Manipulate my decisions
Capítulo inspirado no álbum AM do Arctic Monkeys. Eu espalhei (muito mal espalhado) frases de todas as músicas do álbum, quem conseguir achar mais (comentando na frase o nome da música), ganha um trechinho do próximo capítulo ;)
Espero que todo mundo participe!!!
Qualquer dúvida, estou a disposição.
Observo a cidade adormecida com uma satisfação interior que revigora em meu peito. Não fazia muito tempo que o sol havia surgido e eu já sentia que poderia cair para trás e dormir até que o sol de amanhã nasça, mesmo que meu corpo se engane manifestando uma energia descomunal, sei que preciso descansar.
Assim como o Shawn, que se aproveitou do meu colo para acomodar a cabeça e deixou um pedido implícito para que eu mexesse em seu cabelo, e eu não pude reclamar quando senti seus cachos em meus dedos. O plano era vermos o nascer do sol juntos, mas Shawn estava visivelmente cansado e eu não poderia exigir que ele se mantivesse acordado. Até ponderei em deitar-me sobre seu corpo, mas observá-lo - enquanto meus olhares intercalam entre sua beleza e a beleza da cidade - parecia ser muito mais interessante.
Quando meu namorado me deixou ciente da certeza de seus sentimentos, soltei uma gargalhada alta e nada contida, com direito a barulhos estranhos e tudo. Ele riu comigo e passamos vários e longos minutos abraçados, eu tentando apaziguar a festa que se formou em meu organismo e ele se fazendo de muralha ao meu redor, como sempre faz, refletindo sobre sua própria festa. Acabou que se tornou apenas uma celebração, assim como nos tornamos apenas um coração.
Shawn se remexeu no meu colo e eu imaginei que o chão estivesse começando a incomodar. Eu nem mais sentia minha bunda, mas ele parecia estar confortável demais para que eu pudesse me mover. Ele se vira de barriga para cima e pisca algumas vezes, a fim de se adaptar a claridade. Suas bochechas estão rosadas e ruguinhas adoráveis se aglomeram em volta dos seus olhos, me fazendo tocá-las com a ponta de meus dedos. Dou um beijo em sua testa, assistindo um lindo sorriso iluminar seu rosto, meu dia e a própria Boston, que não precisava de sol nenhum quando tinha o sorriso de Shawn.
- Bom dia, flor do dia - digo sorrindo e ele finalmente me olha. Seus olhos ainda pesam pelo sono e eu temo a bronca que iria levar das pessoas de sua produção por não andar dormindo direito.
- Bom dia - diz coçando os olhos, sua voz reverberando de forma rouca. Shawn se levanta de meu colo e se senta ao meu lado, dando-me um beijo na bochecha cheio de preguiça. Balanço os pés no ar antes de fitá-lo e começar a rir de seu cabelo, que parece uma grande moita de cachos. - Do que está rindo? - pergunta confuso.
- Do seu cabelo - respondo passando a mão por seus fios e Shawn aprecia o breve carinho. - Está adorável.
- Você é adorável - diz dando um sorrisinho, que só aumenta ao ver a ruborização em minhas bochechas.
Nunca sei como lidar com elogios, ainda mais elogios vindos dele.
Shawn sustenta seu sorriso e acaba que um apareça no meu rosto sem nenhuma previsão de saída. Mesmo com sua cara amassada e os cabelos bagunçados, ele não deixava ser incrivelmente bonito, creio que era isso que o deixava tão mais bonito, na verdade. Shawn consegue se destacar em uma multidão mesmo tento tudo para acabar na mesmice, e não falo só da beleza, como do seu talento também. Entendo um pouco mais agora o amor insano que suas fãs sentem por ele e entendo como preciso dividi-lo com todo o mundo.
- O que está pensando? - pergunta.
- Em como eu tenho que dividir você com o resto da população - respondo risonha e logo espero que ele dê uma risada, como o de costume, mas Shawn se mantem sério.
- Talvez eu só queira ser seu - diz e eu sinto toda uma corrente passear pelo meu corpo como o flash, ele não tinha o direito de dizer aquelas coisas em plenas cinco da manhã. Meu corpo não havia criado anticorpos para suas palavras, e nem queria, é extremamente prazeroso sentir seus efeitos em minha pele. - Você é minha?
Palavras certamente não conseguiriam expressar nada do que eu sentia, nem um terço delas, então eu o puxei pela nuca e dei o beijo mais literário que o horário me permitia. Nele, "eu sou sua" se tornou uma frase tão insignificante quanto nós no espaço sideral e, pela sua correspondência imediata, acredito que Shawn tenha entendido sem precisar de explicações ou consultas no dicionário. Porque, querendo ou não, eu sou dele de corpo e alma.
Beijei o canto de sua boca antes de voltar a me sentar normalmente. Ele mantem os dedos que acariciam minha coxa, enquanto eu tento capturar todo o ar que aquele lugar me proporcionava, a fim de que minha respiração se normalizasse.
Sem sucesso.
- Que horas é seu voo? - pergunto quebrando o curto momento que passamos em silêncio.
- Logo após a hora do almoço - responde olhando para a cidade e eu acompanho seu olhar. - O seu é no mesmo horário? - pergunta.
- Não, é um pouco depois - digo dando de ombros, iria ficar zanzando no aeroporto, de qualquer maneira.
- Não quer vir comigo para Los Angeles? - indaga com certa esperança na voz, desvio meu olhar para ele que já me olhava.
- Você sabe que tenho aula durante a semana - murmuro e Shawn me encara como se eu fosse o papai Noel e lhe tivesse negado um presente mesmo quando ele foi um menino tão bom. - Não me olhe assim - reclamo empurrando-lhe levemente pelo ombro.
- Se você tivesse um coração de manteiga, seria tudo mais fácil - resmunga e eu dou uma risada.
- É apenas uma semana - digo tentando tranquilizá-lo, o que não dá muito certo devido os talentos de Shawn em viver como um personagem de novela mexicana.
- Uma semana! - lamenta jogando-se sobre mim, o que me fez rir. - Eu nunca vivi uma sequer semana sem você.
Reviro os olhos.
- Você viveu dezenove anos sem mim, Shawn - retruco afobada pelos seus braços ao meu redor.
- Estou falando desde que te conheci - explica ao se afastar. - Você é muito sem coração.
- Eu me declarei ontem para você e ainda sou chamada de sem coração? - pergunto com o tom de indignação presente em minha voz.
- Se declarou? Você disse que achava que me amava - ironizou. Eu sabia que estávamos brincando, mas não deixei que o incômodo fosse muito longe e o sentimento logo se apossou do meu rosto. Eu só disse que achava por medo do que ele iria falar, não porque ainda tinha duvidas do meu sentimento. - Não fique chateada! - diz passando o braço por meus ombros e eu dou um sorrisinho de "claro que não fiquei chateada", mas sabíamos que era mentira. - Sabe que só estou brincando, eu sei que você me ama.
- Não tenho tanta certeza - resmungo em ironia e Shawn ri, beijando minha têmpora esquerda.
- Ah, eu tenho certeza que amo você, Ellie cabeça vermelha Bamber - diz e eu distanciei-me apenas para encará-lo.
Ellie cabeça vermelha Bamber?
- Eu também tenho certeza que amo você, Shawn Peter Raul Mendes - digo e ele franze o cenho. - O seu nome nem precisa de complemento para ficar engraçado.
- Você é hilária - diz e eu jogo meu cabelo para trás de forma convencida.
Decido levantar e com isso dou início ao trabalho de sacodir toda a terra impregnada na minha bunda, assistindo Shawn fazer o mesmo. Uma ótima ideia surge em minha mente e a ponho em ação indo até ele, começando a ajudá-lo, dando leves tapas em sua bunda, sem nenhuma segunda intenção, mas talvez com terceiras e quartas. - O que está fazendo? - perguntou e eu o olhei como se fosse óbvio.
- Te ajudando - digo escondendo o sorrisinho traiçoeiro que queria tomar meu rosto.
- Então posso te ajudar também? - perguntou se aproximando ainda mais, com um sorriso travesso nos lábios. Shawn colocou as mãos em minha cintura e as escorregou até minha bunda sem desviar o contato visual, deixando tudo um pouco mais intenso. Ele começou a tirar a areia da parte inferior de minha calça, assim como eu havia feito com ele.
De uma hora pra outra ficou meio quente, não é?
- Acho que já deu - digo retirando suas mãos de minhas nádegas, escutando sua risada. - Vamos antes que eu cometa uma loucura.
- Você que começou - se defende.
Isso lembrou a mim o dia que transamos pela primeira vez, quando eu dei início às provocações. Eu deveria começar coisas mais vezes.
Entrelacei minha mão a sua e começamos a refazer o caminho de ontem, mas eu não me sentia tão empolgada quanto na noite anterior, na verdade, não me sentia nada empolgada. Saber que teria que encarar minha mãe mais uma vez depois de tudo que ela me disse, deu liberdade a minha mente em criar todo e qualquer tipo de cenário imaginando como seria e nem nenhum deles se mostrou muito agradável. Shawn percebeu minha agitação, pois passou o braço por meus ombros e depositou um beijo na minha testa.
Mais uma vez as palavras perdendo feio para nossas ações.
Entramos na casa sem tentar fazer nenhum barulho, mesmo que eu soubesse que o gene desengonçado de Shawn não poderia dá-lo o luxo de passar despercebido em canto nenhum. Foi quando minha mãe veio da cozinha e nos observou estancados ao pé da escada, em uma falhada missão de subir sorrateiramente. Suas sobrancelhas se juntaram em confusão, enquanto minha expressão não poderia estar mais morta.
Não nos falamos, eu apenas voltei a puxar Shawn pelas escadas e não o deixei usar sua cordialidade nem para desejá-la um bom dia. Assim que passei pela porta do quarto, joguei-me na cama pronta para dormir até que o beijo de amor verdadeiro pudesse me acordar. Shawn deitou-se ao meu lado, logo após de tirar seus sapatos, e me puxou para que eu descansasse minha cabeça em seu peito. Seus dedos desciam e subiam pelas minhas costas vagarosamente e não demorou muito para que nossas respirações se aprofundarem.
Acordamos em cima da hora. Não exatamente em cima da hora, porque ainda deu tempo de vermos minha família reunida em uma fileira horizontal nos esperando ao fim da escada. Não sabia o que aquilo significava, então soltei a mala e fiquei de frente para os três que mantiveram os olhos em mim durante todo o percurso.
Primeiro me despedi do meu irmão. Agarrei seu pescoço e prometi que ainda teríamos muitas chances de enchermos a paciência um do outro. Ele apenas riu e me abraçou de volta, me soltando para ir falar com Shawn. Por segundo, não deixei nem que meu pai visse as lágrimas da saudade que eu já sentia quando me aninhei em seu peito. Suas mãos acariciaram meu cabelo e ele me olhou nos olhos antes de dizer:
- Eu amo você, querida. Sei como é capaz.
Na terceira vez em que parei na frente de alguém, essa pessoa era minha mãe e ela me olhava de uma forma que, apesar de ter tentado, não consegui decifrar. Encarei-a desconfortável, eu não sabia o que pensar depois de ontem e muito menos o que dizer. Essa seria a hora em que ela iria me dizer que eu era adotada e me apresentar a minha nova família de fracassados? Porque eu não pertencia à família de médicos e fortes que constituía a Bamber, mesmo que os olhos azuis e o resto do meu rosto não me deixassem negar nossa familiaridade. O que me deixa a crer que só nasci de forma incorreta.
- Me mostre que estou errada, Ellie - diz de uma maneira baixa e consistente, com os olhos beirando as lágrimas.
Minha expressão de surpresa era evidente. Eu realmente não esperava por aquilo. Todas as palavras que ontem minha mãe jogou ao vento se juntaram em um grande tornado a minha volta e eu só esperava sair e mostrar que ela errou feio. Não nos abraçamos e não trocamos nenhum outro cumprimento, apenas mantive o rosto apático como de um zumbi - coisa que ela odeia - e Edith utilizou todo o seu autocontrole para não chorar. Talvez de desgosto ou só tristeza, eu realmente não dava a mínima.
Despedi-me com um aceno para meu pai e meu irmão, e, quando dei por mim, Shawn e eu estávamos a caminho do aeroporto. Não havia muitas fãs o esperando, na verdade, acho que as que se aglomeraram ali foram pegas de surpresa ao vê-lo segurando minha mão e rindo de algo idiota que eu havia dito.
"Ele não estava em Toronto?"
"Tenho quase certeza que ele havia pegado um voo para NYC."
"Também, sumido do jeito que é, nem dá para saber por onde ele anda."
Esperava que as fãs não me culpassem por sua ausência nas redes sociais, mas esse final de semana foi um caos para mim e Shawn usou todo o tempo que tinha tentando me fazer sentir melhor. Mas elas não pareciam nada bravas comigo e até foram gentis ao ver minha cara derrotada por horas mal dormidas. Horas nada dormidas, devo me corrigir.
Shawn e eu achamos um lugar para sentar até que seu voo fosse anunciado e, enquanto esperávamos, nós nos atualizávamos na internet. Vi fotos nossas no aeroporto no Canadá, vi fotos nossas discutindo pelo assento ao lado da janela - fotos mais que engraçadas - e vi um tweet que perguntava para Shawn: "qual é sua memória mais bonita da Ellie?"
Movida pela curiosidade, cutuquei-o e ele logo desviou o olhar do seu celular para o meu. Leu a pergunta e olhou para cima, como se ponderasse a questão, fazendo-me rir. Não demorou muito para que um lindo sorriso, aquele mesmo sorriso que deu nessa manhã, tomasse conta de seu rosto.
- Quando você perambulou por sua casa usando a minha Lacoste azul claro e as suas meias até os joelhos - respondeu de um jeito tanto orgulhoso ao fitar-me.
Meu coração palpitou com essa informação. Nem em um milhão de anos imaginaria que essa seria sua resposta, uma cena que passou despercebida por mim e se tornou sua memória mais bonita. Era provável que meu cabelo estivesse alto, sua Lacoste azul claro estivesse toda amarrotada e minhas meias uma vez brancas estivessem sujas pela preguiça de calçar chinelos, fora a minha cara amassada e nada atraente. Mesmo assim, um momento tão banal como aquele foi capaz de prender sua atenção apenas por eu estar sendo eu mesma.
Ia tentar dizer algo quando a aeromoça anunciou seu voo.
- Te vejo em uma semana - diz com certa tristeza na voz ao se levantar. O puxo de volta pelo pulso para sua cadeira e o beijo até que a mesma voz soe nos autos falantes outra vez.
- Eu te amo - sussurro próximo aos seus lábios e Shawn sorri.
- Eu te amo, babygirl - diz e me beija uma última vez antes de levantar e ir para a sala de embarque.
Se olhar para trás é porque me ama.
Se olhar para trás é porque vai sentir minha falta.
Se olhar para trás é porque o que temos vai durar.
E, bem, ele olhou.
(...)
- Ellie, você já está pronta? - gritou Katherine da sala e eu me apressei em achar um par de sapatos combináveis com minha roupa.
Edward havia me convidado para a "melhor festa que o Jason um dia já pensou em dar" e não passou pela cabeça de Katy me consultar antes de atender a chamada e aceitar ir a essa comemoração rotineira. Claro que eu fiz o maior show para que ela desistisse, até inventei cólicas assassinas, mas não lembrei que Katherine sabia mais do meu ciclo menstrual do que eu mesma. Também usei a desculpa da saudade. Essa sim poderia me matar a qualquer momento. Já era sexta feira e a última vez que Shawn deu uma notícia de vida - fora "bom dia" e "boa noite" - foi na quarta, se não fosse pelos seus amigos que me atualizam de seus sinais vitais, eu já teria largado tudo para dar uma tapa em sua cara em Los Angeles.
- Já estou indo! - grito de volta, afivelando meu salto alto. Na verdade, eu estava me arrumando com uma lentidão fora do comum e não sabia qual milagre havia acontecido para que Katherine ainda não tivesse vindo me puxar pelos pés.
Antes de sair do quarto, meu celular começa a tocar e eu bufo ao ter que procurá-lo por entre os lençóis. Encontro-o e meu coração falha uma batida ao ver Weirdo - e uma foto de Shawn dormindo - brilhar no visor.
Eu estava com tanta saudade que doía no peito.
- Seu desgraçado! Quer me matar do coração? - esbravejei sentando na cama, com a melhor cara de indignação que reproduziria assim que seus pés pisassem em Toronto.
- Oi, babygirl- diz calmamente, ignorando minha fala anterior. - Eu estou com saudade.
Eu queria gritar com ele, assim como queria beijá-lo.
- Eu também estou. Por que não me ligou? - perguntei cheia de manha, mexendo com os adereços da minha saia.
- Desculpe, mas as coisas ficaram corridas por aqui. Pensei que as mensagens de bom dia e boa noite fossem o suficiente - brincou e eu revirei os olhos.
Nunca seria o suficiente.
- Você sempre esquece do boa tarde - resmunguei, ouvindo sua gargalhada e assim um sorriso pequenino se perdurou no meu rosto.
- Ellie! Vamos! - gritou Katherine novamente e eu arregalei os olhos. Ela apareceu na porta do meu quarto com uma grande interrogação no rosto. - É o Shawn? - Assenti e ela revirou os olhos, sabia como provavelmente demoraríamos na chamada.
Nem que eu dançasse em uma festa barulhenta com o celular na orelha, eu teria mais tempo com ele.
- Para onde vão? - Shawn perguntou curioso.
- Ah, Ed nos convidou para uma festa - digo dando de ombros, assistindo Katy batendo o pé no chão com impaciência.
- Ed? - perguntou novamente, mas distorcendo o tom ao falar o nome de meu quase amigo.
- É, o Ed - confirmei. - Diminutivo para Edward. - Recebi um resmungo como resposta.
- Só cuidado, tudo bem? Katy me disse como você é fraca para bebidas.
Olhei feio para Katherine.
- O que quer que seja que ele tenha falado, é mentira - se defendeu, erguendo as mãos e eu rolei os olhos, deixando uma risada escapar.
- Não sou fraca para bebidas - argumentei com a voz um pouco esganiçada de mais. Quem mesmo eu queria enganar? - Tudo bem, eu vou tomar cuidado - digo com o dar de derrota, ouvindo-o rir e entendendo como nunca cansaria da sua risada. - E onde você está?
- Em um bar - diz e eu estreito os olhos como se ele pudesse me ver. Era a quarta vez que Shawn me ligava naquela semana, em todas nossas ligações ele estava em um bar.
Gostaria muito de saber se seu fígado é imortal.
- Por que você só me liga quando está chapado? - pergunto com um sorrisinho ladino.
- Isso é uma blasfêmia.
- É mesmo? Foi assim durante a semana - argumento.
- Não tenho culpa se esse é o único momento que tenho para termos uma conversa - retrucou e eu não identifiquei o que o tom de sua voz expressava, o cansaço era o mais provável.
De uma hora para a outra, todo o ar se mostrou denso, inclusive o californiano.
- Eu entendo, também ando bem ocupada - digo e ele nada responde, criando uma atmosfera tensa pela linha telefônica. - Vou sair antes que Katy me mate. É provável que eu fique te enchendo de mensagens, enquanto a assisto ser feliz - dramatizo e ele dá uma risada, não foi sua melhor risada, mas já era alguma coisa.
- Eu só não sei se poderei respondê-las - disse e eu deixo um suspiro escapar. - Estão me obrigando a dormir e não vai demorar muito até que me achem aqui.
- Shawn, por que não anda dormindo direito? - Minha pergunta havia soado um pouco mandona de mais, mas era meu lado protetor tomando de conta e eu não queria impedi-lo.
- Você também? - respondeu com outra pergunta, fazendo-me crer que a única coisa que queria era fugir da real resposta.
- Você sabe que me preocupo com você - digo me sentindo boba.
- Eu sei. - Passamos um momento em silêncio até que ele solta um suspiro profundo. - Já vou ter que ir. Eu te amo, babygirl.
Meu coração apertou e eu só queria sair da fantasia que usava para chorar até dormir.
- Eu te amo, Shawn - digo mordendo o lábio, segurando tudo o que gostaria de dizer.
- Até domingo - diz antes de desligar a chamada.
Encontro os olhos de Katherine atentos aos meus, dou um sorrisinho triste e um dar de ombros desengonçado.
- Por que acha que ele está assim? - pergunto sentindo-me extremamente infantil.
- Tem vezes que você está assim sem motivos - diz ela sentando-se ao meu lado e eu mordo o interior da minha bochecha. - É provável que seja cansaço.
- Eu também, dar inicio a um novo álbum nunca é fácil - digo como se entendesse algo sobre o assunto, mas na verdade só estava falando aquilo para tentar me convencer.
- Vamos. Você precisa de um porre.
A frente da suposta casa de Jason demonstrava um pouco do que encontraríamos lá dentro. Ela estava sobre luzes agonizantes e muitas - muitas - pessoas com copos vermelhos bebendo a todo vapor. Elas mal conversavam, pareciam estar ali apenas para se embebedar e cair quando não lembrar mais de seu nome. E talvez seja por isso que eu estava lá também.
Edward nos esperava e veio em nossa direção quando nossos olhares se encontraram. Seus cabelos já estavam melados pelo suor e sua blusa de botões não estava mais devidamente abotoada - ou nunca esteve -, mas, mesmo com toda a sexualidade impregnada as suas ações e movimentos, meu corpo só pedia e chamava por um canadense, um canadense muito complicado, um canadense que não estava aqui agora.
E é sua ausência que irei tentar ausentar.
- Bem vindas ao hino de festa número um! - disse Ed, ou gritou Ed, segurando nossos ombros, nos introduzindo a uma casa barulhenta com gente desconhecida.
Ed tentou fazer uma conversa funcionar entre nós três, mas sua voz não conseguia se sobressair da música alta, então Katy e eu apenas concordávamos com o que ele dizia. Meu quase amigo pode ter perguntado se gostávamos mais de salgado ou doce, a resposta foi sim. Ele pode ter nos convidado para assaltar a casa da moeda e nós aceitamos.
Na verdade, naquele ponto, eu não estava me importando com muito.
E foi com essa coragem que marchei até o bar e disse o que sempre quis dizer:
- Eu quero tudo!
- Vai ser meio difícil conseguir tudo... - O barman comentou meio embaraçado e eu senti minhas bochechas mudarem de tom, agradecendo pelas luzes desconexas esconderem minha vergonha. - Você não quis dizer "eu quero o mais forte"? - sugeriu e eu ponderei, era isso mesmo.
- Se importa se eu chegar e perguntar de novo? - perguntei me apoiando com o balcão e ele negou.
Retrocedi uns passos e marchei até o bar novamente, mas muito mais determinada do que a vez interior.
- Eu quero o mais forte!
E essa foi como começou a história da pior bebedeira da minha vida. Eu não sabia mais onde estava Katy ou até mesmo Ed, então eu estava sozinha na pista de dança tomando a décima - ou talvez não - da dose mais forte que o barman me arranjou, comprovando a teoria de que sou sim uma fraca para bebidas. Não só para bebidas, acrescentei mentalmente, e foi um péssimo momento para que eu pensasse nisso, porque eu já me via chorando no ombro de uma garota com botas de crocodilo interestelar.
- Ei, quem é você? - ela perguntou ao afastar-me, olhando diretamente para mim. Seus olhos verdes, não que eu tenha certeza, fitaram-me de forma curiosa e eu me sentia bêbada demais para resquícios de vergonha.
- Eu sou Ellie, a fraca - disse erguendo o copo em sua direção e brindando com o vento.
Se Shawn pode apanhar do vento, eu posso brindar com ele.
- Arabella - diz se apresentando e eu aceno em concordância, nem um pouco interessada em seu nome, acreditando na probabilidade que ele cairia em esquecimento pela minha mente. - Por que você é Ellie, a fraca?
- Porque não sou forte - respondi dando uma risadinha sem sentido.
- Eu acho você forte - diz e magicamente eu consigo ouvir sua voz, mesmo que ela usasse o mesmo tom de Ed. Talvez não fosse a música a bloquear suas falas e sim meu desinteresse.
Não consegui me sentir culpada.
- Você nem me conhece, Arabella - digo de uma forma embolada e sua sobrancelha é arqueada rapidamente.
Ela não parecia ser o tipo de pessoa que conhecia antes de julgar.
- Não preciso - conclui antes de perceber que Ed segurava seus ombros, ela vira-se para ele e revira os olhos. - Isso são os sons loucos em seus ouvidos - diz só para mim e logo nos dá as costas para continuar sua festa.
- O que estavam falando? - perguntou o garoto a minha frente. Dei de ombros. - Você está bem?
- Eu estou ótima! - Seu olhar precisou ser reforçado para que eu admitisse o contrário. - Eu estou péssima.
Edward me guiou de volta para o bar e se manteve de frente para mim, parecendo procurar as palavras certas para dizer. Encarei-o, o tédio estampado em meu rosto. Eu não queria saber de suas palavras de consolo, longe disso, eu vim para não ter que ouvir nada disso.
- Está assim por causa de seu namorado? Ele fez alguma coisa? - perguntou e eu franzi o cenho, sentindo uma enorme vontade de rir.
De onde ele havia tirado aquilo?
- Por quê? Por que você acha que ele "fez alguma coisa"? - retruquei, fazendo as aspas com os dedos.
- Bem, porque...
- Casais são assim, sabia? Nem tudo são flores, Edward Moore! - disse um pouco mais alto e sua expressão era de espanto.
- Vocês brigaram?
- Não! - respondi rapidamente. - O que quer me dizer? - perguntei impaciente.
- Saia dessa! - esbraveja segurando-me pelos ombros. Arregalei os olhos, ele também estava bêbado? Ou eu que estava sóbria? - Você não vê que isso só vai te arruinar, Ellie? Esse relacionamento só vai te arruinar.
Arruinar-me?
Enquanto eu tentava entender o que se passava diante dos meus olhos, o pior que poderia ter acontecido, aconteceu. Edward segurou meu rosto com suas duas mãos e forçou seus lábios contra os meus. A sobriedade me atingiu como uma tapa, fazendo-me debater em seus braços suados e pegajosos, tendo em mente que ele não me soltaria por vontade própria. Foi tudo muito rápido e não controlei muito minhas ações quando suas mãos começaram a apalpar meu corpo, causando-me náuseas instantâneas. Usei toda a minha força e determinação para afastar-me dele, não medindo cuidados ao atingir a base de seu nariz com o calcanhar de minha mão, fazendo com que Ed apagasse, caindo contra o chão.
As luzes pararam, a música parou, as pessoas pararam.
Todos observavam a mim - uma louca bêbada que não tirava os olhos do cara que ela havia feito desmaiar - e em Edward - o cara desmaiado -. Senti mãos em meus ombros e olhei para Katherine, com os olhos marejados, enquanto ela me levava até o carro. Não achava seguro que ela dirigisse, mas não me contrapus sabendo que minhas condições eram consideravelmente piores. Sentia-me suja e não conseguia para de chorar. Katy se manteve em silêncio, concentrando-se na estrada, tentando não nos matar.
Assim que chegamos a casa, minha melhor amiga me levou para o meu quarto e, depois de um bom banho acoplado de lágrimas e soluços, deitou-se comigo em minha cama. A última coisa que consigo lembrar é de chorar até dormir.
Estava encarando algum lugar desfocado da parede quando a campainha tocou. Minha primeira intuição foi ignorar, eu realmente não queria falar com ninguém agora, mas meu bom senso se sobressaiu. Acordei nessa madrugada com uma dor de cabeça tão insuportável quanto minha existência em alguns dias e demorou pra que eu saísse da cama, para que eu saísse do banheiro e para que Katy me fizesse ingerir qualquer alimento. Coloquei a xícara de chá que um dia já foi quente na mesa de centro, levantando assim que a campainha tocou pela segunda vez. Minha amiga não estava em casa para me fazer esse favor, então eu andei até a porta e a abri, sem nem mesmo olhar no olho mágico, sendo surpreendida por Shawn em sua versão mais exausta.
Sua presença ali fez com que as lembranças do dia anterior me atingissem com uma força além do comum, além do que eu jamais suportaria.
Ligação; festa; Edward; um dos piores dias da minha vida.
Pulei em seu colo sem muita cerimônia a procura do meu lar, tentando me fazer crer que seus braços poderiam me fazer esquecer toda e qualquer memória vinda daquela noite. Não poderiam, mas já bastava que meu afeto fosse retribuído. Shawn acariciou meus cabelos e eu me permiti chorar em seu ombro, tanto pela saudade, tanto pela vergonha. Não sabia o que ele estava fazendo ali, mas não poderia ter tido hora melhor para que ele aparecesse. Suas mãos afastaram-me, desceram-me e me mantiveram distante pelos quadris. Franzi o cenho, confusa.
Seu olhar parecia quebrado, assim como o meu deveria estar.
- Eu não tenho certeza se deveria te mostrar o que encontrei.
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