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Capítulo 8

"Não me lembro porque a beijei naquele momento. Até hoje, me lembro do nosso primeiro beijo, do momento em que absorvi aqueles lábios, senti o corpo dela contra o meu. Mas o motivo... eu nunca soube. E nem ela, acho eu.

Ela não me repeliu ou protestou. Me beijou com a mesma paixão que eu a beijava, embora um pouco receosa, como se tivesse medo de alguma coisa. Mesmo assim, ela não se afastou. Absorvi o corpo dela em um abraço e aprofundei aquele beijo, que para mim foi muito especial.

Outros beijos se seguiriam aquele... e me recordo do motivo, momento, hora e local de cada um deles. Mas esse primeiro beijo, é o que mais me marcou. Foi o momento em que eu comecei a descobrir que poderia vir amar alguém novamente.

No momento eu ainda não tinha certeza do que sentia pela Livia. Carinho apenas, gratidão... não julguei que pudesse amá-la ou desejá-la. A conhecia fazia dois ou três dias, como poderia estar apaixonado por uma completa desconhecida? Mas devia ter desconfiado, devia ter imaginado que o medo que eu senti quando a vi tendo aquela dor, era o primeiro sintoma do tão esperado verdadeiro amor.

Mas naquele momento nada me importava. Apenas queria manter aquele beijo, que acendeu uma chama no meu interior. Pela primeira vez em muito tempo eu me senti em paz, feliz, completo... efeitos que apenas o amor causa, mas eu ainda não sabia daquilo.

Quando nos separamos, eu toquei o rosto dela com delicadeza. Queria dizer alguma coisa, me desculpar, repetir o beijo, consolá-la..., mas ao abrir a minha boca, vi que ela me deteve com um gesto. Fitei seus olhos e senti uma vulnerabilidade que nem mesmo nos piores momentos ela havia demonstrado. "

***

− Falamos disso depois Pedro... agora preciso ir para o hospital.

***

"Minha vontade era de dizer que não, que falaríamos agora..., mas a saúde dela era mais importante. Assim, me levantei da cama e fui para o banheiro me vestir, enquanto ela separava uma roupa, ainda em silêncio."

***

− Livia?
− O que foi? - Livia parecia não ser mais capaz de encarar o rosto de Pedro, nem mesmo aquela veia que pulsava em sua testa.

−Precisamos falar sobre... sobre o que aconteceu na sua casa, antes de chegarmos aqui.
− Se refere ao beijo que trocamos?
− Sim.
− Ah sim. Isso... bem Pedro, não se preocupe com o que aconteceu. Não é motivo para pânico.
− O que quer dizer com isso? E por favor, pare de desviar seu olhar para outro canto.

− Você me beijou porque sentiu pena de mim, ou porque queria me acalmar. E agora teme que eu pense que você está loucamente apaixonado por mim. Não se preocupe. Não penso que o que aconteceu irá se repetir e entendo o que fez e agradeço.

Ele sentiu como se um balde de água fria fosse jogado em suas costas.

− Eu não pensei isso. Está enganada Livia.
− No que mais teria pensado? Pedro, eu não sou uma boa companhia. Falo nessa doença 24 horas ao dia, não porque eu quero e sim porque ela não me deixa em paz, não posso sair, não posso beber, não posso me divertir... vivo parando em um hospital e a todo os momentos tenho crises. Não sou uma boa companhia, nem mesmo como amiga. Agora sei disso e peço que me perdoe por tê-lo feito passar por isso.

Ela brincou com a corrente que sempre usava no pescoço. Triste, Pedro se aproximou dela e se ajoelhou na frente dela. Livia tentava se manter firme, mas ele via o esforço que ela fazia para não chorar ou se atirar nos braços dele. Com carinho, ele passou delicadamente a mão no rosto dela, como ela havia feito uma vez no jardim.

− Está querendo que eu me afaste de você Livia?
− É o melhor. Você só terá problemas sendo meu amigo.
−Você está sendo egoísta sabe... eu conheço uma pessoa maravilhosa e agora ela quer simplesmente sumir da minha vida...

Livia ficou em silêncio e não respondeu nada. Ele tocou os lábios dela com a ponta do dedo, percorreu aquele rosto frágil numa exploração delicada. Ela perdeu o ar quando ele tocou no seu pescoço e as palavras quase não saíram de sua boca.

− Por quê?
− Livia... você tem algo que... eu não sei explicar. Não vou dizer que eu te amo porque ainda não sei, só sei que eu sinto algo muito intenso por você. Carinho de amigo? Talvez, mas não pode ser apenas isso. Essa noite apenas fiz algo que eu sinto vontade de fazer desde que a conheci... eu falo e você não acredita, mas acho você tão linda...

A voz dele ia morrendo conforme as palavras eram pronunciadas. Os olhos de Livia brilharam por um momento, mas se tornaram opacos logo em seguida.

− Eu vou morrer... eu tenho apenas sete meses de vida... você não merece isso, você não merece sofrer assim. Por favor Pedro, vá embora... se afaste de mim enquanto ainda não tenho importância alguma para você...
−Tarde demais. Você já me marcou quando eu a vi pela primeira vez... além disso, você não sabe se vai morrer ou não. Você mesma disse que há uma chance de acabar tudo bem.
− Sim. Uma chance incerta e pequena demais.
−A vida é incerta Livia, você devia saber disso. Nenhum de nós sabe quando vai morrer... eu posso morrer antes de você... quem garante o contrário? Não se afaste de mim nem tente me poupar... eu quero correr o risco. Eu quero descobrir o que sinto por você e o que você sente por mim... a menos que você não sinta nada.

Livia apenas balançou a cabeça, numa negativa nervosa. Ele deu um sorriso e ergueu o rosto dela.

− Eu sabia... não acredito em destino ou sentimentalismo, mas sabia que você também sentia algo... nem sei como. Talvez você tenha me mudado demais em tão pouco tempo Livia.

E antes que ela pudesse dizer alguma coisa ou contestá-lo, ele a beijou novamente, tentando apagar assim todas as dúvidas dela e dele mesmo em relação as incertezas da vida.

***

Ana acordou sobressaltada quando o telefone tocou. Quem diabos a incomodava as quatro horas da manhã, quando conseguira conciliar o sono? Bufando, atendeu o telefone, tentando não falar com a voz enrolada.

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