Todas as vezes que eu morri
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Por onde começar? Eu tenho uma vida pacata, bem calma para uma pessoa que é cantora em uma banda de fama internacional.

Alice Trinder, esse é meu nome e foi assim que tudo começou. E acabou também.

Califórnia. Às 19:00 hrs, 23 de fevereiro. Apartamento do Josh, meu namorado.

— Sabe o que combina bastante com bolos de aniversário? — Pergunto a Josh enquanto acendo as velas para bater parabéns para ele.

Era seu vigésimo aniversário e eu queria presentear ele de uma maneira diferente. Com meu dom desconhecido, meu talento que escondi por anos.

Eu sabia cantar desde novinha. Mamãe era uma cantora espetacular, mas eu não pude seguir a carreira.

Como eu iria investir na minha carreira musical quando meu pai tinha câncer e não tínhamos um real no bolso? Eu precisava trabalhar.

Mamãe fugiu de casa quando descobriu que meu pai estava doente. Eu fiquei impossibilitada de acreditar na realidade do amor.

E sobre Josh? Sinto algo por ele, mas não sei dizer bem se é amor. Ele tem cuidado de mim durante alguns anos e segurou a barra quando eu simplesmente cai no pior lado do mundo.

Comecei a trabalhar em um escritório de advocacia, mas claramente não foi como advogada. Eu era secretária do doutor Mark e não gostava nada do meu trabalho, nem da forma como aquele velho rabugento me olhava.

— O que combina com bolos de aniversário, Alice? — Puxa-me pela cintura e gruda sua boca na minha rapidamente.

— Músicas de aniversário! — Empolgo-me e bato palminhas e todo mundo vibra também.

— E você vai cantar? — Ele arregala os olhos por alguns instantes quando eu afirmo com a cabeça. — Uau!

— Finalmente vamos ouvir a única voz desconhecida do nosso grupo? — Kimberly, mais conhecida como minha melhor amiga, questiona.

Todos sabem que eu canto, papai fez questão de contar a cada um dos meus amigos, que sempre tentaram me fazer soltar a voz.

Mas por que eu cantaria? Cantar só me lembrava de uma coisa: eu jamais poderia seguir meu sonho.

Conheço um velho ditado que diz "quando você mata um sonho, você morre junto  dele." Eu morri junto com meu sonho e fui enterrada lado a lado.

— Pode começar, Ali! — Josh me incentiva e de repente todos estão gritando "Ali, Ali".

Fecho os olhos por uns segundos e respiro fundo. Chegou a hora de mostrar o que sei fazer, a hora de revelar meu segredo para o mundo, não literalmente "o mundo", mas para meu mundo, que se baseava em todas as pessoas que estavam naquele pequeno pedaço do apartamento minúsculo de Josh.

"Tudo que eu desejo para você é um pouco de felicidade,
Que você saiba amar quem é de verdade
E que sua vida seja repleta de solidariedade.
Tudo que quero é que você saiba aproveitar,
Seu coração escutar
E dos seus problemas se livrar"

Eu mesma criei essa música para hoje. Apesar de não amar Josh da maneira romântica, amo-o como um irmão, como uma parte importante de mim.

— Nossa, Ali! Você foi esplêndida, como seu pai disse. — Os olhos do meu namorado brilham e eu sorrio, me emocionando com seu comentário.

Papai está a cada dia mais debilitado, e mesmo que eu me esforce muito para pagar todas as sessões, não parece que ele vai melhorar.

Então, tento me preparar todo dia para o dia em que verei meu pai partir. Mas não existe preparação para esse tipo de coisa, nunca estamos preparados de verdade para perder alguém.

Ainda menos quando esse alguém foi a única família que te restou.