𝓷𝗼𝘃𝗲. leãozinho
❛ gosto muito de te ver ao sol, leãozinho, de te ver entrar no mar, tua pele, tua luz, tua juba [...] um filhote de leão, raio da manhã. arrastando meu olhar, como um ímã. gosto muito de você, leãozinho ❜
o leãozinho, caetano veloso
A sensação do verão sempre começa um pouquinho antes do que a previsão do tempo diz.
Na espanha, a estação solar deveria ter seu início no dia 21 de junho, daqui há 1 mês, mas como a primavera já está se despedindo das cidades e o calor está tomando conta das casas madrilenhas, nada mais justo de sermos compensados com um dia na praia.
Os garotos do Real Madrid entraram em um pequeno recesso antes de intensificarem seus treinos para a grande final da Champions League, no dia primeiro de junho. Por isso, o mais animado do grupo - vulgo Vinícius Júnior - marcou um rolê na praia em Valência, há 3 horas de viagem do centro da capital.
Aproveitamos a oportunidade para incluir Isa nas nossas saidinhas e apresentá-la ao grupo.
Como nem eu e nem as meninas possuímos carros, Jude achou de bom tamanho que nos desse carona até a praia. E suspeitando de segundas intenções do jogador inglês com a minha pessoa, minhas amigas se jogaram no fundo do carro dele antes mesmo que eu pudesse recusar. Até mesmo a nova integrante preferiu sentar no colo da sua chará.
Observo os seguranças de Jude em um carro atrás do nosso, permanecendo há uns bons passos de nós. Sou a última a descer do prédio com a minha bolsa de praia, então também sou a última a cumprimentar o homem, que ajeitava as mochilas no fundo do automóvel.
— Oi, Jude. — Abro um sorriso, podendo ver o seu rosto depois que fechou o porta-malas. Ele remove o óculos de sol do rosto, me abraçando de canto e deixando um beijo sobre minha cabeça.
— Vamos, vamos, demorada. — Ele me acompanha até a porta do passageiro, abrindo ela pra mim.
— Eu estava arrumando minha juba, não pode me incomodar. — Mexo no meu cabelo, que estava mais cacheado que o comum hoje. Sempre uso a palavra juba para falar sobre o meu cabelo porque me sinto mais poderosa.
— Está linda. — Ele comenta, sorrindo ao olhar para mim. Eu apenas retribui o sorriso em resposta. — E aí, tá animada?
— Não tanto agora que sei que você vai dirigir. — Brinco com ele, sabendo que dias atrás Jude não poderia nem mesmo encostar em um carro.
— Eu já sei dirigir há um bom tempo, ok? Só não podia. Aliás, eu não sou mais velho que você? — Zomba da minha pessoa, me encarando com os olhos semi-cerrados.
— Eu fiz 20 em janeiro. E você? — Tento ser melhor que ele nesse joguinho.
— Faço 21 em junho. — Ele sorri, sabendo que ganhou nessa briga. — Dia 21.
— Sem graça. — Resmungo.
— Pode fazer o favor de entrar? — Ele está rindo das minhas palavras ainda.
— Depois de um chamado desse, vou ter que obedecer.
Jude nega com a cabeça após escutar minhas palavras, fechando a porta do carro depois que eu me ajeito no assento. O garoto faz uma volta e então se senta no banco de motorista, dando uma olhada nas minhas amigas no fundo do carro, que não paravam de falar.
— Vão querer escutar o que? — Ele me olha rápido, como se me incluísse na pergunta. Eu ainda estava meio abismada com o conforto do banco.
— Sabrina Carpenter! — Lu diz com rapidez, antes que qualquer outra interfira.
— Podem escolher aí atrás. — Ele desbloqueou o próprio celular e entregou o Spotify aberto para as garotas, que se animaram com a possibilidade de segurar o telefone dele. — Mas sem vasculhar meu celular.
— Não prometemos nada. — Lani comenta.
Eu dou risada e então Jude da partida no automóvel, com a música mais recente da artista escolhida tocando no auto-falante.
Eu e minhas amigas tínhamos a habilidade de dormir com facilidade. Bom, nem todas, mas nada que um remédio não ajude e uma música mais calma - e brasileira - para abaixar os ânimos e deixa-las quietas por um longo tempo. Me viro rapidamente para observar que até mesmo Isa, sentada sobre o colo de Dora, conseguiu cair no sono.
— Está olhando pra elas como se fossem suas crianças perturbadas que finalmente te deixaram em paz. — Jude dá risada das próprias palavras. No momento que volto a minha atenção para ele, estava focado no trânsito, mas tenho a sensação que me olhava.
— Mas é quase isso. — Acompanho o riso. — Quando tô no carro, eu gosto da calmaria. Não necessariamente do silêncio total, mas um pouquinho de tranquilidade já me deixa feliz.
— Então o sonífero ajudou?
— Fico feliz que não precisei usar da força bruta para convencer elas de irem dormir.
— Uau, você me dá medo. — O sarcasmo em sua voz é evidente.
— Você não sabe o que te espera, Bellingham. — Tento soar o mais misteriosa possível, mas pareço uma criança, falhando miseravelmente na tentativa.
— Fiquei animado. — Ele diz, e me arranca boas risadas. — Que música é essa?
Escolhemos uma playlist bastante MPB para o momento. Geralmente são mais tranquilas, e são fáceis de se conectar porque transmitem exatamente o que sentimos. Meu coração é brasileiro, e a música brasileira traduz tudo que sinto. Nenhuma outra música consegue ser tão poética quanto a nossa.
— O Leãozinho, de Caetano Veloso. — Falo um pouco mais lento que o comum, para que escute bem minhas palavras. Ele não vai entender, mas pelo menos saber o que estou falando. — Preciso te passar uma playlist brasileira. Não consigo acreditar que passou 20 anos da sua vida sem escutar essas músicas.
— Bom, eu não consigo acreditar que viveu 20 anos da sua vida sem me conhecer, então... — Me olha de relance, podendo me olhar por alguns segundos.
— Você é tão metido. — O encaro, querendo rir.
— Só realista. — O sorriso escancara o humor. — Mas eu concordo, preciso aprender essas músicas. Aprender português na verdade.
— Vai lá, repete comigo. — Dou uma pausa para escutar o que a próxima fala do cantor. — Gosto. Muito. De. Você. Le ão zi nho.
— Repete. — Ele dá risada, provavelmente sem entender o que eu digo.
— Gosto. Muito. — Começo aos poucos.
— Gosto muito... — Ele diz, mesmo que com um sotaque muito puxado.
— De você.
— De você... — Repete.
— Leãozinho. Le ão zi nho. — Olho pra ele, especificamente seus lábios, para entender se realmente compreendia como falar o que eu estava dizendo.
— Leão zinho. — Ele diz. — Gosto muito de você, leãozinho. — Canta a frase inteira, junto com o cantor, o que me rende uma felicidade eufórica por ter conseguido ensinar uma frase a ele.
Até comemoro em silêncio, com palminhas, para não atrapalhar as sonhadoras atrás de mim.
— Isso aí. Falou certinho. Já virou brasileiro.
— E o que significa? — O sorriso no rosto dele declara sua felicidade ao ser elogiado. Bom, e quem não gosta?
— Eu gosto muito de você, pequeno leão. — Digo, e dessa vez em inglês. Dizer aquelas palavras me deixaram levemente envergonhada, porque parecia uma declaração. Mas não era.
Jude me olha de relance, sorrindo. Ele só concorda com a cabeça, permanecendo feliz enquanto observava o caminho em sua frente. Tiro os meus olhos dele, meio envergonhada. Estou olhando para a mesma direção que ele.
— O cantor fez essa música para alguém que considerava um ser luminoso, verdadeiramente bom de coração. Meio inocente, sabe? Puro. — Explico, como se tentasse me justificar. — Filhote de leão é só uma metáfora.
— E o que mais ele diz?
— Fala sobre a pessoa no sol, no mar. Fala sobre ele ser um raio de luz, sobre ele ser a razão da felicidade do cantor. É uma letra bem bonita. — Não tiro meus olhos da estrada.
— Se eu precisar de um expert em música brasileira, e romântica, já sei onde encontrar.
— Bom, acho que você não precisa, já tá um expert nisso. — Olho para ele, deixando a entender que mencionava sobre o fato dele ter me enviado um buquê de flores com uma música do Seu Jorge como carta.
— É, eu sei. — Me olha de volta, com aquele sorriso sereno, de quem sabe exatamente em que terreno está pisando. E ele entendeu o que eu quis dizer.
Jude era um cara difícil de se resistir. Parecia dizer as palavras certas nos momentos certos. Tinha lábia no sangue e um poder de convencimento muito forte sobre mim. Ele pode até parecer um cara comportado, mas possui o conhecimento de não só o que falar para alguém, mas como dizer as coisas. O tom de voz que me fazia respirar fundo, como fiz nesse momento.
Tento focar agora nos outros carros do lado de fora, e na música romântica, para não me deixar levar pelo momento, tentando conter um sorriso que eu sabia que não conseguia disfarçar.
Em algum momento da estrada, caí no sono como todas minhas amigas. Foram três horas de carro, alguns longos minutos dormindo, mas finalmente poderia sentir o cheiro da maresia tomando conta das minhas narinas, enquanto caminhávamos com o grupo completamente reunido.
— E aí, tava com saudade da praia? — Vini se aproximou de mim, com as mãos nos bolsos e o óculos pendurado na camisa.
— Você não tem ideia do quanto. Parece que tem anos que não vou.
— Já vou logo avisando que não se compara com as do Brasil. — Isa entra na nossa conversa, já que estava do meu lado. — Por que estamos conversando em inglês?
— É verdade! Hoje eu quero música brasileira para pelo menos me sentir um pouquinho em casa. — Comento, sentindo meus pés entrando em contato com a areia fina da praia e meus olhos visualizarem um mar transparente e brilhante na minha frente.
— Sim, senhora. — Vini carregou buscou a caixa de som que trouxe quando nos posicionamos em uma mesa na praia.
— Sem papinhos em português hoje. Vou ficar achando que tão falando mal de mim. — Camavinga toma conta da conversa, abraçando Vini pelo ombro.
— Mas a gente tava. — Isa brinca com o garoto, que já conseguiu pegar uma leve intimidade com a garota para carrega-lá no colo e ameacar jogar na areia.
Todos estavam fazendo a mesma rotina. Nós, garotas, passando protetor solar, e os meninos, Rodrygo, Jude, Tchouameni buscando a bola de futevôlei para jogar na praia. Eles eram craques nisso, então não duvido que seja um show, mas eu me negava a estragar o jogo com minhas pessimas habilidades.
Tudo que eu queria era mergulhar naquela imensidão que me chamava, molhar o meu corpo na água salgada e sair renovada, porque sempre era tudo que eu precisava para começar novos ciclos. E a cena realmente parecia uma nova temporada da minha vida.
As garotas tinham o mesmo desejo de matar a saudade do mar. Então, decidimos apostar uma corrida até a beira e então pular de vez na água quando estivesse fundo o suficiente. Alanis não só furou a largada, como Dora ficou pra trás por deixar seu óculos de sol na canga no momento, e Isa segurou o braço de Lu para que ela não chegasse primeiro.
Quando o nível já estava fundo o suficiente, mergulhamos na pequena onda que veio e então me senti abraçada pela melhor sensação do mundo.
No momento que saímos da água, nós juntamos aos garotos e eu finalmente cedi aos pedidos. Jogar altinha era um talento que eu com certeza não possuía. Muitos brasileiros sim, mas não eu. Então passar vergonha é certamente minha função no grupo. Não só uma vez, como várias. Cansado de tanto rir das minhas tentativas sem êxito, como todos os outros faziam - rachando o bico até não poder mais, a ponto de cair no chão - Jude corre atrás de mim com a mão cheia de areia, como se fosse jogar.
— Não não não não! — Repito, correndo na direção mar, que estava há poucos passos da roda.
— Você tá merecendo. — Sei que ele diminuiu o ritmo da sua corrida porque não é possível que um jogador de futebol esteja se comparando a minha velocidade.
— Ei, não. — Paro de correr, recuperando meu fôlego. — Eu falei que era ruim jogando, você que não acreditou.
— Tudo bem, tudo bem. Eu vou ter piedade de você. — Ele joga a areia no chão, batendo uma mão na outra para remover o excesso. Me olha de relance, crescendo um sorriso maldoso e divertido.
— O que foi?
— Se não vai ser areia, vai ser água. — Jude, no mesmo instante que me avisa, abraça meu corpo e nos joga na água.
Quando retorno do meu mergulho não intencional, respirando o ar que me faltou por breves segundos e ajeitando meus cabelos, além de remover a água do meu olho que sempre incomodava, começo a rir da situação. Não só isso como uso as mãos para empurrar água para Jude.
— Você tá tão ferrado. — Digo.
— Eu não sabia que era vingativa. — Tira o rosto da direção, jogando água de volta.
— Trégua! — Levanto as mãos, respirando fundo e voltando a rir da situação aos poucos.
— Trégua. — Ele diz, acompanhando minha risada.
— E eu não sou vingativa. Só... devolvo na mesma moeda. — Tento fazer com que ambas coisas fossem completamente diferentes, mas no final não eram.
— Isso significa que se eu te beijar, alguma hora, você me beija de volta? — Ele não perde a chance de flertar comigo, me arrancando um sorriso involuntário.
— Idiota. — Jogo água mais uma vez, voltando a uma guerra sem fim.
Naquele momento, eu soube que com a energia renovada, um novo ciclo estava nascendo. Era claro que em uma cidade diferente as coisas iriam mudar, mas as pessoas que eu estou conhecendo e me aproximando só deixam ainda mais claro que ainda tem muito pela frente. Parece até que uma música boêmia tocava nos meus ouvidos enquanto o sol batia contra a pele de Jude, e o sorriso largo pelas risadas incansáveis trazia um cenário ainda mais agradável.
Óbvio, eu não me deixava levar completamente. Mas podia me divertir um pouquinho ali e fazer uma nova amizade que até o momento me trazia a mais pura felicidade.
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