Middle: I Guess That's Why They Call It The Blues
SUNBURN
Middle: I Guess That's What They Call It The Blues
A luz forte do sol da manhã levantando-se no horizonte incide em minha pele exposta. Os óculos escuros e o protetor solar são a única proteção para meu rosto; e o biquíni, para o meu corpo. Finco os dedos dos pés na areia fofa e um pouco úmida por causa da maré - antes - alta, enquanto deixo meus pensamentos irem longe; os olhos fechados, bem apertados, apenas me deixam usufruir do momento aguçando os outros sentidos. O barulho baixo e abafado de risadas ao longe e ondas calmas são as únicas coisas que ouço, além da respiração serena dele, deitado ao meu lado; além disso, o cheiro de maresia, inevitavelmente, me lembra de casa. Não a que construí aqui e, apesar de tudo, se tornou minha favorita e mais... verdadeira. Mas a minha casa na minha cidade natal.
Lentamente, movida pela necessidade de tocá-lo, movo meus dedos pela toalha de estampa de passarinhos amarelos e laranjas estendida na areia e alcanço sua mão.
Nossos dedos se tocam tão delicadamente que por um momento duvido realmente ter encostado, mas a descarga morna de eletricidade que em seguida corre pelo meu braço estirado e para ao chegar em minha nuca, arrepiando todos os pelos pelo caminho, me dá indícios de que, apesar da relutância e leveza do toque, é apenas ele que consegue me passar essa sensação. É uma sensação boa, por sinal, combina perfeitamente conosco: o calor que tomou conta dos nossos corações de maneira lenta, mesmo agora tudo ter parecido acontecer em tão pouco tempo...
Mas, após alguns segundos aproveitando a sensação, subitamente, sinto como se o gesto fosse errado. Muito errado. Não apenas comigo, mas com ele também. Ainda mais quando ele enrosca seu mindinho ao meu; numa promessa silenciosa que sabemos bem que não será fácil cumprir.
Há uma decisão a se fazer; ambos sabemos disso. E é por isso que estamos aqui: no lugar em que ele me trouxe no nosso primeiro encontro e magicamente se tornou nosso lugar favorito.
Lembro-me de que íamos ao parque neste dia, mas eu insisti em revisitar alguma praia daqui, já que moramos perto o suficiente da costa para chegar de carro. Praias me lembram de casa. Já era de se esperar isso vindo de uma garota que, na sua terra natal, mora de frente para uma bela orla e a imensidão azul do oceano. E por causa disso, desenvolveu uma paixão pelo mar e pelo que há além dele.
É o que me trouxe aqui em primeiro lugar: o espírito aventureiro; a vontade de conhecer uma cultura diferente, pessoas diferentes, uma nova língua..., mas...
- No que está pensando? - Taehyung pergunta, enfim quebrando o silêncio reflexivo entre nós.
Viro o rosto para o seu lado e sorrio, finalmente abrindo os olhos para olhá-lo. De tudo nesta paisagem, ele definitivamente merece ser observado.
Taehyung é lindo. O garoto mais bonito que já tive a oportunidade de conhecer. Sua pele bronzeada apenas estará mais ressaltada depois do bronze de hoje, seu sorriso quadrado que nasce de forma tão espontânea me faz perder o fôlego e sua atenção concentrada sobre mim faz minha pele esquentar, como se o meu interior conflituoso estivesse exposto apenas para ele.
Ele é o namorado que toda garota sonha ter. Sou grata por ter tido pelo menos este tempo consigo.
- Lembra de quando caminhamos pela beirada desta praia e eu o empurrei na água porque se recusou a entrar?
Taehyung ri alto; sua risada alcançando e ressoando em meus ouvidos como se fosse minha melodia favorita. Na verdade, acabei de descobrir que ela é.
Eu fiquei estressada pois ele não queria entrar na água, mas, no final das contas, ambos rolamos pela água quando eu o empurrei e, em seguida, uma onda me levou junto.
- Eu não queria molhar o carro - protesta, recordando-se da cena.
- Bobagem! - acabo rindo também.
- Pelo menos eu tive uma desculpa para fazê-la ficar mais tempo comigo.
- É verdade - mordo o lábio inferior, reflexiva.
Taehyung me obrigou a esperar nossas roupas secarem depois do passeio na praia. Por isso, vagamos pela cidade até anoitecer, quando perdemos a noção do tempo engajados em uma conversa dinâmica sobre diversos assuntos.
- Acho que não teria uma segunda chance se a deixasse ir embora logo depois do passeio na praia.
- O que te faz pensar isso? - ergo uma sobrancelha questionadora.
Taehyung dá de ombros.
- É apenas uma dedução. Nós não conversamos tanto antes de me derrubar na água.
- Ambos estávamos nervosos. - Fixo o olhar no céu límpido acima de nós.
- Você estava?
Assinto.
- Sinceramente, não parecia - completa. - Pensei que estava em desvantagem.
Um resquício de sorriso passa pelo meu rosto conforme eu expiro pelo nariz.
Ficamos em silêncio.
Apoio uma mão na barriga e batuco os dedos na região, incapaz de tocar no assunto principal que nos trouxe aqui hoje. Eu ensaiei todas as palavras antes de vir, mas agora, elas me fogem da mente. Me sinto incapaz de terminar prematuramente tudo o que construímos neste último ano.
- E agora, no que está pensando? - sua voz grave irrompe o silêncio mais uma vez, afastando-me dos meus receios.
- Em nós - respondo desta vez. E é verdade.
Ele estende o braço em minha direção e toca minha bochecha com a costa da mão, puxando consigo uma mecha de cabelo para trás da minha orelha. O toque me faz suspirar involuntariamente.
- Acredita que esse tempo passou tão rápido?
Nego com um breve aceno, ainda desfrutando de seu toque suave.
- Parece que foi ontem que nos conhecemos.
- E você me disse que um ano seria muito tempo - ele ri de forma triste. Com certeza está se lembrando da nossa primeira conversa. Sei disso porque também estou.
- Pensei que logo enjoaria de mim - admito. Mesmo naquela época, eu entendia o suficiente da cultura coreana envolvendo os namoros para saber do histórico absurdo de amor e desamor em poucos dias.
Quando Taehyung revelou no nosso primeiro encontro, exatamente onde estamos agora, que estava interessado em mim de uma maneira amorosa ainda desconhecida por ele, pensei que não duraríamos muito; pensei que era mais um caso de interesse passageiro. Enquanto ele se mantinha otimista quanto a nós.
Somos opostos nessa questão: o amor. Mas, acontece que, no final das contas, ele estava certo. Perduramos até hoje, com grande parte da sua compreensão e paciência envolvida, pois eu admito que posso ser difícil de lidar. Nunca havia namorado antes, mas foi uma experiência incrível e... única vivida com ele. Me sinto honrada. E eu adoraria saber até onde iriamos se as circunstâncias fossem outras.
- Engraçado, achei o mesmo de você. Sempre tivemos cabeças diferentes, achei que logo terminaria comigo - confessa.
Abro mais o sorriso. O mesmo pensamento..., mas justificado de um ponto de vista diferente. Até nisso somos opostos e compatíveis ao mesmo tempo.
Taehyung fala fazendo carícias em meu rosto.
- Ainda bem que ambos estávamos errados.
- Sim - ele me presenteia com seu sorriso quadrado.
Com o indicador pairando no ar, entre nós, fecho um olho e contorno seu sorriso perfeito, imaginando como seria ter uma pintura de seus detalhes minuciosos posta em uma moldura.
Afasto o pensamento. Por falta de talento, me concentro apenas em manter a imagem em minha mente. Acho que é o suficiente. Tem que ser.
- Promete que vai falar com seus pais? - indago, preocupada.
Taehyung hesita por um momento, deixando transparecer só um pouquinho da sua incerteza e medo, mas acaba acenando positivamente.
- Obrigado por abrir os meus olhos - diz.
Dispenso seu agradecimento.
- Não está feliz neste curso, logo iria perceber isso.
- Não sei com o que estava na cabeça quando concordei em fazer direito.
Suspira pesadamente.
- Também não sei - deixo uma risadinha escapar. - Você nasceu para ser fotógrafo, Tae. E eu estou sendo sincera quando digo que tem talento.
- Bom, concordo com a primeira parte. Não levo jeito para estudar leis.
Assinto veemente, sem sequer pensar duas vezes. Várias vezes o ajudei a estudar e o resultado sempre fora trágico. Todas as vezes chegávamos ao ponto de ele largar o corpo na cama minúscula do seu dormitório e choramingar o quanto é um fracasso com a voz abafada pelo travesseiro cobrindo o rosto.
- Quando eu for famoso irei dizer a todos que você foi a minha primeira modelo oficial - continua.
Ergo uma sobrancelha, ameaçadora e desconfiada.
- Pretende fotografar outras mulheres?
Taehyung ri nasalado e, em seguida, passa a língua entre os lábios.
- Não como eu a fotografei, linda - responde com um sorriso malicioso perdurando no rosto.
Assumo uma expressão de incredulidade e me ergo um pouco, com a ajuda dos cotovelos, sobre a toalha apenas para bater no seu peito.
- Ya! Seu pervertido! - exclamo.
Taehyung solta uma gargalhada alta, ao ponto de fazer seus olhos puxados formarem apenas duas linhas curvas, e me puxa pela cintura para mais perto de si, virando meu corpo com rapidez. Espalmo as mãos em seu peito e arregalo os olhos, surpresa.
- As pessoas estão olhando, Tae - sussurro, aproximando a boca do seu ouvido.
Taehyung me aperta entre seus braços e inspira o cheiro dos meus cabelos soltos caindo sobre seu rosto. Sua mão tocando a pele exposta da minha barriga faz meu corpo todo esquentar.
- Não ligo - diz.
- Desde quando? - sorrio, boba, mexendo inconscientemente nos seus cabelos macios e de um castanho-claro vibrante devido à luz amarelada do sol.
De repente, ele fica sério. Suas mãos deixam minha cintura e moldam meu rosto, prendendo cada lado entre as palmas quentes, e sua expressão é tensa, temerosa, quando pergunta:
- É uma despedida, não é?
Suspiro profundamente. O peso das palavras engasgadas na minha garganta finalmente forçando a saída pela boca. Temia que este momento chegasse, porém... não há mais como evitar.
Essa é a verdade: minha aventura na Coréia do Sul acabou. Em algumas horas, estarei no aeroporto pegando o primeiro voo de volta ao meu lar, no Brasil. E, se tudo correr como o esperado, dentro de alguns meses estarei embarcando em outra aventura. Pois é assim que eu vivo desde que me formei, consegui um emprego e, assim, minha independência financeira e emocional e descobri meu amor pelo mundo.
Nunca esteve nos meus planos permanecer por muito tempo, mesmo depois de conhece-lo. Construir uma vida neste lugar seria complicado, visto que sou estrangeira e não tenho uma formação reconhecida no país.
Além disso, eu abrigo e alimento este espírito livre dentro de mim. Sou apaixonada por novas aventuras. Não quero me ater a alguém quando sou tão jovem e a tantas outras coisas a se viver e conhecer.
- Sinto muito - digo, e só então percebo o quanto me dói dizer isso para ele.
Justo ele. A última pessoa que eu queria machucar no fim de tudo.
Quando me dou conta, estou com lágrimas grossas acumuladas nos olhos.
Me sinto presa em uma estrada bifurcada, parte de mim quer abraçar o seu amor e mergulhar de cabeça nisso e a outra parte reclama a realização de todos os meus sonhos de viagem com todo fervor.
E o pior de tudo é que quando mesuro isso em uma balança, por mais que queira vê-lo se sobressair, noto que o meu pessimismo quanto a este sentimento tão poderoso florescendo dentro do peito, o faz perder.
Eu queria apenas que as circunstâncias fossem outras.
- Tá tudo bem, Sol - garante, forçando-se a abrir um sorriso fechado quando noto a tristeza acumulada e contida no seu olhar. - Sabíamos que terminaríamos assim.
Apoio minha testa na sua e inspiro o ar quente próximo a si.
- Acha que nos veremos novamente? - pergunta. Apesar de conseguir disfarçar bem, noto a pontada de expectativa em sua voz.
Balanço a cabeça em negativa diversas vezes, os olhos fechados novamente. Taehyung entende que eu não quero dizer que a resposta é um "não", mas a verdade é que sequer sei como responder àquilo. A vida dele sempre esteve atrelada a este lugar, enquanto a minha sempre pertenceu à diversos lugares. E ainda assim, mesmo sem saber ao certo, eu ainda conseguia imaginá-lo repelindo seus desejos e escolhendo viver preso em uma vida planejada pelos pais, embora espere profundamente que ele siga seu coração e corra atrás dos seus sonhos.
De qualquer forma, não podemos adivinhar o que o futuro nos reserva. Aceitarei o que tiver de ser, mas admito que, se pudesse coordenar os rumos de todas as minhas decisões e suas consequências, adoraria ser levada de volta até ele; em outras circunstâncias, em outra fase do nosso amadurecimento constante.
Compreensivo com a minha falta de resposta, ele permanece fazendo as carícias em meu rosto e cabelos.
- Não quero que me odeie por causa da minha escolha - admito, então, meu maior medo.
Ele sorri fraco, como se eu estivesse falando uma loucura.
- Como eu poderia odiar a mulher que amo? - declara, pegando-me de surpresa.
Abro os olhos de repente, afastando-me um pouco para encará-lo.
Ele disse...
- Tae... - choramingo.
- Eu sei - respira fundo, me interrompendo. - Prometemos não dizer isso um para o outro, mas...
É a minha vez de interrompê-lo.
- E-Eu... - inspiro uma lufada pesada de ar. - Eu também te amo - confesso verdadeiramente pois não sei se teria outra chance, envolvendo meus braços ao redor do seu pescoço e juntando nossos lábios em um beijo de despedida - porque também concordamos em não nos despedimos no aeroporto, seria ainda mais doloroso.
Demora apenas um segundo para Taehyung processar tudo e corresponder ao meu toque. Sua mão espalmada vaga pelas minhas costas, enquanto a outra se embrenha entre meus fios de cabelo e sua língua explora cada cantinho da minha boca, lentamente, como se quiséssemos fazer este momento durar para sempre, ser infinito - talvez não necessariamente em nossas mentes, mas sim, em nossos corações. Em certo momento, deixo uma lágrima solitária escorrer pela bochecha e se mesclar com o doce sabor da sua boca conectada a minha.
Não nos importamos com quem está ao redor. Não nos importamos com mais nada além de nós.
E quando nos separamos, e aos poucos recuperamos o folego, eu finalmente entendo da maneira mais pura e cruel os motivos pelos quais chamam este sentimento excruciante de tristeza. Sabendo que, a partir de agora, todo o tempo que tenho em minhas mãos, na ampulheta da minha vida, poderia ser o tempo passado com ele.
E apesar do sol quente da manhã estar nos queimando há tempos, nada dói mais do que as queimaduras de sol que eu mesma estou deixando aberta em seu peito. E, consequentemente, no meu também. Marcas profundas e ardentes no lugar que por vários e vários dias ele costumava dizer ser meu: o seu coração.
❇
Espero que tenham gostado, não se esqueçam de votar e comentar por favor 💙
Beijos amores e até o próximo (e último) capítulo.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro