Fuga
– Você está bem querida?
– Apenas um pouco cansada.
– Você deveria dormir mais sabe? – A fala da morena para a amiga foi interrompida pelo som do celular tocando – Alô? Sim sou eu, claro, daqui a meia hora? Certo, me encontre perto do estacionamento. Meu anjo preciso ir resolver algumas coisas se cuide.
– Claro, até depois.
A garota de cabelos platinados apenas sorriu falsamente e deu um “tchauzinho” logo fechando a cara e se jogando de costas na cama bagunçada. Decidiu então que precisava relaxar, abriu os armários, pegou uma bolsa preta de couro, colocou alguns maços de cigarro, celular e fone de ouvido, um batom vermelho e seus calmantes, calçou seus velhos all stars, vestiu uma jaqueta e foi saindo de casa, entretanto foi barrada por seu pai que a olhava com desgosto:
– Aonde você acha que vai?
– Sair, já ouviu falar?
– Você não vai sair daqui.
– Ah não? Tudo bem.
A garota deu um empurrão no homem e saiu correndo, jogou a bolsa por cima do muro da casa e o pulou, pegou suas coisas e correu como nunca havia feito, pode ouvir os berros do homem que era obrigada a chamar de pai, porém não ligou e continuou correndo até uma parte mais afastada da pacata cidade em que vivia.
Correu como nunca havia feito antes e quando percebeu já estar afastada o bastante da cidade foi diminuindo a velocidade de seus passos e começou a caminhar com calma e normalizando a respiração.
Sorriu ao ver as grandes árvores e rochas, se sentou perto da beirada onde só havia grandes rochas geladas por conta da maresia e bitucas de cigarro espalhadas pelo chão, tirou um dos maços da bolsa e acendendo um cigarro para acalmar sua raiva, inspirou a droga cheia de nicotina e sorriu soltando a fumaça acinzentada pelo ar vendo-a sumir por causa do vento.
Respirou sentindo o ar limpo, aquele lugar era o único de Greenday que ainda era possível de se sentir ar puro sem que o cheiro de nicotina, gasolina, tintura, óleo, borracha queimada e enxofre viessem juntos. Terminou seu cigarro jogando mais uma bituca no chão. Olhou seu colar e sentiu a paz esvaziando-se de seu corpo rapidamente, arrancou o objeto do pescoço o jogando na grande extensão de águas azuis vendo-o afundar.
Daise havia lhe dado aquele objeto, que antes era tão precioso, antes da mesma começar a namorar, agora a morena mal havia tempo para si pois estava sempre com Cotton. Às vezes sentia uma grande vontade de contar ao namorado de sua amiga que ela já havia ficado com a mesma várias vezes, até mesmo enquanto ela namorava o garoto. Então recolheu suas coisas e saiu andando, já tinha um lugar para onde iria.
Foi andando até sentir o cheiro típico de óleo, tintura e borracha, sorriu, a oficina de Benny era praticamente sua segunda casa, isso se não fosse a primeira, deu um chute na porta entrando e vendo o melhor amigo bater a cabeça e gritar:
– PORRA! CARA QUANTAS VEZES EU JÁ FALEI PRA VOCÊ NÃO ENTRAR ASSIM?
– Acho que umas 23 e com essa 24, mas não sei porque você continua dizendo se sabe que eu vou entrar assim todas às vezes.
– Realmente, nem sei porque ainda perco meu tempo – Bufou – Enfim, o que você quer agora praga?
– Eu preciso daquilo.
– Ah não! Nem vem! Eu não quero ir! – Choramingou o garoto de cabelos coloridos.
– E eu lá perguntei se você quer alguma coisa? Se arruma e vamo' logo! – Falou a menina de cabelos prateados pegando as chaves do carro.
Benny saiu de baixo do carro e sorriu, retirou as luvas cheias de graxa e trocou a camiseta manchada por uma limpa, pegou uma jaqueta, a carteira e os dois saíram dali. Star pulou pelo capo do carro entrando e apoiando o braço na janela aberta enquanto acendia um cigarro, Benny entrou e a menina lhe estendeu o maço com cigarros, o garoto aceitou e deu partida no carro.
Os dois foram até a casa da menina, ela então entrou e pegou uma mochila com roupas, pertences pessoais e comida, porém quando estava saindo seu pai agarrou seu pulso:
– Aonde você pensa que esta indo?
– Sair com meu irmão.
– Aquele garoto não é seu irmão!
– Cala a boca! – Então a menina empurrou o homem para trás e correu até o carro pulando dentro do mesmo, o melhor amigo deu partida e então ela mostrou o dedo do meio e gritou – VAI SE FODER SEU VELHO!
Assim que estavam longe o possível para não serem alcançados, os dois começaram a rir enquanto fumavam seus cigarros e viam as pessoas do subúrbio em que moravam saírem de suas casas para reclamar, mas tudo que faziam era jogar bitucas e caixas de cigarros nos mesmos enquanto riam.
Logo que saíram daquela parte da cidade e foram andando até a parte mais afastada onde residiam diversos animais selvagens e as pessoas de Greenday não habitavam, saíram do carro e foram caminhando floresta adentro até que avistaram uma pequena casa na árvore e um balanço gasto feito de pneu.
Sorriram e juntos gritaram alto, ninguém poderia os ouvir apenas os animais e a natureza que havia em volta, deram risada e subiram para a pequena casa. Haviam duas camas de solteiro improvisadas, cobertas, travesseiros, armários, uma pequena churrasqueira.
Enquanto Star arrumava a pequena casa, Benny foi pegar o restante das coisas como o carvão que sempre mantinha no carro, a caixa de isopor com bebidas e energéticos fora o resto da comida que os dois haviam trazido.
Assim que o garoto subiu com as coisas, a menina ajudou a guardar e arrumar todas as coisas em seu devido lugar. Logo que acabaram sentaram no chão e começaram a conversar coisas aleatórias do dia a dia dos dois, pegaram também duas garrafinhas de bebida para começar e um saco de salgadinhos.
– Caralho mano, meu pai é um embuste da porra, puta que pariu – A menina se pronunciou enquanto dava um gole na bebida gelada.
– Concordo – Benny disse rindo – Minha mãe é igual, eu não posso falar nada.
– Nunca vi tua mãe.
– Sério?
– Sim.
– Ainda bem né, imagina você conhecer aquela vagabunda do caralho, sério, eu tenho vergonha de ser filho daquela mulher.
– Faço das suas palavras as minhas.
– Um brinde a nós, os adolescentes com os pais mais fodidos de Greenday – E então bateram levemente as garrafas como se estivessem fazendo um brinde pelo melhor motivo do mundo – A gente é foda.
– É eu sei – E então mais uma golada – Benny, e aquele garoto com quem tu tava’ ficando?
– O Noah? Ah, ele ta’ bem – Um sorriso singelo apareceu fazendo as maçãs do rosto do garoto se realçarem – Nós havíamos marcado um encontro, mas acho que a avó dele não deixou.
– Mas que mulherzinha chata do caralho em? Por que você não trás ele pra cá?
– O QUÊ? – Se engasgou – Acho que não daria certo.
– Por quê? Qualquer coisa a gente foge os três, eu viro prostituta de luxo, você vira mecânico e o Noah cozinheiro, não tem como dar errado.
– Você ouviu o que acabou de dizer? – Levantou uma sobrancelha – Alô Star, nós temos dezessete anos! A gente nunca vai sobreviver assim, você sabe né?
– Benny, cala a porra da boca e só se deixa levar uma vez na sua vida, se nós não morrermos por suicídio, vai ser por cirrose ou câncer de pulmão, então aproveita e se diverte você só vive uma vez.
Então os dois ficaram em silêncio bebendo e dando risada por algum barulho que vinha de fora, ligaram para Noah dizendo onde estavam e pedindo para o garoto ir ao encontro deles e trazer roupas, talvez aquela fosse a ultima vez que eles ficariam naquela cidade.
Assim que o outro garoto chegou Benny sorriu, se levantou e abraçou o menino de madeixas ruivas e olhos cor de mel, trocaram um selinho rápido e se sentaram pegando coisas para comer. Conforme conversavam e comiam, o tempo ia passando e o sol dava lugar à lua, o céu que antes era rosa alaranjado agora era um forte tom de azul e roxo com vários pontinhos brancos cintilantes e uma grande bola reluzente, deixando tudo ainda mais belo e natural.
Foram se deitar, amanhã de manhã estariam partindo de Greenday para sempre e começando uma nova vida. Longe do subúrbio.
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