Capítulo 5.
POV Brunna Gonçalves
Acordei na manhã seguinte com o som irritante do celular tocando. Cobri minha cabeça com o travesseiro na tentativa de fazer o som desaparecer.
Sem sucesso, tateei a cômoda ao meu lado, procurando pelo aparelho. Quando o encontrei, a chamada já havia sido encerrada e na tela o nome de Juliana aparecia como chamada perdida.
O relógio ainda marcava 06h30, o que significava que eu ainda tinha meia hora de sono até meu despertador tocar.
Desgraçada. Eu iria matá-la.
Ainda sentada na cama, esfreguei os olhos e disquei o número de minha melhor amiga de volta.
— São seis e meia da manhã, Juliana. Eu espero que seja algo muito importante, caso contrário, já pode ir pensando em quais serão suas últimas palavras.
— Olá, melhor amiga do mundo, bom dia! Como você está? Eu estou bem também, muito obrigada por perguntar! — seu tom era irônico. — Desculpe atrapalhar o sono de Vossa Majestade, mas acontece que eu tive um pesadelo horrível com você e liguei para saber se está tudo bem. Como foi a conversa com o Matthebyl ontem?
— Matthebyl? — perguntei.
— Mistura de Matthew e Chernobyl.
Foi impossível segurar o riso.
— Não foi nada amigável, CheeChee. Eu abri o jogo e ele me disse que era stress, e que eu estava sobrecarregada por ser a reta final do casamento. Por isso estou me sentindo dessa forma, tão... desanimada. Depois do discurso de autoajuda ele tentou transar comigo, mas eu não estava no clima e acabamos discutindo de novo. Dormi sozinha e acordei agora com você me ligando.
— Meu Deus, Chancho! O que foi que você viu nesse cara?
— Eu também não sei...
[...]
Depois de mais alguns minutos com Juliana no telefone, despertei totalmente. Não iria conseguir voltar a dormir, afinal já não havia tempo para isso.
Fui até o banheiro e resolvi tomar um banho. Estava adiantada, então me permiti ficar mais tempo debaixo d'água.
Quando saí, abri meu guarda-roupas e o fitei por um tempo, observando as roupas organizadas por cor.
O que vestir para o primeiro dia no emprego novo?
Optei por algo básico. Uma camisa branca com um suéter preto por cima, uma calça jeans clarinha com as barras dobradas e nos pés, meu all star branco.
Agradeci mentalmente a todos os deuses cabeleireiros por permitirem que meu cabelo ficasse decente ao menos uma vez na vida. Deixei-o solto, com os cachos escorrendo livres pelas minhas costas.
Quase não passei maquiagem. Apenas o básico: base, lápis e rímel. E um pouco de batom, claro.
Peguei meu celular para checar o horário.
08:00.
Ótimo. Ainda tinha uma hora até me encontrar com Ludmilla.
Fui até a sala e procurei pelo molho de chaves do meu carro, encontrando-o sob a mesa de jantar.
Olhei-me mais uma vez no espelho antes de ir para a garagem do prédio.
Iria fazer uma parada antes de ir para a loja de vestidos.
[...]
Estacionei em frente a loja e olhei para o horário no painel do carro. Faltavam 5 minutos para as nove.
Pontual.
Peguei o suporte de copos junto com o pequeno pacote que havia deixado no banco do passageiro e saí para trancar o carro.
Teria funcionado se eu não fosse atrapalhada a ponto de quase derramar o café dos copos em minha roupa.
— Você precisa de ajuda? — a voz rouca soou próxima a mim.
Virei lentamente meu rosto apenas para confirmar a quem pertencia aquela voz.
Ludmilla.
Sorri automaticamente e ela fez o mesmo. Suas mãos ágeis pegaram os copos que antes estavam em meus braços. Tranquei o carro e virei-me para ela.
— Trouxe nosso café da manhã. Era pra ser surpresa, mas você acabou descobrindo antes, então... Surpresa! — sorri sem graça.
— Você é adorável, Brunna. — ela me encarava. — Vamos entrar? Tenho algumas coisas para te mostrar.
— Vamos sim, a senhora primeiro. — fiz um gesto com as mãos indicando para que ela fosse em minha frente.
Ao invés de subir os degraus e entrar na loja, Ludmilla parou de frente para mim.
— Senhora? Me acha velha, Brunna? — seu semblante era sério.
— Não, senhora... Digo, Ludmilla! Eu só quis ser gentil e deixá-la ir na frente para mostrar-me o caminho e...
Parei de falar quando percebi que ela estava... rindo?
— Estou apenas brincando, Brunna. — ela tentava controlar o riso — Vamos combinar uma coisa: sei que sou sua chefe, mas apesar disso não quero que me trate como se estivéssemos em uma hierarquia, ok? Pode me chamar de Ludmilla. Só não me chame de Oliveira, não gosto muito do meu segundo nome.
— Combinado então, Oliveira. — prendi o riso.
Ela me encarou estreitando os olhos enquanto subíamos os degraus que levavam à loja.
[...]
Ludmilla me levou até uma sala no terceiro andar, que julguei ser sua pelas iniciais fixadas na porta.
— Fique a vontade, Brunna. Podemos tomar café aqui, enquanto isso conversamos sobre o que faremos hoje.
— Antes disso... — deixei o pequeno pacote que tinha em mãos em cima de sua mesa — Espero que goste. Trouxe pra você.
Ela abriu o pacote e sorriu quando percebeu do que se tratava.
— Não acredito que você comprou brubs's pra mim. — ela me encarou. — Está tentando conquistar sua chefe pelo estômago?
— Tenho que ter uma carta na manga caso não goste das minhas fotos, não é?
Rimos juntas.
— Bom, o que vamos fazer hoje é muito simples: quero que me fotografe. — ela me olhava tranquilamente.
Arregalei os olhos. Não pensei que essa seria minha primeira tarefa.
— Muito bem. E como vai funcionar o ensaio? Algum pedido em especial? — falei, procurando não demonstrar meu nervosismo.
— Pretendo escolher a capa para a revista que mencionei ontem, se lembra?
— Me lembro sim.
— Pois bem, iremos fotografar com o objetivo de definir qual será a foto de capa. Acha que consegue? — ela arqueou uma sobrancelha e sorriu de lado.
— Não só acho, como tenho certeza. — devolvi no mesmo tom, encarando-a.
É... O dia de hoje seria longo.
[...]
No terceiro e último andar da loja ficavam apenas a sala de Ludmilla e o estúdio onde eu iria trabalhar na maior parte do tempo.
Ele era enorme!
Havia um camarim com banheiro, para melhor comodidade das modelos, junto de um espaço com cadeiras e mesas, onde o trabalho pós-ensaio era feito. Também havia uma parede cheia de equipamentos fotográficos de última geração: câmeras, flashes, lentes, filtros, tripés e claro, todo o maquinário de iluminação profissional.
Ludmilla me deixou livre para escolher com qual material iria trabalhar e confesso que eu estava confusa diante de toda a riqueza de conteúdo, mas procurei pegar aquilo que eu já estava familiarizada, afinal, apesar da qualidade dos materiais que eu tinha em mãos, meu objetivo era surpreendê-la com a forma cujo a qual eu vejo o mundo.
Com o meu talento.
Preparei todo o cenário e iluminação do local: um fundo branco, clássico, com um alto banco preto no centro do plano, onde Ludmilla iria se sentar. Deixei os quatro holofotes configurados em posições diferentes, para que a luz ficasse do jeito que eu queria. Escolhi uma das milhares de câmeras disponíveis e liguei o computador, para auxiliar no processo pós-ensaio.
Se tem uma coisa que Juliana me ensinou em todos esses anos trabalhando juntas, é que tudo fica melhor com música. Por isso, abri também no computador, minha playlist preferida, e a música logo se espalhou por todo o ambiente daquela sala.
(Inicie: Gorgeous - Taylor Swift)
Estava sentada olhando para a tela do computador quando Ludmilla saiu do camarim. Virei-me para vê-la e por um momento esqueci como se respirava.
Ela estava linda.
Usava um vestido xadrez de alças finas nas cores vermelho e preto. O quadriculado era pequeno, deixando a peça delicada em seu corpo. Seu cabelo estava solto e alguns pequenos cachos se formavam nas pontas. Nos pés, um coturno preto.
Ela se aproximou de mim. Seu perfume levemente adocicado invadiu-me de uma só vez.
— Você acha que eu devo usar essa jaqueta preta? Fiquei em dúvida se vestia ou não. — ela disse e só então reparei que ela segurava uma jaqueta em suas mãos.
Ludmilla era dona de uma beleza indescritível. Ao vê-la de perto pude notar detalhes que antes ainda não havia reparado: ela usava uma gargantilha trançada em seu pescoço e a maquiagem em seu rosto era natural. Seus olhos estavam em um tom castanho bem clarinho e seu sorriso, alinhado e perfeitamente branco, cobria sua boca.
— Brunna? — a voz rouca me chamou.
Pisquei algumas vezes, recuperando os sentidos e saindo do transe hipnótico que era olhar em seus olhos.
— Perdão, eu... Você está muito bonita. — falei, ainda olhando-a.
— Muito obrigada, Brunna. — ela sorriu. — Mas e então, uso ou não a jaqueta?
— Quando formos fazer as fotos de corpo inteiro você pode colocá-la, mas por enquanto fique sem.
— Sim, senhora.
— Senhora? Me acha velha, Ludmilla? — cruzei os braços, imitando sua ação de mais cedo.
Ela riu.
— Claro que não, boba. Só não pude evitar, desculpe. — ela sorriu. — E então? Podemos começar?
Ignorei o fato de ela ter me chamado de boba e respondi à sua pergunta.
— Podemos. Por favor, sente-se no banco preto no centro. Vou pegar a câmera.
Ludmilla se sentou no banco e cruzou as pernas.
— A propósito, adorei a música. — ela comentou.
— Trabalhar com música é a melhor coisa do mundo. Deixa o ambiente mais descontraído. — aproximei-me dela, com a câmera em mãos.
— Tem razão. Acho que estou um pouco menos nervosa agora. — ela sorriu e eu tirei uma foto. — Brunna!
— Você não é a única, acredite. Mas não precisa ficar nervosa. Sou só eu e uma câmera, relaxa! — tentei tranquilizá-la.
Ela estreitou os olhos em minha direção e logo em seguida começou a fazer algumas poses. Ajustei a câmera em meu rosto e comecei a fotografá-la.
[...]
Após algumas fotos com Ludmilla sentada, pedi para que ela tirasse o banco para começarmos a fotografá-la de pé. Rapidamente, olhei para a câmera e passei por algumas fotos.
Estavam todas perfeitas.
Quando ela voltou para o centro do plano percebi que a alça esquerda do seu vestido havia caído.
Aproximei-me até ficar de frente para ela.
Ludmilla me olhava fixamente. Seus olhos, que antes estavam em um tom claro de castanho, tornaram-se escuros, e sua pupila estava levemente dilatada.
Seu cabelo continuava da mesma forma, exceto por alguns fios que estavam sob seu rosto.
A diferença de altura não era gritante, mas existia.
Estávamos próximas. Muito próximas. Mais do que a barreira invisível de aproximação quando a pessoa não tem uma relação romântica com você permite.
Mas de alguma forma, isso não me incomodava.
O cheiro do meu perfume estava misturando com o dela. A combinação ficou incrivelmente prazerosa de se sentir.
O silêncio tomava conta da enorme sala. Provavelmente minha playlist já havia acabado.
Ludmilla me olhava de uma forma diferente. Não sabia decifrar o que seu olhar queria dizer, mas era intenso.
Desviei meu olhar do rosto de Ludmilla e fitei a alça caída. Levei minha mão esquerda até seu ombro e, delicadamente, puxei-a de volta para o lugar. Meu polegar fez um leve e breve contato com sua pele. Pude ouví-la suspirar.
Voltei a olhar para a mulher parada em minha frente. Os fios continuavam soltos pelo seu rosto.
E como um reflexo, peguei a câmera que estava presa em meu pescoço e aproximei-a do meu rosto, focando em Ludmilla e fotografando-a.
— Ei! Eu não estava pronta! — Ludmilla reclamou.
— Shhhh... — levei meu indicador até minha boca. — Ficou perfeita!
Percebendo que ainda estávamos próximas demais, me afastei, indo em direção ao computador.
O silêncio ensurdecedor continuava a preencher o ambiente.
— Eu vou... — Ludmilla fez um gesto apontando para o camarim. Ela parecia nervosa. — Trocar de roupa.
— Tudo bem. A roupa nova também vai fazer parte do ensaio? — perguntei.
— Não, eu vou colocar a roupa que eu estava usando anteriormente. Acha que temos o suficiente para escolher a capa da revista?
— Acho sim. Vou passar as fotos para o computador enquanto você se troca.
— Ok, então. Eu já volto.
Observei-a entrar pela porta branca e voltei minha atenção para a tela em minha frente.
Meus pensamentos estavam confusos, revivendo o momento anterior a Ludmilla sair correndo para trocar de roupa.
O que havia acabado de acontecer?
Havíamos ficado próximas demais. O suficiente para sentir sua respiração em meu rosto.
E eu incrivelmente não me importava com isso.
Conectei o cartão de memória da máquina no computador e logo as fotos começaram a aparecer. Procurei pela última foto.
A que eu havia tirado perto demais.
A câmera havia pego todos os detalhes possíveis de seu rosto.
Os olhos, donos de uma cor indescritível, que mais pareciam galáxias perdidas que ainda precisavam ser descobertas. A pupila dilatada. As sobrancelhas fortes e perfeitamente desenhadas. A boca coberta com o batom de cor vermelha. O nariz com a pequena argola prateada e por fim, os fios soltos pelo seu rosto.
Não sei por quanto tempo olhei para aquela foto, mas levei um susto quando ouvi a voz de Matthew espalhar como um eco pelo estúdio.
— Brunna, precisamos conversar.
— Matthew? Que susto! O que você está fazendo aqui?
Ele se aproximou de mim. Fiquei de pé para encará-lo.
— Perguntei por você na recepção, me disseram que estaria aqui. Vamos almoçar? — ele sorria.
— Eu estou trabalhando, não posso sair agora. — cruzei os braços. — Além disso, eu não tenho mais nada para falar com você.
— Parece que está tendo um intervalo. — ele olhou ao redor. — Você vai almoçar comigo sim.
Matthew segurou meu braço direito com força.
— Me solta. — falei tentando me livrar do aperto. — Você está me machucando.
— Algum problema? — virei-me em direção a voz.
Era Ludmilla.
— Não, Lud. Está tudo bem. — engoli em seco.
Ela se aproximou. O olhar sério, voltado para Matthew. Percebendo a aproximação da mulher, ele soltou meu braço.
— E quem é essa? — ele me perguntou.
— Ludmilla Oliveira, muito prazer. — ela respondeu a pergunta.
— Ah! Então você é a famosa Ludmilla que gosta de roubar a mulher dos outros.
— Não diria roubar, até porque ela não é um objeto e não pertence a você para ser roubada. — ela me olhou. — Brunna e eu estávamos em uma reunião de negócios ontem a tarde. Pedi desculpas pelo ocorrido e a deixei em casa.
— Entendi. Agora se me dá licença, irei levar a minha noiva para almoçar. — Matthew me encarou. — Te espero no carro, Brunna.
Ele voltou a encarar Ludmilla, medindo-a de cima a baixo e, sem dizer mais nada, saiu.
— Mil desculpas, eu... Ele é um idiota. — falei, virando-me para ela.
— Não se preocupe, Brunna. Está tudo bem.
— Eu passei as fotos para o computador e salvei-as no HD externo também. Você precisa da minha ajuda para escolher?
— Na verdade, preciso. Faço questão que minha equipe esteja ciente de todos os passos de composição e você, como fotógrafa, tem uma visão diferente dos demais. Mas não se preocupe, pode ir almoçar agora, nos falamos mais tarde.
— Tudo bem, então. Mas já aviso que não vai ser um processo fácil. Dei uma olhada em algumas fotos enquanto você trocava de roupa e elas estão maravilhosas.
— Eu não tenho dúvidas disso, tenho a melhor na minha equipe. — ela sorriu. — Me ligue se precisar de alguma coisa.
— Pode deixar. Isso serve pra você também. — retribuí o sorriso. — Tchau, Lud.
Olhei-a sem saber o que fazer.
Um abraço? Um aperto de mão?
Ludmilla se aproximou de mim e cuidadosamente me envolveu em seus braços.
Sentir o cheiro de seu perfume tão de perto me fez perder os sentidos por alguns segundos.
Recobrei a consciência ao sentir um arrepio percorrer por todo meu corpo, devido à sua respiração quente em meu ouvido acompanhada de sua voz:
— Tchau, Brunna.
Fiz meu caminho até a porta de saída do estúdio, mas parei quando ouvi Ludmilla me chamar.
— Brunna?
— Sim? — virei-me para ela.
— Adorei o apelido.
Sorri sem graça, senti minhas bochechas queimarem. Foi algo tão natural tê-la chamado de Lud que só fui me dar conta depois que já havia falado.
— Até mais tarde. — falei e sorri pela última vez antes de virar-me e seguir o caminho até o elevador.
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POV Narrador
Ludmilla estava sozinha no estúdio, que agora parecia ainda maior sem a presença da latina.
Ela caminhou até o computador e notou que uma das fotos preenchia a tela.
Aquela foto.
Sorriu ao perceber que Brunna provavelmente observara a mesma foto que agora estava diante de seus olhos e sorriu ainda mais ao lembrar-se do momento em que aquela fotografia havia sido tirada.
Ela sabia exatamente o que fazer.
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