Capítulo 1
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Primeiro Chute
Maio de 1994
Estava no colégio, hora do intervalo, eu lia um livro quando percebi que alguns garotos jogavam bola na quadra. Uma bagunça, gritaria, risada e muita confusão. Algo chamou minha atenção. Um rapaz, ao dar um chute na bola, o seu tênis voou junto e caiu no telhado. Todos riam do coitado. Comecei a prestar atenção, assim como várias outras pessoas, inclusive meninas que batiam palmas e davam gritos de incentivos para que ele escalasse o paredão e chegasse ao telhado. Era um verdadeiro homem aranha ao escalar, então observei sua agilidade. Quando ele chegou perto do tênis, o pegou, levantou como se fosse à conquista de uma taça, um prêmio alcançado. O colégio foi abaixo. Gritaria e aplausos explodiram no pátio.
Com tanta algazarra foi impossível não chamar a atenção da coordenação da escola. Foi neste instante que apareceu o coordenador disciplinar no pátio para saber o motivo de tanta bagunça. E lá no telhado, o homem aranha levantava o tênis e era aplaudido. Alguns garotos gritavam que ele era uma bola murcha — um perna de pau —, mas as meninas gritavam:
— Lindo!
Onde eu me encontrava não conseguia ter noção se ele era bonito, o que conseguia ver era seu físico, realmente de tirar o fôlego.
O Senhor Aurélio, não tinha uma cara muito boa, logo o mandou descer. Antes de atender ao seu pedido ele me olhou. Seu olhar prendeu o meu de uma maneira como se tivesse preso por uma corrente de eletricidade. Um fio imaginário que não me possibilitava mexer. Por mais que minha cabeça pensasse: pare de olhar! Eu não conseguia virar o rosto e nem abaixar os olhos. Vi somente seus olhos negros brilharem e ele sorrir. Como num passe de mágica, o encanto foi quebrado. Fechei meus olhos e voltei a respirar.
O que foi isso? — pensei.
Fechei o meu livro e voltei para sala de aula.
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Mudei para essa escola há algumas semanas, tudo era muito novo ainda. Eu estudava antes em um colégio que pertencia à Universidade Federal, e como todas as federais estavam em greve há quase dois meses, meus pais resolveram transferir-me de escola, pois se preocupavam que eu perdesse o ano. Com isso, minha cabeça e meu coração ficaram uma bagunça.
Meu nome é Isabela, tenho 16 anos e curso o segundo ano do ensino médio. Minhas duas melhores amigas, Ana e Raquel, mudaram de escola junto comigo, mas estão em outra turma, pois elas fazem novamente o primeiro ano. E no dia de hoje, elas faziam prova que perderam. Corríamos atrás do prejuízo que a greve tinha feito nas nossas vidas. Apesar de que, elas queriam mais era ficar perto dos garotos, embora precisassem estudar. Eu tinha outros amigos, mas nada se comparado com a nossa amizade. Éramos unidas demais, desde pequenas.
Eu namorava um universitário, que não estava na cidade por causa da greve, falávamos por telefone neste período. Mas nosso relacionamento ficava a cada dia mais distante. O seu nome é Alex. Ele é alto, olhos verdes, loiro, um corpo atlético e quase perfeito. Um pouco ou bastante convencido de sua atração física sob as mulheres, se achava por isso.
No início, todas minhas amigas ficaram a fim dele, mas ele veio logo conversar comigo, daí para um cinema e outros encontros foi um pulo. Fiquei me achando no início, mas para falar a verdade e dizer que me apaixonei, não era verdade.
Desde o início, eu percebi que faltava um quê. Aquele frio no estômago, a vontade de estar junto e se encontrar. Achava-o lindo, divertido, mas gostar de verdade... Não. Eu me divertia muito mais com minhas amigas do que com ele. E quando saíamos somente nós dois, eu ficava pensando o que elas faziam. Sabia que isso não podia ser normal.
Até ver aqueles olhos negros de longe.
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Minha sala de aula ficava no segundo andar do prédio, uma construção antiga e muito bem conservada. Entrei e sentei em minha carteira atordoada, sentia um frio no meu estômago que chegou a secar minha boca. Balancei a cabeça como se pudessem balançar meus pensamentos para bem longe. Abri o livro na tentativa de voltar a ler e me concentrar em outra coisa, mas não adiantou, eu li uma página e meia e não sabia se quer uma palavra.
O sinal tocou. As pessoas começaram a entrar, rindo e falando do rapaz no telhado. Em seguida o professor entrou e pediu silêncio e que todos abrissem o livro na página 42.
Acabou a aula e eu não via à hora de encontrar Ana e Raquel para contar o que tinha acontecido no intervalo. Elas me esperavam na saída, estavam eufóricas e ao mesmo tempo decepcionadas, por que ficaram sabendo de certo cara que escalou a parede do pátio e deu um show no intervalo e elas perderam. Não paravam de falar um minuto, contaram também de outro garoto que foi pego beijando uma garota no banheiro. Falaram que tinham sido convidadas para uma festa e de outro evento que Ana tinha em família, por isso não poderia ir, na tal festa. Eu acabei ficando quieta e perdida nos meus pensamentos.
Elas eram assim, às vezes queriam falar, falar e falar. Esqueciam que em diálogos existiam a outra parte que era o escutar.
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Ana, ela era loira de olhos azuis, tão claro que às vezes parecia que lhe faltavam cor. Tinha um espírito aventureiro que muitas vezes nos colocavam em confusão. Já a Raquel, ela era meio desligada, adorava tudo o que era diferente e ligado a natureza e rústico. Tinha um cabelo com cachos num tom bem diferente, não chegava a ser ruiva, era um tom acobreado mais lindo que eu já tinha visto, dava um contraste com seus olhos bem azuis, muito diferentes do da Ana.
E eu! A equilibrada desse trio. Meus cabelos eram castanhos, os olhos um pouco verdes e caramelos, muito bonito por sinal. Confesso que adoravam meus olhos. Sempre fui muito centrada e colocava essas duas de volta nos trilhos. Éramos como irmãs e tudo que acontecia com uma, todas se envolviam e ajudavam da melhor forma.
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Depois de um tempo, Ana percebeu que eu continuava quieta, então perguntou:
— Isabela, o que aconteceu? Por que não falou nada até agora?
— E por acaso vocês deixaram? — perguntei, e elas deram risadas — Posso falar agora? Eu vi tudo isso acontecer ao vivo e a cores, e sei que não foi bem assim como vocês estão falando.
Acabei sendo o centro das suas atenções por alguns minutos. Contei tudo, somente não falei da parte final, pois poderia ser pretensão minha. Afinal até agora não sabia se tinha sido verdade, ou se eu que imaginei coisas.
Chegamos ao ponto onde nos separavam. Ana pegava carona com uma vizinha e outras vezes era a mãe que a buscava.
A Raquel, sempre o irmão a buscava.
Eu andava até a clínica do meu irmão, ele ia comigo, pois almoçava na casa dos meus pais todos os dias. A esposa dele trabalhava numa agência bancária e fazia seis horas diretas, por este motivo almoçava no local de trabalho. Eles somente voltavam para a casa de noite. Eu brincava que ele era um folgado, mas a carona era boa.
Tiago, meu irmão, é veterinário e têm uma boa clientela. No momento, expandia com outros serviços a clínica. Trabalhei de recepcionista para ele antes de entrar no ensino médio. Na época, era como brincar de casinha e com bichinhos de verdade, sem falar que ganhava uma grana. Depois os estudos apertaram e ele precisou de alguém para trabalhar em período integral.
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Logo depois do almoço Ana me ligou e chamou para estudar na casa de Raquel. Na verdade era uma desculpa para ficarmos juntas e no final da tarde darmos umas voltas na rua. A casa de Raquel era um ponto estratégico, pois ela morava bem perto de onde a galera se encontrava. Herança de família, a casa tinha um estilo antigo, com portas e janelas grandes. A varanda de frente para rua era um lugar perfeito para se ficar, uma mesa de jantar que acomodava minha família inteira mais os convidados. Fora os sofás e espreguiçadeiras com almofadas. As flores e plantas em todos os lados completava a harmonia desse lugar.
Apesar de a cidade estar um pouco parada sem os estudantes da universidade, era gostoso passear e papear com os amigos. Combinei de ir, mas avisei que realmente precisava estudar.
Assim que cheguei comecei a fazer todos os exercícios proposto pelo professor de física. Fiz um resumo das matérias dadas naquele dia e iniciei o livro de literatura. Enquanto elas, não saiam da varanda, com um livro em mãos que não saíram da mesma página. Eu somente escutava as risadinhas de longe.
A dona Marta veio me avisar que iria colocar um lanche na mesa da varanda e que era hora de nós darmos um tempo nos estudos.
Ana disse com a maior cara de pau:
— Nossa! Estou cansada de tanto estudar. — Revirei os olhos, e ela continuou: — verdade Isa, eu sei cada carinha gato que passou aqui, quantas vezes passou, o número de vezes que ele olhou para cima e quantos eram feios. É matemática pura!
— Mas você está lendo um livro de literatura! — exclamei.
— Para você vê como sou uma boa aluna, faço tudo ao mesmo tempo. Romantismo e romancinho — Deu risada.
A Raquel, com seus cachos rebeldes, passou o braço pelos meus ombros, e falou:
— Isa, você precisa ser menos estudiosa, está querendo mostrar para aqueles fedelhos da sua turma que você é uma CDF? Não precisa meu anjo, daqui a pouco eles vão saber; basta sair suas notas, ou as outras forem transferidas — Eu a interrompi:
— Vocês sabem que não é nada disto! Eu não gosto de deixar acumular matéria.
Levantei e cheguei perto do balaustre da sacada e meus olhos não acreditaram no que viram. O homem aranha, com uma garrafa de água na mão passava na rua e no instante que foi tomar a água, olhou para cima e deu direto com meu olhar — então exclamei:
— Meu Deus, o homem aranha!
Daqui a pouco a bola vai rolar e o jogo começar
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Primeiro chute foi dado. Agora é deixar rolar e ver como desenrola essa história.
Você vai acompanhar comigo?
Faça seu comentário. Seja o juiz também.
Aqui você pode votar a vontade.
Até o início do próximo tempo.
Beijo
Lena Rossi.
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