Capítulo 16 - "Meu filho"
"Portanto, lutem! Como se esta fosse sua última chance. Salvem este mundo corrompido, e transformem o futuro da nossa nação!"
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Nena
Eu sempre me recordo daquele dia. É como um pesadelo constante para mim; As cinzas. Talvez seja o dia mais triste da minha vida; Talvez para todos nós.
Eu fugi da guerra. Para muitos, fui covarde, mas vejo isso como um elogio por ser a única sobrevivente da minha raça. A guerra Magnus. Também conhecida como a guerra entre magos e bruxas. Aconteceu a milhares de anos. Hoje, não passa de uma lenda, uma história infantil.
E depois de quase ver a morte com meus próprios olhos, busquei refúgio em algum lugar acolhedor. Certamente não encontrei. Então, vaguei pelo mundo vendo os comuns se reerguendo, tenho uma vida feliz, até que seu fim chegasse. E eu? Como seria feliz, se nunca descobri o verdadeiro o significado desta palavra. Não é agora, que saberei.
As bruxas nunca tiveram uma conduta assim. Nós não eramos uma família, e sim um clã. E em uma sociedade dividida entre poderes, o que nos restava era obedecer cada patente. Por isso, por mais que não nos amassemos como os humanos se amam, nós protegíamos e nos importavamos com cada membro. Assim, quando a Guerra Magnus eclodiu, lutamos até o fim. Talvez... Somente elas lutaram até o fim.
— Bom... — ergui meu rosto, avistando a vila pelo alto monte. — Morrer de fome, eu não vou.
Então usei o pouco de magia que lembrava, para me transformar em alguém mais jovem e trabalhar para quem fosse. Trabalhei muito e conquistei o que tenho hoje. E não sou meramente "feliz". Eu ainda procurava o real significado de minha vida, sabendo que talvez nunca encontrasse.
Até que um dia, tudo mudou. Ele veio. Aquela criança chorona, fedida e feia pra danar, foi abandonada na porta da minha casa, naquele dia chuvoso. Estava todo sujo, com cinzas, me lembrando de meu passado. Talvez por isso fiquei com ele, ou pela grande quantia que me oferecem.
— 500 pratas! Essa criança é feita de ouro? — olhei assustada.
Estava tudo escrito em uma carta, com um selo específico. O selo do rei. E o outro dos caçadores. Ou eu estava sonhando, ou esse sonho era muito louco. Só podia ser um.. Sonho.
E estava escrito:
"Humilde plebeia, venho lhe pedir um favor, mas especificamente uma ordem. Cuide de Gael, ele é... Especial. Não posso confiar em você totalmente, eu sei, mal a conheço. Apesar que estes dias venho lhe investigando e preciso de seus serviços. Não se esqueça do pagamento, sei que não faria nada de graça. Sem perguntas e objeções, este é um pedido do rei em pessoa."
Agradecido,
Daniel
Com curiosidade e medo ao mesmo tempo, continuei olhando para aquela criança, antes de colocá-la em minha casa. Não parecia alguém especial. Era feio e estava sujo. Mas por algum motivo, aceitei o pedido.
— Rei Daniel. — repeti. — Ok... Preciso do dinheiro.
Peguei a sexta e entrei em minha casa e arrumei tudo para aconchegar uma criança ao lar. Ele seria minha nova "família". Isto é hilário.
Servos do rei vinham semanalmente, verificar a comida e tudo mais. Além de trazerem armas e objetos estranhos, dos caçadores. Depois de um ano, ninguém se importava mais com ele. Apenas eu. E continuei durante anos, cuidando dele. Ele havia se tornado como um filho pra mim. Parecia que enfim encontrava a "felicidade".
E colocaria agora a vida de meu filho e de sua amada em risco? Por um rei perverso? Ou Salvaria minha própria pele? Preciso encontrar uma... Solução.
Daniel continuava impassível como sempre, então eu sabia que seria difícil encontrar uma escapatória. Eu precisava dizer tudo. Pois ou arriscava minha própria vida, ou eu arriscava a vida das pessoas próximas a mim.
Eu sabia que no fundo era egoísta, a parte mística em mim, falava mais alto. Então fora fácil tomar uma decisão. Mas uma pequena voz de consciência me inquietava. Diria que a parte irritante em mim; a qual queria proteger a todo custo, minha única família.
E Então, ele disse:
— O que!? Pensei que tinham o matado! — gritou se lembrando de Robin Hood. — Desgraçado... Ele fugiu!
— Ele já fugiu a 20 anos. — eu dizia. — Está em um vilarejo um pouco longe da capital. É onde... Onde eu moro.
O que estou fazendo? Estou me entregando! E... Gael?
— Ótimo, ótimo. Agora vi que é uma boa fofoqueira. Será que não contou algum segredo a eles? Um de que ele é o rei!? — ele gritou levantando-se de sua cadeira.
— Essa é a verdade. — me atrevi responder. — Deveria contar. Mas não contei... O dinheiro é mais importante. — disse, e vi que ele se acalmou. — Eu me infiltrei.
— Está vigiando a família de Robin Hood? — ele se assentara novamente em sua poltrona, perguntando.
— Exato. — respondi. — Estou investigando eles a um tempo. Parecem que estão tramando algo grande... Como... — olhei determinada para ele. — Os próximos vigilantes. E Raven, é a nova líder.
— A filha de Robin Hood. — ele respondeu. — Ra-ven. — soletrou rindo. — Gostei deste nome.
— E parece que não é só isso... — continuei. — Estão espalhando ideias turvas pela capital. Querem tirar você do trono. — sorri dizendo.
— Estúpido! — disse ele rindo. — Completamente Ridículo! Lutarão com o que e com quem? Eu tenho um exército; armas, tropas, cavalos. O que eles tem? Força de vontade? — gargalhou. — Creio que não é algo de se preocupar.
— Se eu fosse você teria cuidado. — o avisei.
— Você não é. Faça o seu trabalho. — disse ele suspirando. — Preciso que procure um pouco mais sobre eles, investiguem até seus calções se for preciso. Quero pistas e logo darei a ordem de destruir aquele vilarejo. — concluiu rancoroso.
E mais uma vez ele se atrevia dizer uma coisa destas. Parecia que o poder havia subido pela sua cabeça. Não achava que seria possível que ele colocasse fogo em outro vilarejo, por sua própria vontade. Então irritada gritei:
— Mas e eu? E minha casa? Você está louco? — gritava. — Apenas prenda eles! — sugeri.
— Prender...? — ele ria. — Você terá o mesmo destino se continuar reclamando.
Completamente com raiva em meu ser, gritei:
— Desgraçado! — agarrei a gola de seu manto, levantando-o.
— Sol-te! — ele soletrou.
— Desgraçado! — gritei novamente.
— Sol-te! — ordenou. — Se ainda quer ver Gael vivo.
Ouvindo aquilo, me afastei, pensando o que poderia fazer para salvá-lo e salvar minha própria pele. Novamente aquelas questões voltavam para mim. Estava perdendo então, todo o orgulho que tinha de meu próprio clã, para salvar um simples humano?
Mas ele não era um simples humano. Ele era meu filho.
— Pensei que não seria capaz de matar seu próprio irmão. — admiti sincera.
— Então você não me conhece. — disse se recompondo.
— Pense direito Daniel... — dizia a ele — Quer repetir tudo de novo? Matar outro vilarejo? Existem pessoas inocentes lá. Sei que seus pais não estariam contentes com isso...
— Eles não estão mais aqui! — gritou.
— Por que você os matou! — provoquei.
— Eu não os matei! — gritou novamente. — Você sabe que foi o maldito Rei Ricardo. — dizia aos prantos. — Ele... Que destruiu minha família. Matou meu pais e-
— Você pode não ter matado seus pais, mas está se matando aos poucos. — disse, o intervindo.
Aquela frase foi como um baque pra ele. Ficou em choque, pensativo. Eu não sou de dar conselhos , ainda mais para um inimigo. Mas neste momento ele precisava. Eu me vi nele; Sozinho, porém ainda tinha Gael.
— Eu vou embora. — concluí. — Tenho que cumprir sua ordem, não é?
— Sim, sim. — concordou, olhando para suas próprias mãos. — Vá antes que eu me enlouqueça. E a propósito... — olhou finalmente para mim. — Te dou alguns dias. Se não trazer notícias, eu mesmo faço seu trabalho, de um jeito pior...
— Tudo bem. Que seja feita sua vontade. — disse ironizando. — Adeus... — me despedi. — Os guardas abriram a porta e eu sai da sala.
Mas quando dei meu primeiro passo, Daniel me chamou:
— Espere! Eu... — tentou dizer. — Leve a caixa.
— Que caixa? — perguntei me virando.
— A caixa, dos meu pais. Os caçadores... Do Vilarejo. — disse olhando para o chão. — Esconde ou queime. Apenas se livre disso.
— Tudo bem... — disse pegando a caixa que estava nas mãos de um empregado.
Fiquei intrigada que ele mesmo não tivera feito o trabalho. Ele poderia ter mandado queimarem a caixa, mas não o fez. O que o haveria impedido? Talvez ele estivesse se mudando aos poucos. Eu esperava, que não fosse para pior.
Quando estava saindo pela grande porta, apenas disse em auto tom para o rei:
— É o mesmo Daniel que conheço? — perguntei sorrindo.
— Eu espero que não queira... Que responda sua pergunta... — disse fechando as portas e entrando no cômodo.
Assim que cheguei em casa, Gael estava me esperando e pelo visto incomodado de alguma forma. Me estremeci em pensar no fracassado dia anterior. Mas pelo menos, ele também achava que tudo fora um sonho. Ou era o que eu pelo menos esperava.
— Onde estava vovó? — ele perguntou, assentado no sofá, erguendo seu rosto.
— E-eu estava na capital. — contei a meia-verdade. — Fui fazer compras... — disse adentrando em minha casa, fechando a porta da entrada.
— Tem certeza? — perguntou seriamente, me olhando.
— Está duvidando de mim Gael? — perguntei intrigada.
— Eu só estou fazendo uma pergunta. Você ficou a tarde inteira fora de casa.
— Oras! — exclamei. — Isso não é da sua conta! — disse caminhando para a cozinha.
Coloquei a caixa pesada em cima da mesa.
— E então o que é isto? — apareceu na cozinha, pegando a caixa.
Antes de conseguir abrir, segurei seu braço.
— Eu já disse que não é da sua conta! — gritei, tirando de suas mãos.
Eu fui idiota. Ele viu a caixa. Mas não conseguiria usar algum feitiço para esconder. Estava muito cansada naquele dia. Já estava velha demais, para truques baratos.
— O que está me escondendo vovó? — perguntou com ódio nos olhos. — Estava na capital e trouxe outra caixa com este selo. Acha que eu sou idiota?! Parece que é que você não confia em mim.
— Eu nunca disto isso! — eu disse sinceramente.
— Mas demonstra...
— Eu acredito em você! — eu disse indignada.
— Mas eu não. — ele suspirou e continuou. — Me mostre o que tem na porra desta caixa! Ou eu vou embora daqui.
Suas palavras fizeram com que eu recuasse para trás.
— Você não pode! — gritei assustada.
— Posso sim! — correu para seu quarto e eu, fui atrás.
Logo, começou a arrumar suas coisas em um saco.
— Eu posso sim! — afirmou novamente.
— Você está louco?! — perguntei aflita. — Pra onde vai e com quem?
Se ele fosse embora seria meu fim. O rei mataria a todos.
— Eu cansei! — dizia me olhando e arrumando suas coisas. — Chega de mentiras! Você foi pra capital ver o rei! Ele quase me matou. O que quer com alguém que me fez tanto mal? — indagou.
— E-eu... — tentei dizer, segurando seu braço.
Ele tirou minha mão rapidamente e andou com passos firmes em direção a saída. Parecia que minha esperança se ia aos poucos. E aquele sentimento que tanto procurei, também.
— Eu estava te esperando pra te contar. Raven e eu iríamos viajar, a procura dos novos vigilantes. Mas você tinha coisas mais importantes a fazer não é? — gritava. — Estava com meu irmão!
— Eu já disse que-
— Eu já sei de tudo. ele me interrompeu, virando-se.
Pude ver a carta em suas mãos. Era dos caçadores! Então, ele descobriu sobre seus pais. Eu estava completamente ferrada.
— Eu tenho uma família. Um irmão. Você sempre disse que eu estava sozinho... Como pôde...? — vi que lágrimas escorriam pelo seu rosto.
— Eu fiz isso pra te proteger... — disse aos prantos.
— Você não é minha mãe. Não haja como se fosse! — disse rancoroso.— Era minha família. Eu tinha direito de saber... — olhou no fundo dos meus olhos. — Então Adeus... Espero que... Seja feliz. Eu vou em busca do meu próprio destino.
E estas foram suas últimas palavras.
Eu fiquei paralisada. Como ele poderia me abandonar desta forma? Eu não conseguiria fazer a mesma coisa com ele. Eu deveria ter feito algo, usado minha magia para impedi-lo, mas... Não consegui. Minha única família se foi. O que faria? As consequências viriam de meus atos e mais mortes estariam em minhas mãos.
Continuei de pé, com a porta aberta, apenas vendo Gael partir. Me contentei em olhar para as estrelas, talvez elas tivessem reservado algo pra mim. O destino. O mesmo que tirou tantas coisas de mim.
— Como você cresceu... — disse em meio as lágrimas.
Sentia em mim um misto de emoções: Triste por ter perdido um filho, feliz pela minha escolha e orgulhosa pelo homem que ele havia se tornado.
Determinada, entendi que nossos caminhos seriam completos opostos. E que um dia, nos encontraríamos.
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