00.04《☆》
IV. Mãe
Quando se está só, a nossa consciência se torna nossa companheira. Ela toma forma, contornos e até mesmo vida. Seria uma ideia estúpida se não fizesse todo o sentido para Evangeline. Ela mais que ninguém sabia o quão era difícil lidar com “outras pessoas” que vivem junto a mente dela.
Uma vez na boa e velha Londres, Evan conheceu um padre que a aconselhou a manter a mente limpa, sem pensamentos negativos, pois eles eram a principal causa de suas dores e temores. O medo constante de perder o controle sobre seus poderes a assustava, mas o que ela mais temia era machucar alguém ou decepcionar a N°9.
A vadia loira era como um demônio em sua vida. Não lhe dava amor, atenção, carinho e muito menos compaixão, mas como o amor é cego, ela não via ou não sentia o mal que a outra fazia consigo.
Se não fosse pelos irmãos, ela jamais teria se libertado desse amor doentio.
– Relembrando o passado, Eve?
– Ben? – indagou Evan incrédula. Seus olhos não podiam acreditar no que eles estavam vendo. Era Ben Hargreeves em sua frente. – Você está morto. Como é possível eu estar vendo você? O Klaus, ele...
– Tá tudo bem – tranquilizou Ben, com um simples aceno de mão como se pedisse calma. – Você está certa, eu estou morto e sobre o Klaus, não ligue.
– Certo – respondeu hesitante. – Ei, onde estamos? – Evan mal se deu conta de que não estava mais no sótão onde Klaus a deixara.
O lugar em que estavam era totalmente diferente: um campo descampado repleto de flores silvestres e nas margens havia grandes árvores frondosas e algumas frutíferas, poucas, mas tinha.
Sobre a copa das árvores sobrevoava um bando de corvos em uma rota circular sem fim. Era estranho e um pouco monótono, quase sem vida. O tempo parecia não passar e se dava para notar pela posição do sol, que se encontrava por entre as árvores e seus raios solares pareciam feixes de luz nas folha verdes.
Era tudo tão mágico e encantador, parecia até um sonho.
– Eu estou sonhando? – prosseguiu. Seus olhos estavam maravilhados com o que via. Era tão real que ela quase desejou que fosse. – Por favor, diga.
– Não, irmã – riu – Você não está sonhando.
– Se eu não estou sonhando e esse lugar é real, então onde estamos?
Ben deu um passo a frente da irmã.
– Aqui – posicionou o dedo indicador sobre a testa da irmã. – Sua música criou esse lugar e nos para cá.
– Por quê?
– Porque você precisa de ajuda.
– Eu? – apontou para si. Eve não podia acreditar no que estava por vir: um sermão do Ben, do espírito do Ben. – Ben, eu não preciso de ajuda. Eu estou bem.
– Até quando você vai mentir para si mesma, Evangeline Hargreeves, hein? – cuspiu Ben. – Eu conheço o seu coração, sei suas fraquezas e seus pontos fortes. Você não me engana.
– Como você tem tanta certeza disso se você está morto? – retrucou Eve. – Como você tem tenta certeza de que realmente me conhece? Como pode ter tanta certeza de que eu não mudei, hein?
– Se você realmente tivesse mudado, os corvos no céu seriam borboletas e o tempo passaria normalmente, haveria noites e dias, haveria mais estações do que apenas primavera e você teria liberdade para ser você mesma, e não uma personagem num filme ruim que foi boa parte das nossas vidas.
O silêncio que se seguiu foi algo aterrorizante, mas compreensível. Ben sempre foi o mais sensato entre os irmãos, sempre abrindo os olhos de Evan e tentando ajudar Klaus com seu problema com as drogas, porém sem sucesso.
A vida havia sido cruel com eles, principalmente para Klaus, que se afundou no mundo das drogas, mas nos últimos dias parecia estar limpo.
– Amar não é errado, Ben.
– Amar aquela mulher é que é errado, Evangeline. – retrucou Ben.
– Isso não é da sua conta.
– Quer um conselho? – prosseguiu Ben, ignorando a irmã. – Não vale apena lutar por algo que nunca foi seu.
– O que quer dizer com isso? – indagou confusa.
– Adeus, irmãzinha – disse Ben. O mais novo deu lhe a costas e seguiu bosque a dentro. – Está na hora de voltar.
✯
– Ei, tudo bem? – a voz firme de Allison foi a primeira coisa que Evangeline ouviu ao passar pela ala dos quartos do segundo andar.
– É – respondeu Diego. Eve conhecia bem a voz do irmão. – Sei lá, é surreal ver ela assim. Eu queria contar para ela que...
Allison o olhou de supetão esperando alguma informação que explicasse a supta interrompição de Diego.
– A gente não tem tempo, temos que ir.
– Não sei não, Diego. O Cinco tá lá deitado, inconsciente. Precisamos dele.
– A gente consegue fazer isso sem ele. – assegurou Diego.
– Nós já fizemos isso, lembra? Acabamos todos morrendo. Eu não sei, só acho que eu devia voltar e ver a Claire.
– Não dá para escapar dessa, Allison. Foi isso que começou a bagunça em primeiro lugar. – afirmou Diego. Seus olhos e os de Allison se voltaram para o pequeno quarto onde Número Cinco e a mãe estavam. – O Luther tá certo.
– Humpf, pensei que você nunca diria isso.
– É, bom – respondeu Diego, desconcertado. Ele era orgulhoso demais para dizer isso outra vez e muito menos na frente dos outros irmãos. – Temos que ficar juntos.
Allison olhou bem para o irmão na esperança de que ele estivesse realmente falando sério.
– Por onde vamos começar? – indagou Allison, confiante.
– Bom, não tem nenhum endereço no arquivo, mas tem relação de parentesco. A avó do Jenkins, ela mora perto da estrada para Jackpine.
– Acha que ele levou ela para lá? – indagou Allison seguindo Diego escada abaixo.
– É um bom lugar para começar.
✯
Na soleira da porta, meio escondida, Eve observava atentamente os movimentos ágeis e delicados da mãe ao cuidar do filho acamado. Ela era a única que estava alheia a toda essa confusão e Eve agradecia aos céus por isso, seria muito triste ver alguém que já perdeu um filho perder os outros de uma vez só.
Ela estremeceu só de pensar que logo morreria – de novo?
– Mãe?
– Oh! – assustou-se Grace. – Querida, eu não vi você aí.
– Normal – deu de ombros sem se importar. – É a minha segunda mutação fazendo efeito.
– Sua...o quê?
– É uma piada – apressou-se em explicar. – Coisa de super-herói.
– Certo – respondeu Grace de forma alegre como de costume. Certas coisas nunca mudam. – Você veio para ver o Cinco?
“Não!”
– Sim – sorriu sem mostrar os dentes. – Fiquei sabendo que ele foi baleado. Ele vai ficar bem?
– Claro que vai – respondeu Grace, com estranheza. – Mas achei que não gostasse dele.
– Ele sempre foi arrogante, mãe. Mas ainda é meu irmão.
– Como a Vanya? – supôs Grace.
– Não! – afirmou. – Isso é outra história, a maluca fez por merecer o meu desprezo e o Cinco já nasceu arrogante.
– Vocês são complexos. – comentou Grace, rindo.
Isso era verdade, eles eram complexos. Todos, sem exceções, tinham medos e sonhos que jamais compartilhariam com ninguém, pois eram diferentes dos demais e isso assustava, sempre foi assim e por que haveria de mudar?
Ainda meio vacilante, Eve se aproximou da mãe e sentou-se ao seu lado.
– Você...uh...não se importa por eu ser...diferente? – perguntou Eve, hesitante e se odiou por isso. Ela temia que Ben estivesse certo e temia mais ainda a reação da própria mãe, ela esperava que Grace a entendesse e não a julga se. – Não é?
– Diferente? Por quê?
– Por eu gostar da Nove, mamãe.
– Ah, querida – sorriu Grace, envolvendo a filha num abraço apertado. – Isso não importa. Eu vou sempre amar você do jeito que você é, sendo o que for e o mais importante para mim é que você seja feliz com quem você quiser.
– Eu te amo, mãe. – disse Eve, com a voz embargada. Era tudo que ela mais queria ouvir naquele dia maluco, que alguém a amava e que não se importava com quem ela deveria ou não amar.
– Eu também te amo, meu passarinho.
Fim do 00.04
–––––––––––
Se eu chorei nesse final? Com certeza!
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro