68_ Donuts, Jujubas e amendoim
A loja ainda estava fechada quando cheguei. Eu ainda não tinha me acostumado com a ideia de ter que trabalhar aos domingos e, certamente, não ficaria muito tempo fazendo isso. Para minha grande sorte, minha chefe era uma mulher jovem, uns três anos mais velha que eu apenas, e ela era super gente boa.
Sabe aquele tipo de mulher jovem e sonhadora? Que está se sentindo na sua melhor fase por estar realizando o sonho de ter o próprio negócio? Essa é a minha chefe. Ela era super compreensiva e amava conversar. Em só uma semana trabalhando com ela meio expediente, eu já sabia quase tudo da vida dela e ela da minha.
Tá, eu sei que eu nem conheço ela direito e sair falando da minha vida para alguém que eu mal conheço não é lá uma coisa muito segura a se fazer. Mas, como foi a primeira semana da loja e não teve tantos clientes, tivemos bastante tempo para conversar. E como papo vai, papo vem, acabamos ambas falando demais.
Quando cheguei, ela estava na parte da cozinha, fazendo os primeiros donuts do dia. Tirando ela e eu, só mais uma pessoa trabalhava lá: o Gustavo. Ele trabalhava com ela na cozinha e eu quase nunca o via, já que chegava e já se enfiava naquela cozinha.
ㅡ Prova isso. ㅡ Deise saiu da porta da cozinha e apareceu na minha frente com uma colher com uma pequena porção de algum recheio nela.
Deixei o pano que estava limpando o balcão e peguei a colher. Provei o recheio sem nem saber do que era e me surpreendi com o gosto.
ㅡ O que é isso? ㅡ Fiz uma careta. Aquilo estava divino, mas não consegui distinguir o gosto. Nunca tinha provado nada parecido.
ㅡ Você gostou? ㅡ Ela perguntou com uma sobrancelha arqueada.
ㅡ Sim, é muito bom. Mas, o que é? ㅡ Ela arregalou os olhos encarando a colher que ela pegou da minha mão.
ㅡ Eu não sei. ㅡ Voltou para a cozinha.
ㅡ Você... ㅡ A segui e parei na porta. Gustavo estava lá dentro mexendo em algo numa panela. ㅡ Não sabe?
ㅡ Não fui eu, o Gustavo que fez. Ele me disse a receita e eu fiquei com medo de provar. Me dá um pouco. ㅡ Ela lavou a colher e entregou para ele. O garoto apenas riu pegando um pouco mais do recheio da panela.
ㅡ Por que ficou com medo? O que tem aí? ㅡ Arregalei os olhos. Gustavo me encarou sem dizer nada e isso apenas aumentou o medo do que eu tinha comido.
ㅡ Doce de leite... ㅡ Ouvi o primeiro ingrediente e me senti um pouco aliviada. ㅡ Abacate... ㅡ Franzi as sobrancelhas. ㅡ Manga... ㅡ Fiquei ainda mais confusa. ㅡ Pasta de amendoim. ㅡ Ele parou de falar e eu continuei o encarando. ㅡ Fora coisas normais, como leite e etc.
ㅡ Viu por que eu não quis provar? Quais as chances de dar certo? ㅡ Deise fez uma careta se apoiando na bancada e encarando o recheio na colher em sua mão.
ㅡ E aí você foi lá e me deu, né? ㅡ Cruzei os braços.
Deise imitou a risada da Chiquinha de quando ela fazia alguma besteira e eu ri me apoiando na ombreira da porta.
ㅡ Prova logo. ㅡ Gustavo pediu e ela tomou coragem de provar.
ㅡ Minha nossa... É divino! Como você descobriu isso? ㅡ Os dois começaram a conversar e eu senti o meu celular vibrar no meu bolso. O peguei ainda apoiada na ombreira e vi que era uma mensagem do Trevor. Uma foto, na verdade.
Ele estava no aeroporto, dava para ver pelo cenário, mas o foco da foto era uma caixa fechada de jujubas e outra de amendoim que ele tinha na mão.
Sophia- Por que comprou isso? Vai caber na mala?
Trevor- Um garoto veio me oferecer quando desci na rodoviária e eu pensei que ele estava vendo as caixas inteiras. Perguntei quanto era e ele disse o valor da unidade. Perguntei quantos tinham nas caixas e aí somei o valor. Quando paguei que percebi que ele estava vendendo a unidade, porque ele ficou todo feliz e quase chorou me agradecendo.
Ri de sua mensagem. Talvez seja a minha risada mais triste da semana.
Sophia- Fez o dia do garoto. Você ao menos gosta de jujuba e amendoim?
Trevor- Gosto, mas não tanto para comer uma caixa inteira de cada. Você gosta?
Sophia- Não costumo comer muito, porque não faz parte da minha dieta. Mas, sou apaixonada. Na verdade, tudo que é besteirinha eu gosto.
Trevor- Vou ter que resolver um negócio aqui agora. Você está bem? Chegou bem ao trabalho?
Sophia- Sim. Estou bem...
Trevor- Que bom. Te aviso quando entrar no avião.
Sophia- Ok, cuidado.
Guardei o celular novamente e vi Deise e Gustavo rindo juntos por causa de alguma coisa. Eu sorri com a cena, mas vê-los daquele jeito só me deixou com inveja por Trevor já não estar aqui. Eles não diziam que tinham alguma coisa, mas eu suspeitava. E shippava, claro.
Deise olhou para mim ainda rindo, mas pareceu notar a minha expressão.
ㅡ Faça mais disso. ㅡ Ela disse ao Gustavo e veio na minha direção. ㅡ Ele foi embora hoje, né? ㅡ Deise me abraçou de lado e me levou para fora da cozinha. Paramos no balcão, a loja já estava aberta, mas ainda não havia aparecido nenhum cliente.
ㅡ Foi. Não tem nem um dia que ele foi e eu já to com saudades. ㅡ Me apoiei no balcão.
ㅡ Ah, Sophia, não precisa trabalhar hoje. Eu tinha me esquecido completamente que desse detalhe. Pode ir pra casa. ㅡ Ela tocou o meu ombro.
ㅡ Não, não, eu to bem. Não tem necessidade. ㅡ Desencostei do balcão e ouvimos o sininho atrás da porta tocar. Um homem entrou na companhia de uma garotinha que aparentava não ter mais de cinco anos. Ele sorriu para nós em cumprimento e se sentou numa das mesas. ㅡ E prefiro me distrair.
Ela concordou com a cabeça e voltou para dentro da cozinha. Eu peguei a comanda e fui na direção do homem para anotar o pedido. É claro que eu preferia mil vezes ir para casa e só descansar, afinal, domingos são meus dias sagrados de descanso, mas não queria mostrar pra minha chefe que qualquer coisa poderia me impedir de trabalhar. Trevor foi embora, ok, mas eu não estava doente. Não estava morrendo e ele ir embora não era motivo.
Se eu fosse para casa só ficaria mais triste por estar pensando nele. Prefiro me acostumar logo com a ideia e mostrar pra ela que sou competente e que não brinco em serviço.
[...]
Eram quase uma da tarde quando cheguei em casa naquele domingo. Em geral, eu gostava de domingos. Gostava da vibe do domingo com sol, a família reunida para o almoço e a televisão ligada no SBT o dia todo.
Não sei é assim nas outras casas, mas minha mãe liga a televisão no Celso Portiolli no almoço e só desliga quando acaba o programa Silvio Santos. Era SBT o domingo inteiro.
Minha casa estava silenciosa quando entrei. As janelas estavam fechadas, tudo estava escuro e triste. Depois da última noite, parecia que Trevor estava por toda parte.
Joguei minha bolsa no sofá e me lembrei o motivo pela qual Trevor tinha ido embora. Eu sabia que teria que lembrar disso muitas vezes para não me entristecer. De certa forma... Funcionava.
Comecei a abrir as janelas para deixar luz entrar, liguei a televisão e coloquei no SBT, só pela vibe do domingo, mesmo que eu não fosse prestar atenção.
Tirei a roupa do trabalho, coloquei uma roupa fresca e fui fazer o meu almoço. Por mais que essa não fosse lá tão agradável, eu gostava de mudanças. Gostava da sensação de fazer algo diferente, de começar uma nova rotina ou coisa parecida. Querendo ou não, essa era uma mudança e tanto. E eu teria foco. Foco nos meus sonhos, nos meus planos, no meu auto cuidado e na minha saúde mental.
Estava almoçando assistindo a televisão quando ouvi alguém gritar no portão da minha casa.
ㅡ Correio! ㅡ Estranhei. Eu não estava esperando nada. ㅡ Correio! ㅡ Gritaram de novo.
Deixei o meu prato de lado, calcei o chinelos e saí na varanda. Consegui ver um cara parado no portão, mas não conheci. E estranhei novamente porque ele não estava vestindo de amarelo ou azul.
Caminhei até o portão e o abri. Fiz uma careta por conta do sol, mas a desfiz e comecei a rir quando vi o que estava na mão daquele cara.
ㅡ Na verdade, eu não sou do Correios. ㅡ Ele riu e me estendeu as duas caixas, uma de jujuba e a outra de amendoim. ㅡ O Trevor me pediu pra te entregar. Disse algo sobre você comer com moderação porque não queria estragar sua dieta ou coisa parecida. ㅡ Ri segurando as caixas.
ㅡ Obrigada! ㅡ Ele voltou para dentro de seu carro e partiu com ele.
Encarei as caixas em minha mão e continuei sorrindo. Notei um bilhete colado numa delas e entrei para conseguir ler. Deixei as caixas na mesa de centro e puxei o bilhete.
" Me desculpa por isso, mas você vai aproveitar melhor que eu. Na próxima te mando caixas de frutas. "
•••
Continua...
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