14
Winter's pov:
"Aqueles que acreditam em você quando você não acredita em si mesmo são os únicos a se manter por perto."
Eu não gosto muito da sessões de terapia. As perguntas, o olhar observador, os aconselhamentos. Eu não gosto como isso muitas vezes parece tão artificial e clichê, mas na maior parte eu não gosto do fato de ter que falar sobre os meus fantasmas. Eu também não gosto do fato de que nem sempre consigo colocar em prática aquilo que sei ser o melhor para mim.
— Te vejo na próxima semana, — minha terapeuta diz enquanto a acompanho até a porta depois de mais uma de nossas sessões. — Se precisar fazer alguma alteração quanto ao seu horário entre em contato.
Balanço a cabeça.
— Acho que nós duas sabemos que isso não vai ser necessário. — Digo, segurando um livro contra o meu peito, vendo ela fazer algumas anotações no celular.
Quando termina, a srta. Park ergue o olhar e sorri para mim, como se estivesse orgulhosa de alguma grande conquista minha.
— Você está diferente hoje — ela diz em tom gentil. — Acredito que o seu passeio no fim de semana passado contribuiu nessa questão. Foi uma novidade bem vinda saber que você está tentando se adaptar, Minjeong.
Sorrio comigo mesma.
A srta. Park não sabe de todos os detalhes envolvendo essa minha pequena façanha fora de casa.
Conversamos mais um pouco e, antes que eu me dê conta, estou deitada na minha cama. Respiro fundo, olhando para o teto.
Não consigo me concentrar.
Há tanto que gostaria de fazer, mas não sei por onde começar. Gosto cada vez mais a ideia de tirar um tempo para mim, principalmente agora, já que minha vida está uma verdadeira confusão. Mas minha mente continua repetindo a conversa que tive com minha psicóloga. E inevitavelmente isso também me faz lembrar daquilo que gostaria de esquecer.
Fecho meus olhos.
Shh...
— Você está bem, Minjeong? — Jimin diz, de pé na porta do meu quarto, com uma mochila pendurada em seu ombro. Meus olhos se abrem e eu respiro aliviada. Ela nunca soube o quão perfeito é seu timing, mas ela sempre aparece quando eu preciso dela.
Sorrio e sento de pernas cruzadas na minha cama, olhando para ela. Jimin sempre sorri tão largo quando olha para mim, o que por sua vez traz sorrisos para os meus lábios. Eu nem sempre tive vontade de sorrir, mas Jimin? Ela me faz sentir como se sorrir fosse tudo o que eu sempre quis fazer.
— Posso entrar? — Ela pergunta.
— Claro — respondo em tom gentil. — Você acabou de chegar da faculdade?
— Sim. Ningning fez questão de me arrastar para um seminário depois das aulas. — Ela diz, sentando na minha cama. — Por falar nisso, eu esqueci de comentar, mas no outro dia ela veio conversar comigo.
Olho para ela, surpresa.
— Ai, meu Deus, eu não sei o que ela disse para você, mas conhecendo minha amiga, sinto que devo um pedido de desculpas.
— Tudo bem. Ela só queria proteger você.
Arqueio uma sobrancelha.
— Ela fez ameaças?
— Só umas quatro ou cinco.
— Uau, parece que ela não foi muito dura com você — brinco.
— Talvez seja o meu charme, ela não conseguiu ir contra isso — Jimin responde.
Reviro os olhos e ela ri.
— É, todo mundo deve mesmo te adorar.
Ela franze a testa e balança a cabeça.
— Como as pessoas podem me adorar se nem me conhecem?
Eu não sei o que responder, então só fico ali, olhando para ela. É então que vejo em seus olhos o mesmo tipo de solidão que eu sinto todos os dias. Como uma pessoa tão linda quanto Jimin pode se sentir sozinha?
— Sei que você deve olhar para mim e achar que tudo é fácil na minha vida, mas não é. Tem um monte de coisas a meu respeito que as pessoas não sabem.
— Sinto muito, eu não queria...
— Tudo bem, Minjeong. Não precisa se desculpar. E de qualquer forma foi bom ter essa conversa com a Ningning, ficou nítido o quanto a amizade de vocês é verdadeira e... — Suas palavras desaparecem quando ela vê meu olhar atento. — Ela estava certa. Vocês são como uma família.
Assinto com a cabeça.
— Ningning foi uma das poucas pessoas que ficaram ao meu lado depois do que aconteceu... Eu não saberia colocar em palavras o quanto isso significa para mim.
Ela ri e beija a ponta do meu nariz.
— Fico feliz por você ter alguém assim ao seu lado. — Diz, sendo sincera. — Mas agora, eu tenho algo para você. Para nós. — Ela pega sua mochila, abre-a e tira um livro de entro. — Eu percebi que você ainda não tinha esse na sua coleção, então passei na livraria e comprei. Além disso, vai ser um ótimo pretexto para passar mais tempo com você enquanto lemos juntas.
Sorrio.
— Por que você decidiu cursar letras? — Pergunto. Estamos em um processo natural de aprender mais uma sobre a outra, mas percebi que ainda não entendo bem esse detalhe da vida dela.
— Porque as palavras contam histórias de um jeito único, e não há fracassos no mundo literário, não de verdade, apenas a chance de fazer um equívoco brilhar.
— Gostei disso.
Ela assente com a cabeça.
— É disso que mais gosto. Você tem a chance de fazer com que momentos ruins possam se transformar em momentos perfeitos. Gosto disso.
— Acho que é por isso que gosto tanto de mergulhar na literatura — confesso.
Ela ergue ligeiramente a cabeça.
— Então quer dizer que a garota que tem uma biblioteca particular é mesmo fascinada por literatura? Estou chocada — brinca.
Dou uma risada.
— É, você tem razão.
— Eu realmente gosto disso, sabia? — Ela sussurra, inclinando-se na minha direção.
— Do que você está falando? — Pergunto, confusa.
— Da sua risada.
Ela se aproxima mais. Meu coração dispara, sinto um aperto no peito. Estamos tão próximas, e os lábios dela estão muito perto dos meus. Ela vai me beijar, penso comigo mesma. É um bom momento, e eu sei que ela vai aproveitar. Mas, antes de acontecer, Jimin se levanta e começa a andar pelo meu quarto, passando os dedos pelas capas de todos os meus romances.
— O que é isso? — Ela pergunta, pegando um pequeno caderno com uma capa de couro.
Eu levanto da cama e corro até ela.
Jimin sorri maliciosamente.
— Oh meu... este poderia ser o diário
de Minjeong?
Eu pulo para ela, e ela segura sobre sua cabeça. Eu pulo de novo, e ela o move para trás das costas. Meus braços estão selvagens, tentando pegá-lo.
— Que tipo de coisas você escreve aqui, hein? Seus pequenos segredos sujos? Eu não posso deixar de me perguntar...
Reviro os olhos.
— Pare com isso e me devolva o caderno.
Ela sorri mais e seu sorriso me faz feliz, e louca, e animada, e assustada de uma vez. Quanto mais ela se afasta para evitar que eu tire o diário dela, mais eu salto para tentar agarrá-lo. Toda vez que nossa pele roça uma contra a outra, eu quero me aproximar. Toda vez que ela me toca, eu quero mais. Ela continua sorrindo.
— Sinto muito, Minjeong. Eu sei que você nunca vai me perdoar, mas eu tenho que ver. Eu só tenho que ler uma página para ver que tipos de pensamentos passam pela sua...
Ela abre a primeira página e para de falar.
Ela para de rir, também.
— A lista de objetivos da Minjeong? — Pergunta.
Minhas bochechas estão quentes, meu estômago dá um nó.
Volto para a minha cama e sento-me.
Ela segue, senta-se e me entrega o diário. Foi culpa da leitura.
A leitura é um dom e uma maldição para mim. Esses livros me fazem capaz de escapar para um mundo que eu nunca experimentei, mas ao mesmo tempo, eles me lembram de todas as coisas que eu estou perdendo.
Então, eu fiz uma lista.
A lista para que se de alguma forma, de alguma maneira, eu for capaz de superar o que aconteceu e recuperar minha vida, eu tenha coisas para fazer, para ver, para explorar. Pensamento positivo, talvez, mas se os livros me ensinaram alguma coisa, foi que sonhar sempre é uma boa causa para participar.
Há centenas de itens na minha lista de afazeres, e alguns dias eu quero saber se eu nunca chegarei a realizar mesmo alguma dessas coisas.
— É uma lista de coisas que você quer fazer? — Jimin pergunta conscientemente.
Assinto com a cabeça.
— Você pode fazer todas, você sabe.
— Talvez... — sussurro, colocando uma mecha de cabelo atrás da orelha.
Ficamos em silêncio por um momento, ambas olhando para o caderno. Jimin coloca-o de lado e segura minha mão na sua, entrelaçando nossos dedos.
— O que você quer fazer no futuro, Minjeong?
Eu penso muito nisso, essa pergunta. O que eu quero fazer? O que eu posso ser? Uma autora, talvez. Esse era o meu maior sonho quando estava me preparando para a faculdade. Infelizmente ele foi reduzido a quase nada depois que minha vida virou de cabeça para baixo.
Ergo a cabeça e me deparo com o olhar mais sincero que já vi na vida.
— Jimin... Eu acho que isso não importa.
— Importa muito.
Abro a boca para falar, e minha voz sai fraca.
— Eu queria ser escritora, Jimin. Mas esse foi um sonho que ficou no passado. Está tudo bem para mim. Não é nada de mais.
— Não — argumenta Jimin, balançando a cabeça de um lado para o outro. — Não — ela repete, mais séria dessa vez.
— Qual é o seu problema?
— Não é verdade. O seu sonho é uma coisa importante, sim. — Ela para, os olhos castanho-esverdeados fixos nos meus. O tom dela é tão firme, como se tivesse certeza do que está dizendo, que suas palavras atingiriam meu coração em cheio. — Não é algo que deve ficar no passado.
Eu não sei o que responder, então fico em silêncio.
— Minjeong?
— O quê?
— Me promete uma coisa?
— O quê?
Jimin se aproxima mais e leva as mãos ao meu rosto, me fazendo olhar para ela.
— Se o mundo fizer você sentir que está se tornando outra pessoa... — Fecho os olhos ao ouvir essas palavras, e as lágrimas começam a escorrer pelo meu rosto. Jimin as enxuga com o polegar enquanto continua falando. — Se ele te magoar e você quiser fugir, lembre dos seus sonhos. Eles não devem se abandonados, está bem?
— Está bem, eu prometo.
Ela enfia a mão no bolso da mochila e pega uma caneta. Então abre o meu caderno em uma página em branco e escreve:
*Algum dia você vai recomeçar sua vida, Minjeong. E neste dia, eu quero ser a pessoa que vai estar ao seu lado. Eu vou ajudá-la a riscar as coisas fora de sua lista de afazeres. Eu vou te incentivar a seguir seu sonho.*
— Jimin... isso é... — As lágrimas voltam a escorrer pelo meu rosto, e balanço a cabeça. Eu tenho tantas coisas que quero compartilhar com ela, mas sei que não vou conseguir agora. Estou emotiva demais.
Jimin sorri ligeiramente e desliza os dedos pelo meu rosto. Nossos olhares se encontram — ela foca nos meus olhos castanhos, e eu estudo os olhos castanho-esverdeados que me olham com tanta intensidade.
— Eu quero que você mantenha essa página como esta. — Ela diz.
— Por quê?
— Por que ela é minha promessa para você. É um lembrete de que você tem alguém com quem contar, não importa o que aconteça. Além disso, sempre que tiver um dia ruim, você pode olhar essa página e se lembrar de que não está sozinha. Não de verdade.
Seguro firme o meu caderno.
— Obrigada, Jimin.
— Sempre, Minjeong. — Ela diz, em tom gentil. Então fica alguns instantes em silêncio, parecendo pensativa. — Mas preciso admitir que sua lista me deu uma ótima ideia.
Eu não quero, mas acabo sorrindo.
— Eu já deveria adivinhar.
— Confia em mim. Acho que você vai gostar.
— Eu sei que vou me arrepender disso, mas... O que você tem mente?
— Quero que você me acompanhe até a Yonsei University esse fim de semana. Ningning e eu andamos conversando e concluímos que seria interessante se você fosse conhecer a faculdade na qual pretendia ingressar.
— Eu... — Fico surpresa diante do seu pedido, e balanço a cabeça. No fundo eu tenho vontade de fazer isso, mas sei que não vou conseguir. — Não acho que seja uma boa ideia, Jimin.
— Por que? — Ela pergunta.
— Você sabe que eu não...
— Eu sei — Ela interrompe, abraçando-me, e eu pressiono meu corpo contra o dela. — Mas também sei o quanto você gostou do nosso último passeio, então achei que seria interessante fazer isso mais vezes. E eu não vou deixar você sozinha em nenhum momento.
Partes de mim ainda se irritam com a maneira como ela me empurra, mas outra parte sabe que eu preciso ser empurrada. Ela é parte da razão pela qual eu tenho me permitido enfrentar meus temores. Mesmo quando Jimin ainda era rude, ela acreditava em mim sobre um futuro.
— Promete? — Me vejo perguntando.
Ela se afasta ligeiramente e coloca meu cabelo atrás da orelha.
— Prometo.
Sinto que essa promessa é verdadeira. Ofego levemente quando seus lábios roçam nos meus. Ela me beija de forma tão suave, mas, mesmo assim, posso senti-la através do meu corpo.
Então é assim que deve ser. É assim que o coração deve bater. Isso é amor.
Mesmo que eu tenha desafios para enfrentar nos dias que virão, acredito que vou ficar bem. Vou ficar bem porque Jimin, de alguma forma, está me mostrando o que recomeçar verdadeiramente significa, como é a sensação, e nada jamais vai poder tirar isso de mim. Mesmo se a vida ficar sombria, esse sentimento vai permanecer vivo em minha mente.
Quando finalmente paramos, nossos lábios ainda ficam se tocando enquanto hesitamos em nos separar. Quando abro os olhos, encontro o seu olhar, e ela sorri para mim quando segura minha mão para beijar meu pulso.
— Obrigada por confiar em mim, Minjeong.
Olhando em seus olhos, pisco rapidamente, para não perder muito desse momento.
Ela me dá um meio sorriso, como se estivesse esperando que eu dissesse algo. Como não falo nada, coloca a mão no meu rosto, percorrendo a lateral da minha bochecha com o polegar.
Não imaginei que isso fosse possível. Não imaginei que uma pessoa pudesse entrar na minha vida de uma forma tão intensa e inesperada.
— Obrigada por ter paciência comigo, Jimin — digo, segurando sua mão.
Ela balança a cabeça e sorri.
— Está tudo bem. Eu já disse que quero fazer parte de cada uma das suas conquistas.
Meus lábios se separam como se eu fosse falar, mas nenhuma palavra sai.
Ela sorri conscientemente.
— De nada. Podemos ler agora?
Assisto com a cabeça, e nós duas nos deitamos na minha cama enquanto ela pega o livro que comprou para mim.
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