Capitulo 23 - Possibilidades
Gilbert acordou assobiando naquela manhã, em que o universo parecia estar lhe dando um dos seus melhores presentes.
Anne voltaria para casa naquela tarde e essa era a razão de sua alegria. Nos últimos dois dias, passara a maior parte do seu tempo com ela e tiveram ótimas conversas, que o deixaram bastante motivado para continuar com sua vida e alguns de seus projetos de antes.
Muita coisa tinha mudado dentro dele e a maioria dos planos que tinha feito antes do acidente, não cabiam mais em sua atual situação.
Estava voltando aos poucos ao trabalho. A sua paixão pela fotografia continuava intacta, e pelo menos isso era um grande alívio, pois lhe dava a sensação de normalidade que não tinha sentido nos primeiros dias pós coma.
Entretanto, todo o trabalho ainda estava sendo realizado em casa. Moody tinha contratado um fotógrafo para substituir Gilbert nos três meses em que ele ficara ausente e o rapaz pôde constatar que o trabalho do tal fotógrafo era muito bom, mas lhe faltava certa experiência para que as fotos ficassem da qualidade almejada Assim, o acabamento final, estava sendo realizado por Gilbert, com a ajuda de seu computador e técnicas especiais aperfeiçoadas por anos, ele conseguia dar às fotografias o toque desejado e esperado pelo cliente.
Esse contato diário com a parte técnica que estava aplicando nos bastidores, estava despertando nele a vontade de voltar ao estúdio e experimentar aquela expectativa que sempre o atingia, antes de uma sessão de fotos. Contudo, ainda não tivera alta de seu médico que lhe dissera que enquanto suas pernas não estivessem suficientemente fortes, ele não poderia se dar ao luxo de trabalhar várias horas seguidas e em pé.
Por isso, voltara a fazer exercícios em uma academia local, e com a ajuda de um preparador físico, sua antiga forma estava retornando também. Contudo, sentia falta do estúdio e do trabalho que o absorvia o tempo todo, porque era o que sabia fazer de melhor.
De tudo o que perdera naqueles meses em coma, ele lamentava ter ficado longe da fotografia e do prazer que sempre lhe causava um trabalho bem feito. Mas, se não fosse pelo seu acidente e as consequências que sofrera depois, não teria conhecido Anne. E mesmo que alguns lhe dissessem que aquilo fora um sonho apenas, Gilbert acreditava em predestinação, porque Josie os teria apresentado em sua festa de aniversário, se toda aquela fatalidade não tivesse acontecido.
O destino tinha dado o seu jeito, e se encontraram em sonho, mesmo que Anne não pudesse se lembrar, Gilbert sabia que tinham se apaixonado e vivido aquele amor intensamente. E se ela nunca se lembrasse, não tinha importância, porque ele iria conquistá-la à sua maneira outra vez
-Está feliz, filho? Faz tempo que não te vejo assobiar desse jeito.- Seu pai comentou, vindo do jardim, onde passara a manhã toda trabalhando.
-Eu estou me sentindo muito bem hoje.- Gilbert respondeu, sorrindo.
De manhãs nubladas e sem grandes perspectivas, ele ganhara outras mais coloridas e cheias de um sentimento que não saberia descrever ao certo.
Havia esperança agora e sonhos que ele não ousava falar em voz alta, mas que brincavam em sua mente com inúmeras possibilidades.
Precisava de tempo e paciência para entrar na vida de Anne, como ela entrara na sua. E precisaria de mais tempo ainda para fazê-la compreender que podiam dar certo, mesmo com sua recente decepção e seu coração partido.
-Algum motivo especial para essa alegria súbita?- John perguntou, observando o filho com curiosidade. Era uma surpresa vê-lo tão bem disposto, mas era um conforto também, depois de dias em que ele parecia sem ânimo e sem vontade nenhuma de fazer as coisas mais simples.
-Eu poderia mentir para o senhor e dizer que não, mas como me conhece tão bem, saberia de primeira que eu não estaria sendo honesto.- Gilbert respondeu com seu velho bom humor.
-Então me conta qual é o motivo?- John perguntou, feliz demais por ver Gilbert voltando a ser o que era.
-Vou ver minha garota. - Ele revelou com um sorriso enorme, fazendo John arregalar os olhos e perguntar:
-Você e Samantha reataram?
Gilbert viu na expressão do pai certo desagrado, e entendia porque. Seu pai nunca fora um grande fã de Samantha, embora a tratasse com educação e respeito, porque ele vivia exatamente o que pregava. Em seu ponto de vista, qualquer pessoa merecia ser tratada com dignidade, mas isso não queria dizer que se simpatizasse com ela ou que aprovasse a relação que Samantha tinha com seu filho.
Talvez, John Blythe tivesse uma percepção maior que ele sobre as pessoas, e soubesse ler suas intenções antes que fossem de fato reveladas. Gilbert se sentia um tolo por não ter percebido que os sentimentos de Samantha por ele não tinham a profundidade que pensara. Mas de certa forma, se sentia agradecido, porque se Samantha não tivesse terminado com ele, sua história com Anne teria sido outra.
-Não, papai. Na verdade, nunca mais vi Samantha depois que terminamos.- Gilbert respondeu, vendo a surpresa na expressão do seu pai se tornar ainda maior.
-Então, de que garota está falando?- John perguntou, encarando o rapaz como se ele estivesse enlouquecido.
-O nome dela é Anne. Sofremos o mesmo acidente, mas a conheci antes.- ele mentiu, pois se contasse ao pai que naqueles três meses em coma, ele tinha viajado ao Havaí, conhecido a garota mais incrível do mundo e se apaixonado, John o mandaria direto para um manicômio, pois ia pensar que o cérebro dele tinha sido afetado no acidente.- Ela vai sair do hospital hoje e prometi que estaria lá quando recebesse alta, pois a tenho visitado há alguns dias. - Gilbert explicou, antecipando a pergunta de seu pai
-Ela é responsável por toda essa animação?- John perguntou, ainda sem acreditar que aquela garota pudesse existir.
-Sim. Estar com Anne me deixa feliz. Ela é tão inteligente e linda. Tenho certeza de que o senhor vai gostar muito dela.- Gilbert perguntou.
-Posso ir com você? Agora que a mencionou, ficou curioso por conhecê-la.- John pediu impulsivamente. Queria ter certeza de que o nome que Gilbert acabara de mencionar pertencia a uma pessoa real. Seu filho parecia estar em sua melhor forma, mas era assustador ver que ele passara de uma depressão que o acompanhara assim que voltara para casa, a uma euforia súbita.
Não sabia se aquilo era normal ou se havia algo relacionado à sequelas pós acidente. Estava preocupado, porque ao longo de sua vida, vira amigos e conhecidos sofrerem acidentes como Gilbert e nunca mais voltarem ao normal por lesões que não puderam ser curadas, especialmente se tais lesões se concentrassem no cérebro.
Pelo que os médicos disseram,Gilbert batera a cabeça mas não chegara a ter uma fratura grave. Contudo, médicos não eram deuses e poderiam muito bem se enganar com algo daquele tipo.
-Claro, papai. Anne vai adorar conhecer o senhor também. - o rapaz disse com animação.
-Vou me trocar e depois podemos ir.- John respondeu, indo para o próprio quarto, onde trocou de roupa e pegou as chaves do carro, pois Gilbert ainda não tinha recebido liberação para dirigir.
De sua casa até o hospital, John tentou manter uma conversa descontraída com o filho, ao mesmo tempo em que procurava obter mais informações a respeito de Anne. Não sabia bem o que pensava descobrir, porém, queria apenas entender com o que estava lidando, porque ainda temia que Gilbert estivesse confundindo coisas dentro de sua própria cabeça .
Ao entrarem no hospital, Gilbert passou pela recepção, cumprimentou a atendente e foi direto para o quarto de Anne, sem precisar de permissão nenhuma, pois já tinha se tornado bastante conhecido ali, por conta de suas visitas constantes à Anne. Na verdade, todos pensavam que Gilbert era o namorado da ruivinha, e o rapaz não desfizera aquele mal-entendido, porque já se considerava assim, futuramente.
John apenas o acompanhou, observando o que acabara de acontecer com certo assombro, mas sua preocupação não era menor do que antes.
Pai e filho chegaram juntos ao quarto que Gilbert conhecia tão bem e quando entraram, o rapaz viu um homem e uma mulher já idosos conversando com Anne.
-Oi, Gilbert. Que bom que chegou, esses são meus tios, Matthew e Marilla Cuthbert. - Anne disse, se sentindo mais feliz com a chegada do rapaz.
Esperava pelas visitas de Gilbert com ansiedade, porque falar com ele, lhe fazia muito bem. Gilbert parecia sempre estar a um passo à frente dela, pois lhe dizia o que precisava ouvir em momentos nos quais sentia que o mundo ia engoli-la, e desabafar era a única forma de recuperar o controle que estava por um fio.
-Já ouvimos falar muito de você, meu rapaz. Obrigado por estar dando apoio a Anne e ser um ótimo amigo.- Matthew disse, apertando a mão de Gilbert calorosamente.
A palavra amigo não era bem o que Gilbert desejava ouvir dos lábios de Anne, quando ela falasse dele para alguém. Mas tinha que se lembrar que naquela história toda, era esse papel que ainda representava na vida dela.
Ele sabia o que sentia,se recordava do que viveram naquela ilha, mesmo que fosse um sonho, o que realmente para ele fora mais que isso, pois em sua mente aquilo fora como um encontro de almas, algo raro de se acontecer, mas que para sua sorte, acontecera entre eles e tinha certeza de que Anne ainda se lembraria. Era apenas uma questão de tempo e paciência, e isso ele tinha de sobra.
-Obrigada. Ela também tem sido muito importante para mim. Acho que Anne contou que sofremos o mesmo acidente. - Gilbert respondeu, retribuindo o aperto de mão de Matthew.
-Contou sim. E achei uma coincidência incrível. Ou talvez, interferência divina.- Marilla comentou com um sorriso misterioso nos lábios, enquanto cumprimentava Gilbert.
-O que quer dizer, Marilla?- Anne perguntou se sentindo um pouco confusa com aquela colocação. Marilla às vezes, lançava alguns comentários, deixando seu sentido no ar, que bem sempre ela conseguia alcançar. Mas também tinha consciência que sua tia era uma mulher muito sábia, e nunca dizia nada se não tivesse plena convicção de que serviria como conselho para alguém. Anne aprendera com o tempo, a dar o devido crédito às suas palavras, porque nada escapava àquela mulher judiada pela vida, mas com um coração enorme.
-Nada, querida. São apenas pensamentos tolos de uma velha igualmente tola.- Marilla disse cheia de humor.
-Marilla, você não é velha e nem tola.- Anne disse protestando.
-Concordo com suas palavras, senhorita. - John disse, sem pensar, fazendo com que todos os presentes lhe lançassem um olhar espantado, inclusive Gilbert, e sentiu seu rosto esquentar de vergonha.
-Ah, me desculpem . Esqueci de apresentar. Este é meu pai, John Blythe. - Gilbert disse, olhando para o pai que não tirava os olhos de Marilla Cuthbert. Era a primeira vez em anos, que via seu pai interessado em uma mulher.
-Muito prazer.- Matthew disse, apertando a mão de John que lhe respondeu:
-O prazer é todo meu.- e depois se virou para Marilla, pegou a mão dela na sua, a levou aos lábios, depositando um beijo no dorso dela, enquanto dizia:
-Encantado, senhora.
-Prazer em conhecê-lo, Sr. Blythe.- Marilla respondeu, sem saber muito o que dizer àquele homem galanteador.
-Apenas John, por favor. - O pai de Gilbert disse, fazendo com que Anne olhasse para o rapaz, sorrindo divertida, enquanto ele revirava os olhos e pensava que nunca imaginara que John pudesse ser tão piegas.
-Papai, essa é a Anne.- Gilbert disse, interrompendo a troca de olhares entre ele e Marilla. Ele achava bom que seu pai se interessasse por alguém, depois de anos vivendo sozinho. Mas não achava que aquele momento era o mais adequado, pois tinham acabado de conhecer a família de Anne e não desejava que seu pai passasse uma imagem negativa, ofendendo a tia da ruivinha com seus olhares explícitos.
-Você não sabe o quanto estou feliz por conhecê-la. - John disse, após a apresentação de Gilbert, pois se sentia aliviado por ver que o filho estava mesmo falando de alguém de carne osso quando lhe contara sobre Anne.- Sinto muito que tenha passado por algo tão terrível.
-Obrigada. - Anne respondeu. Ainda não conseguia falar com as pessoas em geral sobre seu acidente, a não ser Gilbert. Parecia que ninguém podia entender como se sentia, a não ser ele. Por isso, se fechava totalmente quando alguém tocava no assunto. Era angustiante e doloroso a ponto de fazer sua cabeça doer terrivelmente.
Gilbert notou seu olhar angustiado, segurou em sua mão e perguntou baixinho:
-Tudo bem?
-Está sim - ela respondeu com um sorriso aliviado, agradecendo mentalmente por ele estar ali. Olhar para o rosto dele era encontrar a paz que precisava para seu coração, pois não se lembrava muita coisa do acidente, mas o terror que sentira quando o carro batera e depois capotara, fora algo imenso demais para que sua mente pudesse esquecer, mesmo em três meses de coma.
-Anne vai para casa hoje.- Gilbert informou ao pai, mudando o foco da conversa, pois sabia que falar sobre o acidente ainda era algo difícil para a ruivinha.
-Que ótimo. Posso ajudar em alguma coisa?- John se ofereceu, animado por dois motivos. O primeiro era que seu filho estava bem e feliz, e o segundo era a bela dama que acabara de conhecer e com quem tinha interesse em ter uma amizade mais profunda. Eram poucas as mulheres que lhe causavam uma grande impressão, mas Marilla Cuthbert era o tipo de mulher que não precisava falar muito para que chamasse a atenção de alguém.
Ela tinha um olhar firme e profundo que mostrava uma sabedoria inata a qual não era comum a todas as pessoas. John não conhecia a história dela, mas tinha a sensação que aquela mulher de fala enérgica e expressão sincera, já vira mais daquele mundo do que se podia imaginar. E pessoas assim como ela, eram raras de se encontrar e impossíveis de se deixar ir, sem que ao menos pudessem ser conhecidas mais a fundo.
-Obrigada por se oferecer, mas já temos tudo preparado para levar Anne para casa. Ela vai ficar conosco até se recuperar totalmente. - Marilla respondeu com seu sorriso mais simpático. - Mas gostaria de convidar você e Gilbert para jantar no próximo sábado em nossa casa. Creio que Anne precisa estar com pessoas que fazem bem a ela, agora que as coisas estão voltando ao normal.
-Convite aceito.- John disse, sem esperar pela resposta do filho, cujo olhar se prendeu no de Anne, fazendo-a sorrir de forma divertida, fazendo Gilbert perceber que ela pensara o mesmo que ele. Aqueles dois estavam flertando um com o outro na frente de todos, e Gilbert nunca vira seu pai agir de forma tão galanteadora na presença de uma mulher.
-Diana pediu para te dizer que ela e as outras meninas vão te visitar em casa no fim de semana. Não puderam vir hoje.- Matthew a avisou.
-Tudo bem.- Anne respondeu,embora estivesse triste para não ver suas amigas, entendia que cada uma tinha sua vida e não podiam estar ao lado dela vinte quatro horas por dia.- Você iria para casa conosco. Isso é, se não estiver ocupado?- Anne perguntou esperançosa. Não sabia porque, mas estava sentindo um medo estranho de deixar o hospital e ir para Green Gables, porque fora daquelas paredes que de certa forma fora seu lar naqueles três meses, não sabia como as coisas seriam, principalmente em suas atuais condições.
-Vou sim, se não for atrapalhar. - Gilbert respondeu, lançando um olhar para Matthew e Marilla.
-De jeito nenhum. Vou adorar conversar um pouco mais com você. - Marilla respondeu, ao mesmo tempo em que Matthew balançava a cabeça, concordando com ela.
-Você se importa, pai, se eu for com a Anne?- Gilbert perguntou, pois tinham vindo ali juntos e não achava certo deixá-lo voltar sozinho.
-Claro que não, filho. Tenho que voltar para casa e terminar um artigo esportivo para o jornal que escrevo. Te vejo em casa mais tarde.- John respondeu com um sorriso. Estava feliz por Gilbert estar se abrindo para a vida de novo e se aquela garota fosse a responsável por isso, ele teria com ela uma dívida de gratidão para o resto da vida.
Assim que John partiu, depois de prometer a Marilla que estaria presente no jantar do próximo sábado, Gilbert acompanhou os Cuthberts e Anne até Green Gables em uma viagem que durou por duas horas de carro.
Ao passar pelo portão de madeira, seu olhar correu pela paisagem completamente verde, e seu coração foi capturado pela visão daquele lugar que lhe causava uma paz imensa. Ali estava um paraíso no qual ele faria maravilhas com sua câmera, pena que não estava com ela e a única maneira que teria de registrar aquele momento era com o seu celular, cuja qualidade das fotos não ficariam na alta qualidade pela qual o rapaz prezava tanto.
Quando saíram do carro, Gilbert fez questão de carregar Anne para o quarto, pois como ela ainda não podia caminhar, essa seria a maneira mais sensata de levá-la até lá, principalmente porque ele percebera o desconforto dela ao seu empurrada por Matthew na cadeira de rodas fornecida pelo hospital, e podia jurar pela expressão facial da ruivinha, que ela estava lutando contra seus sentimentos naquele momento.
-Vou fazer o almoço. Quer algo especial para comer, Anne?- Marilla perguntou, assim que Gilbert ajudou Anne a se acomodar na cama.
-Não, Marilla. Estou sem fome.- Anne disse desanimada. Desde que acordara do coma seu apetite ia de mal a pior. Não tinha mais prazer em fazer as coisas de antes, pois em sua atual situação, estava se sentindo péssima. Não podia andar, sua cabeça doía quase todos os dias, se sentia cansada e sem ânimo.
O médico lhe dissera que tais sentimentos eram normais, que desapareceriam conforme ela fosse se acostumando de novo com sua vida de antes. Mas a verdade era que, nada seria como antes nunca mais. Sua vida tinha dado uma guinada tão grande, que ela não sabia como sair daquele furacão imenso.
-Filha, você precisa comer. Está tão magrinha. Se quer retomar à sua vida, é necessário que se fortaleça física e mentalmente. - Marilla a aconselhou.
-Vou tentar, Marilla.- Anne respondeu com um sorriso triste.
-Bem, vou deixar vocês conversarem e voltar para minha cozinha. Almoça conosco, Gilbert?- Marilla perguntou, já na porta para deixar o quarto.
-Sim, se não for dar trabalho. - o rapaz respondeu com simplicidade.
-Você já é amigo da família. Não é trabalho nenhum.- Marilla disse antes de sair.
-O que está acontecendo, Anne? Você parecia tão feliz em voltar para casa, mas agora que chegou aqui, parece que perdeu toda a animação. - Gilbert comentou, preocupado com ela.
Não gostava de vê-la daquele jeito. Talvez a adaptação pós acidente fosse mais difícil para ela do que o rapaz imaginara. Anne ainda estava sensibilizada com tudo o que acontecera, mas esperava que agora que a ruivinha estava em casa e no meio de pessoas que se importavam com seu bem-estar, ela voltaria à forma de antes.
-Estou feliz em voltar, mas não queria estar nessa situação. Não quero ser um fardo para ninguém, Gilbert. Se tivesse condições, voltaria para o meu apartamento, mas enquanto não puder andar como antes, vou depender de outras pessoas para poder fazê-lo. Não vê como isso é humilhante? - ela disse, seus olhos se enchendo de lágrimas a cada palavra.
-Você não é um fardo para ninguém. Não pense assim, afinal essa condição é temporária. Logo, poderá fazer todas as coisas de antes. É só ter paciência. - o rapaz disse, segurando-lhe a mão.
Anne parecia tão fragilizada, que queria abraçá-la e falar de todos os sentimentos que estavam trancados dentro dele por ela, principalmente pelo que tinham vivido naquele sonho e pela felicidade imensa por tê-la reencontrado no mundo real. Ele precisava mais dela do que a ruivinha podia imaginar, e queria dar a ela todo o seu apoio e amor.
Contudo, ainda estava na posição de amigo e não podia sonhar em ser algo mais no momento, porque Anne ainda não estava pronta para seguir em frente após seu relacionamento fracassado.
-Acho que não é só isso que está me incomodando. Existe uma sensação de inutilidade dentro de mim que não consigo lutar contra e não sei o que fazer com minha vida daqui para frente. - Anne disse com certo desespero, sem se importar em esconder de Gilbert o que estava sentindo, pois ela sabia que o rapaz a entenderia.
-Não acha que é muito cedo para pensar sobre isso? Você acabou de acordar de um coma e ninguém espera que você saia por aí, tomando decisões difíceis. Viva um dia de cada vez, Anne. E quando estiver física e mentalmente sã, tome as decisões que forem melhores para você. - Gilbert disse com sinceridade. Ele lembrava de como Anne se sentia do mesmo jeito em seu sonho e queria amenizar esse sentimento depressivo o quanto antes.
-E se quando eu me recuperar ainda não souber o que fazer?- Anne perguntou, o encarando com seriedade.
-Eu estarei aqui para te ajudar.- ele respondeu, acariciando os cabelos dela, enquanto seus olhos procuravam o dela, deixando que seu coração transmitisse todo o seu amor através do olhar.
Anne estremeceu, ao perceber a intensidade com a qual ele a encarava. Não conseguia ainda compreender o que aquela expressão enigmática queria dizer, e não queria imaginar coisas que a deixariam em uma situação complicada.
Se não estivesse tão machucada por dentro, talvez se atrevesse a ir mais fundo e perguntar a Gilbert o que se passava na cabeça dele, todas as vezes que ele a observava como se quisesse dizer algo mais, contudo, ainda precisava tirar de dentro de si e exterminar todos os seus sonhos quebrados, para se permitir experimentar outros e descobrir o que queria viver dali em diante.
Percebendo o silêncio de Anne e a maneira como ela baixou a cabeça para escapar dos olhos dele, Gilbert disse:
-Eu sei do que precisa para se sentir melhor. Espera um instante.
Ele saiu do quarto e foi até onde Matthew estava sentado vendo televisão e perguntou:
-Pode me emprestar seu carro? Vi um lago aqui perto e queria levar Anne para tomar um pouco de ar puro.
-Claro, fique à vontade.- Matthew disse, lhe estendendo as chaves.
-Obrigado. - Gilbert respondeu, andando apressadamente até o quarto e pegando Anne no colo novamente.
-Para onde vamos?- ela perguntou sem entender nada daquela atitude do rapaz.
-Vai saber logo. - Gilbert respondeu sorrindo, a levando até o carro e dirigindo até o lago que ficava a alguns metros da casa.
Quando Gilbert parou o carro e a ajudou sair dele, a ruivinha o olhou admirada e perguntou:
-Como sabia que esse era meu lugar favorito na infância?
-Eu não sabia, apenas deduzi. - Gilbert respondeu, se lembrando que ela lhe dissera no sonho muitas vezes que amava o mar, mas como não podia deslocar Anne para um lugar tão longe, pensava que aquele lago singelo poderia lhe trazer a calma que precisava naquele momento de incertezas acerca do seu futuro.
-Eu costumava vir brincar aqui. É tão tranquilo e tão próximo da natureza. Naquela época, eu tinha tantos sonhos.- ela comentou, com os olhos perdidos no lago.
-Que tipo de sonhos?- Gilbert perguntou, depois que já tinham se acomodado na beira do lago, sentados lado a lado.
-Você não vai querer saber. São sonhos de menina.- Anne respondeu, com o rosto corado, pois sabia que não teria coragem de revelar a Gilbert que sonhava com um príncipe encantado,uma casinha adorável e crianças para torná-la um lar feliz.
-É claro que quero. Desejo saber absolutamente tudo sobre você. - ele respondeu de forma intensa, fazendo Anne perguntar, enquanto seu coração batia descontroladamente.
-Por que?
-Porque você é importante demais para mim.- Gilbert disse, com o rosto um pouco mais próximo dessa vez.
Anne queria fazer mais perguntas, mas não pôde,porque elas ficaram presas em sua garganta enquanto sentia o rosto de Gilbert cada vez mais perto. Então, ele baixou a cabeça, deixando sua boca próxima de Anne, mas quando ela pensou que aconteceria um beijo entre eles, o rapaz apenas esfregou a pontinha do seu nariz no dela, fazendo Anne perguntar:
-O que está fazendo?
-Eu estou te admirando, porque você é linda demais. - Em seguida, ele deixou um beijo na testa dela e puxou a cabeça da ruivinha para seu ombro.
Acomodada tão confortavelmente sobre o ombro do rapaz, Anne não sabia bem o que sentia com toda aquela intimidade que estava sendo construída ali, mas de repente, ela pensou que deixaria para analisar aqueles sentimentos mais tarde, porque naquele momento, tudo no que queria se concentrar era naquela sensação de paz que a fazia feliz.
Olá, pessoal. Novo capítulo postado. Espero que o apreciem e me deixe seus comentários e votos, pois suas opiniões são importantes para mim. Beijos e obrigada.
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