34. incisão perigosa.
Mary observava a sala médica em silêncio, as cortinas fechadas bloqueavam o mundo exterior, isolando-os naquela atmosfera tranquila. O silêncio era reconfortante, quase íntimo. Sua atenção, no entanto, se desviou quando sentiu os braços de Charlie se enrolarem suavemente ao redor de sua cintura. Ele a puxou para mais perto, fazendo-a se acomodar em seu colo.
Sem dizer uma palavra, Charlie inclinou-se e depositou um beijo suave no braço de Mary. Ela manteve os olhos nos papéis que segurava, mas o calor do gesto e a proximidade entre eles deixavam o ambiente com uma tensão sutil. Em silêncio, os dois voltaram a olhar os documentos, fingindo que aquilo era apenas mais uma tarde de trabalho, mas o espaço entre o dever e o desejo parecia cada vez menor.
Charlie, com um tom casual, comentou enquanto olhava os papéis. —— O Sr. Troy decidiu que já estava na hora de desligar os aparelhos de Lois.
Mary concordou com um aceno de cabeça, mas seu desconforto era evidente. Ela mexia nervosamente nos papéis em suas mãos, tentando focar em qualquer coisa além da notícia. Charlie percebeu e franziu o cenho, inclinando-se para mais perto.
—— O que foi? —— perguntou ele, com a voz baixa e curiosa.
Mary deu um suspiro curto, seus olhos presos em algum ponto distante.
—— Eu gostava da Lois —— respondeu, sem se aprofundar, mas havia uma tristeza inquieta em suas palavras.
Charlie ficou em silêncio por um momento, talvez não esperando esse tipo de resposta. Ele apertou levemente a cintura dela, um gesto que parecia tanto de conforto quanto de posse, enquanto observava o rosto de Mary com mais atenção.
—— Eu sei —— disse ele suavemente, sem tirar os olhos dela.
Charlie suspirou enquanto continuava a segurar Mary suavemente pela cintura, sua voz baixa e quase filosófica.
—— Eu vejo a morte como uma libertação da alma. Um fim para o sofrimento.
Mary, ainda inquieta, balançou a cabeça, claramente desconfortável com a conversa. ——Você é obcecado pela morte, Charlie.
Ele abriu a boca para responder, mas foi interrompido por uma batida firme na porta. Ambos ficaram tensos por um instante. Mary rapidamente saiu do colo dele, ajeitando os papéis em suas mãos, enquanto Charlie se endireitava na cadeira. Seus rostos ficaram sérios, voltando à postura profissional no segundo em que a porta começou a abrir.
Quando a porta se abriu, parecia que estavam apenas discutindo algo trivial sobre os documentos.
A enfermeira entrou na sala, com uma expressão séria e controlada, como se já estivesse acostumada com o peso do momento.
—— Está na hora —— disse ela, com voz calma.
(...)
O quarto de Lois estava mergulhado em uma atmosfera de tensão e despedida. Enfermeiras, alguns médicos, e a filha de Lois estavam lá. O Sr. Troy, com os olhos fixos nos papéis de concordância, assinava com mãos decididas, enquanto o Dr. Charlie Mayhew permanecia ao seu lado, com a postura firme e profissional.
Assim que o Sr. Troy terminou de assinar os documentos, a porta do quarto se abriu bruscamente, e uma mulher com cabelos longos e lisos entrou apressada. Era Megan, sua expressão tomada pela angústia.
—— Não! Megan, não! —— gritou o Sr. Troy, com a voz carregada de frustração e dor. —— Isso é privado! —— Ele se apressou para segurá-la pelos braços e começou a empurrá-la de volta para fora, sua raiva e desespero transbordando enquanto a afastava da cena.
—— Pai, por favor... —— Merrit tentou argumentar, mas sua voz foi abafada pelo peso da situação.
Charlie olhou para Mary por um instante, como se estivesse avaliando a situação, enquanto as enfermeiras observavam em silêncio, esperando pela conclusão inevitável. O momento da despedida estava próximo, e ninguém podia escapar do peso desse adeus iminente.
—— Eu só quero prestar meus respeitos a Lois, por favor. —— Megan explicou.
O Sr. Troy, ainda tomado pela ira, retrucou com frieza.—— Você não respeitou ela. Você estava atrás do emprego dela, Megan. Ela te detestava.
Megan deu um passo à frente, a voz carregada de emoção. —— Eu só quero dizer adeus e ir embora, nada mais.
O Sr. Troy, incapaz de conter sua indignação, gritou.
—— Segurança!
Sua filha, que estava ao lado da cama de Lois, assistindo a cena com os olhos arregalados, finalmente interveio.
—— Pai! —— ela gritou, com um tom de súplica e reprovação. —— Por favor, deixa ela falar.
O ambiente ficou ainda mais tenso, as vozes abafadas pelas máquinas que mantinham Lois respirando. As enfermeiras trocaram olhares inquietos, enquanto o Dr. Mayhew observava a cena de longe, com um ar reservado, esperando a ordem do Sr. Troy para continuar.
Megan se virou para a filha de Lois, seu olhar em busca de solidariedade, enquanto Troy, rígido, mantinha sua decisão. —— Não!
A situação estava à beira de um colapso.
Mary, um pouco hesitante, entregou a seringa nas mãos de Charlie, que se aproximou da cama de Lois e se sentou ao seu lado, pronto para injetar o líquido letal. Mas antes que pudesse prosseguir, Merrit, irrompeu em lágrimas, sua voz embargada cheia de angústia e revolta:
—— Não, pai! Ainda não é a hora! —— Ela se aproximou da cama, tentando interpor-se entre Charlie e sua mãe. —— Precisamos deixar as pessoas se despedirem dela. Eu preciso me despedir!
Marshall Troy, visivelmente impaciente, retrucou com firmeza:
—— Não. Já conversamos sobre isso, Merrit. Não podemos prolongar mais esse sofrimento. Está decidido.
Merrit, sentindo a frustração e o desespero crescerem dentro de si, voltou-se para Charlie com os olhos faiscando de raiva e determinação.
—— Se você fizer isso agora, —— disse ela, sua voz afiada como uma lâmina. —— Eu juro que vou te acusar de homicídio negligente no tribunal.
A sala inteira mergulhou em silêncio, o ar carregado de tensão. Charlie, ainda segurando a seringa, hesitou, seus olhos buscando Troy, mas Merrit não recuou. O Dr. Mayhew estava visivelmente abalado pela ameaça, mas o olhar de Sr. Troy se manteve firme, inabalável, ignorando o confronto entre sua filha e o médico.
As enfermeiras trocaram olhares ansiosos, como se estivessem à espera de uma decisão que nunca parecia vir. Merrit, com os olhos cheios de lágrimas, olhou para o pai e disse, sua voz carregada de emoção:
—— Vocês vão perder a minha mãe hoje, mas você, pai, vai perder a filha também. É isso que você quer?
Sr. Troy, confrontado pela sinceridade da filha, hesitou, sua expressão endurecendo. O silêncio pairou no ar, pesado com a dor e a indecisão. Finalmente, sua resistência começou a ceder.
—— Está bem, Merrit.
Ela não perdeu tempo. Com determinação, caminhou até o rádio, ligou-o e escolheu a música favorita da mãe; "Star" de Nina Simone. As primeiras notas suaves começaram a preencher o ambiente, trazendo um toque de nostalgia e tristeza.
Charlie observou Merrit enquanto a música ecoava na sala, o contraste entre a suavidade da canção e a gravidade da situação cortando o ar. Ele, então, olhou para Mary, que permanecia em silêncio ao seu lado. A tensão aumentava enquanto os acordes da canção dançavam entre os sentimentos de todos.
—— Você sabe —— começou Charlie, sua voz baixa e introspectiva —— Eu vejo a morte como uma doce emancipação da alma.
Ele olhou para Lois, agora em um estado de calma profunda, como se estivesse em paz. Junto a Mary, ele se preparou para realizar o ato final. Com um movimento decidido, injetou a seringa no braço de Lois, enquanto a música de Nina Simone preenchia o espaço com uma melodia melancólica.
O rosto de Merrit se contorceu em tristeza, suas lágrimas escorrendo enquanto a canção parecia ecoar a despedida.
Assim que todos já estavam prontos para desligar os aparelhos e ouvir o último bip, algo inesperado aconteceu: o coração de Lois voltou a bater, e o monitor começou a bipar insistentemente. O som agudo cortou o silêncio pesado da sala, fazendo com que todos se virassem, atônitos.
—— Está viva?
Charlie, por sua vez, franziu a testa, analisando rapidamente os dados no monitor. A expressão de seu rosto misturava surpresa e profissionalismo enquanto ele checava os sinais vitais de Lois. Então, os olhos dela se abriram lentamente, confusos e vagarosamente se ajustando à luz do ambiente.
—— Mãe? —— Merrit exclamou, sua voz carregada de esperança.
Lois piscou várias vezes, tentando focar nos rostos ao seu redor. Ela estava viva.
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