20🌑
Não haviamos falado mas naquilo, e Akira poderia muito bem estar a diverti-se comigo, mas mesmo assim, fui ao lago naquela noite, e como eu havia esperado, Akira estava lá, recostado a uma ávore, a espera.
- Cheguei a pensar que não viria - diz ele se aproximando de mim e me envolvendo com o braço, um gesto íntimo demais, porém não recuei.
- Eu não vinha - digo, e isso era uma tremenda mentira.
Ele sorri para mim como se a mentira estivesse estampada em minha cara e me conduz até a beira do lago, até o mesmo lugar em que haviamos ficado na noite em que descobri meu destino, o que me esperava. Ele porém não faz gesto nenhum para se sentar, pelo contrário, fica em pé apenas observando o lago, e em seguida se dirige a mim.
- Você não chegou a ir até a cidade em sí? - pergunta, com uma leve curiosidade em sua expressão quase indecifrável.
- Há uma cidade fora desse espaço? - pergunto surpresa, e ele rí.
- É claro que sim. Acha mesmo que os Trils só lutam e não vivem?
Rio de seu comentário, pois era exatamente este o meu pensamento.
- Poderia me mostrar ao invés de continuar seu discurso debochado - digo, indiferente.
- Claro - diz ele, momentos antes de nos disolver novamente em ar.
Quando me solidifico e piso no chão sentindo aquela sensação estranha no estômago se dissipar, estamos em uma cidade iluminada, viva, não como a do mundo humano, com bêbados e violência, mas viva. Perco as palavras diante daquilo, e quando elas me voltam a boca, só consigo formular duas delas o suficiente para dizê-las em voz alta.
- É linda - digo, antes que ele segure minha mão e me guie pelas ruas.
Tudo tinha luz, e não havia tensão apesar da guerra próxima. Ao caminhar ao longo da cidade, consigo destinguir tabernas e hospedarias e contruções gigantescas onde supus que Trils com famílias enormes moravam.
A partir daí, minha noite virou uma confusão de sombras e luz e divertimento, da qual só me recordo de fragmentos.
Lembro de quando Akira me puxou para dentro de uma taberna onde vários Trils dançavam em um espaço enorme. Lembro também de quando depois de três copos de bebibas, Akira, revelando um lado seu nunca visto, me puxou para dentro daquela alegria contagiante e dançamos até que nossos pés não aguentassem mais.
Me recordo do momento em que ele um pouco mais sóbrio me levou diretamente para meu quarto e me desejou boa noite, depositando um beijo em minha testa, antes de se retirar logo em seguida para os próprios aposentos.
🌑
- Jenny, acorde por favor.
Abro os olhos lentamente e vejo a luz do sol em meu quarto. Quando meus olhos estão totalmente abertos vejo Akira sentado ao meu lado na cama, me olhando com olhos tristes, uma olhada geral por meu quarto me permite ver Scott se aproximando e sentando também ao meu lado, as lágrimas escorrem por seu rosto.
Me sento imediatamente na cama e olho para os dois, um peso se formando em meu estômago. Penso em falar algo, mas estou confusa demais no momento para isso.
Akira segura uma de minhas mãos com as suas, quase me afasto ao toque pois as mesmas estão geladas e trêmulas.
Sinto meu mundo desabar quando depois de três tentativas mal sucedidas para falar, ele diz com a voz baixa.
- Os Glions começaram o extermínio - diz ele - mataram os pais de Scott e...sua mãe.
Solto minha mão da sua e escondo meu rosto das mãos. As lágrimas vêm e não consigo falar nada.
Não...aquilo não podia ter acontecido...minha única família...não não e não...
Akira me envolve em um abraço e sinto Scott se juntar a ele logo depois, seu corpo sacudindo junto ao meu devido aos suluços.
Não...não...não pode ser...
Eu estava em choque, não conseguia me mexer, não...não ela...
Não me recordo em meio aos meus devaneios de quando eles saíram. Talvez não tivessem saído. Talvez tivessem passado o dia ali, comigo, enquanto eu chorava e chorava por não saber o que fazer e ao mesmo tempo querer fazer algo, trazer minha mãe de volta. A culpa me tomou por nem ao menos ter contado a verdade para ela sobre o que estava fazendo, por não ter me despedido, por não ter lhe dito um último eu te amo.
Perco a voz depois de gritar como uma louca, e minhas pernas doem depois de eu ter andado várias vezes inquieta pelo quarto mesmo ao ouvir os pedidos de Akira para que eu me sentasse, e adormeci quando a exaustão da mente me dominou por completo, me levando para um lugar mais tranquilo do que o que eu estava agora a pouco.
🌑
Abro os olhos. A realidade me cai no momento em que acordo. Minha mãe morreu.
Não. Foi morta, morta pelos malditos Glions.
Olho ao redor e vejo Akira deitado a meu lado me observando, um braço passado por minha cintura, não parece ter dormido. Nenhum sinal de Scott no quarto, ele devia estar em seu próprio modo de aversão e desespero em outro lugar.
Eles. Eles que me tiraram Julian e traumatizaram Scott, eles que quase me levaram, agora haviam levado meu único vestígio de família, minha mãe.
Suspiro fundo, e repito mentalmente: sou forte, posso lidar com isso. Demorarei a superar, mas superarei.
Mas eu queria vingança. O pensamento me vem no momento em que a tristeza é substituida pelo ódio atroz, sentimento ínfimo dentro dos que me tomavam, mas profundo, monstruoso.
Passos. Eu precisaria caminhar para aquilo, para vingar o que me destruía. E o primeiro passo para aquilo...
Olho no fundo dos olhos de Akira, e ele sustenta meu olhar. A aproximação foi tão rápida, tão natural, algo que havia sido escrito nas estrelas...
- Diga a Kalel que estou pronta para a cerimômia, quero me tornar mestra espiã ainda hoje se possível - digo em um fôlego só para Akira, os olhos voltados para os seus.
Algo brilha em seus olhos quando ele segura minha mão e a aperta, e se aproxima de mim para me dar um beijo na testa.
- Assim queira - diz ele minutos depois de sumir no ar, ao encontro de Kalel.
🌑
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