London
P.O.V – Sherlock
E lá estava eu, na mesma sala do pequeno apartamento 221B da Baker Street, em minha velha poltrona, mas algumas coisas estavam diferentes agora, eu podia sentir, não era mais o mesmo, algo havia mudado e não era o mundo entediante lá fora, algo em meu interior estava mudando, era inevitável negar os sentimentos que se afloravam e o pior de tudo, estava com medo do que isso poderia me causar futuramente.
Antes de pegar o jornal para voltar a minha atual rotina, que agora se baseava em ler as notícias, ver a polícia correndo em busca de assassinatos e casos tão claros e simples de serem resolvidos. Por que você não vai resolver os crimes? Você, caro leitor, deve estar se perguntando o que estou fazendo da minha vida. A resposta é simples, os casos não me atraem mais.
Não, não parei de solucionar crimes, correr atrás de cadáveres e cenas obscuras e fora do normal. Sou o mesmo Sherlock, arrogante, que quer sempre ter a última palavra e explicação de tudo, ou pelo menos, acho que ainda sou.
Na verdade minha alma clama pelos dias agitados e a aventura dos casos sem pé nem cabeça, mas sempre uma coisa óbvia de se resolver. Mas não sinto o mesmo prazer e a euforia que me inundava. Já faz alguns dias que Lestrade não aparece por aqui a pedido de Mycroft, ele sempre aparecia aqui, pelo menos umas três vezes por semana para me informar de novos crimes, já minha caixa de mensagens, podemos dizer que a palavra "cheia" seria um mero eufemismo para lhes dizer a quantidade de opções de crimes para eu resolver.
Não adiantava, por mais que me interessasse pelos casos e uma vez ou outra começasse a me envolver e tentar soluciona-los, antes mesmo de começar a formular questões em minha mente, já desistia e o largava.
– Você não é mais o mesmo Sherlock. – Lestrade disse uma vez. Ficou ainda mais surpreso quando finalmente comecei a chama-lo pelo nome certo “Greg”, lembro de sua cara de espanto quando falei seu nome certo pela primeira vez.
– Você mudou após o casamento de John. Pelo menos sabe que perdeu seu animalzinho de estimação. – Mycroft sempre achava um jeito de me deixar ainda mais irritado, mas aquilo também era verdade, me encontrava praticamente como um homem sozinho.
John se casara com Mary alguns meses atrás, não me entenda mal leitor, eu não estou com ciúmes de John Watson, pelo contrário, ele merece ser feliz e ter uma família, afinal Mary está grávida e creio que isso será muito bom para meu amigo.
Após seu casamento, continuamos resolvendo crimes, Mary foi uma ótima aliada nesse ponto, bolou planos excelentes para que tudo continuasse normal e o casamento não afetasse minha antiga amizade com John. Deu certo, até os dois decidirem tirar um tempo para a lua de mel em Paris, um dos grandes sonhos de Mary.
Já faz uma semana que eles foram viajar, uma semana que sou obrigado a olhar a poltrona vazia de John, até enchi um balão com um rosto desenhado e o amarrei no acento para não me sentir tão só, já que não tinha mais a Sra. Hudson para me fazer companhia e criticar minhas ações. Não se preocupem, ela está bem, apenas pediu alguns dias de folga para poder visitar uma prima em outra cidade.
Nem mesmo podia chamar Molly para comer batatas, ela estava viajando, ganhou um curso gratuito de medicina durante um ano em Cambridge, ela merece tudo isso e muito mais, ela é uma pessoa maravilhosa e uma ótima amiga.
Analisei todo o cômodo a minha volta, tudo tão vazio e silencioso, nem sei mais se a palavra entediante seria uma boa definição agora. Encostei a cabeça na poltrona, apoiando a xícara de chá na perna, nem sei como havia conseguido preparar, já que minhas mãos não paravam de tremer, efeito da cafeína e narcóticos excessivos que vinha ingerindo nos últimos dias. Fechei os olhos e respirei o mais fundo que podia até escutar um toque familiar, mas que a meses não ouvia. Não podia ser real. Estava tão drogado e debilitado com meus sentimentos que agora estava ouvindo coisas? Pensei.
Estiquei o braço para pegar meu celular sobre a pequena mesa ao meu lado. Era real, tanto a mensagem quanto quem a havia me mandado.
“Feliz aniversário Sherlock”
I.A.
Sim, era meu aniversário. Não era um fato tão importante de ser lembrado e nada que fosse mudar a vida de outras pessoas. Mas ela sabia, agora estava parado encarando a tela do celular e aquela mensagem, que me trazia uma certa alegria e uma sensação de que estava apaixonado por alguém. Irene Adler havia lembrado do meu aniversário e aquilo por um momento passou a ser um dos melhores presentes da minha vida. Bem na verdade o maior presente da minha vida foi Redbeard, meu fiel companheiro de infância, lembro até hoje todas as vezes que brincávamos de pirata, mas minha infância não vem ao caso agora.
Por alguns segundos todo o sentimento de tristeza havia se esvaído, junto com o resto do tédio que circulava pela sala. Como estava com saudade de Irene, seus truques, jogos, seu jeito sensual e provocante de ser, realmente aquela mulher me deixava louco e capaz de fazer coisas que nem eu sabia que era capaz de fazer.
O que faria agora? Olhava a mensagem e deixaria as coisas como estavam, apenas guardando aquela felicidade para mim mesmo e tranquilo por saber que ela ainda se esforçava para se manter viva e estava se escondendo em algum lugar mundo a fora? Ou responderia aquela mensagem e lhe diria todos meus sentimentos e a dor enorme que estava sentindo por ela sempre perturbar meus pensamentos e não poder tocá-la?
Permaneci olhando para a imagem do celular que me trazia a seguinte mensagem na palma da minha mão. Não podia lhe dizer nada, não podia me render a essa teia de sentimentos, não era do meu feitio ser assim, não podia me rebaixar daquela forma. Desliguei o aparelho, na intenção de não receber mais nenhuma mensagem durante o resto do dia, não que isso realmente fosse acontecer, ninguém me mandava mensagens a não ser John, que as vezes mandava um “Oi” perguntando como estava e que a viagem estava sendo maravilhosa. Nunca abria suas mensagens, não me interesso por nenhuma mensagem que comece com “Oi”, se bem que nos últimos dias nem John estava me mandando mensagens.
Como já fazia dois dias que não dormia e estava completamente vivendo a base de cocaína, fui até meu quarto, um dos lugares mais intactos da casa, visto que permanecia dias e dias paralisado no meio da sala ou em meu próprio palácio mental. Me joguei na cama, quando dei por mim já estava adormecido.
Na manhã seguinte uma claridade tremenda inundou meu quarto, me obrigando a levantar meio cambaleando pelo quarto e me lembrar de que havia dormido com a janela aberta. Mas naquela manhã não estava sozinho como de costume, alguém estava na sala, provavelmente sentado em minha poltrona, um cheiro de bacon e ovos predominava a casa.
Quando cheguei próximo a sala, me deparo com Mycroft sentado na poltrona, bebericando um pouco de chá e na mesa da cozinha, que na noite anterior estava repleta de fórmulas entre outras experiências, havia alguns ovos mexidos cobertos por bacons e uma xícara de chá.
– Sra. Hudson já voltou? – perguntei indo em direção a mesa.
Peguei um prato e coloquei alguns ovos, peguei a xícara e coloquei chá até a metade. Encarei Mycroft e apenas com o olhar ele entendeu que deveria sair da minha poltrona, lógico que antes de sair me olhou com relutância.
– Sentiu saudades irmãozinho? – Perguntei levando a xícara a boca.
Mycroft não disse nada, apenas me encarou e contorceu um pouco os lábios fazendo uma careta.
Conversamos por alguns segundos, foi uma conversa muito boa por sinal, fazia tempo que não riamos daquele jeito. Relembramos das nossas brincadeiras de criança, de como eu adorava brincar de pirata e o quanto eu havia mudado. Posso lhe afirmar que foi uma das conversas mais agradáveis que já tive, eu estava carente e um pouco debilitado e ele conseguia ver isso, por mais que brigássemos na maior parte do tempo eu me sentia honrado em ter um irmão como ele.
Após algumas horas de conversa, Mycroft me informou de um caso que, como ele mesmo disse, iria finalmente me tirar do tédio. Posso afirmar que as informações sobre o caso não eram muito corretas e não fazia sentido, ou eu que estava drogado demais para não compreender? Enfim, apenas me lembro que ele disse que eu deveria ir para Paris e apenas lá iria resolver um crime.
De primeira neguei, afirmando que não tinha motivo nem condições para sair de Londres e ir para outro país, mas algo naquela conversa embaraçada de Mycroft me intrigava, era como se uma parte de mim quisesse ir para Paris.
– E acha que isso me tiraria do tédio? – O encarei sorrindo ironicamente.
– Se vai tirar você de seu tédio existente, já não posso afirmar. Mas vai te deixar um pouco feliz. – Ele riu quase que se convencendo a si próprio que aquilo tudo iria ser vantajoso para mim.
– Já tem algum lugar em mente, que posso ficar? – Perguntei agora comendo uma fatia de bacon.
– Ficará em um quarto no Champs Elysées Plaza.
– Nossa, desta vez você se superou. – Disse um pouco espantado com a escolha de meu irmão, já que sabia que aquele hotel era um dos mais caros de Paris.
– Já que vai viajar, é melhor que fique em um lugar seguro e confortável.
– Mas este não é o Hotel que Mary e John estão passando a Lua de mel? – disse relembrando do cartão do hotel que estava na mala de John antes de sair para o aeroporto.
– Sim. Espero que não se incomode com a escolha do lugar. – Mycroft disse se levantando e já de saída. – Esteja pronto as sete, sem atrasos por favor.
– Como tem a certeza de que vou para Paris? – O encarei quando se voltou para minha direção.
– Eu sei que não deixaria passar esse caso. Sei que ficou interessado. – Mas antes que pudesse protestar ele já havia descido as escadas e a única coisa que ouvi foi um singelo “Passar bem irmãozinho.”
Passei o resto da tarde revendo alguns casos antigos e analisando outros em que Lestrade estava empacado, criando deduções de como eles poderiam resolve-los. Mas uma coisa não saia da minha cabeça, a mensagem de Irene.
Desde a hora que li a mensagem, não pegara mais no celular, não sabia se ela havia mandado mais alguma coisa ou se era apenas invenção da minha cabeça, mas uma coisa eu tinha certeza, queria vê-la novamente e dizer como foi difícil salvar sua vida tentando me infiltrar naquele arsenal terrorista, mas logo tentei me livrar de tudo aquilo e voltar meus pensamentos para a proposta de Mycroft, aquela história toda estava muito estranha e eu não conseguia decifrar, mas toda vez que pensava naquele assunto, instantaneamente me vinha a imagem de Irene, aquilo já estava me deixando louco. O que Irene tem haver com isso, já que ela está perdida pelo mundo? Era o que me perguntava. Mas não podia chegar na conclusão de que ela estava lá, não podia me precipitar e chegar a esses pensamentos dominados pela emoção.
Pensei muito, creio que fiquei pelo menos umas duas horas circulando sem rumo pelos cômodos do 221B, até que fui ao meu quarto e peguei a mala em cima do guarda roupa, coloquei algumas roupas na mala, já que sabia que Mycroft nunca me mandaria para um hotel sem pelo menos estar bem equipado com roupas e coisas do dia a dia, mas para prevenir, montei uma pequena mala apenas contendo coisas básicas.
Passei a noite em claro revisando a mala, indo e voltando a cada instante da janela para a sala, para ver a movimentação de Londres, com certeza essa viajem estava me deixando apreensivo.
Quando os primeiros raios de Sol apontaram, fui até o quarto, posicionei a pequena maleta próximo a porta para ficar mais fácil, me dirigi ao banheiro, fiz a barba, não que estivesse muito grande, mas pelo fato de estar algumas semanas trancado em casa, achei necessário apresentar uma boa impressão.
Assim que acabei a higiene, ouvi a buzina do motorista que iria me levar até o aeroporto, Mycroft realmente era a pessoa mais pontual que conhecia. Rapidamente peguei a mala e o sobretudo que estava jogado na poltrona e me dirigi as escadas, mas antes de finalizar a descida, senti um peso no bolso do casaco. Havia colocado o celular no bolso, como um impulso e uma certa necessidade, liguei o aparelho e fui direto nas mensagens. Não haviam me mandado nenhuma, nem mesmo ela, mas li calmamente apreciando cada palavra a mesma mensagem me desejando parabéns. Ouvi novamente a buzina do carro parado a minha porta, desliguei o celular e o joguei no bolso, quando dei por mim já estávamos na pista de decolagem particular de Mycroft de frente para seu avião particular, um aperto e nervoso dominavam meu corpo, em algumas horas sairia de Londres e só Deus, se é que ele existe mesmo, ou sei lá quem estivesse no controle, saberia o que aconteceria em Paris.
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