Capítulo 43 - Fugitivo
Chegamos na estação dentro do tempo previsto. Alex, na verdade, dizia que havíamos chegado 2 minutos mais cedo. A estação, ele continuou dizendo, enquanto levantávamos e nos encaminhávamos para saída do trem, não é perto de nada da cidade, mas tem conexão com quatro linhas de metrô.
― Onde você quer ir? – ele perguntou, enquanto caminhávamos pelos túneis, em direção ao metrô.
― Não sei... Na torre Eiffel? – Ponderei.
― Nossa, Katerine, quanta criatividade...
― Aonde devemos ir, então, Alexander? Deixarei você ser o guia – respondi, fazendo careta.
― Até porque você não faz mesmo ideia de onde iria, não é mesmo? – ele espetou.
Preferia quando ele estava usando os óculos escuros, mesmo que ele parecesse ridículo. Seus olhares não eram justos. Tenho certeza que não existe um ser humano no mundo que não se sentisse pressionado por eles. Eu ainda estava aprendendo a desvendá-los.
― Você não acha que pode ser reconhecido sem os óculos escuros? – Questionei.
― Acho que não, Katerine. Sei que você não é minha fã, mas a People disse que Paris é a capital mundial onde eu tenho menos fama – ele deu de ombros.
― Ora, existe no mundo um lugar onde Alex Rodder não tem fãs? – Ironizei.
― Aparentemente sim – ele respondeu, dando um sorriso. – Uma cidade de Katerines.
― Deve ser uma cidade incrível, então – brinquei.
― Concordo – ele respondeu, olhando para o outro lado. - Seu ticket de retorno é que horas?
― Provavelmente no mesmo horário do seu – eu respondi.
― Eu não comprei meu ticket de retorno – ele disse. – Não consegui descobrir o horário do seu.
― Não está tarde demais para fazer turismo? – Eu questionei. Já eram quase oito e meia da noite. Não imaginaria que alguma atração turística ainda estaria aberta.
― Vou te levar para onde eu quiser, então – Alex ponderou, me puxando pela mão na direção de uma das linhas.
― Espero que supra minhas expectativas – brinquei novamente.
― Eu também – ele concordou, distraído em olhar as placas.
Nós pegamos o metrô rapidamente, após comprarmos os bilhetes nas máquinas automáticas. Em certa estação, trocamos de linha. Alexander parecia entretido, fazendo buscas em seu celular, sem me dar nenhum tipo de informação.
― Para onde estamos indo? – Eu questionei, quando entramos na outra linha do metrô.
― Sairemos na estação Trocadéro – ele apontou o mapa.
― E o que vai ter lá? – Questionei.
― A torre Eiffel – ele respondeu.
― Não tem graça, Alexander – eu revirei os olhos.
― Não é uma piada – ele brincou de volta.
Não era uma piada.
A torre era tão grande que provavelmente dava mesmo para ver de Paris toda. Suas luzes brilhavam tanto que eu pisquei, tentando ajustar minha visão.
― Tcharãn – Alex disse, abrindo os braços para me indicar a Torre, quando terminamos de subir as escadas da estação.
Eu não disse nada. Não tinha condições de dizer nada. Estávamos em um imenso jardim, que eu não conseguia ver o fim – nem para frente, nem para os lados, muito menos para trás. A torre estava na nossa frente – enorme e brilhante. Dava até vontade de chorar de emoção.
Eu nunca fui muito entusiasta da França, de Paris ou da torre, em si. Só que estar lá trazia um sentimento diferenciado.
― Essa é a Praça do Trocadeiro, Katerine. É a melhor vista da torre de toda Paris – Alex comentou, se aproximando novamente.
Estar lá com Alexander trazia um sentimento ainda mais diferenciado.
― Obrigada – eu disse, tocando seu ombro.
― Pelo que? – Ele perguntou.
― Por me trazer aqui – eu respondi.
― Você disse que queria vir na torre Eiffel – ele deu de ombros, um pouco encabulado.
Nós andamos pelos jardins, um pouco sem rumo, na direção da torre. Eu ainda me sentia incapaz de dizer muita coisa, mas Alex preenchia o silêncio com todo tipo de informação que considerava relevante sobre o local e sobre o monumento brilhoso em nossa frente. Algum tempo depois, eu sabia que os jardins onde estávamos tinha mais de 90 mil metros quadrados (isso ele procurou no google, pelo celular) e que abrigavam até um Palácio. O parque se findava na altura do Rio Sena, conforme o Google Maps e fomos caminhando até lá.
― E sobre a torre, Alexander, o que diz o Google? – Eu perguntei deslumbrada.
― Não preciso procurar no Google sobre a torre, sei tudo que você quer saber – ele respondeu, dando um sorriso.
― Então fala!
― Ela foi construída por um rapaz chamado Jacqs para uma menina com sobrenome Eiffel. Era para ser uma construção temporária, para a Exposição Mundial de Paris. Jacqs pretendia pedir Eiffel em casamento no topo da torre, no dia de sua inauguração. However, durante a construção ele sofreu um acidente e ele caiu lá de cima, sem que Eiffel sequer soubesse do seu amor – ele disse, apontando para torre. – Foi mais ou menos daquela altura ali que ele caiu.
Eu parei de andar, chocada com a história. As lágrimas que estavam contidas brotaram no cantinho dos meus olhos. Que história horrenda! Se essa era a verdade por traz da torre, por que as pessoas ainda a visitavam? Uma tragédia! Será que Eiffel soube do amor de Jacqs por ela, no fim da história? Por que a torre se chama Eiffel? Deveria se chamar JACQS! Afinal, foi ele quem morreu na construção. Quem será que terminou de construir?
Eu só percebi que tinha dito tudo isso em voz alta quando Alexander começou a rir. O som da gargalhada dele se propagou pelos jardins, assustando casais e turistas que estavam sentados pela grama, fazendo piquenique e conversando sobre a vida. Por sorte ele não era muito famoso em Paris, porque rindo daquela forma era óbvio que todos o reconheceriam.
― Do que você está rindo? – Perguntei, um pouco irritada com sua falta de sensibilidade com Jacqs.
Ele tentou parar de rir, mas não conseguiu. Desembestou em gargalhar novamente. Eu olhei para aquela cena, ciente de que havia sido feita de palhaça.
― Você inventou essa história, Alexander? – Perguntei, metade irritada e a outra metade tentando conter minha própria gargalhada.
― Desculpa, Katerine – ele pediu, limpando as lágrimas dos olhos. – Eu sei que não deveria, mas é que você estava tão deslumbrada.
― Alguma parte da história é verdade? – Questionei.
― Só a parte da construção temporária, feita para a Exposição Mundial de Paris – ele assumiu.
― Foi Jacqs que fez? – Perguntei.
― Não, eu inventei Jacqs – ele deu um pequeno sorrisinho. – O nome do construtor é Eiffel mesmo. O casal que eu contei não existiu.
― Eu deveria adicionar isso a minha lista de motivos pelos quais eu estou com raiva de você, inclusive – eu disse.
― Tem uma lista?
― Claro.
― Posso ver? – Ele pediu.
― Claro, é só entrar na minha cabeça – eu zoei. – É uma lista mental.
― Adoraria saber o que se passa na sua cabeça.
Silêncio. Eu sentei na grama, sentindo meu corpo ligeiramente moído. Afinal, a noite tinha sido longa e diferente, era comum que eu estivesse um pouco cansada. Alex continuou caminhando em volta de mim, com as mãos nos bolos e ombros encolhidos, por conta do frio.
― Sabe que originalmente ela foi super mal recebida? – Ele disse, olhando para torre. – Os artistas locais diziam que ela tornaria a cidade feia e arruinaria as já existentes artes parisienses.
― E por que ela ficou aí, então? – Questionei.
― Porque a população gostou dela – ele respondeu, dando de ombros.
― Aclamada pelo público, detestada pela crítica – eu comentei.
― Story of my life – ele disse, tão baixo que acho que não era para eu ter ouvido.
Silêncio.
Quanto mais eu convivia com Alexander, menos nossos momentos de silêncio eram constrangedores. Muito menos em Paris, com o ligeiro burburinho dos grupos próximos, o barulho dos barcos no Sena, buzinas de bicicleta e toda agitação, mesmo em uma noite pacata na Cidade do Amor. Eu olhei para Alexander. Acho que, no final, era no silêncio que eu conseguia ouvi-lo melhor. No silêncio era mais fácil interpretar seus gestos e olhares. Naquela noite eles diziam que havia muito mais dentro dele do que ele deixava transparecer. Até para mim.
― Vamos andando? Precisamos atravessar o rio para o outro lado, se você quer ver a torre de perto – ele pontuou.
― Ai, eu estou moída – disse, me jogando no chão. Minhas costas agradeceram quando se esticaram na grama. – Nós vamos poder subir nela?
― Acho que não conseguimos mais ingressos para subir agora – ele ponderou, mexendo no celular. – Mas talvez para amanhã. Sim, para amanhã é possível. Compro? – ele perguntou. Nem esperou eu responder. – Pronto, comprei.
Eu pensei em reclamar e perguntar quanto foi. Juro que as palavras vieram na ponta da minha língua, mas eu desisti no último segundo. Era um pouco hipócrita reclamar do valor de um ingresso quando eu estava sendo claramente bancada por Alexander desde o meu acidente. Não que eu esteja satisfeita com essa situação. Não acho justo. Porém, não é como se eu tivesse condições de ficar em Londres por tanto tempo por conta própria também.
― Esse corpo moído só pode ser ressaca – Alex riu, em pé na minha frente.
― Eu não bebi ontem, Alexander – eu respondi, dando um pequeno sorriso.
― Achei que tinha bebido – ele disse, sentando-se no chão.
― Quem estava bêbado era você, Alex – respondi. Eu não tinha certeza se isso era ou não verdade, mas não tinha sentido gosto de álcool, quando nos beijamos.
― Eu não, Katerine – ele respondeu, esticando-se ao meu lado.
Apoiou-se no cotovelo, para me olhar de cima. Eu contive o ímpeto de arrumar meu cabelo, mas resolvi que não havia muito o que ser feito: ele estava todo espalhado pela grama, provavelmente angariando formigas.
― Nenhum de nós, então – Alex disse, escorregando um pouco seu cotovelo pela grama e se aproximando mais ainda de mim.
Pronto, era um daqueles momentos.
Um daqueles momentos em que eu não podia fazer nada, além de questionar se essa era realmente minha vida. Como podia ser minha vida, com um garoto tão bonito olhando dessa forma para mim, com as luzes da torre Eiffel ao fundo?
― Que bom, Alex – eu angariei forças para dizer. – Porque eu detesto quando me beijam só quando estão bêbados.
Alexander se sentou abruptamente, como se de uma hora para outra eu tivesse virado novamente um unicórnio radioativo. Ele ficou olhando para torre, como se estivesse se controlando para não gritar.
― Alex? – Chamei, sentando-se ao lado dele.
― Caio? – Ele perguntou, entre dentes, sem me encarar.
Eu assenti, em silêncio.
― Você é a maior corta-clima, hein Katerine – ele disse, voltando o rosto para mim.
― Sou? – Perguntei, me aproximando um pouquinho. – Porque eu acho que ainda tem bastante clima aqui.
― Tem? – Alex deu um pequeno sorriso, inclinando o rosto na minha direção.
― Acho que sim, vem ver de mais perto – brinquei.
― Nossa, não é que você está certa? – ele riu, antes de me beijar.
Fomos jantar em um restaurante que tinha vista para a torre. Era incrível, mas eu não cansava de admirá-la. Da mesma forma que não cansava de admirar Alexander. O restaurante era caro, mas Alex insistiu tanto que eu acabei aceitando. Os nossos momentos pós-beijo ainda eram algo que eu ainda não sabia como lidar, e muito menos Alexander. Quando nos levantamos da grama, estávamos ambos sem jeito e sem saber qual era a melhor forma de lidar com a situação. Caminhamos em silêncio quase o tempo todo, distantes e pensativos.
Durante o jantar, conversamos sobre amenidades. O tempo frio (muito frio mesmo), se em Paris neva (sim) e quais são os pratos típicos da cidade (quero experimentar todos). Em nenhum momento mencionamos o que acontecera pouco antes, na grama parisiense, quando a mão dele se enfiou no meu cabelo, como se ele estivesse até hoje querendo arrancar os grampos dele. Muito menos entramos no mérito da minha própria mão, que caminhou para barra de sua camisa antes que pudesse sequer perceber. Talvez tivéssemos ficado ali para sempre. Talvez eu amasse, inclusive. Porém, ficamos assustados com gritos histéricos próximos. Não eram para Alex, porém. Eram para uma revista feminina, no meio de um grupo de amigas adolescentes.
Espera, talvez fossem para Alex, no fim das contas.
Eu já tinha um hotel reservado – uma das únicas coisas que eu fiz antes de sair para Paris só com uma mochila nas costas. Era um hotel barato e um pouco distante, mas parecia agradável. Alex nem sequer sugeriu que eu mudasse. Simplesmente descobriu como chegar lá, pelo celular e começamos o caminho, depois do jantar. Por volta de 30 minutos depois, estávamos saindo na estação de metrô próxima do hotel.
Eu precisava avisar para Alexander que o quarto que eu havia reservado era para só uma pessoa, mas não sabia se isso seria mal interpretado. Talvez ele não estivesse nem sequer cogitando dormir no mesmo quarto que eu, depois do fiasco da noite anterior.
― O hotel é ali – Alex apontou para o prédio, do outro lado da rua. – Vou esperar 10 minutos aqui para você fazer o check-in e depois entro para pedir um quarto.
― Você não disse que não era famoso aqui? – Preocupei-me.
― Ainda que seja uma cidade de Katerines, é sempre bom evitar problemas – ele respondeu. – Nos encontramos depois.
Depois demorou muito. Alex não apareceu. Eu tive tempo de fazer check in, tomar banho, averiguar o que havia na minha mochila e descobrir que eu não tinha levado um pijama. Enfiei-me em uma camisa minimamente confortável, coloquei roupas íntimas e me enrolei no edredom. Era uma noite fria, sem dúvida. Esperei Alex bater na porta, ou dar qualquer sinal de vida – ainda que por celular. Nada. Meu celular já estava carregando na tomada, mas só apontava ligações e mensagens da minha família e de Mari.
Levantei da cama, um pouco preocupada, ainda enrolada no edredom. Andei na direção das enormes janelas, que iam do chão até o teto. Abri as cortinas. Descobri que não eram simples janelas, mas sim portas de vidro. Abri-as. O vento frio quase congelou meus ossos, mas eu me arrumei no edredom e segui em frente. A vista, apesar de não ser para torre Eiffel, era muito bonita.
― Oi – alguém disse.
Eu pulei com o susto. Alex estava sentado no terraço, que aparentemente conectava todos os quartos. Ele estava vestindo só uma calça de moletom, também enrolado no edredom.
― O que você está fazendo aqui? – Juntei forças para dizê-lo.
― Ora, eu reservei o quarto – ele deu de ombros.
― E por que não me procurou, Alex? – Eu reclamei.
― Não sabia o número do seu quarto e não quis perguntar na recepção – ele olhou na minha direção, meio desolado. – E meu celular acabou a bateria. Não trouxe o carregador.
― Fico surpresa que você tenha trazido qualquer coisa, Alexander – eu brinquei, sentando-se ao seu lado.
― Esqueci a maior parte.
― Você pode usar meu carregador – eu disse.
― Obrigada, Katerine.
― Por nada, Alexander – dobrei as pernas, me encolhendo ainda mais para evitar o frio. – No que estava aí pensando, na minha ausência?
― Sabe, Katerine... – Ele olhou na minha direção, desolado. – Eu acho que também estou fugindo.
Virei-me na cadeira, para encará-lo, ao invés da paisagem. Virei a cabeça para o lado, tentando entender o que ele queria dizer.
― Eu não estou fugindo – disse.
― Está – ele apontou o dedo na minha direção. – Mas vamos voltar nesse assunto depois.
― Por que você está fugindo, Alexander? – Eu perguntei, querendo desviar o assunto novamente.
― Do que não seria uma pergunta melhor?
― Do que você está fugindo, Alexander? – repeti, com a correção.
― Primeiro da Sara – ele respondeu.
― Mas por quê?
― Porque ela quer me obrigar a fazer coisas que eu não quero, entende? – Ele assumiu.
― Como o quê?
― Não aguento mais ela dando palpite na minha vida e carreira. Ela é a melhor agente do mercado, mas eu me sinto profundamente unhappy – ele suspirou.
― Já pensou que ela pode ser a melhor a gente do mercado, mas a pior a gente para você? O mercado não é feito de pessoas iguais. Não é um mundo de Alexanders – eu ri.
― Não. E, se fosse, seria um mundo de Alex Rodders e não Alexanders – ele comentou.
― Alexander, vocês são a mesma pessoa – eu escorreguei meu braço para fora do edredom e toquei sua mão.
― Eu sei – ele mexeu na mão, para cobrir a minha. – Só que às vezes parece que não.
Ficamos na sacada mais um tempo, conversando sobre outros assuntos, a maior parte deles puxados por Alex. Eu só reparei que estava caindo de sono quando Alex riu, dizendo que eu estava quase dormindo sentada.
― Não estou cansada – eu menti, para ficar mais um pouco.
― Você está exausta.
― Seu quarto é com cama de casal? – me ouvi perguntar, o que só PODIA significar que eu estava realmente caindo de sono e grogue por ele.
― Vai dormir, Katerine – Alex deu uma gargalhada. – O dia vai começar cedo amanhã.
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OLÁ!!!!! Capítulo fora de hora para compensar meus sumiços!!!
Quero lembrá-los que estou na Bienal de Minas até DOMINGO, 14h. Passem para me ver, que nem a Carol e a Isabella passaram!!!!!!! Agradeçam à elas pelo capítulo: juntei minhas forças para escrever, porque prometi pras duas.
Espero que vocês estejam gostando dessa França. E preparem os corações para o próximo capítulo... Se Deus quiser ele vem antes de terça.
Beijos e obrigada!
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