Capítulo 9 | Um ponto fora da curva
Senti minha garganta seca arranhar.
Relutei em abri meus olhos, paralisada e catatônica quando o único barulho que os meus ouvidos capturaram foi pequeno estalido de simples engrenagens girando.
Santa Mãe dos Desesperados...
Era possível sentir o meu mundo se desfazer lentamente em mil pedaços atrás de mim.
Se fugir não me custou à vida, tentar mata-lo certamente vai me custar.
Morta. Eu já podia me ver morta!
Encarei a pistola de prata em minhas mãos trêmulas e pressionei o gatilho mais duas vezes, louca, furiosa, agarrando-me a um único fio de esperança de que a arma estivesse apenas com um mal funcionamento e mergulhando em uma espécie de colapso de nervoso e desespero quando nada aconteceu.
— Não. Não. Não. Não... — Eu repetia, tentando fazer a arma funcionar.
Dava para sentir meu coração se partir como vidro estilhaçado dentro do peito.
Contive a vontade de me encolher no chão e chorar como uma criança frustrada e soltei a arma das minhas mãos com rancor, o barulho de metal se espalhou pelo cômodo, quando o objeto encontrou o chão.
Eu a encarei com repulsa e ergui o meu olhar para Travis. Seus lábios curvados em um odioso riso arrogante. Ele esticou o braço em direção à maleta e pegou de lá um objeto fosco e plástico, preto e comprido.
— Eu disse que você não estava pronta. — Ele vagou em minha direção. — À propósito, esperava que você fosse mais esperta do que isso! — Lamentou, passando uma mecha de cabelo por de trás da minha orelha. — Isto daqui é um carregador e uma arma não funciona sem ele. Você só pode estar brincando se acreditou que eu te entregaria uma pistola carregada. — Ele suspirou e se abaixou para pegar a arma do chão. — Eu não posso confiar em você — estalou, encaixando a arma na maleta. — Por outro lado, é bom saber que você está pronta para atirar em alguém quando precisar.
Não percebi quando ele se aproximou outra vez, mas eu havia recuado de modo que a parede havia me traído, encurralando-me entre ela e ele.
Encarei seus olhos que tomaram uma coloração verde sombria e assustadora. Minha respiração se alterou e meu coração acelerou.
— Presta bastante atenção, porque eu vou te falar uma coisa e só uma vez... — Sua voz soava ameaçadora. Seus olhos estavam frios e a sua postura dura. — O Raymond não estava brincando quando disse que mataria qualquer pessoa que tivesse ligação com você. Então, já chega de bancar a vadia louca desesperada — ele fincou dolorosamente o seu dedo indicador na pele de meu ombro — ou você faz exatamente o que te mandarem fazer, ou eu te deixo viva tempo suficiente para que veja todos os amigos morrerem, um a um... sem piedade. E depois que você tiver sofrido bastante com isso, eu mesmo me encarrego de acabar com você. — Sua voz estava mais furiosa e dura do que o normal, o que me fez entrar em um estado de pânico.
Oh merda!
Os meus olhos quase pularam para fora das orbitas.
Virei o meu rosto para o outro lado e desviei os meus olhos dos seus, sentindo a raiva se esvair do meu sistema, cedendo espaço para o medo. Eu não sabia o que fazer.
Engoli a seco todas as suas palavras, sentindo todo meu corpo endurecer com a sensação horrível de congelamento.
Porque eu?
Eu não sou nada além de uma garçonete em um bar noturno.
Que habilidades uma garota como eu poderia ter?
— Você consegue fazer isso? — Inquiriu ele, interrompendo os meus pensamentos ao puxar o meu queixo com brusquidão, forçando-me a encarar seu olhar.
Encarei-o com repulsa, mas assentei que sim, de modo relutante e amedrontado, com a cabeça. Esperava que em algum momento eu precisasse sair deste lugar, para fazer seja lá o que fosse necessário e neste mesmo momento, estaria preparada para a minha fuga.
Estava disposta a me dedicar.
Ele me imprensou mais com seu corpo contra à parede. Seu olhar ainda estava sobre mim ameaçador e vil.
— Sem maluquices, sem joguinhos ou atitudes impulsivas. — Insistiu, afastando-se repentinamente, fazendo com que o peso de toda a situação recaísse como chumbo sobre os meus ombros.
Precisei apoiar-me pelas pernas, arqueando o corpo para a frente ao suspirar ruidosamente, tentando arejar o meu cérebro.
✦✦✦
Dedicação.
Uma ótima palavra para definir os dias que se sucederam. Estava me dedicando inteiramente a minha sobrevivência e com isso, passava todo o tempo livre treinando. E toda essa dedicação estava me rendendo bons frutos. Percebia meu corpo visivelmente mais forte e mais hábil. O sentimento de raiva se acumulava condicionado ao meu corpo, e eu o alimentava.
Precisava dar tempo ao tempo. Parecer ser uma pessoa confiável neste momento era o meu principal objetivo e esperava pelo momento certo de agir, e quando isso acontecer, estarei forte e pronta para fazer o que for necessário.
Por enquanto, Travis e Ernest pareciam acreditar que estava verdadeiramente me entregando à causa deles, e eu realmente estava. Mas entregava-me a minha causa de sobrevivência. Eles que se ferrassem.
Estava me preparando para isso.
Agora, estava sendo uma "boa garota" — como Travis mesmo dizia — e tinha recebido permissão para circular com supervisão do sexto andar para o quinto, ou seja, da minha cela para o salão de treinamento, onde eu tentava passar a maior parte do tempo. Era isso ou ficar naquela jaula de vidro, onde costumava me martirizar e reviver os meus tormentos a todo o momento.
Mordi com força a parte interna do meu lábio e desferi uma série de socos fortes e chutes no grande saco de areia preto suspenso a minha frente. O barulho do impacto no equipamento envolvido por um plástico grosso ecoou pelo espaço, misturando-se a minha respiração pesada e acelerada. Suor banhava meu corpo. Estava ali fazia algumas horas.
Havia muitos sentimentos tumultuados dentro de mim e sentia que quando começava a agredir algo, uma pequena parte disso tudo estava indo embora, como uma descarga de emoções. Um meio de tentar manter meus pensamentos na linha, sem me afundar no poço de loucuras do qual esse lugar estava tentando me sugar.
Ergui o meu olhar para o lado, encontrando a figura suada de Travis, enquanto devolvia silenciosamente os dois pesos de musculação para os seus respectivos lugares.
— Treinar com o saco de areia é fácil... — Provocou Travis, arqueando as sobrancelhas e pegando uma garrafa de água do móvel metálico que ficava livre para uso no canto mais afastado.
Franzi o cenho, levando a mão aos cabelos a fim de tirar a mecha que caia e grudava em meu rosto.
Travis encostou seu quadril no móvel e levou o gargalo da garrafa a sua boca, solvendo-a com alguns goles. Observei involuntariamente a ondulação que os músculos do braço formavam e ergui o olhar de súbito novamente, desviando o olhar de seu corpo.
Ele é bonito, tinha de reconhecer. Seu corpo estava em forma, os braços são fortes e definidos, o abdômen trincado e embora Travis fosse um cretino totalmente deplorável e asqueroso, ele conseguia chamar bastante atenção pelo rosto e pelo corpo.
— O que você acha de uma luta de verdade? — Emendou, dispensando a garrafa e quebrando a distância que havia entre nós, ficando frente a frente agora.
Dei de ombros. Eu sabia que ainda não era páreo para Travis. Ele era mais forte e tinha muito conhecimento com luta corporal, sem deixar de pontuar a diferença de quase vinte centímetros na nossa altura. Sobretudo, sentia-me capaz de lhe dar um pouco de trabalho e eu adoraria receber a oportunidade de socar a cara dele ao menos uma vez.
— Tá bem. — Acenei de lado com a cabeça, dando de ombros, e ele tomou sua postura, erguendo a guarda com os braços.
Travis começou a saltitar, um pé alternado do outro e me atacou com uma sequência de socos que consegui esquivar com agilidade e destreza. Depois, contra-ataquei tentando lhe acertar um chute na lateral da cintura, mas o meu pé viajou pelo vácuo, passando direto e voltando ao chão.
Ousei tentar dois socos, no qual ele desviou com um pulo rápido para trás e capturou com astúcia o meu braço. Tentei me defender alvejando uma joelhada em sua coxa, o que não adiantou muito, pois seu lábio se ergueu, distorcendo-se em um riso pretencioso. Chiei, desejando substituir sua presunção por hematomas. Seu ego inflado serviu de combustível para suportar a dor que vinha a seguir e senti uma dor abrasadora tomar meu braço, quando ele o torceu no ar, acompanhei o movimento, ficando imobilizada e de costas para o peito de Travis.
O calor de seu corpo quente do treinamento se propagou para o meu e desesperei-me ao sentir sua respiração quente roçar o meu pescoço.
O meu bom-senso implorava por uma distância segura de Travis.
— Isso foi impressionante — comentou, sua voz áspera e arrogante soou muito próximo de minha bochecha, reverberando gravemente por meus tímpanos. Um calafrio trilhou a minha espinha dorsal, implorando para que eu desse um jeito de afastá-lo — afinal, você não é mais uma vadiazinha tão indefesa assim...
Oh maldito! — Minha mente se revirou furiosa com sua provocação.
Remexi meu corpo revoltada em seu aperto. Estava farta de sempre tê-lo me chamando de "vadia". Queria fazê-lo engolir suas palavras e lhe mostrar que realmente não era tão indefesa quando ele desejava que fosse.
Eu definitivamente acabaria com ele.
O meu peito subiu e desceu em uma respiração alterada. Senti o sangue quente borbulhar em minhas veias e impulsionei meu corpo com as penas, empurrando-o abruptamente de costas contra a parede e articulei uma cotovelada em seu quadril com o braço livre, conseguindo então a oportunidade de me desvencilhar do seu aperto.
Sem que percebesse a tempo, Travis me deu uma rasteira, jogando-me com tudo no chão e colidindo de costas contra o acolchoado e quando ele tentou se aproximar com um soco armado, defendi-me instintivamente com um chute em seu peito, afastando-o. Isso me rendeu tempo para correr em sua direção como um felino traiçoeiro e pular sobre seu corpo, derrubando-o brutalmente no piso. Encaixei as minhas pernas nas laterais de seu corpo, travando-o no chão. Encarei-o duramente nos olhos.
— Eu não sou uma vadia! — Ralhei muito furiosa e tentei lhe acertar uma sequência de socos que ele bloqueou prontamente, formando um escudo de músculo com os braços.
O maldito agarrou o meu ombro, forçando-me a tombar com o corpo para o lado, subindo por cima de meu abdômen. Ele apertou a sua mão em minha garganta e eu comecei a resfolegar ruidosamente procurando por ar.
Isso não parecia em nada com um treino.
O meu rosto começou a aquecer e as forças começaram a me faltar com a ausência de oxigenação.
O desgraçado estava se vingando de mim.
Sem dúvidas Travis era um bom lutador e possuía muitas vantagens se comparado a mim, mas eu era uma pessoa esforçada e estava disposta a lhe dar um pouco de trabalho.
Ouvi um arranhar de garganta que ganhou momentaneamente a atenção de Travis e isso fez com que ele afrouxasse o aperto em volta do meu pescoço. Aproveitei a oportunidade e me forcei a retomar a minha posição por cima de seu corpo. Ignorei o ruído áspero que tentava nos chamar a atenção e lhe acertei um soco rápido e sem piedade na altura da sua boca.
— Sua cretina! — Grunhiu ele em resposta.
Remexi a cabeça, ignorando a dor que aquilo havia rendido ao meu punho.
Antes mesmo que pudesse erguer o meu olhar, o sangue rubro verteu rápido da pequena fenda que meu golpe lhe abriu no canto esquerdo do seu lábio inferior.
Oh minha nossa!
Eu tinha feito aquilo!
Realmente eu tinha gostado muito de fazer aquilo e estava orgulhosa do meu esforço. Afinal, ele não era tão indestrutível quando gostava de aparentar. O desgraçado sangra, e sangra rápido.
Eu tinha sido uma cretina aproveitadora, mas no fim, não importava, Travis fez coisas piores comigo. O que era um pequeno corte se comparado a um sequestro?
Ergui o olhar, encontrando o corpo de Raymond parado ao pé da entrada do salão, nos encarando com um olhar atento e uma expressão sisuda. Precipitei em me agitar e sair de cima de Travis, afastando-me do seu corpo.
— Travis... — A voz ríspida de Raymond tomou conta do ambiente e eu tratei de ficar o mais longe possível dos seus olhos.
Travis assentiu com a cabeça, saindo do salão de treinamento, deixando-me sozinha.
✦✦✦
A maioria das luzes já tinha sido apagada. Estava quase dormindo, quando ouvi a barulho arrastado da porta de vidro se abrir. Sobressaltei, sentando-me com urgência à beira da cama, e forcei os meus olhos a enxergarem a silhueta à meia luz na minha frente.
Esperei um pouco para ver quem poderia ser, e suspirei aliviada quando percebi os traços físicos eram de Travis.
Ele se pôs para dentro do espaço a passos pesados, prostrando-se próximo à entrada.
— Levante! — Ordenou rispidamente, fazendo um pequeno gesto com a cabeça.
Desejei lhe perguntar o que estava acontecendo, mas estava tão aturdida que acabei por engolir a seco. Hesitante em levantar da cama, mas acabei acatando a ordem sem questionar.
O que ele queria agora? O que faria comigo?
Estava sendo uma boa garota, cumpria todas as ordens que recebia. O que mais poderia fazer?
Meu coração bateu a mil no peito quando Travis jogou de relance uma bolsa em minha direção, eu a capturei com um bom reflexo.
Analisei de cenho franzido da forma como que pude, em meio à baixa luz, a parte externa da bolsa, desejando ansiosamente por abrir o zíper e saber o que estava contido ali.
— Vista isso, e esteja pronta em cinco minutos. — Determinou com uma voz carregada e áspera, saindo da cela logo em seguida.
Não era necessário que seu rosto recebesse muita luz para que soubesse que ele não estava com uma das suas expressões mais amigável, se é que existia uma.
Olá, meus amoooores!!!
Como vocês estão?
E principalmente, o que vocês estão achando do rumo que a história está tomando?
Estou seguindo firme aqui!!
Espero que vocês estejam gostando e se você leu... Não esqueça de deixar a sua estrelinha!! <3
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