Capítulo 32 - Um presente inesperado
Acordei com alguém batendo na porta. Novamente aquela sensação estranha, de não entender exatamente onde eu estava me acometeu. Passou quando eu gritei entra e David entrou correndo no quarto, sorrindo de orelha a orelha.
— O Papai Noel deixou mais presentes, não falei que ele ia deixar? – ele disse, parando na beira da minha cama.
— Jura? Oba! Vai indo lá que eu te encontro lá! – Respondi, dando um sorriso de volta.
Eu comecei a me levantar e ele saiu em disparada, sem nem olhar para trás.
— Eu falei que ele ia madrugar – Alex disse. Só então reparei que ele estava parado na porta. – Mas na verdade já são quase 10 horas, então ele não madrugou realmente.
Minha primeira reação foi cobrir meu rosto. Provavelmente eu estava com a cara amassada, cabelo bagunçado e, ai, meu Deus, e se eu estivesse com baba seca colada no rosto?
— Não tem problema – eu respondi. – Já encontro vocês lá.
— Ok – ele respondeu, dando um passo para trás. – Ah, Katerine?
— Sim? – Perguntei, ainda tampando o rosto.
— Espero não ter sido inconveniente ontem à noite.
Eu esqueci de tampar o rosto, tamanha surpresa. Achei que o protocolo da manhã seria não citar o que aconteceu na noite anterior.
— Qual parte, a de me carregar escada abaixo?
— Espero que seja uma piada – ele disse, encostando-se no batente. – Essa também.
— Qual outra parte? A de você ter dito duzentas vezes que precisa me contar uma coisa e, no final, não contar nada?
— Essa – ele respondeu, encolhendo os ombros.
— É um pouco inconveniente que você não tenha contado até agora – eu respondi, virando de costas. – Agora, com licença, eu preciso me arrumar para encontrar seu irmão.
— Tudo bem – ele respondeu, dando mais um passo para trás. – Até já.
— Até, Alexander.
Eu esperei até ele fechar a porta para tirar o pijama. Claro que eu não tinha trazido outra roupa, então fui obrigada a me enfiar no vestido que vestia ontem novamente. Fiz tudo lentamente, já que estava sozinha, com meia perna e meio braço sendo totalmente inúteis. Pior, sendo pesados. Eu devo ter demorado muito mesmo, porque alguém bateu na porta de novo. Eu abri.
— Você está demorando muito! – Era David, reclamando com uma voz fofinha. – Eu estou muito curioso!
— Já estou pronta! – Eu ri. – Vamos?
— Por favor! – Ele agarrou minha mão boa e me puxou para fora.
Eu fiz o possível para acompanhar seus passos. Suas pernas eram pequenas, o que facilitava bastante, mas eu ainda era mais lenta por causa do gesso.
— David, vai machucar a Kate assim – Alex disse, quando nos viu chegar. – Ela não consegue andar tão rápido com a perna quebrada.
— Ah! – David pareceu horrorizado com a possibilidade de ter me machucado. – I'm sorry, Kate, machucou?
— Não – eu sorri. – Está tudo bem.
Mesmo assim, ele me ajudou a sentar no sofá (ou tentou), buscou almofadas e puxou o puff para eu apoiar a perna. Eu agradeci um milhão de vezes e Alex ficou rindo.
— Tudo pronto? – Carol entrou no recinto, segurando uma bandeja de biscoitos natalinos. – Ué, cadê os outros convidados?
— Aqui estamos – Igor disse. Mariana vinha logo atrás, segurando os presentes que compramos para Alex no dia anterior.
— Acho que o Papai Noel se confundiu e deixou presentes lá no meu quarto por engano! – Mariana disse. Eu pisquei para ela.
— Coloca ali – David apontou para árvore.
Mariana fez conforme o pequeno mandou e depois sentou do meu lado.
— Feliz Natal, Kate – ela disse, me dando um abraço.
— Feliz Natal, Mari – eu respondi, tentando retribuir o abraço mesmo com o braço avariado.
— Falta a Sophie e o papai – David reclamou.
— Eles já estão vindo – Carol respondeu. – Mandei seu pai ir acordar sua irmã.
— Ih, então vai demorar – Alex cruzou as pernas. Igor, que estava sentado do lado dele no outro sofá, acompanhou o movimento com os olhos. – É sempre um caos tirar Sophie da cama.
— É sempre um caos tirar Kate também! Como vocês conseguiram? – Mariana perguntou, dando uma risada.
— Não foi tão difícil – Alex respondeu, sorrindo para mim.
— O mérito é de David, não seu – eu ri.
Eu sabia que Mariana queria me puxar para o canto e pedir explicações, mas nem sequer havia explicações para serem dadas. O mérito era mesmo de David, eu nem sabia que Alex estava no quarto!
— Aí estão eles – Carol disse em inglês.
Nós todos olhamos e avistamos Steve se aproximando com Sophie. Ele estava sorrindo e desejando Merry Christmas. Ela parecia estar desejando morrer. Ou, pior, matar alguém. No caso, eu, Mariana e Igor. Provavelmente mais eu mesmo.
— Podemos começar, então? – David perguntou, já chacoalhando uma caixa que tinha seu nome.
— Sim, David – Carol riu.
E assim começamos.
Eu me senti um pouco estranha. Era íntimo demais participar da troca de presentes de uma família que não era a minha ou de um amigo próximo. Pior, era a família de um astro de cinema mundialmente famoso. Eu sentia como se estivesse invadindo um espaço que não é meu. Não era para eu estar ali...
Mas muitas vezes eu esquecia que Alex era um astro de cinema mundialmente famoso.
Ali, sentado no sofá, com aquele sorriso genuíno no rosto, ele só parecia um garoto.
Um garoto muito bonito, claro.
Mas só um garoto.
Um garoto que gostava de Star Wars, amava a família e tinha preocupação exagerada com os horários dos remédios.
Mas era o mesmo garoto que arrastava uma horda de fãs para todo lugar que ia.
O que eu estava fazendo nessa casa, sinceramente? Isso estava errado.
— Katerine?
— Oi – eu respondi, saindo do transe.
— Achei que você tinha dormido em pé! – Mariana reclamou. – Ela faz isso às vezes. Nas aulas, então...
— Katerine – Alex chamou de novo. – Seu presente.
— Eu ganho um presente? – Perguntei, chocada.
— Ora, eu ganhei – Mariana respondeu, esticando uma blusa na minha cara.
— Eu também – Igor respondeu, mostrando óculos escuros novos.
— Ah! – Foi tudo que consegui dizer. – Obrigada.
— Espero que você goste – ele disse.
— Vou gostar – eu respondi, mesmo antes de abrir.
Eu abri a caixa com um pouco de medo. Independentemente do que fosse, precisava me lembrar de sorrir e agradecer. Mas a questão é que era tão bonito que eu acho que talvez tenha soltado um gritinho de emoção.
— Como você sabe que eu gosto de hq?
— Você estava vestindo uma camisa do Homem Aranha naquele dia que fui no hotel – ele disse. – Quer dizer, em um dos dias que eu fui no hotel.
Eu levantei o vestido na minha frente. Ele era realmente muito bonito! Frente única, com a cintura marcada do jeito que eu gosto e com a estampa de vários recortes de hq, de diferentes super-heróis – inclusive o Homem Aranha.
— Pensei que talvez você pudesse usar no Ano Novo – ele disse, dando de ombros. – Quer dizer, não sei o que vocês vão fazer na data, mas é só uma ideia.
— Não dá – Sophie entrou na conversa. – Claro que você foi fotografado nessa loja. Agora o mundo inteiro quer descobrir quem é a garota sortuda que vai ganhar o vestido que Alex Rodder comprou.
— Ah – ele murchou o sorriso.
— Tudo bem – eu tentei consolá-lo, me esticando até o outro sofá para tentar tocar sua mão. Claro que não consegui. – Eu vou usar no Brasil. Ninguém vai pensar que é o mesmo vestido.
— Ah – ele tentou sorrir novamente, mas pareceu mais triste ainda.
— Agora os nossos presentes para você – Mariana disse, agachando-se perto da árvore e puxando três pacotes. – Feliz Natal, Alex!
— Obrigado - ele respondeu.
Mariana se abaixou para dar um abraço e Igor se esticou para abraçá-lo também, logo depois. Alex olhou para mim.
— Não estou exatamente em uma posição muito favorável para abraços – eu me justifiquei, dando um sorriso. – Mas Feliz Natal!
Ele esticou o braço no espaço entre os dois sofás e fez exatamente o que eu tentei fazer antes: tocou minha mão. A diferença é que ele foi bem-sucedido.
— Feliz Natal, Katerine.
— Então, o que é? – Sophie perguntou, revirando os olhos.
Alex puxou a mão rapidamente, esforçando-se para abrir os pacotes o quanto antes. Ele disse muitos obrigados enquanto tirava as camisas do pacote, mas Sophie disse o que todo mundo provavelmente estava pensando:
— Ótimo! Mais camisas! Porque um ator mundialmente conhecido provavelmente tem poucas no closet dele.
— Sophie! Pare de ser malcriada! – Carol interferiu.
— Não, realmente, eu adorei – Alex disse. – Obrigado.
— Vou preparar o almoço. Sophie, você vai me ajudar na cozinha. AGORA – Carol ordenou. – Alex, será que você pode colocar a mesa para mim?
— Claro, mãe – ele respondeu.
— Vocês vão ficar para o almoço, né? – Carol perguntou.
Eu olhei para Igor e Mariana, sem saber o que responder. Eles bateram os ombros, mostrando-se totalmente sem ideias também.
— Claro que vão ficar – Alex respondeu por nós.
Mariana e Igor ajudaram a colocar a mesa. Eu era totalmente inútil, então fiquei sentada no sofá. David carregou todos os seus brinquedos novos até o sofá e me mostrou um por um, entregando-os na minha mão para que eu fizesse uma rigorosa análise. Ele só ficava satisfeito quando eu fazia algum comentário. E um comentário como "legal" ou "adorei" não valia. Precisava ser um comentário completo, tipo "muito legal seu helicóptero de brinquedo por controle remoto. Já pensou como vai ser legal colocar ele para voar quando não estiver um frio de rachar lá fora?". Ele ria. Acho que ele achava engraçado eu achar que estava um frio de rachar lá fora.
— Não está nem nevando! – Ele disse.
— Aqui neva muito?
— Não, só às vezes – ele pareceu triste. – Você devia voltar um dia, quando nevar e você estiver sem gesso, aí a gente pode brincar de fazer anjos na neve.
— Vou adorar – eu dei um sorriso.
Como poderia contar a verdade para ele? Que provavelmente nós nunca nos veríamos novamente?
David tinha recebido muitos brinquedos do Papai Noel, o que só podia significar que ele era uma criança muito especial mesmo. Eu analisei um por um, fazendo comentários engraçados e rindo das ideias dele. Ele pediu para fazer um novo desenho no meu gesso e eu deixei. Ele estava distraído desenhando quando eu percebi que Alex estava nos olhando.
Fiz um gesto de "fazer o quê?" com as mãos e Alex respondeu, mexendo só os lábios e fazendo um coração com as mãos "acho que ele te ama". Eu dei uma risada e respondi, mexendo só os lábios também: "ora, eu sou um amor". Quando o desenho de David ficou pronto ele me explicou que tinha feito nos dois, fazendo anjos na neve.
A comida saiu um pouco depois e nós todos nos reunimos na mesa. Sophie estava um pouco mais tratável do que na noite anterior, mas aposto que era só porque ela tinha ganhado um celular novo, top de linha de Natal do irmão mais velho. Estava sendo menos insuportável comigo e com Mariana e Igor por causa disso. Mariana já estava se sentindo em casa. Ela e Carol já tinham piadas internas, já que Mari foi ajudar na cozinha, junto com Sophie. Igor, por sua vez, ainda tinha uma cara de pânico constante na cara. Era um pouco engraçado. Ele se desinibia às vezes, mas na maior parte do tempo, só ficava olhando para Alex como se estivesse duvidando que tudo aquilo fosse real.
Eu também.
Nós já tínhamos acabado de comer e estávamos conversando sobre histórias constrangedoras da infância de Alex novamente. Parecia ser o tópico de conversa favorito de Carol. Sophie, que já estava começando a ficar intratável novamente, lá pelas tantas empurrou a cadeira para trás e disse:
— Se vocês me dão licença, preciso fazer algumas ligações natalinas –então saiu da sala.
— Vish, eu também preciso ligar para minha família – Mari disse em português sem perceber. Sempre que estávamos na presença do Sr. Rodder nós falávamos em inglês, para que ele se sentisse incluído.
— Vou aproveitar para ligar também – foi Igor, já em inglês novamente.
— Eu vou levar meus presentes novos para o quarto – David comentou, feliz.
— Vou dar uma olhada no escape do carro, ontem estava com problema – Steve disse. – Não sei o que está acontecendo.
— Vou arrumar a louça – Carol disse, catando as coisas da mesa.
Todos ajudaram na tarefa. Todos menos eu, que permaneci sentada e quebrada. E Sophie, que já tinha se mandado há muito tempo. A sala ficou vazia. Cada um foi para um lado resolver seus afazeres.
— Você também precisa ligar para sua família? – Alex perguntou, voltando da cozinha.
— Provavelmente – respondi.
— Precisa ser agora ou pode esperar mais um pouco?
— Pode esperar, mas por quê? – Perguntei.
— Eu preciso falar uma coisa – ele respondeu, me ajudando a levantar.
— Ai, de novo essa história? – Aceitei sua ajuda.
— Você consegue andar um pouco? Queria te levar em um lugar – ele disse.
— Em um lugar tipo, 15 minutos andando ou em um lugar tipo, logo ali do lado?
— Logo ali do lado – ele respondeu com um sorriso. – Se for muito longe, posso te carregar.
— NÃO – respondi, com mais intensidade do que o necessário, provavelmente.
A lembrança dele me carregando escada abaixo na noite anterior retornou com força. A intensidade da negação era necessária. Alexander não era um garoto normal. Alexander era Alex Rodder.
ALEX RODDER.
A voz da Mariana dizendo esse nome ressoou na minha cabeça. Quantas vezes eu ouvi esse nome, meu Deus? Por que, em nenhuma dessas vezes, Mariana disse que ele era assim?
Acho que nem ela sabia.
— Katerine? – Ele chamou e eu percebi que tinha divagado de novo. – Você está bem? Já tomou seus remédios?
Eu soltei uma gargalhada.
— Você é um pouco hipocondríaco, não é? Pode falar a verdade – disse, agarrando-me no braço que ele estendeu.
— Claro que não – ele respondeu, caminhando ao meu lado com passos de formiga. – Eu só tenho muito respeito pelas recomendações médicas.
— Eu tomei meus remédios – eu disse.
— Que bom – ele respondeu. – E você ainda não fez seu monólogo sobre obrigações. Um dia perfeito.
— Eu estou fazendo mentalmente agora que você está me cerceando – eu respondi.
— Ah, então é isso que você está fazendo toda vez que fica parada olhando para o nada! – Ele exclamou.
— Talvez – eu ri.
Era melhor ele pensar que eu estava fazendo monólogos do que ele saber a verdade: que eu estava pensando mesmo era na sensação da sua barriga nua contra meu corpo enquanto ele me carregava pela escada.
Alex abriu as portas de vidro da sala e o vento frio me fez congelar.
— Eu sei que você não está vestida apropriadamente para oito graus, mas eu juro que é uma caminhada curta – ele justificou.
Eu assenti, trincando os dentes para evitar que eles batessem. A verdade é que tinha até um pequeno sol no céu. Bem pequeno mesmo. Ele não esquentava muito, mas acho que foi o suficiente para que eu não congelasse no lugar e não conseguisse andar. De qualquer forma, Alex não estava mentindo: a caminhada era curta.
O único detalhe que ele esqueceu de me informar é que ela envolvia subir uma escadaria talhada na grama.
Eu não precisava nem olhar para ele para ter certeza que ele estava contendo sua vontade de dizer que me carregaria, se eu pedisse. Mas eu não ia pedir. Segurei mais forte em seu braço e subi. Degrau por degrau, mais lenta do que uma avó de 80 anos com bengala. A bengala, no meu caso, era o Alex.
Eu já estava ficando um pouco irritada. Será que ele não podia simplesmente dizer o que queria? Nós precisávamos fazer toda essa peregrinação para sabe lá Deus aonde só para que ele me contasse algo? É o que, na casa dele tem escutas do TMZ? E o que ele tem de tão importante para dizer que as escutas não podem pegar? Depois de todo esse sufoco, eu só esperava que a fofoca valesse a pena!
Eu esqueci toda minha lamúria quando chegamos ao final da escada. Para início de conversa, a vista lá de cima era encantadora. Os pais de Alex claramente moravam em uma região amplamente residencial da cidade e era possível ver uma imensidão de casinhas. Mas o que roubava mesmo a cena era um jardim de inverno lindo. Era uma casinha toda de vidro, com madeira branca fazendo as ligações. O pé direito era alto e ela era super espaçosa, ocupando grande parte do espaço lá em cima. Dentro, várias plantas, uma mesa de jantar com cadeiras e alguns sofás.
— Chegamos – Alex disse. – Lá dentro tem aquecedor, eu prometo. E você pode colocar sua perna para cima.
— Eu estou bem – respondi, caminhando ao lado dele para entrarmos na estufa.
— Aqui é meu lugar preferido da casa – ele disse, abrindo a fechadura. – Na verdade, acho que é meu lugar preferido do mundo.
Por que você está me trazendo no seu lugar preferido do mundo?
— É muito bonito mesmo – não tive coragem de fazer a pergunta.
Ele me ajudou a sentar no sofá que tinha vista para a cidade. Puxou uma cadeira para que eu apoiasse meu gesso, que nessa altura já estava sujo de terra. Por sorte a cadeira era de ferro e não tinha estofado. Então ele fechou a porta, mexeu em alguma coisa e voltou, carregando uma taça de vinho e duas taças.
— Você já foi lá embaixo buscar isso e voltou? – Eu perguntei, horrorizada. – Meu Deus, estou muito mais lerda do que pensava!
— Não – ele riu. – Tem uma mini adega aqui.
— Ah – respondi. Ah. – Eu preciso estar bêbada para você me dizer o que você quer?
— Não, mas talvez eu precise – ele brincou, empurrando a rolha da garrafa já aberta com o dedo.
Eu achei que era brincadeira, pelo menos.
— Espera – ele se refreou com a garrafa pendurada. – Você já tem 18 anos, né?
— Claro que sim – eu respondi. – Mas fico lisonjeada por você achar que não.
Ele riu de novo, colocando o líquido nas taças. A lembrança dele bebendo vinho na ceia me ocorreu. Ah! Então talvez fosse esse o motivo das esquisitices de ontem à noite. A pergunta era: eu estava preparada para mais uma rodada de esquisitices?
— E aí? – Eu esperei ele dar o primeiro gole para perguntar. – Já pode falar?
— Algumas coisas sim – ele respondeu, andando até o sofá com as duas taças.
Sentou-se ao meu lado e estendeu uma para mim. Abriu e fechou a boca algumas vezes e eu fiquei na apreensão para saber o que ele diria.
— Mas não acho justo que eu fale as coisas que eu tenho para dizer e você não fale nada de volta.
— Eu vou comentar o que você disser – eu ri.
— Não, não vale. Você faz uma pergunta. Depois é minha vez.
— Tá bom – eu respondi. Eu só queria saber o que ele queria falar. – Eu primeiro: o que você queria dizer ontem à noite?
— Eu queria dizer duas coisas. Primeiro: não acredito que você sabe que eu gosto de Star Wars. E eu não acredito que você comprou dois presentes. Como você sabia que minha admiração por Star Wars deve ser um segredo?
— Isso são duas perguntas. Primeiro: eu já te expliquei isso. Segundo: eu imaginei que fosse um segredo, ainda que eu não entenda porquê – eu comentei. – Aliás, antigamente você vivia saindo em fotos usando camisas de Star Wars, de Game Of Thrones e até de Pokémon. De uns tempos para trás nunca mais vi.
— Quer dizer que você fica procurando fotos minhas online? – Ele perguntou. Suas bochechas começaram a queimar. As minhas também.
— Não. Quer dizer, a Mariana fica e me mostra todas, mesmo que seja contra minha vontade – eu respondi.
— Então quer dizer que você não quer ver minhas fotos? – Ele brincou.
— Não. Quer dizer, quer parar com isso? – Eu ri. – Por que é que você nunca mais usou essas camisas?
— Eu mudei de agente – ele explicou. – E ela tem sido extra cuidadosa com a minha imagem. Ela acha que esse tipo de camisa e comportamento não condiz com a imagem que eu preciso ter no mercado.
— Você precisa ser uma pessoa chata para estar no mercado? – Eu perguntei.
— Aparentemente sim – ele respondeu.
— Que chato, Alexander. Deve ser horrível.
— Você está sendo sarcástica? – Ele perguntou, com um risinho.
— Não – respondi. – Eu realmente acho que deve ser horrível. Não poder ser você.
— É isso, sabe? – Ele disse, dando um gole na taça. – Você sabia que está no meu maldito contrato com ela que eu não posso usar meus óculos?
— Você usa óculos? – Perguntei.
— Só para ler – ele respondeu.
— Mesmo assim!
— Sim, mesmo assim – ele concordou, amargurado. – Por que mesmo eu estou te contando isso?
— Por causa do vinho? – Eu brinquei.
— Não – ele riu. – Por causa do nosso jogo de perguntas.
— O que me lembra: qual era a segunda coisa que você queria me dizer ontem?
— Ok, isso vai ser difícil – ele se ajeitou no sofá. – Mas como você está com dificuldade de locomoção, acho que você não vai poder sair correndo.
— Nem que eu quisesse – respondi, temendo sua revelação.
Ele respirou fundo e olhou para o horizonte, para a cidade. Era difícil não encará-lo, especialmente quando eu sabia que ele não estava olhando. Provavelmente eu parecia bem assustadora, olhando para ele com uma cara de louca, segurando a taça de vinho como se ela fosse meu motivo para existir.
— Ok, lá vai: desculpe por ter te parado de seguir no instagram. Eu entrei em pânico.
O quê?
— Você não viu? – Alex perguntou e só então eu percebi que tinha dito o quê em voz alta. – Você viu. Até apagou o instagram.
Eu não achava que ele ia levantar esse assunto. Para ser sincera, já tinha até esquecido disso. Parecia que isso tinha acontecido há milênios atrás.
— Você está pedindo desculpa por ter me seguido ou por ter parado de me seguir? – Eu perguntei.
— Er... – ele se enrolou. – Essa não é uma pergunta justa.
— Como você foi parar no meu perfil, para início de conversa? – Essa era uma dúvida que me assombrava.
— Minha agente me passou os seus dados e os de Mariana quando me ligou para avisar que eu encontraria vocês no tapete vermelho – ele disse, vermelho novamente, que nem o tapete. – Só que ela disse que uma das vencedoras não parecia ser minha fã.
Eu me encolhi no sofá, desejando sumir.
— No caso, eu? – Perguntei, lá do fundo.
— No caso, você – ele respondeu, dando uma risada. – Eu fiquei curioso e fui investigar.
— E aí me achou tão incrível que resolveu me seguir? – Brinquei.
— Você é incrível – ele disse, encolhendo os ombros. – Mas, na verdade, eu só cliquei no botão sem querer mesmo.
— Cara de pau – eu ri, dando um tapa no ombro dele com minha mão boa.
— Eu ia fingir que nada tinha acontecido, mas aí eu vi que várias pessoas começaram a te mandar mensagens. Não sei como elas souberam que eu te segui! Então fiquei em pânico e parei de te seguir algumas horas depois...
— Eu percebi. Mas não adiantou, viu? Elas continuaram me seguindo e comentando e perguntando. Tive que deletar o meu instagram mesmo. E trancar o da Mariana sem ela perceber, porque elas também estavam enchendo o saco dela.
— Eu realmente, am very sorry – ele disse, bebericando o vinho de novo. – Espero que você não esteja chateada.
— Por você ser um stalker louco ou por eu ter sido obrigada a deletar o instagram?
— Both? – Ele se sentiu culpado. – Mas eu não sou um stalker louco.
— Não? – Perguntei.
Eu estava brincando, na maior parte. Ele era um pouco stalker, mas quem não era? Era esquisito que dentre todas as pessoas do mundo ele tenha escolhido me stalkear, mas ele não tinha feito nada de ofensivo ou invasivo... Só tinha me seguido sem querer. Novamente, quem nunca?
— Desculpe – ele disse de novo, encolhido.
— Alexander, tudo bem – eu disse, esticando a mão para tocar seu ombro. – Eu não estou chateada.
— Really? Você não sabe como eu estou aliviado – ele disse, segurando minha mão por cima do seu ombro. – Eu queria te dizer isso desde que te vi no hospital, mas eu nunca achava as circunstâncias propicias.
— Só tem uma coisa – eu disse, puxando minha mão com a lembrança. – A Mari não sabe sobre esse acontecimento do instagram. Ela nunca pararia de falar sobre isso. Acho que ela talvez até ficasse com raiva de mim. Você não pode falar para ela, tudo bem?
— Eu não pretendo falar novamente sobre isso. Nunca mais. Uma vez já é constrangedor o bastante – ele respondeu, olhando para o horizonte novamente. Suas bochechas ainda estavam vermelhas. – Mas espera, você realmente não era minha fã?
Eu fiquei vermelha. Depois comecei a ter um ataque de tosse. Logo em seguida, um ataque de risada. Alex começou a gargalhar da minha cara, mas eu não conseguia me controlar. Tive que fechar os olhos e respirar fundo.
— Essa não é uma pergunta justa – eu respondi, abrindo os olhos.
— Mas eu realmente quero saber a resposta – ele disse, vermelho.
Não sabia se ele estava vermelho de rir ou vermelho de vergonha mesmo. Talvez os dois.
— Eu fui obrigada a assistir todos os seus filmes um milhão de vezes. Fui obrigada a ouvir histórias sobre você outro milhão. Era um pouco maçante, entende? A culpa não é sua – eu tentei explicar. – Era só um pouco demais.
Ele fez uma careta, parecendo um pouco chateado. Ficou olhando a taça e girando o vinho dentro dela, como se fosse a coisa mais interessante da face da terra.
— Mas você é bem diferente do que eu imaginava – eu tentei corrigir.
— Sim, mais bonito – ele levantou um lado da boca em um meio sorriso.
— Esse é um assunto que eu não pretendo falar novamente, nunca mais – eu levantei a mão, cortando o assunto, ao lembrar da situação constrangedora no hospital. Ele levantou o outro lado da boca, dando um sorriso completo. – Não é isso, na verdade. Você é diferente mesmo. Não achei que alguém com a sua fama fosse ser tão...
— Humano? – Ele riu, levantando o rosto para me olhar.
— Legal – eu completei.
Ele fitou meus olhos, corando novamente. Era absurdo que Alex Rodder pudesse corar tão constantemente considerando que seu trabalho consistia em, basicamente, não ter vergonha de nada.
— O quê? - Ele se assustou, levantando as mãos para cobrir seu rosto. - Estou vermelho? De novo?
Ai Jesus, eu estava encarando? Assenti sem graça, torcendo para que eu mesma não estivesse começando a rosar novamente.
— Como, Alexander? - Perguntei. - Como é possível? Como pode o ator mais bem pago com menos de 25 anos ficar vermelho o tempo todo?
— Você sabe minha posição nessas listas? – Ele pareceu horrorizado.
— Entende agora a história de ser um pouco maçante? – Perguntei.
Ele tomou um gole de sua taça, desviando os olhos para paisagem. Era realmente difícil não o encarar, independentemente de ele estar vermelho ou não. A versão do Alex na vida real era muito melhor do que aquela versão dos filmes que Mariana me fazia assistir. Ele era incrível. Nunca imaginei que ele seria assim. Na verdade, acho que nunca fiz nenhum pré-julgamento sobre Alex Rodder. A única coisa que eu pensava quando eu ouvia seu nome era NÃO, MARI, NÃO, PELO AMOR DE DEUS, DE NOVO NÃO.
E agora eu pensava em tantas outras coisas.
Coisas que eu não deveria estar pensando sobre o número 1 das listas de revistas de mulher.
Talvez fosse melhor ter mantido meu pensamento original.
Mas provavelmente agora era tarde.
— É que, sei lá... – ele começou a explicar, olhando para mim. - Quando eu estou atuando é quase como se não fosse eu mesmo, mas outra pessoa. Quando o diretor grita corta, as luzes apagam e tudo volta ao normal... Minha vergonha retorna. – Ele deu de ombros, desviando o olhar para paisagem de novo. - Acho que é uma questão de saber diferenciar e separar meu trabalho da minha vida... Pessoal.
Ele voltou a me olhar e eu tomei um gole da taça, sem saber o que dizer. Não queria ficar olhando demais para ele. Era uma péssima ideia ficar olhando demais para ele, quando ele tinha olhos daquela cor. Como era humanamente possível alguém ter olhos assim?
— Mas você já fez perguntas demais! É minha vez agora – ele sorriu. – Qual é a sua banda favorita?
— Rooney – eu respondi num solavanco.
— Rooney? – Ele repetiu, inclinando a cabeça como se estivesse tentando lembrar que banda era aquela. – Não é um jogador de futebol?
— Também, mas não – eu ri. - Quase ninguém conhece essa banda, mas eles são ótimos. O vocalista é o protagonista de Diário da Princesa. Quer dizer, ele é o Michael, não a Mia, obviamente. Você deve saber disso, afinal é ator e deve encontrar atores o tempo todo, já deve ter visto a Anne Hathaway – eu respondi, me enrolando. – É uma banda de Los Angeles, que toca um rock num estilo mais antigo assim...
— Você gosta de música, então? – Ele perguntou.
— Claro que sim. Gosto de pensar que vivo a base dela – sorri. – Eu trabalho em uma loja de CDs lá Rio, se chama Prato e Tambor.
— E você sabe tocar alguma coisa? – Ele perguntou, jogando o braço por trás do sofá.
— Sei, bateria – eu respondi, sorridente. – Eu aprendi alguma coisa de guitarra, mas muito pouco.
— É uma rockstar, então? – ele riu.
— Não. Longe de mim – eu respondi, dando uma risada.
— Eu também não sei quase nada de guitarra – Alex disse, para minha surpresa. – Mas sei tocar violão.
— Violão? Ainda dá tempo de praticar entre uma filmagem e outra?
— Às vezes. Eu tento – ele ri. – É só um hobbie.
— É um belo hobbie – eu comentei.
— Qual é o seu? – Ele perguntou.
Você pode culpar o que quiser pela minha resposta: o clima ameno dentro do jardim, a vista lindíssima, o sorriso dele ou seu interesse... A maneira como eu me sentia confortável conversando com ele...
Eu culpo o vinho.
— Escrever músicas.
— Escrever músicas? – Ele se debruçou para ouvir mais de perto. – Tipo, letras de música?
— Sim – eu respondi, tomando um gole enorme do vinho. O que eu estava fazendo? Contando isso para esse garoto! Algo que quase ninguém sabia. – Mas não vamos falar sobre is...
— Mas você faz a melodia também? Ou só a letra? – Ele perguntou. – Posso ver alguma?
— Eu não trouxe nenhuma – respondi.
Não era mentira. Quer dizer, era mais ou menos mentira.
Eu tinha a letra que ganhou o concurso. Ela estava no e-mail da Mariana. Eu só precisava pedir. Mas eu não pediria.
— Nenhuma? – Ele pareceu decepcionado.
— Não – eu respondi. – E isso é segredo, não sei porque estou te contando isso.
— Bem-vinda ao meu mundo – ele levantou a taça, numa espécie de brinde. – Você precisa parar de ser tão incrível. Minha irmã está certa, vai que você vende minhas informações para a mídia?
— Ah sim – eu ri. – Alex Rodder, o grande astro teen, é um geek! E não é só isso: ele gosta de beber vinho e tocar violão nas horas vagas!
— E não é só isso: eu também conserto carros antigos com meu pai – ele riu.
— Claro que conserta, por que não consertaria? – Eu murmurei, imaginando-o coberto de graxa.
— Você está duvidando?
— Claro que não, Alexander. Eu acredito, mas é que não tem graça falar sobre hobbies com você. Você claramente é melhor nisso do que eu.
— Eu não escrevo letras de músicas. Esse é um talento incrível – ele voltou no assunto.
— Já não sei mais de quem é a vez de perguntar – eu cortei.
— Pode ser sua – ele respondeu.
— Não é meio chato viver sua vida sendo perseguido por gente o tempo todo? Paparazzis, fãs histéricas e tudo mais?
— Um pouco. Parte de mim já está acostumada. A outra parte entra em pânico toda vez que vê uma câmera de foto ou uma adolescente – ele riu.
— Eles não vêm aqui? – Eu perguntei. – Os paparazzis, digo.
— Até agora fui bem-sucedido em manter a localização dessa casa em segredo – ele respondeu. – Uma coisa é eu ser exposto a mídia o tempo todo. Outra bem diferente é expor minha família, que não tem nada a ver com isso. Eu sou o único ator da casa. Não quero que os justos paguem pelo pecador.
— O pecador, no caso, você? – Eu ri.
— Sim – ele respondeu. – Quem resolveu seguir essa carreira fui eu.
— Você sempre quis ser ator? – Perguntei.
— Não – ele respondeu. – Na verdade, eu sempre quis ser diretor. Eu comecei a fazer faculdade de direção na UCLA – Universidade da Califórnia, mas então tive que trancar para gravar filmes, séries, programas e todo tipo de coisa. Até hoje não terminei.
— Mas você quer terminar?
— Gostaria – ele respondeu, um pouco amargurado. – Mas precisaria voltar logo. Minha matrícula não pode ficar trancada por mais muito tempo ou serei jubilado.
Eu duvido muito que a UCLA jubilasse Alex Rodder. Aposto que era só uma questão de um telefonema – ou até de um e-mail – para que eles entendessem a situação e estendessem a matrícula pelo tempo que ele precisasse. Gostaria que alguma faculdade fizesse isso por mim. Na verdade, só queria que alguma faculdade me quisesse.
— E você? Deve estar escolhendo sua carreira, não? – Alex perguntou e eu retornei à realidade.
— Sim – eu respondi. – Mas para ser sincera, eu não faço ideia. Já fiz os exames, estou aguardando os resultados para escolher...
— Por que você não faz algo relacionado a música? – Ele perguntou, acreditando que era realmente uma ótima ideia.
— No Brasil, Alexander? – Eu contive uma gargalhada.
— Não precisa ser no Brasil, ué – ele deu de ombros, sem entender minha defesa.
E novamente, culpe o que você quiser.
Eu continuarei culpando o vinho.
— Na verdade, eu fiz os SATS.
Eu quis engolir minha frase no momento que terminei de proferi-la. Queria que as letrinhas se materializassem na minha frente e queria catar uma por uma, antes que elas chegassem até o ouvido do Alex. Conseguia até visualizar essa cena em câmera lenta. Eu, lutando contra o tempo.
Mas essa era a vida real. Não era um filme do Alex.
— Fez? Que fantástico – ele disse, animadamente. – Acho que seria uma oportunidade incrível, não? Talvez você pudesse começar a trabalhar no próprio Estados Unidos, não precisasse nem voltar para o Brasil.
— Talvez – eu respondi, desanimada com minha matraquice.
— O que foi? – Ele percebeu.
— Eu também não contei para os SATs para ninguém. Você precisa parar de extrair essas informações de mim. O que você colocou nesse vinho, soro da verdade? – Eu estiquei a taça na direção dele.
— Você está me dizendo tudo isso por livre e espontânea vontade – ele empurrou a taça de volta. Seus dedos esbarrando nos meus. – Mas fique tranquila, também não vou vender seus segredos para o TMZ.
— Esse segredo você também não pode falar nem para Mariana – eu reforcei.
— E qual é a história de vocês duas? – Ele perguntou, levantando-se para pegar mais vinho. – Amigas desde sempre?
— Sim, desde o útero – eu respondi, esticando minha taça para que ele enchesse novamente. – Nossas mães ficaram grávidas juntas e somos melhores amigas desde então.
— Mesmo com toda matraquice dela sobre mim? – Ele brincou, enchendo as taças sem nem olhar para elas.
— Incrível, não? Sou muito paciente – eu respondi, incomodada com o tanto que ele me olhava. – Ela é praticamente minha irmã.
— Você tem irmãos de verdade? – Ele perguntou, voltando com as taças. – Pelo jeito você pode adotar o David.
— Não tenho, mas adoraria adotar o David – eu ri, pegando a minha.
— E Mariana, tem irmãos? – Ele perguntou, sentando-se novamente ao meu lado.
— Sim – eu tomei um longo gole da taça.
— Pelo jeito é uma história ruim – ele respondeu, observando meu gole.
— Péssima – eu respondi.
— Ex-namorado? – Ele perguntou.
— Ex. Não exatamente namorado – eu respondi.
— Entendo – ele respondeu.
Nós dois tomamos um gole da taça ao mesmo tempo, olhando um para o outro pelo canto do olho.
— Mas existe um ex-namorado? – Ele perguntou de novo.
— Existe – eu respondi. – E ele está namorando a Mariana.
— Não entendi – ele entortou a cabeça. – Deve ser algum problema com o meu português.
— Não, você entendeu. Ele está namorando a Mariana. Meu ex-namorado está namorando minha melhor amiga – eu repeti.
— But... how?
— Eu já expliquei – dei de ombros. – Sou muito paciente.
— Eu não – ele comentou. – Inclusive, se fosse comigo, acho que nunca mais falava com nenhum dos dois.
Se Ryan começasse a namorar Gabriella, você nunca mais falaria com ela e nem com ele?
A pergunta coçou na minha língua, mas eu tomei um gole de vinho para engoli-la. Comecei a pensar que muito tempo já tinha se passado, pois o sol começava a ser por. Tudo bem que o sol ia embora muito cedo no inverno inglês, por volta das quatro da tarde, mas mesmo assim. Alex estava olhando para mim novamente, com um daqueles meio sorrisos de sempre no rosto. Era um pouco aterrorizante pensar dessa forma, mas ele era realmente fantástico. Os últimos raios de sol clareavam ainda mais seus olhos, de forma que era possível ver seus cílios dourados batendo. Dava vontade de tocar nele. Mas eu agarrei mais forte a taça.
— Não é esquisito me ter aqui? – Eu perguntei. – Invadindo sua vida dessa maneira?
— Ah, não – ele jogou a mão sem a taça para cima, num gesto de exaustão. – Estávamos indo tão bem hoje, sem essa história de obrigação.
— Não estou dizendo que você me trouxe aqui obrigado – eu respondi. – Só estou perguntando se a minha presença não te traz estranheza. Não sou sua melhor amiga da infância, uma parente perdida ou outra atriz, como você. Sou uma fã.
— Na verdade, não é – ele corrigiu.
— Sou agora – eu sorri.
— Não Katerine, não é esquisito te ter aqui – ele respondeu.
— Mas esse é seu lugar mais especial do mundo – eu continuei.
— Fico feliz que você esteja aqui – ele confirmou. – Sim, foram circunstancias esquisitas que te trouxeram aqui...
— Tipo me estatelar no meio do tapete vermelho por causa de suas fãs histéricas? – Perguntei.
— Tipo isso – ele riu, apoiando a taça sob uma mesinha com plantas próxima. – Quer dizer, what were the odds... I mean...
— Quais eram as chances – eu corrigi.
— What were the odds da garota que se acidenta na première ser a mesma que eu segui sem querer no instagram? – Ele questionou-se.
Eu depositei a taça em uma mesa com plantas próxima também, puxando meu pé de cima da cadeira para o chão. Ele nem percebeu, continuava me encarando e dizendo:
— What were the odds? Você poderia ser uma garota maluca. Eu não tinha como saber, nem te stalkeando online. Podia ser uma psicopata – ele riu.
— Posso ser ainda, você não sabe – eu ri.
— Não, Katerine. Na verdade, eu sei – ele segurou minha mão boa. – What were the odds...
— Quais eram as chances, Alexander. Quais eram as chances?
— Sabe... – ele começou a dizer algo, inclinando-se um pouco na minha direção.
Eu estava genuinamente curiosa para descobrir o que ele questionava se eu sabia. Porém, outro lado de mim estava absolutamente absorto pela maneira como o rosto dele estava emoldurado pelo pôr-do-sol. Os raios contornavam seus cabelos e os faziam brilhar, deixando-os quase loiros, eu tinha que admitir (mas nunca para Mariana). Seus olhos sempre tinham um brilho próprio, mas eram ainda mais bonitos naquela meia luz.
— Sei – respondi.
— Sabe mesmo? – Ele perguntou, refreando-se por um segundo, supostamente surpreso com minha resposta.
— Uhum – respondi.
Naquele momento ele poderia ter me perguntado qualquer coisa e minha resposta continuaria sendo uhum. Tudo pareceria uma ótima ideia saindo da boca de Alex naquelas circunstancias. Ele era lindo demais, era absurdo. E a parte mais difícil de lidar era que ele também era uma ótima pessoa. Ele também era lindo por dentro. Era inebriante ficar perto assim dele.
— Ah, Katerine – ele disse, dando um pequeno sorriso. Então se aproximou ainda mais, para dizer no meu ouvido. – Eu acho que você não sabe de nada.
Eu provavelmente não sabia de nada na vida mesmo.
Tanto não sabia de nada que eu nunca, nem em um milhão de anos, achava que ele ia fazer o que fez depois de dizer isso. Claro, ele estava se aproximando. Mas eu achei que era para me contar algum segredo. Mais um, pelo jeito.
Nunca, jamais, never, eu ia pensar que o motivo real pelo qual ele estava se aproximando era para me beijar.
Porque é isso que acontece no momento seguinte ao que ele me diz que eu não sei de nada. A última palavra já fez cócegas na minha bochecha por conta da proximidade e, antes que eu conseguisse tentar entender o que estava acontecendo, Alex virou o rosto na minha direção e uniu nossos lábios.
Nem todo choque do mundo, todavia, me impediria de beijá-lo em retorno.
Eu sei que provavelmente eu deveria estar pensando: AI MEU DEUS, EU ESTOU BEIJANDO ALEX RODDER. Mas a verdade era que tudo que eu estava pensando era: hmmmmmmmmmmmmmmmmmmmm.
Meu gesso do braço terminava antes do meu cotovelo, o que me permitiu colocar os braços por trás do seu pescoço, ainda que de uma forma ligeiramente desengonçada. Eu percebi que ele deu uma pequena risada do fato, mas não separou nossos lábios.
O que eu realmente deveria estar pensando era: PÉSSIMA IDEIA, ele é um ator mundialmente famoso, você tá maluca, Katerine? Mas essas ideias nem passavam pela minha cabeça, muito menos quando as mãos de Alex se enfiavam no meu cabelo, acariciando minha nuca e puxando-me ainda mais para perto. Eu não conhecia Alex Rodder, eu só conhecia Alexander.
Não sei quanto tempo se passou até que ouvimos um barulho. Um farfalhar de folhas, como se um grupo de pessoas estivesse caminhando por uma floresta. Alex se separou de mim, já me empurrando para baixo, contra o sofá.
— Fica aí, não se mexe – ele disse, levantando-se em um salto.
Eu observei enquanto ele rodava a casa de vidro, olhando em volta como se estivesse procurando algo. Ou alguém. Então disse:
— Tem alguém vindo. Essa parte da casa dá entrada para uma floresta. De vez em quando aparecem escoteiras perdidas, mas podem ser fãs loucas também. PRECISAMOS descer. Você vai precisar me deixar carregar você no colo.
— Ok – Eu respondi, incerta do que estava acontecendo.
Antes que eu pudesse perguntar qualquer outra coisa, ele já tinha me carregado e estávamos descendo a escada talhada na pedra como se estivéssemos sendo perseguidos por algum tipo de assassino. Nós passamos pelas portas de vidro da sala de estar da casa dele e ele me colocou no chão, fechando-as atrás de si.
A sala de estar continuava vazia.
— Kate – ele disse, passando a mão pelo rosto como se estivesse com raiva ou envergonhado.
— Alex – eu chamei, puxando-o pela mão. – Não precisamos falar sobre isso, eu sei.
— Você precisa parar de achar que sabe tudo, rockstar – ele abriu um sorriso.
Eu abri a boca para responder, mas Mariana escolheu esse momento para aparecer correndo e gritando:
— Ai, meu Deus, onde vocês estavam? Estávamos morrendo de preocupação.
Ops.
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Eu tô ouvindo os gritos DAQUI.
Talvez eu esteja gritando também.
Como avisado no meu perfil, estou postando o capítulo adiantado hoje porque vou viajar e só volto dia 03. Como não tenho certeza se vou ter acesso a internet plena por lá, resolvi adiantar e deixar todo mundo feliz. Mas agora capítulo só dia 05, terça. Segurem esse forninho.
Fiquem a vontade para mandar inbox, comentar, postar no instagram, fazer o que vocês quiserem. E mil perdões se, em algum momento na vida, eu não respondi algo que vocês postaram para mim ou me taggearam. Eu esqueço. Eu vejo, tô na rua/no trabalho/na vida e penso "ai que lindo, vou responder quando chegar em casa". Preciso dizer que quando chego em casa já esqueci? Meta para 2016 vai ser ou responder na hora ou ter uma lista de pessoas que preciso responder, rs.
Enfim, espero que o ano de vocês seja incrível e abençoado. Que seus sonhos se realizem, que meninos/meninas fantásticas roubem seus corações e que possamos viver novos momentos lindos aqui no wattpad. Para mim é muito satisfatório fechar o ano com Tiete! com mais de 110k de leituras e Acampamento beirando 1mi (talvez ele feche 1mi até lá. Só faltam 4k). Eu já disse isso, mas vou dizer de novo: OBRIGADA. Vocês são minha força.
Então até 2016!
Beijos,
Clara
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