Capítulo 21: De volta a Dearborn [narrado por Afonso]
Hoje Valentina e eu completamos 15 anos de casamento, os anos mais felizes da minha vida. Parece que foi ontem que eu a vi pela primeira vez naquele restaurante.
O ano era 1998, era uma noite quente quando eu entrei no L. A. Bistrô, um dos melhores restaurantes italianos de Michigan. O cheiro da comida era maravilhoso e a decoração clássica deixava o ambiente muito mais agradável. O restaurante estava cheio, as mesas estavam quase todas reservadas. Eu olhei ao redor à procura de uma mesa para me sentar, quando percebi que havia uma mulher sentada em uma das mesas mais afastadas das demais, ela estava sozinha.
Era a mulher mais linda que eu já vi.
Ela se virou para mim e os nossos olhos se encontraram, eu dei um sorriso e ela sorriu de volta e acenou.
Ah e que sorriso!
Eu não hesitei e fui até ela.
- Olá, boa noite. - eu disse com um sorriso. - Eu... eu posso me sentar? - perguntei meio tímido.
Ela não demorou e respondeu:
- Sim, claro, por favor! Eu preciso mesmo de uma companhia. - ela disse sorrindo.
- Pode ter certeza que eu sou uma ótima companhia. - eu disse me sentando. - Meu nome é Afonso, muito prazer. - estendi a mão a cumprimentando.
- Valentina, o prazer é todo meu. - ela retribuiu o comprimento com um longo sorriso.
Ela era ainda mais linda de perto. Seus cabelos eram castanhos e ondulados, cada fio no seu devido lugar. O seu sorriso era maravilhoso, com dentes perfeitamente alinhados e ela tinha um brilho diferente no olhar, algo que me encantava.
- Bom... já pode soltar a minha mão. - ela disse risonha.
Só então notei que eu ainda estava segurando a mão dela.
- Oh, me desculpe. - eu disse envergonhado, corando.
- Tudo bem. - ela simplesmente sorriu.
Então o garçom apareceu, nos entregando os cardápios.
- Boa noite, aqui está o nosso cardápio.
- Obrigado. - respondemos quase juntos.
Então ele se retirou.
- Mas e aí Afonso, você é daqui? - ela perguntou.
E assim continuamos conversando, descobrimos muitas coisas um sobre o outro. Ela era muito engraçada e simpática. Eu fiquei impressionado com as histórias de aventura que ela me contou sobre a sua infância. Ela era simplesmente adorável.
Os minutos de conversa foram se passando e nós fizemos os nossos pedidos. Ela pediu um macarrão à carbonara, acompanhado de um vinho tinto suave, o prato tradicional do restaurante, e eu pedi o mesmo.
Não demorou muito e o garçom trouxe os nossos pedidos.
- Aqui está. - ele disse.
- Muito obrigado. - agradecemos.
Comecei a saborear a comida e estava ótima.
- Hum, está uma delícia. - indaguei.
- Nisso eu tenho que concordar, está mesmo uma delícia. - ela disse. - E você vem sempre aqui? - perguntou.
- Sim, adoro a comida italiana. - eu respondi, bebendo um pouco do meu vinho.
- É, eu também. - disse.
Sorri, mais uma coisa em que somos parecidos.
- Opa... está sujo aqui. - ela disse, pegando o seu guardanapo e se inclinando até mim. Com cuidado ela passou o pano no canto da minha boca, limpando.
Seu toque era suave e me fez sentir confortável. Ela ficou alguns segundos parada, olhando para mim com aquele olhar meigo.
- Prontinho. - ela sorriu, terminando de me limpar.
Eu sorri de volta, um sorriso sincero.
Continuamos ali até terminarmos o jantar. De repente os músicos do restaurante começaram a tocar, era uma música romântica.
- Eu adoro essa música, quer dançar? - eu perguntei gentilmente.
- Ah, mas eu não sei dançar. - ela respondeu meio envergonhada.
- Eu te ensino, venha.
Me levantei, segurando a mão dela que também se levantou.
- Tem certeza? Eu posso pisar no seu pé. - ela disse e nós demos risada.
Eu a levei até a pista de dança, onde havia alguns casais dançando.
- Agora você coloca a mão nos meus ombros... - eu disse, erguendo os seus braços.
- Aqui? - ela perguntou.
- Isso, e eu seguro na sua cintura. - coloquei as mãos em volta da sua cintura com delicadeza.
Então começamos a dançar.
Um passo para cá.
Dois passos para lá.
E ela se saiu muito bem.
- Assim? - perguntou sorrindo.
- Muito bem! - eu disse.
Sua expressão era de entusiasmo, como se estivesse feliz por ter conseguido dançar. Ela olhou para mim e continuamos com as nossas trocas de olhares e sorrisos carinhosos. Logo ela encostou a cabeça no meu peito e nós ficamos ali, dançando juntos por vários minutos.
Quando a música acabou nós voltamos para a mesa e ficamos conversando. Eu não me cansava de ouvir ela falar, a sua voz era muito linda. Ficamos ali por horas até sermos interrompidos pelo garçom:
- Ah, com licença. Me desculpem por interromper, mas nós já estamos fechando. - ele disse.
- Oh, meu Deus. - ela disse, olhando em seu relógio. - Já é tarde, nós ficamos conversando e nem percebemos a hora passar.
O garçom nos entregou a conta e eu paguei, mesmo ela insistindo que não precisava. Como já estava tarde eu não deixaria que ela andasse sozinha pelas ruas, então me ofereci para levá-la até sua casa. Ela aceitou, nós entramos no carro e seguimos até chegar na casa dela.
- Bom, chegamos. - eu disse.
Saímos do carro e eu a acompanhei até a porta da casa.
- Muito obrigada, você foi mesmo uma ótima companhia. - ela agradeceu, com um sorriso estampado no seu rosto.
- Que isso, eu que tenho que agradecer. - eu disse.
Nós ficamos ali parados, nos encarando.
- Então... boa noite. - ela disse, quebrando o silêncio.
Ela se aproximou de mim e me deu um beijo na bochecha, mas eu senti que a sua boca encostou no canto da minha.
- Boa noite. - eu disse com um sorriso de canto.
Ela então deu mais um aceno e entrou na casa. Eu fiquei parado em frente a porta por mais alguns minutos até sair do transe e ir de volta até o carro. Coloquei as mãos no bolso do casaco, sentindo que havia um papel. Tirei o papel do bolso e nele estava escrito "me liga" com um número de telefone embaixo. Deixei escapar um sorriso e olhei de volta para casa.
- Valentina...
E eu tive certeza que ela seria a mulher da minha vida.
E foi assim que nós nos conhecemos, viramos amigos e não demorou muito tempo até começarmos a namorar. Namoramos por alguns anos, nos casamos e desse amor nasceu a Elena e o Jared, os meus orgulhos. Mas eles já estão cansados de ouvir essa história.
Eu estava no banheiro, terminando de me arrumar. Dei mais uma olhada no espelho, arrumando a minha gravata, está noite nada poderia dar errado. Nós vamos jantar fora para comemorarmos mais um ano juntos, vamos de volta a Dearborn, onde tudo começou.
Saí do banheiro, estando finalmente pronto e caminhei até a sala. Do corredor já podia ouvir as risadas e as conversas animadas. Entrei na sala, vendo Valentina. Ela estava maravilhosa, assim como na primeira vez que a vi.
Caminhei lentamente até ela.
- Valentina... você está linda! - eu disse.
O vestido azul que ela usava a deixou mais linda e o seu perfume era muito bom.
- Obrigada, meu amor. Você também está lindo! - ela disse.
Estávamos concentrados ali, nossos olhares eram apaixonados. Mas logo fomos tirados do transe por Elena, que começou a tossir para chamar a nossa atenção.
- Oi, filha, você está aí. - eu disse. - Eu não tinha te visto.
Contei a ela que iríamos jantar onde nos conhecemos e ela sorriu, desejando que aproveitássemos bem a noite. Chamei o Jared, que insistiu muito para posar na casa de um amigo da escola. Valentina era contra, pois não queria que Elena ficasse sozinha. Mas como ele não parava de insistir acabamos aceitando. Jared desceu as escadas correndo, já que nós estávamos um pouco atrasados.
Então fui até Elena e me despedi.
- Te amo, filha. - disse a abraçando.
- Também te amo, pai. - ela disse, correspondendo ao meu abraço.
Ela nos acompanhou até a porta e nós corremos rapidamente até o carro, já que estava chovendo.
Tinha que estar chovendo justo hoje?
Acenamos e entramos no carro, partindo em seguida.
- Será que a Elena vai ficar bem? - Valentina perguntou, preocupada. - Tem certeza que não é melhor o Jared ficar com ela? Ele pode dormir outro dia na casa do seu amigo.
- Olha mãe, a Elena já é bem grandinha, ela sabe se cuidar. - Jared disse no banco de trás.
- Jared tem razão, Valentina. - eu disse. - Ela vai ficar bem.
Valentina sempre se preocupou com Elena, desde aquele acidente.
Não demorou até chegarmos na casa do amigo de Jared. Deixamos ele lá e continuamos nosso caminho até Dearborn. O trajeto era curto, apenas 12 km de distância de Detroit, então havíamos chegado em menos de vinte minutos. Eu deixei o carro no estacionamento do restaurante, descemos dele e caminhemos juntos em direção a entrada.
Eu havia feito uma reserva, então logo nos levaram até a nossa mesa. Valentina parecia muito animada com o ambiente do restaurante, que, mesmo em uma noite chuvosa ainda estava lotado, assim como naquela noite quente em que nos conhecemos.
- É impressionante como o lugar continua o mesmo, não mudou nada. - ela comentou, olhando todo o espaço.
A arquitetura clássica continuava a mesma e isso era até reconfortante.
- Tem razão, meu amor. O lugar continua igual, mas não foi só ele que não mudou. Você também continua a mesma, linda como da primeira vez. - eu a elogie, arrancando um sorriso alegre de seu rosto.
- Ah, querido. Muito obrigada. Você também continua o mesmo cavalheiro de sempre e, eu admiro muito isso em você. - ela disse gentilmente.
Eu sorri.
Então o garçom apareceu, nos servindo um champanhe como cortesia da casa.
- Um brinde ao nosso amor. - eu disse, erguendo a taça.
- Um brinde a nós, por estarmos completando mais um ano juntos. - ela completou, encostando sua taça na minha.
Ambos bebemos o líquido.
Eu me aproximei dela, acariciando a pele macia do seu rosto. Encarei seus olhos castanhos, cheios de sentimentos e a beijei carinhosamente. Ela correspondeu passando a mão pelos meus cabelos. Seus lábios eram macios e cada vez mais abriam passagem para que eu explorasse a sua boca. O gosto do seu batom de morango misturado com o sabor do champanhe trazia uma sensação diferente e incrível ao mesmo tempo. Ficamos alguns minutos ali até nos afastarmos, terminando com um selinho.
- Eu te amo. - nós falamos juntos.
A nossa sintonia era maravilhosa.
Decidimos que depois do jantar iríamos terminar nossa noite em um lugar mais reservado, para aproveitarmos cada segundo juntos. Então Valentina mandou uma mensagem para Elena, avisando que só voltaríamos pela manhã.
Demos início ao nosso jantar, pedindo uma coisa mais leve como entrada. Decidimos experimentar uma salada caprese, que por sinal estava muito boa. Assim que Valentina terminou o prato, pediu licença e foi até o banheiro. Enquanto isso eu resolvi checar o meu celular para ver se havia algo importante. Desbloqueei a tela, vendo que havia uma chamada perdida de Elena. Me questionei sobre o motivo de ela ter me ligado e então retornei a ligação para saber como ela estava.
Ela não demorou e atendeu.
- Oi, filha. - eu disse. - Como você está, querida? Está tudo bem? - perguntei.
- Oi, pai. - ela sussurrou.
- Porque você está sussurrando, filha? - perguntei, estranhando sua ação.
- Pai, porque você não me avisou que a sua encomenda chegaria hoje?
- Encomenda? Que encomenda, filha? Eu não encomendei nada.
Houve um silêncio do outro lado da linha.
- Elena? - chamei algumas vezes.
Só escuto o barulho do tu-tu-tu e a ligação é encerrada.
Mas o que será que aconteceu? Me perguntei. Então Valentina voltou do banheiro, se sentando na mesa.
- Que cara é essa, querido? Você está bem? - ela perguntou.
- Por acaso você estava esperando alguma encomenda, Valentina? - perguntei.
- Encomenda? Não, amor. Porque?
Suspirei.
- Encontrei uma chamada perdida da Elena no meu celular, então resolvi retornar. Ela estava meio estranha, sussurrando no telefone. Ela falou sobre alguma encomenda, perguntando porque eu não avisei que a tal encomenda chegaria hoje. Mas eu não me lembro de ter encomendado nada. Tentei conversar com ela mas acho que a ligação caiu. - expliquei tudo a ela.
- Nossa, isso é mesmo muito estranho. - ela disse. - Porque ela estaria sussurrando? Tenta ligar para ela de novo.
Assenti, discando o número e voltando a ligar.
- Atende...
Mas dessa vez caiu na caixa postal.
- Ela não atende. - eu disse.
- Será que ela está bem, Afonso? - Valentina perguntou, seu tom era de preocupação.
- Eu não sei.
Definitivamente essa ligação foi estranha demais, será que a ligação realmente caiu ou ela desligou? E porque agora ela não me atende? Isso estava me deixando muito perturbado.
- Não deveríamos ter saído hoje, primeiro esse tempo ruim e agora... - ela falou, com um quê de arrependimento.
Valentina sempre foi uma mãe protetora, ela se preocupa muito com as crianças. Aliás, Jared e Elena não são mais crianças, Elena tem 19 anos e Jared já vai fazer 17. Mas mesmo crescendo, eles continuam sendo os nossos bebês. Só de imaginar que alguma coisa ruim possa acontecer com um deles, eu já fico nervoso. Mas eu tinha que manter a calma, além de tudo, ainda precisava acalmar Valentina.
- Calma, fica tranquila. Ela está bem. - eu disse, tentando acalmá-la. - Elena deve ter tido um engano e a ligação caiu. Foi só isso, tudo bem?
- Tudo bem. - ela concordou, ainda inquieta.
Continuamos de onde havíamos parado, voltando a nos concentrarmos no jantar. O clima já não era mais o mesmo, a preocupação estava ocupando as nossas cabeças. Eu comecei a puxar alguns assuntos e até contei algumas coisas engraçadas, para tentar aliviar a tensão de Valentina. Deu certo e logo ela já estava animada novamente.
- Só você mesmo, Afonso. - ela deu risada.
Valentina quis escolher o nosso prato principal, e eu concordei. Ela escolheu um espaguete à matriciana, acompanhado de um bom vinho tinto, era a combinação perfeita. O sabor da massa era muito bom e me fez lembrar dos tempos de infância, quando minha mãe preparava o espaguete para mim e meus irmãos. Logo depois veio a sobremesa, um zabaione gratinado com morangos. Confesso que dessa sobremesa italiana eu nunca havia provado, mas me surpreendi com tamanho sabor.
Assim, nós terminamos o nosso jantar e seguimos conversando por mais alguns minutos. Estar com Valentina é como nunca mais se sentir sozinho. Decidimos então que já era hora de irmos, pagamos a conta e saímos, indo até o carro.
Fomos até um motel, que não era muito longe do restaurante. Chegamos e logo nos deram a chave do nosso quarto, fomos até ele e entramos. A decoração do quarto já deixava o clima mais quente. Me deitei na cama vendo Valentina ir até uma mesa e beber um espumante que estava ali. Quando ela terminou veio até mim, mordendo os lábios. Tirou o meu paletó e deitou ao meu lado, enquanto eu a beijava com carinho e ternura.
- Não me abandone. - sussurrei, puxando-a para cima de mim.
- Nunca. - ela sussurrou de volta, enquanto eu arrancava seu vestido e jogava de lado.
Repetimos isso várias vezes, enquanto do outro lado da cidade, eu sabia, Elena está bem.
Valentina acabou adormecendo nos meus braços. Eu a olhava analisando o seu rosto, ela era linda até dormindo. Ficamos ali, abraçados entre os lençóis e eu fiquei pensando, imaginando como seria o nosso futuro daqui para frente, quando nossos filhos já estiverem casados. Nós seremos velhinhos e grisalhos e, certamente teremos muitas histórias para contar aos nossos netos.
Peguei meu celular e fui entrando na galeria. Passei o dedo pelas nossas fotos e sorri, vendo uma selfie engraçada que nós tiramos nas férias do ano passado, em Denver, no Colorado. Visitamos o parque Red Rocks & Amphitheatre. O lugar era perfeito, com locais incríveis para fazer trilhas a pé. Me lembrei de sorrir quando Elena tropeçou em um galho no meio da trilha. Jared passou o resto da caminhada inteira fazendo piadas sobre o tombo que ela levou. Foi uma das férias mais divertidas da minha vida.
E pensando em Elena, me lembrei da ligação que nós fizemos mais cedo. Pensei em ligar novamente para ela. Talvez ela não fosse atender, pois poderia estar dormindo, mas resolvi tentar. Quase desisti, achando que ela realmente não atenderia. Vários segundos se passaram, até que ela finalmente atendeu a ligação:
- Oi, filha. Querida, está tudo bem? Eu acho que a nossa ligação caiu, eu perdi o contato e não consegui mais retornar. Como estão as coisas por aí? - perguntei depois que ela atendeu.
- Oi, pai. - ela respondeu, sua voz era meio chorona.
- Filha, você está chorando? O que aconteceu? Você está bem mesmo? - eu perguntei preocupado.
- Não, pai. Não se preocupe. É só uma dor de cabeça muito forte que não quer passar. Mas eu estou bem. - ela disse.
- Meu Deus, querida. Você já tomou um remédio?
- Sim pai, acabei de tomar. - respondeu.
- Olha, sua mãe e eu já estamos indo. É melhor nós voltarmos. - indaguei, ainda preocupado.
- Não, pai. Eu estou bem, é sério. Não quero atrapalhar a sua noite com a mamãe. Podem aproveitar bem.
- Você não vai atrapalhar, filha. Nós vamos volt... - ela me interrompeu.
- Não! Não será preciso, pai. Já está passando. - insistiu mais uma vez.
- Tem certeza, Elena?
- Sim, pai. Não se preocupe.
- Tudo bem, filha. Mas qualquer coisa não deixe de nos ligar. Ah... Elena, o que tem a tal encomenda? - perguntei ainda curioso.
- Não era nada importante, pai. Depois conversamos sobre isso.
Nada importante?!
- Está bem, querida. Tchau!
- Tchau, pai.
E a ligação terminou.
Isso estava me deixando confuso. Não consigo entender porque Elena está assim, tão estranha. Primeiro ela vem com essa história de encomenda e, depois diz que não era nada. Também é estranho ela ter insistido tanto para não voltarmos para casa, logo ela que não gosta de ficar sozinha. Eu espero que ela esteja mesmo bem. Pelo tom da sua voz dava para perceber que ela tinha chorado, mas será que era apenas uma dor de cabeça? Ou tem alguma coisa que ela não quis me contar? Eu realmente espero que não seja nada demais, quero voltar amanhã e encontrar a minha filha bem.
Valentina percebeu a minha movimentação na cama e me abraçou mais forte.
- Quietinho, amor. - ela disse, meio sonolenta.
Me aconcheguei ao seu lado e também acabei pegando no sono.
[...]
Já faz alguns minutos que acordei e não paro de encarar o teto do quarto, perplexo. Eu não consegui dormir direito. Tive um sonho, mas consigo me lembrar muito bem dele, só tenho a sensação de que ele não foi muito bom. Por isso estava perplexo. Era frustrante tentar lembrar de algo e não conseguir, imagino o que Elena passou quando perdeu a memória, pobre menina. Aquela maldita sensação de que alguma coisa estava errada me fez levantar da cama e me vestir.
Eu precisava caminhar para tirar esses pensamentos da minha cabeça. Levei o lençol até os ombros de Valentina, a cobrindo. Passei a mão pelo seu cabelo e dei um beijo em seu rosto.
- Eu já volto, amor. - disse, mesmo sabendo que ela não iria ouvir.
Então saí do quarto e fechei a porta, indo direto para a recepção.
A pequena sala de recepção do motel estava vazia, a não ser pelo recepcionista que estava dormindo profundamente em cima do balcão. A sala tinha uma televisão ligada, instalada na parede e uma máquina de refrigerante ao lado de um pequeno e aparentemente confortável sofá. Fui até a máquina e coloquei o dinheiro na mesma, escolhendo o meu refrigerante.
Abri a latinha, dando um gole no guaraná. Olhei para o relógio presente na sala, vendo que já era avançada a madrugada. Continuei em pé, sem querer me sentar no sofá. Eu escutava ao longe o som baixo da televisão, que provavelmente exibia um programa qualquer de auditório.
"Agora vamos para um rápido intervalo." Disse o apresentador.
Eu olhava para fora, através da porta de vidro da recepção. A noite agora estava mais calma e sem nenhum resquício de chuva. Minha cabeça voltou a ter os mesmos devaneios de antes. Parado ali, comecei a pensar em tudo o que tinha acontecido esta noite, até ser despertado pela TV.
"Voltamos com mais um plantão do nosso diário de notícias, direto de Detroit." Dizia a apresentadora.
Isso me chamou a atenção, já que se tratava da minha cidade. Me virei completamente para olhar a televisão.
"Como é do conhecimento de todos, os moradores da cidade de Detroit estão em risco desde quando o perigoso assassino escapou da prisão. A cidade não tem sido mais a mesma durante essas últimas horas. A população se mantém em casa desde quando o toque de recolher foi decretado pelas autoridades competentes."
Essa notícia me deixou extremamente preocupado. Isso nunca havia acontecido antes em Detroit. Para a polícia ter tomado a atitude de manter a população em casa é porque esse assassino é mesmo muito perigoso. Logo pensei em Elena, que estava sozinha e senti meu coração palpitar.
Continuei ouvindo a notícia com mais atenção:
"Agora vamos conversar com a nossa repórter de rua, Sara Miller. Neste momento Sara está em frente ao Centro Imobiliário de Detroit, onde o corpo do jovem Ryan foi encontrado."
O que? Uma pessoa morta? Então a situação é mais grave do que parece.
"Boa noite, Sara. Quais são as novas informações?" A apresentadora perguntou para a repórter.
"Boa noite." Ela respondeu. "Estou aqui na cena do crime. A nossa equipe está acompanhando todo o trabalho da polícia. Desde quando o corpo de Ryan foi encontrado, o medo tomou conta da população. A morte do rapaz de apenas 28 anos está sendo associada como a primeira vítima do assassino fugitivo. Isso está causando uma série de questionamentos para os agentes, que, após 15 anos, decidiram reabrir o caso."
Fiquei pensativo, porque esse tal assassino esperaria tanto tempo para fugir da cadeia? Isso estava estranho.
"Agora vamos entrevistar o agente do FBI, John Karter, que tem algo a nos dizer. Boa noite, agente. O que o senhor tem a dizer para os habitantes de Detroit?" Sara perguntou para o agente, que logo tomou a fala no microfone.
"Boa noite. Só quero dizer a população que não entrem em pânico e que confiem no trabalho da polícia. Nós estamos fazendo o nosso melhor para garantir a segurança de todos. Peço que continuem colaborando e que não saíam para as ruas até segunda ordem."
O assunto está ficando muito sério. O caso agora é Federal, o que o torna muito mais importante. Mas quem será esse maldito assassino?
"Agente, qual é o seu recado para o assassino?" A repórter perguntou.
Então ele respondeu:
"Fique sabendo que não importa onde você esteja, eu vou te encontrar. Eu já te prendi uma vez e vou prender de novo. Dessa vez você não vai escapar e não vai mais ferir ninguém. Eu vou encontrar você, Eldon Styne."
Quando ouvi esse nome, fiquei paralisado. Derrubei a lata de refrigerante no chão, sentindo uma lágrima dolorosa sair pelos meus olhos.
- Senhor, cuidado! - era a voz do recepcionista gritando para mim.
Não era possível!
- Isso não pode estar acontecendo. Não pode ser verdade! - eu gritava para mim mesmo.
Esse maldito tem que estar preso. Como ele fugiu?
De repente um filme passou pela minha cabeça e eu só pensei em uma pessoa, Elena.
- O senhor está bem? - perguntou o recepcionista, mas eu nem sequer prestei atenção no que ele tinha perguntado.
Porque? O que ele quer de mim?
Eu estava desesperado. Senti o sangue mas minhas veias pulsando mais rápido. Ele só pode estar querendo uma coisa, vingança! Elena.. Oh, meu Deus. Comecei a ligar os pontos e tudo estava se encaixando. Era por isso que ela estava tão estranha, chorando. Só em pensar nisso senti uma raiva tomando conta de mim, em uma mistura de medo e ódio.
- Miserável! - eu disse, fechando os punhos.
Se ele encostar um dedo na minha filha eu o mato!
Desesperado, comecei a correr novamente até o quarto. Valentina acordou em um sobressalto, pelo barulho da porta do quarto batendo contra a parede.
- Afonso, o que é isso? O que foi? - ela perguntou em um grito.
- Elena.
Saí vasculhando o quarto, procurando o meu celular.
- Cadê? Onde ele está? - perguntei,
- Me diga o que aconteceu, você está me assustando! - ela exclamou.
Achei o meu celular e o peguei, discando o número da polícia.
- Você está ligando para a polícia? - Valentina perguntou, sem entender nada.
- Arrume suas coisas, Valentina. - eu mandei. - Agora!
Ela me olhou assustada.
- Departamento de Polícia de Detroit, qual a sua emergência? - uma voz perguntou quando a ligação foi atendida.
- Preciso de uma equipe de polícia, agora. Eu sei onde este assassino está. - eu disse, sentindo o peso das minhas palavras.
Continua...
_________________________________________
Notas da autora:
Olá, amigos. Tudo bem? Esse capítulo seria publicado no domingo, mas não consegui terminar a tempo. Me perdoem. Então, o que acharam da narração pelo ponto de vista de Afonso? Comentem aí.
Pessoal, acreditem. A história TALVEZ esteja entrando em suas fases finais. Estou até com medo de escrever os próximos capítulos. Mas vocês podem me ajudar dando uma opinião. O que vocês acham que não pode faltar no final desta história? Gostou do capítulo? Vota e comenta.
Até o próximo capítulo!
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