CAPÍTULO 1 - REENCONTRO
Goiânia, GO
18/06/1981 (quinta-feira)
- Vai sair, Regina?
- Sim, mãe, vou levar Andréia na patinação. Papai já foi para o hospital?
- Ele saiu cedo. Disse que tinha uma reunião importante. Algum problema?
- Não, mãe. À noite eu converso com ele. Tchau.
- Andréia, coloque o cinto de segurança.
- Mãe, meu nome é Clair.
- Certo, Andréia "Clair", coloque o cinto.
- Mãe, hoje vou treinar um movimento novo. É muito legal.
- Vou ficar na arquibancada torcendo por você.
Regina estacionou o carro em frente ao clube. Ela admirava a determinação de sua filhinha que, aos 4 anos de idade, já era tão dedicada ao esporte. Ela amava a patinação.
Foram direto para o vestuário feminino. Lá encontraram outras mães e suas pequenas patinadoras. Havia uma efervescência no ar, um alarido de vozes, todas falando ao mesmo tempo.
Após deixar Andréia com a treinadora, Regina e outras mães se encaminharam para as arquibancadas, local oficial das tietes de plantão. Ali o papo rolava solto, sendo os filhos os assuntos preferidos.
Regina observava Andréia fazer as manobras. Ela era realmente obstinada e perfeccionista. Tinha perfil de campeã. A treinadora ensinava o novo movimento. Andréia parecia não ter dificuldade em realizá-lo, porém, ela forçou mais o corpo, se desequilibrou e caiu, torcendo o pé direito. Seu grito de dor ecoou pelo ginásio.
- Andréia! - Gritou Regina e correu em direção da filha.
A treinadora mostrava-se preocupada e Andréia continuava gritando de dor. Regina pegou a filha no colo e saiu correndo em direção ao estacionamento.
No carro, seguiram em direção ao local aonde seu pai trabalhava. Walter Smith era advogado e um dos sócios de um hospital particular da cidade. Vinte minutos depois, Regina entrou na emergência carregando Andréia. Todos as reconheceram de imediato e se apressaram para atender a menina.
Luísa, assistente e amiga de Regina, avisou que o médico a quem assessorava estava disponível para atendê-las e as encaminhou ao consultório do Dr. Roberto Toledo.
Regina entrou na sala do médico com Andréia ainda aos prantos.
- Bom dia! O que aconteceu? Coloque a criança aqui na maca.
- Bom dia, Doutor. Ela torceu o pé enquanto treinava patinação.
Enquanto tentava acalmar a menina e examinar seu pé, Roberto fitou os olhos azuis de Regina. Ambos se sentiram entorpecidos por um segundo, com uma sensação estranha e inexplicável. Roberto foi o primeiro a se recuperar.
- Parece ser apenas uma torção. Vou pedir um Raio-X de emergência para completar o diagnóstico. Mocinha, aguente mais um pouco e já faremos essa dor passar.
Regina sentiu um calor intenso no rosto e foi incapaz de articular uma palavra. Não tinha coragem de encarar o médico novamente. Que coisa mais estranha e constrangedora. Ela saiu do consultório com Andréia no colo, seguindo o médico em direção ao setor de Raio-X. Andréia continuava chorando de dor e gritou quando o técnico tentou ajeitar seu pé para o exame.
- Deixa eu lhe ajudar com isso Luiz, afirmou Roberto ao funcionário, enquanto conversava com Andréia na tentativa de distraí-la.
- Então, Andréia, você sabe patinar bem?
- Meu nome é Clair, respondeu a criança.
Roberto ficou confuso e checou o nome escrito na ficha que estava em suas mãos. Regina ficou vermelha e deu uma explicação.
- O nome dela é Andréia, sim. Ela inventou um nome artístico e acaba criando esses embaraços.
Regina saiu da sala de exames e pediu para avisarem seu pai que ela estava no hospital. O exame foi rápido e Andréia deixou o local em uma cadeira de rodas. Roberto a conduziu à sala de gesso. Regina os seguiu. A situação parecia cada vez mais constrangedora.
- Foi só uma torção mesmo, mas teremos que engessar. Serão pelo menos três semanas com o pé imobilizado, explicou o médico.
- Não vou poder patinar?
- Vai ter que descansar da patinação por algumas semanas, se quiser voltar a praticar esse esporte, Andréia.
- Já disse que meu nome é Clair! respondeu a menina amuada com a informação.
- Andréia, pare com essa bobagem. Você está sendo grosseira, Regina a repreendeu.
Nesse momento, a porta da sala se abriu e o pai de Regina entrou, chamando a atenção dos três, que se viraram em direção a ele. Walter Smith parou e olhou para eles estupefato. Ficou pálido ao vê-los juntos e a cena lhe trouxe memórias de outro lugar.
- Pai, o senhor está sentindo algo? A Andréia está bem, não precisa ficar nervoso. Regina chegou junto ao pai e tocou seu braço.
Walter se recuperou e esboçou um meio sorriso.
- Dando susto no vovô, sua danadinha. Qual foi a peripécia desta vez?
- Só uma torção no pé direito, informou Roberto. Vai ter descanso forçado. Não sabia que era sua neta. Não me atentei ao sobrenome.
- Bem, agora já conhece quase toda minha família. Minha filha Regina Smith e minha neta Andréia Smith, que gosta de ser chamada de Clair.
- Pai! - Regina o censurou.
- O Dr. Roberto faz parte do quadro de especialistas do hospital há alguns meses, informou Walter a Regina. Tem um currículo incrível. Minha netinha não poderia estar em melhores mãos.
- Agradeço seus elogios, Dr. Walter.
- Bem, mocinha, você vai prometer não colocar esse pezinho no chão pelas próximas semanas. Pode bancar o Saci Pererê, brincou Roberto, de forma carinhosa, com Andréia. Depois se dirigiu a Regina e lhe entregou uma receita de analgésico, caso se fizesse necessário.
- Obrigada, Dr. Roberto. Ela terá que retornar aqui?
- Sim, quero vê-la semana que vem, na próxima quinta-feira, respondeu Roberto, e estendeu a mão para se despedir.
Ao suas mãos se tocarem, ambos sentiram um estremecimento. Regina puxou sua mão como se tivesse levado um choque e ficou vermelha. Esse detalhe não passou desapercebido por seu pai.
Walter saiu da sala de gesso com a neta nos braços, acompanhado da filha, deixando Roberto ainda sob o forte impacto que o contato com Regina lhe causou. Ele balançou a cabeça para afastar a sensação e se encaminhou para o seu consultório, onde havia pacientes a sua espera.
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