado o cômodo e já estava ficando exasperada com a demora dele de sair. Quando finalmente viu que ele e Aberdeen se distanciavam, ela correu para o local.
O primeiro lugar em que procurou foi ao lado da pena, mas a missiva não estava lá. Kimberly prendeu a respiração. Talvez não tivesse deixado exatamente por ali, pensou. Tudo estava confuso e ela havia saído de lá tão depressa que poderia muito bem ter deixado em outro canto. Olhou ao redor da mesa e sorriu quando a encontrou. Estava um tanto afastada da pena, mas, no ato de sair rapidamente, poderia tê-la empurrado para longe.
Kimberly procurou sair logo do escritório, temendo que Edward pudesse retornar. Subiu as escadas correndo e, voltando para o quarto, colocou a carta sobre a penteadeira, aliviada. Pegou-a e pensou se deveria mesmo mandá-la para Frederick. Quis lê-la novamente antes de fazê-lo.
Enquanto lia a missiva, surpreendeu-se com o conteúdo. Seus olhos cresciam a cada linha por onde passavam. Não era a sua carta para Frederick, mas uma carta da falecida Eleanor para seu filho Edward. Ela revelava os verdadeiros motivos pelos quais Edward decidira levá-las para Worthen.
Embora não fosse dada às lágrimas, Kimberly sentiu uma imensa vontade de chorar. O que Jane pensaria se soubesse? O que faria? Conhecendo a irmã como conhecia, sabia que para ela seria difícil perdoá-lo. A moça deitou-se sobre a cama com a carta ainda em mãos e ponderou o que deveria fazer. Não queria ser a irmã que separou um casal. Apesar de tudo, Edward parecia realmente amar Jane e elas em Worthen tinham tudo que nunca teriam tido na casinha humilde em Chesterfield.
Havia ao lado do trocador um cesto onde Kimberly depositava sua roupa suja e foi entre os montes de vestido que ela escondeu a carta. Não iria revelar nada à irmã. Todos estavam felizes e era isso que importava, disse a si mesmo, embora não estivesse tão convencida assim de que aquela era a coisa certa a ser feita.
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Bem, parece que as cartas estão perseguindo o Edward rs... Espero que esse capítulo não tenha ficado confuso, mas vocês podem fazer perguntas e deixar opiniões (só não me peçam spoiler).
Queria aproveitar e deixar um agradecimento especial para duas pessoas muito queridas. A TaniaPicon
e a BeccaBonetti pois estão sempre me ajudando com essa história, nos meus momentos mais surtados em que eu tenho vontade de jogar tudo para o alto e dar um hiatus aqui rs... Agradeço a vocês também que estão sempre me acompanhando, comentando e votando. Vocês são os melhores leitores que alguém poderia ter =)
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