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43. epílogo; tal pai, tal filho.



O convento de Ohio se ergueu diante de Mary como uma relíquia de passado histórico, suas paredes de pedra desgastadas contando histórias de décadas de oração e penitência. A edificação, com seus altos arcos góticos e janelas em vitral que filtravam a luz do sol em matizes de azul e vermelho, parecia viva, mas também carregava um peso de solidão. Um vento frio atravessou o espaço, fazendo com que ela sentisse um arrepio na pele.

Mary estacionou o carro na entrada, o barulho do motor diminuindo lentamente, deixando apenas o som dos seus passos ecoando no sagrado silêncio do convento. Ela hesitou por um momento na porta, sentindo a gravidade do lugar, como se cada freira que passasse tivesse um olhar profundo e penetrante, avaliando sua presença. As freiras vestidas em hábitos simples, seus rostos serenos e expressões imperturbáveis, a observavam com uma curiosidade silenciosa.

À medida que Mary caminhava pelo corredor longo e escuro, sentia o peso da história, cada passo ecoando contra o chão de pedra.

Assim que Mary parou no jardim do convento, um espaço sereno e cuidadosamente cuidado, seu olhar se deteve na figura de uma freira idosa que se aproximava com uma graça tranquila. O jardim exibia flores coloridas, seus aromas se misturando ao perfume da terra úmida, criando um ambiente de paz que parecia distante de suas angústias internas.

A freira, tinha o rosto marcado pelo tempo, cada ruga contando uma história de dedicação e fé. Seu olhar era profundo e compreensivo, como se ela pudesse ver além das aparências, até as batalhas travadas dentro da alma de Mary. Quando Mary sorriu, uma luz suave iluminou seu semblante, e então, em um gesto de respeito, se inclinou e beijou suas mãos, uma tradição que expressava reverência e acolhimento.

—— Olá, Irmã Jude —— Mary disse, sua voz quase um sussurro, carregada de uma mistura de esperança e vulnerabilidade.

—— Eu preciso da sua ajuda, Irmã Jude —— disse ela, a voz trêmula, mas firme. —— Estou prestes a ir embora e preciso deixar o bem mais precioso que tenho aqui.

As palavras saíram de sua boca como uma confissão, carregadas de um peso que parecia quase insuportável.

A freira a olhou com um semblante sério, a expressão suave, mas atenta. —— E o que seria esse bem precioso, minha filha? —— Irmã Jude perguntou, inclinando a cabeça ligeiramente, incentivando Mary a continuar.

Mary sentiu o mundo ao seu redor se desvanecer quando ouviu os passos rápidos e a risada alegre de uma criança se aproximando. Antes que pudesse se preparar, um garotinho pequeno, com cabelos loiro-escuros bagunçados e olhos castanhos quase pretos, correu em sua direção, envolvendo sua perna com um abraço apertado.

—— Mamãe! —— ele exclamou, a voz doce e inocente como um eco de uma vida que parecia distante, mas ao mesmo tempo tão próxima. O coração de Mary disparou, uma mistura de amor e dor inundando seu ser.

—— Charlie —— ela sussurrou, o nome do filho escapando de seus lábios como uma oração. O garoto a olhou com um sorriso radiante, a expressão de pureza em seu rosto a lembrando do que realmente importava.

Mary ergueu Charlie nos braços, segurando-o com a mesma delicadeza que um tesouro precioso. O garotinho, que se aninhava em seu colo, olhava para a irmã Jude com curiosidade, como se estivesse se apresentando para uma nova amiga.

—— Cuide dele —— Mary pediu, a voz trêmula e cheia de emoção. —— Porque ele é um presente de Jesus pra mim.

As palavras saíram com a força de um voto sagrado, um compromisso que transcendeu o entendimento comum. Mary sabia que estava entregando não apenas um filho, mas uma parte de si mesma, uma parte do homem da sua vida.

Irmã Jude, com seu semblante sereno e sábio, acenou lentamente, entendendo a profundidade do que estava sendo pedido. Seus olhos brilharam com compaixão e um toque de tristeza.

—— Mary, ele será amado e cuidado aqui, eu prometo.

(...)

Mary observou Charlie, o pequeno ser que a chamara de mamãe, enquanto ele se afastava, segurando a mão da irmã Jude com confiança inocente. Ele acenou, um gesto tão simples, mas que rasgou seu coração ao meio.

A imagem dele, tão pequeno e vulnerável, ficaria gravada em sua mente, uma lembrança preciosa e dolorosa que agora ela precisava carregar.

Com um último olhar, ela subiu no carro e girou a chave na ignição. O motor rugiu, quebrando o silêncio que a envolvia como um manto pesado. À medida que o convento ficava para trás, uma onda de emoções conflitantes a atingiu. Parte dela queria chorar, gritar, se debater contra a decisão que tomara. Mas a outra parte, aquela que havia alimentado a fúria e a sede de sangue, falava mais alto, sussurrando que ela estava prestes a voltar a ser quem realmente era.

Mary era uma assassina, e embora houvesse uma fragilidade em seu coração, havia também uma determinação implacável. A vida que deixara para trás, com seus medos e inseguranças, parecia agora tão distante, como um eco de um tempo que não lhe pertencia mais. Ela precisava voltar à sua essência grotesca, aquela que a fazia sentir-se viva em meio ao caos.

O grotesco era uma parte de quem ela era, uma máscara que precisava ser novamente ajustada em seu rosto.

E assim, em sua jornada solitária, Mary riu, uma risada baixa e contida, sabendo que o verdadeiro espetáculo estava prestes a começar. Ela estava de volta, pronta para retomar seu papel no teatro de horrores que havia criado, uma maestra do caos, dançando com a morte em um baile que não teria fim.








FIM.....

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