Pain
Terras Mortais
O sentimento era de estar se afogando; quando você luta para chegar a superfície, mas não consegue, e uma hora você cansa e se entrega de vez ao mar e a morte. Era assim que eu me sentia na maioria do tempo.
Eu acordei com o coração na garganta. Fazia alguns dias que eu não tinha pesadelos tão ruins e dois anos que não sonhava com Peter. Para ser honesta, eu não tinha sonhado com ele desde que conheci Azriel.
Meu coração bateu com força dentro do peito e senti vontade de vomitar. Estava tremendo e suando e meu horror e desespero... As vezes as lembranças conseguem ser pior que qualquer tipo de monstro.
Teve uma época que era fácil esconder esses sentimentos. Principalmente quando minhas outras preocupações ocupavam tanto minha mente que eu não tinha tempo livre para pensar nas merdas que já tinham acontecido comigo. Mas agora tudo resolveu voltar para me assombrar, e fica ainda pior com aquele sentimento de não conhecer mais meu próprio corpo.
Eu tentei sair da cama, mas meu corpo sequer reagiu. Eu não conseguia me mexer; eu ainda sentia o hálito quente de Peter contra meu pescoço e via seu sorriso horrível enquanto ele rasgava minha roupa. Meu coração acelerou ainda mais; ele ainda estava vivo e estava ainda mais vivo nas minhas lembranças.
Eu tentei por anos ser forte, não demonstrar o como isso me destruiu e ainda me assombra. Sempre usei essa máscara. No fim das contas, nem mesmo ela pode mais me proteger desses sentimentos.
Meu ataque de pânico era tão intenso que eu sequer notei quando Eris se materializou no meu quarto, as quatro da manhã, e me segurou em seus braços. Eu sequer conseguia respirar direito.
Ele não disse nada, sabia que não precisava. Eris somente me apertou em seus braços, passando a mão pelo meu cabelo, tentando fazer com que eu me acalmasse. E, de alguma forma, aquilo ajudou. Meu coração voltou ao normal, e eu consegui respirar. E quando eu voltei ao normal... Eu chorei.
Eu me sentia exausta de guardar tudo aquilo dentro de mim, por tanto tempo. Eu não chorava daquela forma havia tantos anos. Porque eu precisava ser forte, mas como ser forte o tempo todo, como ser forte com o tanto de merda que acontecia na minha vida? Nos piores momentos, eu ainda desejava estar morta.
-Nem mesmo pense nisso.- rosnou Eris, como se tivesse lido meus pensamentos.
Eu não o respondi, mas o apertei com força contra mim, não me importando nem um pouco que ele me visse daquela forma: destruída, quebrada, partida. Porque ele sabia, ele conhecia o fundo da minha alma.
Quando consegui me acalmar completamente, me afastei de Eris para olha-lo, apesar da escuridão do quarto. Ele passou a mão pela minha bochecha de forma carinhosa, tirando as lágrimas que estavam ali.
-Por que está aqui? - eu disse baixinho. Eris somente me olhou, como se sequer soubesse como falar algo depois disso tudo.
-Você sabe o porque, minha dama.- ele disse e eu assenti.
-Obrigada.
-Não tem nada que eu não faria por você, Aisha.- ele disse segurando minha mão. -Você é minha melhor amiga e minha família. Sentir isso que você está sentindo... Também me destrói de certa forma. Eu sempre estarei aqui com você, até mesmo quando você não precisar de mim.
Quando não disse nada, Eris começou a se levantar. Ele beijou minha bochecha, olhou com carinho para Ayla dormindo no berço ao lado da cama e sorriu. Ele me olhou novamente.
-Eu vou estar aqui quando você quiser conversar. - ele disse, disposto a me dar aquele espaço que eu precisava. Eris fez menção de atravessar, mas eu segurei seu pulso.
-Por favor, por favor, não vá. - eu disse baixinho.
Então ele ficou. Ele se sentou ao meu lado e eu deitei a cabeça em seu ombro, sentindo aquele nó que havia se formado na minha garganta aos poucos ir se desfazendo.
-Eu não sei como consertar minha vida.- eu disse fechando os olhos com força. -Me sinto uma imbecil.
-Pare com isso.- ele disse apertando minha mão com força. -Você tem todo o direito do mundo de se sentir dessa forma, Aisha. Mas quero que saiba que não está sozinha e jamais estará sozinha novamente.
-Não acho que mereço isso, Eris. Ter esse tipo de amor e carinho.- eu disse e Eris abriu a boca para protestar e eu sabia o que ele diria sem nem mesmo falar: que ele era mil vezes pior do que eu e que se ele merecia, eu também deveria. Mas não o deixei concluir aquele pensamento. -Como é mesmo que Azriel diz? Que sou uma mentirosa. Talvez ele tenha razão, talvez eu seja mesmo manipuladora e ruim, e certamente sou uma péssima mãe, o que é uma merda porque Ayla merece uma boa mãe. E é foda porque eu não consigo fazer uma coisa que preste, uma coisa boa na merda da minha vida, tudo o que eu fiz foi merda, tudo o que eu fiz, apesar de achar que estivesse fazendo a coisa certa, foi a coisa errada e eu... Eu não sei mais se aguento isso.
Eris me segurou pelos ombros, me fazendo olha-lo nos olhos. Apesar da escuridão, eu podia ver as chamas que dançavam ali dentro.
-Você está tão absolutamente errada que não sei nem por onde começar. - ele disse e eu abri a boca para falar, mas Eris não deixou. -Você é uma boa pessoa, Aisha. Você é sim. Foi a única que conseguiu ver por trás da máscara, a única que me deu uma chance de verdade. Você não é ruim. Jamais seria capaz de ser ruim. Fez merda, pode até ser que tenha feito sim, mas você aprendeu com seus erros. Mudou. Porra, Aisha, você arriscou sua vida pela causa de Vassa, arriscou sua integridade porque ama Feyre, arriscou sua vida por Azriel, e eu não vejo como uma pessoa manipuladora colocaria outros acima dela mesma. E, pelo Caldeirão, onde você é uma mãe ruim, me diga porque eu não sei. Desde o dia em que descobriu que estava grávida, Aisha... Você podia ter morrido e ainda assim se recusou a deixar seu bebê morrer. Você cuidou de Ayla todos os malditos dias desde que ela nasceu e virou uma verdadeira fera quando colocaram sua filha em segundo lugar. Você já provou de várias formas diferentes que morreria por ela, e não acho que uma mãe ruim faria isso. Você teve duas mães ruins, Aisha, então deveria saber que não é uma.
Quando Eris terminou de falar, eu estava chorando. Porque eu precisava ouvir aquilo, precisava ouvir aquilo de alguém. Eu não tinha percebido o quanto eu estava sofrendo, o quanta dor e culpa eu estava carregando até aquele momento. Mas ter esse tipo de libertação... Começava a fazer com que os pedaços do meu coração voltassem ao lugar.
Eris me abraçou e eu o apertei com força, sem me importar com o quão frágil eu parecia naquele momento, sem me importar que ele visse tudo. Cada ferida, cada cicatriz, cada marca.
-Você acha que Azriel um dia vai me perdoar?- eu disse e Eris passou a mão pelo meu cabelo.
-Eu não gosto dele, mas até eu tenho que admitir que ele te ama, Aisha. E ele já te perdoou faz tempo. A questão é, você está pronta para perdoa-lo?
Eu podia ter toda a eternidade agora, mas certamente não ia perder séculos com uma briga que claramente só me machucava. E talvez fosse hora de começar a deixar que meu coração se curasse. E talvez fosse hora de virar a página daquela história.
E, claro, destruir todos aqueles que haviam me destruído.
Aisha começando a se curar é minha religião
O povo que ela quer morto que aguarde, porque Aisha vai ressurgir que nem fênix pra sentar o cacete em geral
E foi isso
Volto no próximo capítulo!
~Ana
Data: 06/03/21
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro