CAPÍTULO 2 - Um anjo pela escada
Eu ainda estava me perguntando o porquê eu não tinha morrido naquele acidente. Provavelmente, ver meus miolos grudados no chão do além seria menos doloroso do que voltar para a casa depois de três dias do hospital com Summer.
Eu havia deslocado o tornozelo e por conta disso mal conseguia firmar o pé no chão, logo, não podia andar. Logo, meus lindos amigos haviam arrumado compromissos e eu teria de ficar o dia inteiro com os cuidados de Summer, já que não tinha mais ninguém disposto a me ajudar a andar.
Ficaríamos na padaria o dia inteiro. Ela tinha de trabalhar e eu iria ficar lá por não ter outro lugar para ir, já que sozinho eu não conseguia nem ir ao banheiro. Desconfortável é a palavra.
Estacionamos em frente a "Cupcake", nome que ela havia colocado para uma PADARIA e ela desceu do carro. Reparem no que aconteceu: ELA DESCEU DO CARRO! E me deixou lá! Ela ME DEIXOU LÁ! Posso com uma coisa dessas? Enfermo desse jeito? Mas é claro que eu NÃO POSSO COM UMA COISA DESSAS. E vou parar de gritar, prometo. Sério.
— Oh, bonita. – Chamei colocando a cabeça para fora do carro, enquanto ela ia em direção a porta de vidro, pronta para entrar. – Eu não consigo andar! – Berrei, e ela apenas se virou como se nada tivesse acontecido e respirou fundo.
— Quer que eu te pegue no colo? – Perguntou olhando para as unhas. Arregalei os olhos, totalmente indignado.
— Espera que eu faça o que? Vá voando? – Questionei e ela deu os ombros. — Summer, por favor! – Supliquei. Ela arfou antes de vir até o carro, abrir a porta para mim, e segurar minha mão para me ajudar a levantar. – Obrigada.
— Não agradecem as obrigações. – Disse me guinchando para dentro, depois de fechar o carro. Revirei os olhos e entrei, enquanto ela me arrastava até a cozinha.
Fiquei lá em silencio enquanto ela dava ordens para os seus funcionários fazerem os pães certos e os bolos que precisavam ser entregues as pessoas que fizeram as encomendas. Ela era autoritária e era engraçado ver um monte de marmanjo recebendo ordens daquela anã.
— Sun! – Chamei tentando me levantar. Ela parou para olhar para mim. – Estou com fome.
— E o que eu tenho a ver com isso? – Questionou franzindo o cenho.
— Preciso de ajuda ou de comida. Faz um bolo pra mim? – Pedi dengoso.
— Tá me achando com cara de... – Ela não terminou o que me fez rir. – Joseph, por favor, eu estou trabalhando.
— Então vamos sair daqui! – Implorei. – Você anda muito estressada ultimamente. Você não era assim comigo. Mesmo depois dos acontecimentos marcantes... – Me referia ao nosso término.
— Eu estou trabalhando. – Repetiu.
— Você é a dona, acho que pode sair à hora que quer. – Disse como se fosse óbvio. – Vamos lá pra frente, a gente come e conversa. Tá precisando relaxar. – Ela não disse nada por um instante. – Por favor! – Insisti.
— Ok. Vamos antes que eu me arrependa. – Disse tirando o avental e o chapéu antes de me ajudar a ir até a parte da frente da padaria.
Eu gostava daquele lugar pelo simples fato de que era a cara da Sun. Fofo. Eu havia lhe ajudado a decorar quando ela decidiu abrir aquele estabelecimento e passamos ótimos momentos juntos ali. Eu havia terminado com a Margot na época e nós ainda éramos amigos. Demos o nosso primeiro beijo ali.
Era muito bem decorado, de um jeito meigo que só ela poderia trazer. Tinha mesinhas onde os clientes se deliciavam com as coisas que ela fazia e ainda poderia conversar a vontade. Seguimos até uma mesinha afastada, onde nos sentamos e um dos seus funcionários anotou nosso pedido antes de se afastar.
— Tá doendo muito? – Perguntou quando me viu gemer para mexer o pé. Eu apenas assenti.
— Tá. É horrível isso.
— Desculpe, de verdade. Eu não imaginava que você iria... – Disse começando a ficar nervosa.
— Não se incomode. Meu pé vai voltar ao normal logo, prometo. – Ela riu. Silêncio. Desconfortável. Suspirei. – Você anda estranha nesses últimos tempos.
— Não começa Joseph. – Disse tirando a franja dos olhos. – Sem papos cabeças hoje, por favor.
— Ok, o que aconteceu? – Perguntei e ela evitou olhar nos meus olhos. – Summer?
— Ai, não me irrita. – Pediu fazendo birra e batendo o pé. – Você é insuportável sabia?
— É incrível, mas eu escuto isso todos os dias e ainda não me acostumei. – Disse colocando o cotovelo na mesa para poder apoiar meu rosto na mão. Ela bateu na minha testa, fazendo minha cabeça ir para trás. Eu ri. – Chata.
— Idiota.
— Trouxa.
— Imbecil.
— Magrela. – Ela ergueu o dedo do meio para mim, e então o garçom chegou colocando o nosso pedido sobre a mesa.
— Não vou te responder, Joseph, por que se eu fosse fazer isso eu iria me estressar mais do que eu já estou estressada. – Respondeu mordendo seu salgado. – E alias, acho que a culpa é toda sua pelo meu nervosismo ultimamente.
— Fazer o que? É o meu charme. – Ela riu.
— Eu preciso comer logo. – Explicou.
— Para de graça, vai. – Pedi, revirando os olhos.
— É sério. – Disse novamente. – Tenho que ir logo, preciso sair hoje.
— Onde a padeira pensa que vai? – Questionei erguendo as sobrancelhas. Ela empurrou minha cabeça de novo. – É, sério, eu estou enfermo e preciso de cuidados.
— Acho que você pode ficar em casa sozinho durante algumas horas. – Disse como se fosse óbvio. – Margot vai vir te buscar daqui a pouco para te levar até o apartamento, onde vai ficar até Katherine terminar o ensaio, ai ela vai pra lá para Margot se libertar, até Dave e Michael chegarem para passar a noite com o Dr. House. – Disse rindo, e eu quase meti minha bengalinha na cabeça dela.
— Acho que preciso contratar uma babá. – Disse comendo. – Ela seria mais amorosa comigo do que qualquer um dos cinco.
— Relaxa. – Disse ela dando os ombros. – Duvido que Margot não providencie isso logo. – Explicou rindo. A sineta da porta tilintou. – Falando nela... – Me virei enquanto Margot se aproximava com o maior bico que já tinha visto. Sun me ajudou a ficar em pé e pegar minhas muletas. – Cuidado. – Disse me dando um beijo na bochecha e um abraço. – Vai precisar. – Riu ao que eu fiz uma careta e ela se afastou depois de falar com Margot.
— Olá amor. Me dá um beijinho. – Pedi fazendo bico, ela simplesmente revirou os olhos e deu as costas. – Amor da minha vida. – Cantarolei. E ela se virou impaciente. – Necessito de ajuda.
— Não sou sua babá. – Disse se aproximando e me ajudando a sair e entrar no carro. Ela me jogou no banco de passageiro bufando. – Vamos logo, estou sem paciência.
— Você sempre um amor.
— Com você até dois. – Disse seca, ligando o carro e seguindo para o meu apartamento. Não dei um pio até lá, pelo simples fato de que ela me irritava mais do que qualquer outra coisa no mundo, e eu não poderia fazer muita coisa daquele jeito. Se falasse alguma coisa muito grave, ela me arrancaria um olho antes de eu conseguir tirar o pé do chão.
Chegamos ao prédio e subimos pelo elevador em silêncio. Ela abriu a porta do meu apartamento com o seu próprio molho de chaves – oi? – e me jogou pra dentro. Ela tinha as chaves da minha casa e eu ainda não sei até onde isso é seguro.
— Vai logo. – disse enquanto eu me apoiava para dentro. Cheguei perto do sofá. – Espera aí, eu esqueci o notebook no carro.– Eu assenti e ela sumiu pela porta.
Coloquei as muletas de lado e assim que eu olhei para o sofá algo muito engraçado aconteceu. Se existe uma coisa estranha é não ter força no pé, porque se você não força no pé, você não consegue se apoiar ou ficar em pé, e logo, normalmente nessas circunstâncias você cai. E foi exatamente o que aconteceu. Eu fui pendendo pro lado devagarzinho como se o mundo estivesse se jogando para o lado.
— Eu to caindo. Eu to caindo. Eu to caindo. – Dizia calmamente, sem me tocar que eu precisava me segurar em alguma coisa. – Cai. – Disse quando meu corpo bateu no chão. – Droga, eu vou acabar morrendo desse jeito. – Disse tentando me levantar.
Nunca vi tanta dificuldade em sentar em um sofá. E se acha drama, tenta fazer isso sem força nenhuma na perna direita por conta da dor em seu tornozelo. É amiga, boa sorte.
— Posso saber o que você está fazendo caído ai? – Margot questionou assim que chegou.
— Me joguei para testar a maciez do piso. – Disse irônico. – O que acha que eu estou fazendo caído aqui? Eu caí, dã.
— Que proeza. – Disse ela, revirando os olhos.
— Vai me ajudar ou vai ficar ai me olhando com cara de tonta? – Ela colocou as mãos nas cinturas, mostrando o quanto ela era poderosa.
— Tonta? – Perguntou levantando as sobrancelhas. – Por que o senhor digno e maravilhoso super Ucker precisaria da ajuda da tonta? Tenho certeza que sua autossuficiência é capaz de te erguer sozinha. – Respondeu me dando as costas, indo para o meu quarto. Que abuso. SAIA DO MEU QUARTO JÁ!
Consegui subir no sofá, e depois de muito implorar ela me trouxe o notebook e os controles da TV. Não tava prestando muita atenção no que acontecia na televisão, pois estava baixa já que Margot estava ocupada escrevendo para a revista sentada à mesa, e eu não queria mais problemas com aquela ali, por isso preferi ficar quieto no meu canto.
Eram quase seis da tarde quando Margot empurrou o notebook por cima da mesa e debruçou sobre o vidro. Cocei a nuca, sem entender o que ela estava fazendo. Parecia cansada.
— O que foi? – Perguntei e ela deu os ombros, sem levantar a cabeça. — Margot? – Chamei, e ela ergueu a cabeça, esfregando o rosto. — O que foi?
— Nada, só cansaço.
— Pode deitar se quiser, qualquer coisa eu te chamo. – Ela fez que não. – Tá com fome? – Perguntei mordendo o canto da unha.
— Relaxa. – Disse dando os ombros de novo, pegando o notebook de volta. Revirei os olhos e peguei o telefone com certo esforço e liguei para uma pizzaria. Pizza essas horas? Hm.
— Alô? Boa tarde, por favor, eu gostaria de pedir uma pizza de mussarela e outra de portuguesa sem queijo. Isso... Nada de tomate. – Comecei a fazer o pedido que chegaria a mais ou menos 15 minutos, porque eu era cliente Premium. Sabe como é... Hehehe.
— Você ainda lembra... – Disse ela depois de um segundo, me olhando de um jeito engraçado.
— Lembro do que? – Perguntei sem entender. Deu os ombros com um meio sorriso nos lábios.
— Das únicas pizzas que eu como. – Respondeu. Eu ri, acanhado.
— Certas coisas a gente nunca esquece. – Disse, e ela tirou a franja dos olhos, e desviei o olhar. Desconfortável. — Sabe... – Comecei de novo, voltando a olhar para ela. – Você tá bem? – Margot riu.
— Porque estaria mal?
— Está comigo há umas cinco horas. – Afirmei ao que ela riu novamente.
— Certo, isso é um bom motivo para eu não estar bem. – Ataquei a almofada mais próxima nela. Margot desviou. – Está vendo?
— Ah, fala sério. Eu não sou tão mal assim. – Fiz bico.
— Mal, você é, mas eu já me acostumei com isso... – Disse suspirando.
— Foram oito meses, né... – Disse sorrindo e Margot engoliu a seco, desviando o olhar para o computador. Merda. — Olha... – Comecei e ela simplesmente ergueu a mão, fechando os olhos.
— Só... Cala a boca. – Pediu trincando os dentes e prestando atenção na tela do notebook. Sabia que ela não estava fazendo nada, só não queria olhar na minha cara. – Você pode ser o mais agradável possível, Ucker, mas isso só acontece enquanto você está calado.
— Não tive a intenção de... Argh. – Grunhi respirando fundo, para manter a calma. – Dane-se.
— Não sei por que eu aceitei isso. De verdade. – Disse mais para si mesma do que para mim. Como se EU tivesse culpa.
— Eu não pedi para ninguém cuidar de mim. Se você quiser, você sabe o caminho da rua. – Cuspi as palavras e eu perceber quando ela me queimou com os olhos.
— Quer saber? Tchau Joseph. – Disse pegando suas coisas de um jeito tão rápido, que se piscasse perderia algum momento importante de sua digníssima partida.
— Tchau, Margot. Tchau. – Disse ao que ela saiu como um furacão pela porta, batendo com força. Ataquei a outra almofada com força na porta assim que ela saiu.
Droga, droga, droga.
Eu não sei quem era pior, eu ou ela. Provavelmente todos devem estar me odiando dizendo "Nossa, como esse Ucker é palhaço", mas poxa, ponha-se no meu lugar. Se fosse você, iria aturar sua ex falando no seu ouvido e querendo ser a certinha quando o placar está 0x0 ou 25714x25714, como quiser? Faz de conta que estamos em um jogo de futebol onde o placar acabou empatado. Quem marcar primeiro, ganha, mas quando todos estão marcando ao mesmo tempo, fica meio difícil calcular, certo?
Esfreguei meu rosto tantas vezes que o índice de oleosidade da minha pele deve ter aumentado uns mil por cento. Só me toquei que fazia isso quando a campainha tocou e o entregador de pizza apareceu. Com certa dificuldade paguei as pizzas no qual não estava a fim de comer e joguei em cima da mesa. Foi só então que eu percebi que Margot havia deixado o notebook ali.
Ah, pronto.
Vamos desvendar a vida da doce e adorável *pigarro* Margot. Sentei-me defronte o computador e vi que a pagina em que ela estava navegando ainda estava aberta. Eram e-mails de um dos setores da revista dizendo que os textos daquela edição não haviam chegado, e faltava um para preencher as lacunas e deve ser por isso que ela estava se matando.
Margot era uma idealista. Gostava de ter moral e falar de problemas sociais e essas coisas mais políticas, ao contrário de mim, que costumava ser mais escritor de livros estilo Nicholas Sparks. Ela sempre teve dificuldades com esses tipos de textos românticos, e a revista falava de tantas coisas, mas ela quase nunca entrava do foco fofoca/infanto-juvenil, no qual a privava de falar sobre problemas econômicos e lhe obrigava a escrever coisas como "10 dicas para arrumar um namorado perfeito" e "O novo cabelo de Justin", e esses outros tipos de assuntos interessantérrimos.
Suspirei ao ler o pedido do texto. Eu tinha aquilo. Mas, Margot merecia tanto amor? Eu havia me formado em jornalismo e publicidade, além de uma pós em letras, exatamente por conta disso, escrever textos e expor minhas ideias em forma de poesia. Eu poderia muito bem pegar um texto de algum autor famoso na internet e deixar que ela se danasse para conseguir arrumar depois. Mas eu trabalhava naquela revista, e o privilégio dela era o meu privilégio mesmo que depois do nosso término Margot fizesse de tudo para me ofuscar. Então, eu iria brilhar, e de praxe, encher um pouco da paciência da nossa queridinha Margozinha.
Abri o e-mail novamente.
Assunto: Ao Acaso. Texto que faltava para a matéria.
Conteúdo:
Alguns poetas dizem que tudo pode acontecer por causa de uma linha no horizonte chamada destino, outros, afirmam que nem tudo é porque um ser maior colocou seu dedo sobre duas pessoas as empurrando para ruas inimagináveis da vida, fazendo com que se cruzassem pelo resto de sua existência. Ainda existem outros que preferem falar que tudo acontece sem querer, escolhas que refletem um futuro desconhecido. Assim, de relance. No agora, no já. Sem pensar, pular, se jogar. Ao destino ou ao acaso, não importa como, mas quando duas pessoas são feitas para ficarem juntas, não importa por quantas ruas andem, eventualmente, encontrarão o caminho de volta.
Enviar.
Fechei a tampa do notebook e refleti no que eu estava fazendo. Ela provavelmente iria vir buscar o note, e veria que o e-mail foi enviado daqui – porque eu anta, esqueci de apagar o historio e ela havia mudado a senha – e consequentemente, iria querer saber quem enviou e me matar por isso. Dane-se também. Tenho pizzas para comer.
Empurrei o notebook e puxei as pizzas, quando a porta se abriu e uma visão de uma Katherine dominou minha visão. Sorri para ela, enquanto ela me dava um beijo na bochecha e ia para dentro, procurar algo no meu quarto. Ninguém respeitava minha casa mesmo...
Duas semanas depois...
— Eu vou repetir de novo... – Disse Margot batendo a mão na minha mesa enquanto eu tentava me concentrar no que acontecia na tela do meu computador.
— Mas, de novo? – Perguntei grunhindo, revirando os olhos, cheio de ironia. Margot só faltava virar uma arma e começar a atirar na minha cara.
— Quem escrever aquele texto? – Perguntou novamente.
— Eu não sei. – Respondi cantarolando. – O texto não arrasou? Então não me enche mais o saco, por favor. Agora, vira gás e vasa, porque por sua causa eu ainda preciso trabalhar. O expediente está acabando e eu ainda estou aqui. E olha que surpresa: é sábado!
— Argh! – Ela grunhiu perdendo a paciência. – Tomara que você apodreça ai. – Disse saindo batendo o pé.
— Não vai ser por falta de praga, né coração? – Disse mais alto para que ela ouvisse, e então tirei os olhos do monitor já que minhas retinas estavam derretendo. – A gente faz algo bom, e ainda reclama? Ah, me poupe, miguxa.
Precisava urgentemente parar de andar com o Dave, amigos, eu sei. Mas não é tão fácil quanto vocês pensam ok? É algo automático, que gruda na sua mente e não sai mais. Como diz Katherine, estou me sentindo uma nega do leite falando assim. Mas isso não vem ao caso, preciso focar em organizar esses arquivos, porque é a coisa mais produtiva que eu faço além de tirar xerox nessa revista. E olha que eu sou formado em jornalismo e publicidade, além da pós em letras! Eu gastei dinheiro nisso, viu?
Tudo bem, Margot é minha chefe, eu sei. Eu sei também que deveria arrumar um emprego novo, eu sei. Mas o que eu colocaria no meu currículo sobre o último emprego? Qual seria a minha função? "Garoto da xerox"? "Escrevi o texto mais bombástico daquele lugar, amiga!" ou, sei lá, "Quebrei a perna"? Decadente.
Terminada o meu martírio e pensamentos de como minha vida poderia ser diferente em um novo emprego, eu depois de arrumar minhas amadas Xerox me levantei. Eu estava com botinha ortopedia, que coisa linda! E a batata da minha perna estava ficando deformada. Por que disso? Ah, claro. Eu havia tirado o gesso, e mesmo meu calcanhar não estando deslocado, ainda doía muito, porque eu tinha amadas pessoas ao meu redor, como Dave e Mike que te levam num escorregador e usam seu pé como freio. Simples assim.
Ai você pergunta: Nossa, Joseph, como você deixa? *cara de pasma* Amiga, olha, não faça perguntas difíceis... Tenho fé que um dia as coisas serão diferentes pra mim.
Cheguei *acredite, que com muita dificuldade, já que meu pé estava formigando e eu parei pra rir, e agradeço que não tinha ninguém ali para ver minha crise de histeria* no elevador. E adivinha só a provação que eu encontrei? Se eu não for pro céu depois dessa, eu não sei o que eu faço, porque é claro que Zeus vai me colocar em situações onde terei de provar meu amor e na poderei reclamar, mesmo é claro quando o elevador está quebrado e você não pode andar.
Havia uma faixa ENORME em amarelo com os dizeres "elevador desligado, não entre". Como se eu fosse uma espécie de superman que fosse abrir a porta com as mãos e sair voando pelo duto, porque somente o aviso de "desligado" pra mi não é o suficiente.
Que venha a escada. Descer 18 andares deve ser uma maravilha, de bengala então, nossa, perfeito. Talvez até o domingo eu chegue a casa. Pensem como eu vou estar filé na segunda? De dar inveja em muitos caras de academia que eu sei. A batata da minha perna então, nossa... Vai até brilhar.
Desce um, desce dois, desce três... Desce quatorze, e já foram quinze minutos. Novo recorde! Uhu. *animação*
— Um dia, eu profetizo sobre a minha vida, que eu terei pessoas ao meu redor que vão querer meu bem e não me machucar. Por que eu não tenho, escute bem, não tenho mais pé para esse tipo de coisa. – Disse para mim mesmo, enquanto descia as escadas de modo deficiente.
— Falando sozinho, idiota? – Disse alguém atrás de mim, e nem me dei ao luxo de virar para olhar para Margot.
— Se você me respondeu quer dizer que não.
— Se fecha queridinha. – Disse ironicamente.
— Queridinha? Certeza? Que eu me lembro não era bem assim que você me chamava. – Sorri pro nada, esperando que ela tivesse captado o veneno de minhas palavras.
— Claro que não, eu era mais escrachada naquela época e te chamava de babaca mesmo.
— Duvido muito. – Respondi enfim olhando para ela, e erguendo as sobrancelhas do modo mais sugestivo que eu achei. Margot desceu os últimos degraus, ficando apenas um atrás de mim, lhe deixando exatamente a minha altura.
— Quem te garante? – Questionou, sorrindo de lado. Ela queria mesmo que eu respondesse?
— Eu sei. – Respondi olhando no fundo dos seus olhos.
— Mentiroso. – Respondeu jogando os cabelos. Dei os ombros, me virando e voltando a descer as escadas. Faltavam pouco, uns três andares no máximo. – Você não sabe de nada.
— Margot, diga o que quiser, mas nunca vai poder negar que eu sei como fazer as suas pernas tremerem. – Disse tão convicto que até eu mesmo poderia acreditar. Sexy Ucker, ativar! Aprendam com o mestre, vai.
— Ai você acorda. – Ri, enquanto ela descia as escadas calmamente atrás de mim. – Joseph, não é apenas por que você é o meu ex que você me conhece tanto assim. – Eu me virei de novo e ela parou abruptamente mantendo a mesma proximidade de antes.
— Não, Margot, mas pode ter certeza que eu conheço o que te fazer arrepiar. Não se esqueça que foi comigo que descobriu metade dessas coisas. – Ela engoliu a seco, enquanto olhava no fundo dos meus olhos sem saber se me odiava ou se ficava com vergonha. FALO MESMO, FÃS, FALO MESMO! – Vai negar?
— Cala a boca. – Disse ainda sorrindo. – Agora.
— Então nega. – Ela se manteve em silencio, ainda sorrindo de um modo engraçado, do estilo "corre que eu vou te matar", como se eu pudesse correr. Cruzei os braços e ergui o queijo pra lhe encarar. – Nega que eu juro que lhe dou o troféu de hipócrita do ano.
— Para um ex inválido, você anda muito convicto das coisas, não acha? – Perguntou engolindo a seco novamente. – Me responde quem postou aquele texto. Quem escreveu.
— Não muda de assunto. – Pedi ainda lhe fitando. Ela jogou os cabelos para o lado, quebrando a conexão de olhares. Fraca. – Trouxa. – Disse lhe dando as costas e voltando a descer as escadas. Faltava um andar e meio.
— Eu te fiz uma pergunta, responda. – Disse atrás de mim. Tinha perdido a paciência. Eu queria ser sexy e ela cortou o meu barato.
— Eu também, responda.
— Não vou responder isso. – Disse convicta. Fracote.
— Nem eu. – Respondi abrindo um grande sorriso. Ela arfou e começou a gritar. Gritar, gritar, gritar, gritar e gritar. Eu não ouvi um terço do que ela estava dizendo era tudo muito desconexo como:
Seu grande idiota... Blá, blá, blá... Palavras inapropriadas para uma história de censura, até então, livre... Blá, blá, blá... Retardado... Bigode... Pernas... Peito com meias... Pintinho de criança... Vou te matar... Blá, blá, blá, blá... Nazaré Tedesco... Prepare-se...
Olhei para ela sem ter entendido bulhufas do que ela queria dizer, e simplesmente arfei lhe olhando de modo tão sereno que dava até vontade de dormir, tamanha minha calma e autocontrole.
— Por que tá me olhando assim? – Gritou, esperneando. Subi as sobrancelhas.
— Acabou? – Perguntei dando-lhe as costas para descer os últimos degraus de escada.
— Idiota! – Berrou, e então, adeus vida, adeus mundo, adeus pé, adeus tudo.
Ela me empurrou amigos, me empurrou. Acha isso legal? Claro que acham! Vocês me acham um cafa, sabem o que é cafa? Então, cafa de cafajeste. Aprendam as palavras abreviadas, ok? Obrigada. Mas ela me empurrou, eu torci meu pé e... Puf. Caí.
Foi um vuco-vuco que eu só vi bengala indo para um lado, pé torcido para o outro e eu rolando, rolando, rolando, igual uma bola. Mas foi uma cena tão linda que dava até vontade de chorar. Por sorte eu estava perto da porta de saída e tudo o que eu fiz foi me jogar em cima dela e sair do prédio. Dó de quem estava passando a minha frente, já que eu estava caindo em cima dela.
Eram duas garotas, elas tinham cabelos mais ou menos longos. Uma era loira, os olhos eram azul e seu corpo era bonito pelo o que vi no meu tombo. A outra tinha os cabelos pretos e os olhos castanhos, mas seu rosto quando ela me ajudou a se levantar era tão lindo que eu imaginei estar sendo resgatado por anjos.
— Desculpe! – Pedi, mancando. Ai que dor! QUE DOOOOOOOOOR! – Eu juro que não costumo cair no meio da rua. – Expliquei para elas. Margot apareceu na saída, segurando a bengala e me jogou com tudo antes de sair marchando. – Só quando sou empurrado. – Elas riram, sem entender enquanto me seguravam de pé. – Desculpe. – Disse de novo e tentei ficar equilibrado. – Sou Joseph, um anjo que caiu da escada. – Me apresentei estendendo a mão. A loira foi a primeira a pegar.
— Prazer, anjo. Sou Gabrielle. – Estendi a mão para a outra, que parecia ainda estar rindo.
— Eu sou Candice. Prazer. – Eu concordei, tentando me manter de pé. – Vem, a gente te ajuda a andar até algum lugar. – Ela se ofereceu, e então Candice e Gabrielle me salvaram.
Fim.
Ou não... Mas é claro que não.
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