36. ritmo cardíaco quebrado
Mary se mantinha concentrada enquanto observava cada movimento hesitante de Lois, a caneta deslizando rápida e precisa sobre o papel, registrando cada progresso, por menor que fosse. A sala era preenchida por sons suaves, o ruído distante de vozes no corredor e o leve ranger do piso, enquanto Lois, visivelmente frustrada, lutava para se equilibrar sobre a pequena bola de pilates.
Ao lado dela, a enfermeira segurava firmemente suas mãos, oferecendo apoio e murmúrios de encorajamento, mas Lois parecia longe de se sentir confortada. As sobrancelhas franzidas e o olhar inquieto denunciavam sua irritação crescente. Ela respirou fundo, como se aquilo fosse ridículo demais para ser verdade, e, sem conseguir conter a exasperação, disparou.
—— Eu não fazia isso antes do coma!
Mary ergueu o olhar do bloco de notas, um leve sorriso brincando em seus lábios enquanto observava a expressão da paciente.
Assim que Charlie entrou na sala, o ambiente, já carregado pela irritação de Lois, pareceu ficar ainda mais tenso. Ele se aproximou com um olhar confiante, as mãos nos bolsos do jaleco, observando Lois com um meio sorriso que ela não hesitou em detestar.
Sua presença ali parecia apenas alimentar o fogo da impaciência dela.
—— O que ele está fazendo aqui? —— ela disparou, os olhos estreitados em desgosto.
—— Vim ver seu progresso —— respondeu Charlie, mantendo o tom calmo, mas com uma leve provocação que não passou despercebida.
—— Vai se fuder —— replicou Lois sem rodeios, as palavras afiadas como navalhas.
Mary, que observava a cena em silêncio, lançou um olhar firme e sutilmente autoritário para a enfermeira ao lado de Lois, um pedido mudo que foi entendido de imediato. A enfermeira saiu rapidamente, deixando Mary, Charlie e Lois sozinhos naquela sala de fisioterapia onde a tensão só parecia aumentar.
Mary fechou seu bloco de notas, encarando Lois com uma expressão que misturava compreensão e firmeza, enquanto Charlie mantinha a postura, os olhos ainda fixos nela, como se esperasse para ver até onde ela levaria a provocação.
O rosto de Lois se contorceu em uma mistura de raiva e descrença enquanto ela encarava Mary e Charlie, suas mãos trêmulas apertando a lateral da bola de pilates.
— Você tentou me matar... Eu ouvi tudo, tudo — disse Lois, a voz baixa e amarga, cada palavra marcada por uma dor que soava como verdade absoluta para ela.
Charlie deu um sorriso controlado, aquele que usava para despistar, e respondeu, suavemente. —— Você alucinou durante o coma, Lois. Talvez tenha imaginado coisas... Eu tentei te salvar.
Lois apenas negou com a cabeça, ainda absorta no que acreditava ser a realidade. Mary então tentou intervir, a voz calma, como se buscasse acalmar a tensão crescente:
—— Tem razão, muitos pacientes pós-coma relatam alucinações... sonhos com outras vidas, outras pessoas.
Mas antes que pudesse continuar, Lois a interrompeu, sua expressão endurecendo.
—— Cala a boca! Você acha que eu não ouvi você e o seu querido médico transando no meu quarto enquanto eu estava em coma? —— ela disparou, os olhos fixos em Mary, carregados de acusação. —— Eu podia denunciar vocês.
O silêncio que se seguiu era palpável.
Charlie e Mary se entreolharam por um segundo, a máscara de profissionalismo dos dois quase desmoronando. Mary deu um passo para trás, tentando processar a gravidade das palavras de Lois. Charlie, porém, manteve-se impassível, sua expressão fechada, mas havia algo nos olhos dele, algo mais sombrio, enquanto o olhar de Lois não deixava o rosto dos dois.
Lois respirou fundo, seu olhar duro percorrendo a sala de fisioterapia antes de pousar em Charlie e Mary.
—— Eu quero ir pra casa.
Sem esperar qualquer resposta, ela agarrou o andador ao lado com força, como se nele estivesse depositada toda a determinação que restava, e deu as costas para os dois, movendo-se lentamente em direção à porta. A cada passo, seus movimentos eram marcados por um orgulho teimoso, uma recusa em mostrar qualquer vulnerabilidade.
Charlie fechou a porta da sala e suspirou, a expressão impassível, como se nada pudesse abalar sua confiança.
—— Ninguém vai acreditar nela —— disse, a voz baixa, mas firme.
Mary, porém, não compartilhava daquela tranquilidade. Seu olhar estava sombrio, e ela cruzou os braços, desviando o rosto para longe dele.
—— E se acreditarem, Charlie? —— Ela lançou um olhar de desconfiança, quase de pânico. —— Estamos ferrados.
Ele se aproximou lentamente, levantando a mão para tocar o rosto dela, mas Mary afastou-se num movimento brusco, seus olhos incendiados de frustração e ressentimento. Sem dizer uma palavra, ela se virou e saiu da sala, deixando Charlie sozinho.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro