Capítulo 2 - Run.
BOM DIA MEUS AMORES! Sinto muito pela demora... Não prometo voltar rápido, de qualquer forma.
Espero que se cuidem. Amo vcs..
COMENTEM E CURTAM ESSA PORRA PQ N SOU PALHAÇO..
Bjs do tio Jace
—
— Como tem se sentido? — O loiro alto caminhou devagar até a poltrona ao lado da cama grande e se sentou ali. Os olhos focados na mulher mais velha. Todos sabiam o que estava acontecendo e o porquê estavam ali.
— É difícil… Muito difícil. Passar anos ao lado de alguém e… Isso se quebrar do nada. No começo era como uma punição. Eu acreditava que estava sendo castigada por algum motivo. — A voz embargada e rouca pelos anos, ecoou por todo o quarto.
Todos prestavam extrema atenção. Gostariam de saber o porquê da solicitação.
—
Lauren Jauregui - 20 de Março de 2016 - 16h
Quão deturpada é a visão do feminismo hoje em dia?
Algo que, inicialmente, era para ser uma união em busca de igualdade de gênero - não apenas do feminino e masculino. Um movimento social, político e econômico, que acolheria a diversidade em busca da igualdade. Para que as mulheres - não apenas mulheres cis - deixassem de ser uma vítima aos olhos da sociedade e passassem a ter poder sobre sua própria individualidade e respeito em cargos e trabalhos gerais, que pudessem ser vistas como humanas e não objetos.
Quem pesquisa e decide ir atrás de verdade, entende essa parte e tenta, ao máximo, aplicá-la.
O que eu digo sobre a visão deturpada, são as pessoas que tentam 'militar' dentro de uma rede social, em busca de seguidores e o famoso nome: 'sensato'.
Mas, vejamos que, você dizer algo como "morte ao pênis", "mulher é quem tem vagina" e coisas do tipo, não te torna um sensato, apenas um ignorante. Isso não é estar dentro do movimento. Rebaixar o outro não é estar dentro do movimento.
O caso é: muitas pessoas ainda não aprenderam que, num mundo enorme, exista uma diversidade muito grande. Onde há mulheres com pênis e homens com vagina. Onde há pessoas que não se identificam com os "dois" gêneros, ou os que se identificam tanto com o masculino, quanto com o feminino.
Não é uma coisa de "troca de papéis com os homens", é a igualdade na relação entre os gêneros diversos.
Muitas das pessoas que adoram militar na Internet e abrir a boca para falar coisas assim, são as que não conhecem do assunto e isso se torna piada de uma forma muito rápida.
É irônica a forma com que as pessoas se posicionam na Internet, sendo que, por trás daquilo, elas não se dão o trabalho de fazer uma pesquisa sequer.
Há um mundo lá fora, diferente da nossa realidade. Talvez, nem todos tenham um acesso a isso. Ao mundo diversificado, onde há siglas demais que explicam poucos sentimentos, mas que possam acolher pessoas.
Nós precisamos nomear nossos sentimentos, é necessário para colocarmos em ordem.
E a nomeação e aceitação, talvez seja a mais difícil para alguns e mais fácil para outros. Cada corpo é um, cada pessoa é diferente, ninguém pode explicar o que você sente.
Há também o tipo de comentário como "entendo exatamente o que você quer dizer" ou "sei, passei por algo parecido". Mas, não é. Você não entende. É impossível você entender, de todas as formas, a dor de uma outra pessoa e tudo o que ela sente.
Cada um sente na pele o que dói, cada um sente a própria dor, mas não a do outro. Cada indivíduo - individualmente criado, com crenças individuais e opiniões diferentes - sente a dor de forma diferente.
Talvez, a palavra do outro te lembre muito do que você sinta, mas a dor dele nunca, jamais, será entendida por você e nem por outra pessoa, já que é um sentimento individual.
— Lauren! — Solto a caneta assim que a voz animada da minha melhor amiga soa pelo salão.
Levanto meu olhar e encontro seus castanhos escuros e brilhantes.
— Mani! — Respondi no mesmo tom.
A mulher deu a volta no balcão e parou ao meu lado. Me permiti abraçá-la.
— Está linda. — Assim que separamos nossos corpos, olhei para ela de cima a baixo, conferindo sua roupa elegante.
Uma blusa branca, simples e bonita com fendas nos ombros. Uma calça skinny escura, coladinha em suas coxas firmes. Para finalizar, uma botinha de saltos altos, deixando seu visual completo. Os dedos, empanturrados de anéis dourados. Os braços, cheios de pulseiras, livre de mangas da camiseta. Uma maquiagem leve com um batom vermelho. Seus cabelos cacheados e compridos caíam por seus ombros e costas.
— Não há novidades, garota. — Respondeu divertida, jogando o cabelo para trás, me fazendo rir de seu jeito auto-suficiente.
— Só gosto de lembrar. O óbvio precisa ser dito. — Entrei em sua brincadeira, mordendo o lábio inferior e levantando as sobrancelhas.
Seu sorriso malicioso e a piscadela galanteadora foram o fim.
— Troca de turnos, Laur. Vaza daqui, vai dormir. — Seu tapinha no meu antebraço me fez sorrir.
Normani se preocupava demasiadamente comigo. Ela sempre era cúmplice de minhas queixas pela falta de sono.
— Há uma nova recepcionista. Meu avô contratou, disse que ela começará amanhã. — Informei ao fechar meu diário e colocá-lo dentro da mochila.
— É mesmo? — Minha melhor amiga pergunta, colocando seu celular em cima do balcão e girando o corpo para me olhar.
Conferi todos os bolsos de minha mochila para ter certeza que não estava esquecendo nada.
— Amanhã mesmo já iniciamos o teste dela. Caso tudo dê certo, terça ela já pode iniciar o turno. — Coloquei a alça escura sobre o ombro. Em minhas costas, o peso da bolsa já dava sinais. Decidi colocar a outra alça, eu não estava afim de ter dores na coluna em pleno Domingo.
— Tudo bem, nos falamos depois? — Mani se aproximou e segurou minhas mãos. Olhei para seu rosto e sorri. Sua pele brilhava e eu conseguia sentir o cheiro do seu creme, morango, tão doce quanto a fruta.
— Claro. Vai passar na casa da Ally mais tarde? — Seus olhos brilhavam tanto que eu podia ver estrelas ali.
— Sim, vamos pedir pizza? — Concordei com a cabeça e me aproximei para deixar um beijo casto sobre sua testa.
— Vamos, Mani. Te vejo mais tarde, tudo bem? Qualquer coisa, me liga. — Falei com a habitual preocupação que ocupava minha mente. Normani é muito cuidadosa e sempre está ligada nas coisas, mas é sempre um reforço, nós podemos resolver muitas coisas juntas.
— Ligo sim, pudim de leite. Agora, saia do meu horário ou eu te jogo na rua. — Ela falou com seu habitual tom de brincadeira. Ri alto quando senti seu beliscão em minha bochecha.
—
— Ally, o que acha de me dar uns beijos? — Assim que abri a porta da casa da mais baixa, entrei sorrateiramente e a encontrei na cozinha, pegando um copo d'água.
— Deus me livre! — Ela exclama alto com o susto e eu gargalho. — Eu tenho que me lembrar de tirar a chave de você, mulher. Não aguento mais, todo dia isso. — Sua reclamação saiu abafada pelo copo de vidro.
— Você me ama demais , Ally Brooke. — Me aproximei e puxei seu pequeno corpo contra o meu, prendendo-a em um abraço forte.
— Saia daqui, sua brutamontes. — Sinto um beliscão no braço e apertei mais nosso abraço, sorrindo para o vento. Era bom ter Ally, era como estar em casa. Seu sorriso era meu maior conforto.
— Só se me der uns beijinhos. — Cheirei seus cabelos e aproximei meu rosto, fazendo meu nariz escorregar pela bochecha lisa e macia de minha melhor amiga.
— Nem em outra vida! Já passei dessa fase de te pegar, Lauren. — Suas mãos pequenas empurram meus ombros para longe e eu ri mais uma vez.
— Um dia você vai largar o Will e ficar comigo de novo, Ally! — Falei alto e em tom de brincadeira.
— Com certeza, todo dia ela fala que vai me largar por você, Laur. — Sorri mais ao escutar a voz do homem atrás de mim.
Me virei e encontrei Will Bracey com um sorriso brincalhão nos lábios. Seu moletom escuro cobria seu tronco forte. Me joguei em um abraço forte e fui muito bem recebida.
— Quanto tempo, Will! — Exclamei com saudades e ouvi um resmungo de Ally. A gargalhada de Will me encheu de felicidade.
— É bom te ver novamente, Lauren. — A voz de Will saiu abafada, seus lábios contra meus cabelos no topo da cabeça, seus braços sobre meus ombros e seu peito subindo e descendo.
— Chega de se pegarem. Lauren chega aqui e quer pegar todo mundo, credo. — O tapa que Ally desferiu em meu braço fez um som estrondoso, mas nada demais.
Gargalhei com sua atitude e me afastei de Will Bracey.
— Você é ciumenta demais, Brooke. Deus me salve. — Dramatizei e olhei para Ally, seus olhos revirando e sua língua estendida em minha direção foi o motivo para minha gargalhada.
— A Normani vem hoje? — Will perguntou, empurrando meu ombro com o seu próprio, me fazendo olhar para ele.
— Sim, ela disse para nós pedirmos pizza. — Respondi caminhando até o grande armário e abrindo sem muito pesar. Eu já era de casa mesmo.
— Mal educada. — Ouvi Ally resmungar e ri baixinho.
— Tudo bem. Você sabe que o aniversário dela tá chegando e a gente sequer preparou algo, né? — Will lembrou, me fazendo parar de procurar algo para comer e olhar para um dos potes no armário.
— Sim, mas as coisas no Motel estão tão apertadas. A gente mal tá conseguindo lidar. A quebra do contrato com a empresa foi uma das piores coisas, apesar de que eles quase não ajudavam, pelo menos eu tinha duas folgas por semana e Normani também. Agora só estamos nós duas, eu quase não consigo pensar na minha vida direito, mas nós vamos ajeitar as coisas o mais rápido possível, não podemos deixar Normani sem aniversário. — Divaguei, ainda olhando para o pote no armário.
Ally suspirou e eu a olhei.
— Eu queria poder ajudar, mas eu não conheço alguém com contatos com empresas que forneçam funcionários bem treinados em relação a limpeza e administração. — Ela disse baixinho. Dei de ombros e voltei a olhar para o armário.
— Eu tenho um conhecido que já trabalhou em uma empresa assim. Se não me engano, eles tinham que ter concluído em administração e já ter trabalhado na área, só podem ser contratados aqueles que têm o curso completo. — Will falou e eu peguei uma caixa de cereal e fechei o armário.
— Você sabe se ele ainda tem contato com a empresa? Eu só preciso de um tempo a mais pra mim, cara, isso é cansativo. — Respirei fundo e peguei uma tigela na prateleira em cima da pia, despejando o cereal por ali para poder comer com calma.
— Na real, Laur, eu nem sei. Faz um tempão que eu não tenho contato com ele, depois que ele casou, se tornou muito fechado, até saiu do nosso grupo de amigos. Mas eu posso tentar contatar ele pra ver se consigo o contato da empresa. — Os braços fortes cruzados e o olhar em mim me fez continuar o olhando.
— Eu ficaria muito grata se você pudesse fazer isso por mim, Will. Normani e eu andamos muito cansadas e tenho certeza que é por conta do trabalho. A demanda é muito alta, às vezes. Quase não conseguimos acompanhar direito. — Suspirei cansada e levei uma colherada de cereal até a boca.
— Farei o possível pra ajudar vocês, Laur. — Will me sorriu um sorriso bonito, aqueles que fazem com que seu dia melhore apenas em recebê-lo. .
—
— Okay! Vocês não estão entendendo? — Perguntei, esquivando meu olhar da planilha à frente para encarar os pares de olhos em minha direção.
Dois olhos num verde escuro e dois castanhos chocolates. Cada um mais lindo que o outro, me fazendo respirar fundo.
— O horário está confuso, Lauren, Você precisa explicar isso com clareza. Temos que ter ordem por aqui. — Normani falou, se afastando da mesa, ainda me olhando. Os braços abaixo dos seios e a coluna ereta, um charme a mais em toda a beleza que seu corpo esplendoroso possuía.
— Estou tentando fazer isso, okay? — Respirei fundo e olhei para baixo. A planilha está sobre a mesa. O papel branco fazia um belo contraste contra a madeira marrom escuro. — Preciso de outro papel, já venho. — Me levantei, largando o lápis sobre a mesa. A frustração invadiu meu corpo, eu estava fodida.
Abaixei a cabeça e caminhei para fora da cozinha, empurrando a porta leve, dando de cara com o balcão da recepção.
Olhei para os lados e abaixei a cabeça novamente, encarando minha mochila.
Me perguntei se havia mais papéis ali ou no armário.
— Laura, querida! — Ouvi a voz arranhada pelo tempo e levantei a cabeça rapidamente, sorrindo ao ver Astrid.
— Ei, vovó As! Bom dia. — Cumprimentei.
Astrid era uma velha senhora que morava no Motel há séculos.
Ela conheceu meu avô, meu pai e agora, a mim.
O que era estranho, já que essa mulher, desde que eu era uma pequena garotinha, tinha a mesma aparência. Nunca mudava.
Seu apelido, vovó As, era derivado de sua idade e nossa aproximação.
Toda manhã ela aparecia por ali, cumprimentando a todos, e de noite, fazia o mesmo. Nas tardes ensolaradas, ía fazer crochê e jogar bingo com suas amigas.
Astrid tinha os cabelos escuros, cacheados, mas em pouquíssimas quantidades. Sua pele negra era tão linda e bem cuidada, algumas pintinhas em seu rosto e pescoço lhe davam um charme. Suas unhas estavam sempre pintadas de vermelho sangue. Apesar da idade, Astrid amava estar sempre bonita, arrumada e preparada para ser chamada para sair.
— Filha, me diz uma coisa. Tem alguma carta para mim? — Perguntou, apoiando o antebraço sobre o balcão. Olhei para trás, onde ficava o depósito de cartas de cada quarto e procurei pelo número certo.
Virei meu rosto para frente e abaixei o olhar.
— Olha, vovó As… Hoje é seu dia de sorte! — Falei animada, puxando a carta com envelope amarelo.
Seu sorriso foi gigantesco, me fazendo sorrir junto.
— Obrigada, filha! Estou tão animada… Pedro me convidou para sair, vou ao cabelereiro esta tarde, para de noite, irmos ao restaurante mais bonito de Miami! — Exclamou sonhadora.
Meu coração apertou de felicidade. Astrid era uma mulher brilhante, tão sonhadora. Aquele tipo de pessoa que te dá a esperança de que as pessoas podem ser melhores. Que tudo tem um lado bom… Que tudo pode ter um lado bom. E eu me sentia demasiadamente feliz e bem perto dela.
— Não se esqueça de mim quando casarem, As. — Falei num falso tom mimado, fazendo um biquinho e cruzando os braços.
— Você vai me ver todos os dias, pestinha. — Afirmou, tentando me puxar para dar um beijo em minha bochecha.
Me debrucei sobre o balcão e senti seus lábios em minha pele.
— Até mais tarde, vovó. — Falei sorrindo, vendo seu corpo se afastar.
Contagiada com a alegria de Astrid, voltei a procurar o papel com mais calma.
Assim que achei, me encaminhei até onde Normani e Ashley estavam
— Okay, vamos ver. — Fiz uma linha sobre a folha em branco. Ali seria a separação de horários de nós três.
Ashley era a mais nova empregada da casa, conseguimos contratá-la devido a uma amiga próxima de Normani. Mas ainda esperava uma resposta de Will, o que talvez fosse demorar mais do que eu imaginava… De qualquer forma, ter uma funcionária a mais já nos dava uma certa liberdade dentro do Motel.
Consegui, com maior clareza, explicar os horários de cada uma de nós. Talvez eu precisasse de ânimo pra conseguir lidar com esses dias turbulentos, e Astrid me deu exatamente aquilo que me faltava.
Consegui até me sentar para descansar após explicar todos os horários e o funcionamento do Motel, o que também era um grande privilégio dentro de um dia agitado.
—
— Boa noite, querida. — Os cabelos sedosos balançaram quando ela se moveu para me olhar.
— Boa noite, senhor e senhora. — Cumprimentei sorrindo.
— Quarto presidencial, por favor. — O homem falou, sem cumprimento, sem nada, mas seu olhar pesando sobre meus olhos e busto deixavam claro suas más intenções.
— Documentos, por favor. — Solicitei da mesma forma.
Os dois se mexeram e pegaram seus documentos, me estendendo eles por cima do balcão.
— Aqui tem muito movimento? — A mulher perguntou, me encarando com seus olhos sóbrios. A coloração castanha era tão brilhante, eu podia enxergar a esperança dentro de seus olhos.
— Bastante, na verdade. Mas, a maioria das pessoas são hóspedes permanentes. Na parte esquerda o movimento é muito maior. — Respondi e ela assentiu, colocando o dedo indicador no queixo e analisando algo atrás de mim.
— Foi construído há muito tempo? Parece uma estrutura antiga. — Voltou seus olhos para mim.
— Camila, chega. — O marido falou, encarando a mulher com repreensão antes mesmo que eu pudesse dizer algo.
Não falei nada, apenas abaixei a cabeça e continuei terminando as coisas para o casal.
Pela visão periférica, percebi que os olhos castanhos estavam sobre o chão, as bochechas avermelhadas pela repreensão incompreensível do marido. Eu me sentiria enojada numa situação dessas se estivesse no lugar dela.
Não é como se eu permitisse que alguém me repreendesse por nada, inclusive na frente de outras pessoas.
Estar no cúmulo do ridículo é se imaginar acima de alguém, como se tivesse autoridade.
Nem a hierarquia familiar me agradava, o respeito deve vir com uma mutualidade dividida, não importa o grau de parentesco. Claro que, quando mais nova, eu não conseguia negar algo ou demonstrar minha irritação e desconforto em uma situação de desrespeito familiar. Aos homens e mulheres, tios e tias, sobrinhos e além, que usam seu grau de parentesco contra alguém para se impor.
Hoje em dia, eu sabia que poderia falar. Eu posso dar voz a quem eu sou.
— Aqui. — Estendi a chave do quarto para eles, junto dos documentos que eles tinham me entregado. — Caso ocorra algum problema, há um interfone acima da cômoda, apertando o número um, a ligação cairá diretamente para a recepção. Caso precisem de algo e eu não estiver, Normani ou Ashley estarão a disposição. — Falei cordialmente, sorrindo genuinamente para os dois.
— Obrigada, Lauren. — Camila respondeu me olhando.
Sem querer, quando a mulher virou o corpo para sair de perto do balcão, percebi seu perfil. Talvez seu nariz levemente empinado e seus lábios carnudos devessem me chamar tanta atenção, mas algo a mais me fez quase saltar. Uma lesão leve e avermelhada, como batom espalhado diversas vezes até quase sumir a cor, brilhava em sua bochecha.
Obviamente não era algo bom.
Camila estava, em seu perfil, carregando uma leve contusão de algo que eu não sabia o que era, mas adoraria perguntar.
Poderia ser do mais banal possível, como uma leve batida na porta do closet - claro que se alguém além de mim tenha a capacidade de concluir tal proeza -, mas poderia ser algo pior, coisa que eu prefiro não imaginar.
Ergui as sobrancelhas quando percebi que fui pega no flagra observando o perfil.
Ou melhor, aquela maldita mancha de lesão corporal que enfeitava seu rosto.
Seus olhos castanhos passearam por cada detalhe em mim, acredito que ela tenha marcado em sua mente como meu rosto era. Seus olhos se abaixaram, não para meu corpo, mas para o diário acima do balcão.
Ela estava reparando.
Claro que não da mesma forma que eu. Mas eu estava ali, diante de seus olhos, sendo observada com minuciosidade. Seu olhar acariciava minha pele, deixando um rastro avermelhado em minhas bochechas, diferentes de sua lesão, claro.
— Boa noite. — Eu mesma não sabia se havia sido um sussurro ou se as palavras tinham realmente saído.
Seus dedos subiram levemente. A pontinha de cada um deles, menos a do mindinho, tocou a vermelhidão em sua face.
Sua careta me deixou claro que aquilo não era batom.
Continuei com os olhos presos nela. Não era um flerte, eu estava hipnotizada.
Talvez pela forma que Camila, mesmo com a vermelhidão tomando conta de uma pequena parte em seu belo rosto, continuava linda. Brilhante como o sol.
Sua pele era tão bonita, me lembrava ouro. Do mais puro e fino, ouro.
Quando meus olhos escorregaram até o homem alto, percebi ali uma incógnita.
Talvez pelo vinco em sua testa. Ou pelo olhar perdido em mim. Algo me dizia que ele tentava me entender, mesmo que sorrateiramente.
Não consegui sorrir desta vez, o que deve ter sido deselegante.
Mas, nenhum dos dois sorriram, o que era um acalento a minha mais nova face séria.
Com outra piscadela, Matthew apoiou a mão sobre o ombro de Camila, guiando a mulher até a extrema esquerda.
A curiosidade que invadia meu corpo não me deixou descansar, não me deixou perceber que eu encarava, fixamente, o rosto da mulher. Com a deselegância do gesto ao ser pegada, novamente no flagra, desvencilhei meus olhos até ouvir o som do elevador se fechando, indicando que eu estava sozinha novamente.
A respiração áspera que saiu de meus pulmões, me fez perceber que prendi ela por todo o percurso em que os saltos batiam no chão, fazendo um som oco e elegante.
Passei a palma das mãos sobre os olhos, eu estava cansada demais.
Escovei os cabelos para trás, meus dedos alisando as mechas.
Quando percebi que meu corpo todo estava tenso, fui atrás da minha garrafa de água.
O líquido gelado fez meus ombros baixarem instantaneamente.
Era tangível a sensação do incômodo ao ver aquela pequena lesão em alguém que eu nem conhecia. Chegava a ser incabível.
Tomei toda água de dentro da garrafinha e respirei fundo.
—
— Alô. — Atendi o telefone, segurando o copo de suco em uma das mãos.
— Oi, Laur. — A voz saiu mansa e manhosa. Revirei os olhos com irritação.
— O que quer? — Sentei na cama com cuidado, não queria derramar todo o suco sobre mim.
— Eu… Estou com saudades. — Falou baixinho com a voz infantil, aquela mesma que, por um tempo, era meu maior ponto fraco.
— E? — Perguntei com descaso.
— Ah, qual é, Lauren? — A irritação na voz macia era palpável.
— Olha, Alexa, você mesma que me dispensou. Se me lembro bem, você disse que havia encontrado alguém melhor, então, pare de me ligar todos os dias, porque eu não sou palhaça, licença. — Falei mais alto do que o normal, desligando a ligação antes que ela pudesse pensar em me responder.
— Fui eu que criei! — Ally exclamou ao meu lado. Revirei os olhos.
Alexa me tirava todas as boas energias. Essa mulher me infernizou a vida da pior forma possível e se acha no direito de vir atrás de mim como se estivesse tudo bem.
— Você tem que bloquear o número dela, Lorena. — Will falou, beijando o topo da cabeça de Ally.
— Eu concordo. De quem estão falando? — Normani perguntou, voltando do banheiro.
— De você. — Respondi séria.
— Meu amor, você não conseguiria viver um dia sem mim, nem vem com esses papos estranhos. — Se jogou ao meu lado, passando um dos braços por meus ombros, me puxando para mais perto.
Abracei sua cintura de lado e busquei o controle com a outra mão.
— Iludida. — Sussurrei manhosa.
Ela gargalhou alto, minha risada foi incontida.
Me aproximei e deixei um selinho sobre sua bochecha.
— Amo você. — Falei perto da orelha de Normani, que virou o rosto e sorriu para mim, sussurrando o mesmo.
—
— Filha, está tudo bem? — Ouço a voz grossa e rouca do meu pai.
Levantei o olhar e encarei seus olhos claros que brilhavam em minha direção.
— Sim, por que? — Franzi o cenho. Tomei mais alguns goles de suco de laranja e olhei para ele por cima do copo.
— Parece aérea, fiquei preocupado. Tem certeza que está bem? — Levantei as sobrancelhas e tentei entender o que havia acontecido.
— Eu acho que tá tudo bem, pai. — Toquei meu cenho e arrumei os cabelos.
Me lembrei de mais cedo. O incômodo de ver aquela pequena lesão em um rosto tão bonito. Camila parecia tão vaidosa, aquela mancha era uma incógnita suja em seu rosto.
— Tudo bem. Como foi o trabalho? — Se sentou ao meu lado, me tirando dos devaneios invasivos e desalinhados.
— Foi cansativo, mas bom. Astrid está cada dia mais animada, Pedro a convidou para sair e ela está animada como nunca. Amanhã pergunto como foi. — Puxo um pirulito do bolso e coloco na boca após tirar do saquinho.
— Astrid é sempre tão animada, vou fazer uma visita a ela. — Meu pai observou, colocando a mão sobre o queixo e bagunçando a barba.
Sorri e concordei com a cabeça.
Eu estava tão cansada que nem me dei o trabalho de dar boa noite para o meu pai, apenas levantei e fui para o quarto. Da mesma forma que me joguei na cama, dormi.
— 25 de Março de 2016 - 14h
Minha cabeça estava estourando de dor.
Resmunguei alto. Meu corpo mole se recusava a largar a maciez da poltrona ao lado do sofá.
— Lauren, pelo amor de Deus, vai comprar um remédio. — Ouvi Ally falar de forma preocupada.
Suas mãos fofas tocaram meus ombros, uma massagem leve na pele tensa, o músculo empurrando minha epiderme. A pulsação que parecia incomodar todo o meu corpo, se concentrava em minha cabeça.
— Eu não quero. — Resmunguei de forma manhosa, encostando a cabeça contra o encosto de couro.
— É sério, Laur. Eu não posso ir, se não, eu obviamente iria. — Ally falou, dessa vez, tocando meus cabelos.
— Ahh! — Gemi alto. — Eu odeio isso. — Reclamei levantando da poltrona.
Me joguei nos braços de Ally assim que dei a volta no móvel.
— Se acalma, bonitona, vai melhorar logo que você tomar o remédio. Agora vai lá. — Ela tocou meu braço, me levando até a porta.
Quis chorar quando o sol bateu em meus olhos, aumentando desproporcionalmente a minha dor.
Grunhi baixinho e andei devagar pela rua.
O caminho parecia muito mais longo, enquanto em um dia normal, eu pensaria ser mais perto.
Agradeci aos deuses e outros seres superiores assim que coloquei meus pés na entrada da farmácia.
Meus olhos reclamaram pela branquitude do lugar, mas ignorei.
Caminhei devagar até uma prateleira qualquer, procurando algum remédio, seja ele qual fosse, apenas para que a minha dor amenizasse.
Uma prateleira de absorventes, outra de camisinhas e nada de remédios.
Bufei e me virei rapidamente, me arrependendo em seguida por dois motivos. O primeiro era o fato de ter virado tão bruscamente que meu cérebro pareceu dar um giro de 360 graus.
O segundo motivo foi o choque tão forte contra um corpo.
Eu apenas parei e me agarrei na primeira coisa que meu corpo poderia alcançar, o que, graças ao bem da humanidade, era uma prateleira.
— Porra… — Xinguei, sentindo o pulsar na minha testa. Tão irritante que eu me sentia medíocre.
— Me desculpa… Eu não- Lauren? — A voz macia me fez abrir os olhos levemente.
Olhei para frente e me deparei com olhos castanhos enormes voltados para mim.
— Oi! Você está bem? — Se aproximou devagar, me olhando curiosamente.
Demorei a associar tudo a minha volta. Balancei a cabeça e fechei os olhos com força, tocando minha testa com a ponta dos dedos indicador e médio.
— Ei, eu te machuquei? — Se aproximou mais.
Neguei com a cabeça e respirei fundo, tentando fazer aquela dor infernal me largar. Coisa que parecia não funcionar direito.
— Eu só… — Respirei fundo de novo e abri os olhos. — Eu só estou com dor, mas faz tempo. — Sorri fraco e me senti menos tensa quando consegui manter os olhos abertos para vê-la normalmente.
— Onde? Eu te machuquei? Me desculpa, Lauren, não foi a intenção. Eu nem ao menos tinha te visto, me desculpa. — Falou afobada, afastando um passo. Os olhos arregalados e as mãos levantadas, como se a qualquer momento ela precisasse se defender.
Franzi o cenho com a atitude da mulher.
— Tá tudo bem, Camila, não me machucou. Eu estou apenas com dor de cabeça, mas faz tempo. — Tento soar o mais paciente e simpática possível.
Os olhos brilhando de preocupação com uma ameaça inexistente. Pelo menos era o que eu pensava.
— Me desculpa. — Dessa vez, sussurrou fraco. Os olhos ainda perdidos.
A encarei sem dizer nada. Tombei a cabeça para o lado e observei seus olhos. O puro horror corroía algo dentro de si, mas era inalcançável.
— Lauren…? — Me chamou, parecendo tímida com meu olhar sobre si.
Não respondi nada, fingi que nem ouvi, apenas continuei encarando.
— Eu… Ahn… — Ela parecia extremamente sem graça agora, mas o medo havia esvaído de seus olhos.
Minha única intenção era essa.
— Está tudo bem. — Repeti com calma para que ela entendesse que era verdade.
Sem graça e não mais assustada, a mulher concordou com a cabeça e eu fiz o mesmo, soltando um sorriso simpático.
— Tudo bem. — Ela falou mais calma.
Suas mãos e ombros relaxaram e seu rosto, aos poucos, voltou a coloração normal.
— Então… Eu vou… — Iniciou, apontando o dedo polegar para trás, para outro corredor de remédios.
— Oh! Claro. Foi bom te ver, Camila. — Continuei sorrindo.
Acenando com a cabeça, Camila se afastou, entrando em outro corredor, enquanto eu não conseguia tirar meus olhos dela.
Mas, em um vislumbre rápido, a observei voltar para perto de mim.
— Eu… Você precisa de ajuda? — Perguntou baixinho, com a voz tão tímida e até mais fina. Seus ombros se apertavam contra seu pescoço e seus olhos perdidos por qualquer lugar que não fosse meu rosto.
A encarei por alguns segundos antes de associar sua pergunta.
— Ahn… Acho que não, mas obrigada por perguntar. — Respondi meio perdida, eu realmente não entendia o que ela queria dizer com aquilo.
Eu parecia tão mal assim?
Suas sobrancelhas vincaram, mas apenas um aceno de cabeça foi levado em minha direção.
Observei novamente seu rosto e não havia nenhum sinal de qualquer contusão ali.
De alguma forma, parecia apenas natural, assim como a outra face, que se demonstrava em uma coloração natural com todo o resto de sua pele.
Não havia machucado algum em sua face.
Suspirei baixinho e nem percebi que observava a pele bronzeada.
Os cabelos castanhos caíam em cascatas divinas sobre seus ombros baixos. Sua jaqueta jeans aberta combinava com a blusa branca sobre seu busto. A calça preta e apertada em suas pernas não muito longas e sapatos baixos em seus pés.
De alguma forma, Camila chamava atenção, isso era óbvio. Sua beleza era admirável. Era impossível passar pela mulher e não reparar em seu cheiro ou na forma com que seus cabelos se moviam.
Quando seu queixo abaixou levemente e um sorriso sem graça tomou conta de seus lábios, percebi que estava indo muito além de uma análise simples e qualquer.
Porém, eu não conseguia parar. Não era como se eu estivesse presa ali, mas meus olhos se sentiam completamente atraídos por cada pequeno detalhe em sua face tão extraordinariamente notável.
Talvez fossem as sobrancelhas bem feitas, quase que completamente alinhadas, pareciam escuras o suficiente para serem notadas, mas não de uma forma exagerada. Ou seu queixo bem feito e forte, o maxilar marcado e sua maçã do rosto tão fina e delicada. Ou, quem sabe, seus olhos baixos e grandes, que deixavam em evidência aquelas duas bolas magníficas em um castanho tão marcante, que combinava com toda e qualquer parte em vista de si.
Camila era realmente bonita, isso era mais do que óbvio.
Quando voltei meus olhos àqueles lindos castanhos, percebi que ela me observava também, mas de uma forma um pouco mais contida.
Talvez eu não tivesse percebido quão imparcial eu poderia ser em uma análise tão minuciosa com meus olhos. A intensidade que eu poderia deixar em evidência para qualquer ser que me interessasse minimamente.
Talvez aquele rosto tão atípico e único tivesse me feito viajar novamente em minha grosseira intensidade.
Suas bochechas tomaram um tom rosado e percebi os olhos levemente arregalados.
Suas duas bolas castanhas se voltaram para o chão, me tirando toda aquela visão detalhada dos dois inexpressivos, mas que eram lúcidos o suficiente para me dar a certeza de que existia esperança dentro daquela mulher.
Mesmo não sabendo onde, do que e por quê.
— Você é bastante bonita. — Observei baixinho, apenas para deixar claro que eu realmente estava analisando-a.
Não que houvesse alguma forma de contradizer, já que parecia minutos além do esperado.
Minutos quais eu usei observando cada detalhe, mas que eu ainda não entendia, que não pareciam suficientes.
— Eu… Ahn… Obrigada. — Sua respiração atrapalhada em meio a frase cortada me deu indícios de que talvez ela não conhecesse muitos elogios.
Isso era intrigante.
— É… Eu realmente preciso ir agora, mas foi bom te ver, Lauren. — Os olhos castanhos não paravam em mim em nenhum momento.
Será que ela estava constrangida com a minha presença?
Eu parecia louca demais por ficar a olhando?
Talvez ela estivesse incomodada…
Certo, eu deveria aprender a ser sútil, muito mais sútil.
Mas eu realmente não havia conseguido deixar passar. Alguma coisa naquela pele bronzeada e conjuntos de extremos castanhos me deixava intrigada e eu nem sabia de qual forma.
Talvez fosse uma beleza marcante. Camila era realmente memorável, seus traços fortes, ao mesmo tempo sutis, deixavam seu rosto mais delicado ainda. Era um conjunto de peças que tornava o quebra-cabeça completo, muito bem feito, eu diria. Ela parecia uma mistura sensata de algo muito bem feito, daquelas que são feitas com calma e carinho, que tem a ênfase enorme do amor, aquele toque de cuidado, quase como uma porcelana em um penhasco. Tão delicada quanto.
Chacoalhei a cabeça em positivo e a olhei sorrir fracamente com aqueles lábios carnudos e avermelhados, os dentes brancos e bem alinhados que deixavam um ar façonheiro.
Era linda.
— É, tudo bem, Camila. Foi bom te ver, mesmo. E obrigada por se disponibilizar em me ajudar. — Acenei com a cabeça em um leve cumprimento.
Sem ao menos reparar, minha dor de cabeça parecia até mais confortável, não sentia minhas pálpebras latejando em explosões dolorosas.
— Até mais.
E ela se afastou.
Okay, eu não tive nem tempo de responder. Mas eu sequer saberia o que responder. Talvez ela estivesse realmente assustada com a minha análise nada sútil e isso me deixava incomodada comigo mesma. Eu poderia ter sido mais discreta em tantos âmbitos, deixando-a confortável diante de meus olhos canalizadores.
Não consegui.
Quando dei por mim, a distância entre nós já era grande o suficiente para perdê-la de vista. E eu nem tinha o que fazer, eu não saberia nem como abordá-la se quisesse.
Suspirei forte e caminhei lentamente até o próximo corredor, lado contrário ao qual ela tinha ido, mesmo que seu rosto marcante continuasse em meus pensamentos.
Depois de rodar muito naquela farmácia, encontrei dois remédios bons o suficiente para me ajudarem com a dor de cabeça.
Sorri fracamente para a moça simpática do caixa, ela parecia estar em um bom dia, isso seria animador se eu conseguisse pelo menos raciocinar direito. A dor ocupava uma boa parte dos meus pensamentos.
E os castanhos intensos também.
Eu queria apenas entender o porquê daquela mulher parecer tão intensa, mesmo com os olhos tão inexpressivos. Parecia uma incógnita, uma contradição grande demais para ser suportada em um curto olhar.
Acenei com a mão para a moça do caixa e saí rapidamente, encontrando a rua quase vazia.
O caminho não era longo, então nem me importei em voltar andando. Apenas abri a garrafinha de água que havia comprado para tomar o remédio. Quanto mais rápido, melhor.
Enquanto caminhava, escutei um fungar baixinho. Franzi o cenho, mas continuei andando.
Mais alguns passos e um fungar um pouco mais alto, junto com um sussurro fraco.
Estreitei meus olhos e observei a rua à minha frente. Olhei para trás e não havia ninguém, tudo parecia calmo demais, mas o fungar baixo continuava, se tornando mais alto a cada passo que eu dava.
Uma grande entrada, que apontava ser o estacionamento da farmácia, estava disposta ao meu lado direito.
Olhei para a entrada enorme e ouvi mais um fungar, junto com um bufo irritado e um soar leve.
Havia poucos carros por ali, o dia era tranquilo demais para que estivesse cheio.
Dei de ombros e continuei andando, mas ouvi uma voz se alterando, o eco profundo do estacionamento parecia deixar tudo pior.
Parei de andar e olhei novamente para dentro do local quase vazio.
Meus olhos encontraram duas silhuetas atrás de um carro alto, parecia luxuoso, era tão branco que chegava a refletir a luz artificial do estacionamento.
Antes que eu pudesse dar meia volta, ouvi mais um fungar, agora estava audível o suficiente, parecia vir daquela direção.
Olhei para lá novamente, mas senti o latejar da dor incessante na minha cabeça.
Fechei os olhos com força e esperei meu corpo se dispor a ter qualquer contato com a luz.
Um farfalhar baixinho e eu voltei a olhar para aquela direção, os dois corpos pareciam em uma proxêmica íntima demais. Um dos dois parecia gesticular bravamente, parecia irritado.
Mais um fungo e um choro baixinho, era realmente naquela direção.
Não ousei dar nenhum passo à frente, mas meu corpo parecia em alerta.
O rosto abaixado e os cabelos cobrindo qualquer resquício de face me deixava aflita.
Ouvi um barulho alto e percebi que uma das pessoas bateu no capô do carro com força, assustando a outra, que soluçou alto em susto.
O homem alto apenas se virou e entrou no carro, deixando a outra pessoa para fora.
Quando o corpo, ainda com a cabeça baixa, deu a volta no carro e entrou no passageiro, percebi, pelas roupas, ser Camila.
Franzi o cenho e continuei olhando, mas não consegui ver mais nada quando ela entrou no carro.
Mordi o lábio com força e senti uma grande interrogação se formar na minha mente.
Por que ela estava chorando? E quem era aquele cara?
Podia muito bem ser o pai dela, talvez ele estivesse contando algo realmente ruim, que o irritasse. Ou quem sabe, dando uma bronca nela.
Talvez estivesse irritado por ela ter esquecido algo ou por ter se atrasado.
Bufei e me senti frustrada. Apenas observei quando o carro passou ao meu lado, mas nem dei atenção, eu não ficaria bisbilhotando a vida alheia, né.
Me dispus a andar novamente e senti a dor diminuindo ao longo do tempo que chegava perto de casa.
Mesmo que aqueles olhos castanhos me atormentassem, eu simplesmente me deitei no longo sofá e me permiti dormir por um longo tempo.
~
O farfalhar baixinho contra a janela, as longas cortinas balançando com o vento gelado que entrava pela enorme parte aberta.
Meus olhos pareciam colados, mas eu sentia tudo à minha volta. Eu sabia cada coisa que estava ao meu redor.
Meus músculos tensos e o suor contra minha camiseta, parecia estranho demais.
Tentei mover o rosto, mas nada pareceu pertinente o suficiente para que meus músculos decidissem acatar aquele comando diário.
Não percebi a presença ruim se instalando aos poucos, apenas sabia que ela estava lá.
Mas, ao mesmo tempo, conseguia sentir meus dedos entrelaçados em algo que parecia seda. Que me passava segurança e até mesmo parecia ser brilhante.
Sentia o tremor das minhas próprias pálpebras, um frio na barriga e meu baixo ventre explodindo em uma sensação dolorosa demais, como uma cólica.
Minha cabeça parecia flutuar, meus pés pareciam formigar. e minhas mãos suavam.
A garganta seca e dolorida… Tudo parecia perdido.
Até que…
— Lauren! — O grito me despertou e eu levantei rapidamente, logo me arrependendo ao sentir a tontura invadindo meu corpo e meus olhos se tornarem borrões pretos. — Caramba! Você parecia mal, estava se revirando todinha aí, mulher. — Ally falou, me puxando pela gola da blusa e colocando as costas da mão contra minha testa, testando minha temperatura.
Olhei para os lados, tentando identificar o cenário onde eu estava. Logo percebi que era a casa de Ally, onde eu havia dormido no sofá.
— Você está bem? Teve um pesadelo? — Aquele olhar cauteloso, parecia minuciosa em procurar qualquer erro em minha imagem, tentando achar algum problema que pudesse ter causado aquele revirar borbulhoso.
Minha pele não parecia tão quente e meu ventre não doía de verdade, mas as sensações foram tão reais que era tangível.
Estranho
Não consegui formular uma frase, minha cabeça estava confusa demais para aquilo. Minha garganta estava realmente seca.
— Lauren? — Olhei para Ally e encontrei confusão naqueles castanhos profundos e bonitos.
Pisquei algumas vezes e tossi antes de conseguir formular uma frase verdadeira.
— Acho que tive um pesadelo. — Minha voz saiu mais inconsistente do que eu poderia ter imaginado.
Uma careta se formou no rosto da minha amiga loira e ela acenou.
— Mas você está bem? — Ela ainda apertava a gola da minha blusa, me puxando para deixar o rosto na altura do dela.
— Sim… Eu acho. — De repente, um ponto na minha cabeça se acendeu e eu relembrei do toque de seda em meus dedos, cobrindo minha mão em um agarrar firme, mas não forte.
Olhei para baixo e encontrei minhas mãos livres de suor e de qualquer tecido que fosse tão macio ao ponto de me confortar de uma certa forma.
Mordi o lábio inferior e senti minha testa vincar.
Meus dedos pareciam levemente avermelhados nas extremidades.
Curvei os lábios e dei de ombros, não podia ser nada demais.
— Eu vou buscar água pra você e já volto, fica aí. — Ally avisou, me ajudando a encostar no sofá. Eu apenas assenti com a cabeça e a olhei se afastar.
— Obrigada. — Sussurrei baixinho.
Com estranheza, olhei novamente para meus dedos.
Algo estava errado naquela situação. Não havia sido um pesadelo qualquer. E aquele toque de seda…
Eu não fazia ideia do que era aquilo, mas também não ia me dar o trabalho de tentar descobrir. Minha cabeça não doía mais, mas eu não iria arriscar pensar demais.
Pelo menos não hoje, não agora.
Agradeci à Ally novamente assim que ela me entregou o copo d'água.
Era sempre bom ter alguém comigo… uma amizade.
E como Ally e Normani, amizades verdadeiras. Aquelas que nunca se quebram. Talvez isso me fizesse grata, muito mais do que eu conseguisse expressar de qualquer forma.
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