Capítulo 18⛩Ilha Shamian⛩
Assim que chegamos da viagem e calculei que era um horário apropriado, liguei para meus pais e contei tudo que vi em nosso fim de semana, claro omitindo o episódio com a serpente.
Minha mãe já está mais conformada com minha ausência, mas disse que morre de saudade. Ela me deu um recado de Vó Lan, que quer saber se já tenho alguma pista de suas irmãs ou outros parentes. Respondi que não, mas que em breve começarei a procurar.
Meili e eu retornamos nossa rotina no Instituto. Eu estava um pouco ansiosa. Acho que Wen percebeu, quando olhei pela décima vez para a porta, pensando que uma certa pessoa ia chegar a qualquer momento, mas não chegou. Seu lugar ficou vazio o dia inteiro.
"Ouvi dizer que ele viajou. Não aparece desde o dia que você viajou com Meili. " Disse Wen.
Suspirei discretamente e me concentrei na aula.
Para piorar, Enlai estava um grude, não saía da minha cola.
No fim da aula, o Senhor Liu anunciou que a aula passeio até a Ilha Shamian será no dia seguinte e ele nos acompanhará.
Estou empolgada em conhecer o lugar. Depois de tudo que Chen me contou aquele dia na fonte, fiquei realmente curiosa.
Infelizmente, meus amigos não poderão ir. Meili, Wen e Enlai, têm avaliação de inglês, disciplina que eu não preciso fazer. Obviamente, Chen também não irá. Ou fará essa prova, ou ainda estará viajando.
À noite fui deitar ansiosa com o passeio. Meili e eu conversamos um pouco antes. Ela realmente ficou balançada com as coisas que lhe falei na viagem. E agora não para de falar na vinda de Hong para cá.
Custei a pegar no sono e quando adormeci, tive mais um dos meus sonhos com neblina, florestas e perseguições. Acordei arfando e suada. Sentei na cama, mas estava ainda com a visão embaçada. Parecia ter visto uma espécie de ave no batente da janela, me observando. Esfreguei os olhos e foquei melhor, mas não havia nada lá. Devo ter sonhado...
No dia do passeio, como estava ensolarado lá fora, usei meu vestido florido. Ele é de alcinha, curto e fresquinho. Coloquei também sandálias confortáveis. A Senhora Sying insistiu para que eu usasse um chapéu seu emprestado. Olhando no espelho, gostei do resultado.
Quando cheguei no ponto de encontro, o Senhor Liu disse que eu já poderia embarcar, pois não faltava mais nenhum aluno de sua lista.
Ao entrar no barco, mãos grandes se estenderam para me ajudar. Aceitei e quando ergui a cabeça, para agradecer, dei de cara com o rosto que não consegui esquecer nos últimos dias, apesar de todos os esforços.
"Você veio!" Digo surpresa
"Decepcionada?"
"Não, só achei que você fosse fazer a avaliação de inglês também."
"Já cumpri esse módulo."
"Você sumiu!" Sondo.
"Você também." Ele revidou.
"Fui visitar parentes da Mei, no interior. " Explico, não sei porquê.
"E eu fui resolver alguns assuntos. " Ele responde vagamente.
"Ah...." Ele é sempre tão reservado no que se refere a sua vida.
Durante a viagem até a Ilha Shamian, ficamos debruçados lado a lado, na mureta da embarcação. Chen estava empolgado e começou a me contar detalhes sobre a ilha:
"A palavra Shamian significa (superfície de areia), porque é formada por um banco de areia. Na ilha, temos a sensação de voltar ao passado através das estátuas, que retratam a vida da população em séculos passados. Como aquela da fonte, no Instituto."
Acenei, lembrando daquela cena constrangedora, em que quase caí.
Ao desembarcarmos, o Senhor Liu deu uma breve palestra e depois nos dispensou para explorar a Ilha.
Chen me acompanhou durante todo o tempo, mostrando ruas, monumentos e praças. Tirei várias fotos com minha nova câmera.
Em um certo momento, Chen pegou minha câmera e começou a fotografar-me. Isso me deixou um pouco constrangida, mas o fato dele estar tão à vontade, me fez calar. No final, me soltei e já estava fazendo poses.
Mais tarde, sentamos em um banquinho de praça para comermos fatias de melancias, compradas em um ambulante. Fiquei pensativa, revisando tudo que já fiz nessa primeira semana na China. Vi alguns lugares maravilhosos, fiz amizades e conheci pessoas interessantes, como Chen, apesar de algumas estranhezas, parece que estamos nos tornando amigos.
"Um Yuans por seus pensamentos!" Chen me entrega uma fatia.
Dou um sorriso.
"Estava só pensando como essa viagem tem sido maravilhosa para mim."
"Fico feliz que está gostando daqui e de ter te conhecido. Você é uma garota incrível. É inteligente, sensível e amiga. Mesmo sabendo que não sou muito sociável, não se importa com o que os outros pensam."
"Mas é assim que tem que ser. Precisamos aceitar uns aos outros, como são. Todos temos nossas esquisitices."
"Você faz com que eu me sinta normal. " Chen diz pensativo.
"Mas você é normal. Talvez um pouco fechado demais, mas isso não dá direito a alguém de te excluir."
Chen fica sério.
"Você não me conhece. Não sabe quem eu verdadeiramente sou."
"E quem você é então?"
"Algumas pessoas me chamam de aberração."
"Não perguntei o que os outros acham, e sim quem você é." Corrijo-o.
Ele fica em silêncio por um tempo. Depois respondeu:
"Alguém que você não gostaria de conhecer realmente e que tem feito um esforço sobrehumano para se afastar..."
Ele pronuncia isso baixo. Seus olhos estão naquele tom negro, mas nuances azuladas começam a surgir e se direcionam para meus lábios. Leva uma das mãos a uma mecha de meu cabelo, colocando atrás de minha orelha. Fecho os olhos e espero, mas nada acontece. Quando abro, ele me observa. E diz:
"Desculpe." Se afasta no banco.
"Desculpe pelo o quê?" Pergunto frustrada.
"Você deve manter distância. Não quero me envolver..." Ele começa a se explicar.
"Tudo bem!" Levanto envergonhada e ofendida.
"Ei, espere! Não me interprete mal!"
"Não precisa se explicar, não aconteceu nada e eu não estou pedindo nada a você." Saio andando com meu orgulho ferido.
Chen abaixa a cabeça parecendo triste. Não dá para entendê-lo. Primeiro me despreza, depois fica triste, quando me afasto.
Prefiro ficar o restante do passeio com o grupo de alunos que estava com o Senhor Liu. Quando me aproximo ouço sua explicação:
"A Ilha de Shamian está localizada no distrito de Liwan de Guangzhou, na província de Guangdong. Já foi abrigo para comerciantes internacionais..."
Chen também se junta ao grupo, mas fica me observando de longe.
Paramos em uma construção do século passado que agora funciona como espaço para exposições, cybercafé e centro de cursos. No meio do prédio de dois andares, há um espaço aberto com um lago cheio de carpas, pedras, plantas e flores exóticas, que dão um ar selvagem ao local.
Sento-me à beira do lago e fico brincando com os dedos na água. Admiro a beleza do lugar, enquanto penso na minha conversa com Chen. Ele me confunde com suas atitudes. Está bem claro para mim, que ele até sente algum interesse, mas se comporta como se fosse indigno, diferente e perigoso. Só que não sinto que ele seja capaz de fazer mal a alguém. Será que estou com meu instinto de autopreservação com defeito?
Um farfalhar nas folhagens desperta minha atenção. Levanto a cabeça e olho ao redor. Noto que o grupo já se afastou um pouco. Sinto aquele arrepio na nuca, que sempre precede o acontecimento de algo estranho. Isso vem se repetindo com frequência.
Percebo que estou sendo observada, logo depois sinto uma pancada em minha cabeça. Um peso permanece estacionado no local. Segundos depois o peso a se mexer, agitando e se embrenhando em meus cabelos. Olho para o reflexo no lago e vejo um animal peludo e dourado me atacando. Dou um grito estrindente de susto. Tento tirar ele de cima de mim apavorada. Mas ele começa a mostrar os dentes e tentar me arranhar. Continuo gritando e me sacudindo, até que tropeço e caio no chão. O animal desce e investe para cima de mim, visando agora meu rosto. Grito e coloco os braços à frente para me proteger. Então ouço um golpe e o som abafado de um corpo caindo ao chão. Abro os olhos e vejo Chen. Ele empurrou e tirou o animal de cima de mim. É um macaco, que agora arreganha os dentes enormes para Chen. Mas ele não precisa fazer absolutamente mais nada, apenas fica ali parado, encarando o animal por alguns segundos. Logo depois, o primata furioso se torna um animal manso e se afasta de nós, subindo em um arbusto e sumindo entre as folhas.
"Como você está?" Chen pergunta ajudando-me a levantar.
"Apavorada! De onde saiu esse macaco? Animais ferozes como esse, podem andar soltos por aí?!"
Chen franziu o cenho.
"Na verdade, eles não costumam aparecer com frequência por aqui. Você se machucou?"
Ele me examina, preocupado.
"Acho que não."
Me inspeciono. E além de uns arranhões e da bagunça que está meu cabelo e roupa, eu estou inteira.
"Ainda bem! Mas porque se afastou do grupo? Precisa ter mais atenção! Você é sempre assim tão distraída?"
"Desculpe se te dei trabalho, mas parei só um instante para admirar o lugar e aquela fera me atacou. Não acho que a culpa seja minha!" Me defendo.
Chen me observava, preocupado.
"Você precisa se limpar e beber algo para se acalmar antes de irmos. Venha, vou te acompanhar até o banheiro e depois aviso ao Senhor Liu para nos esperar."
"Está bem." Aceito sua ajuda, porque estou realmente assustada e com medo daquela fera aparecer de novo, mas fiquei magoada, por ele pôr a culpa em mim.
Parada no banheiro sozinha, olho minha imagem no espelho. Meus cabelos bagunçados, minha roupa esgarçada e meus olhos arregalados. Meu Deus, o que está acontecendo? Há algo errado comigo. Muitas coisas estranhas veem acontecendo nessa minha primeira semana na China! Chen tem razão. Eu sou praticamente um ímã para acidentes e confusões. Não é à toa, que ele tenta se afastar.
Mas ele também é muito estranho! Que ser humano consegue acalmar um animal enfurecido como aquele, somente com o olhar?
Saio do banheiro e dou de encontro com aquele rapaz franzino, que estava sendo ameaçado por Hu, alguns dias atrás. Ele segura minha bolsa.
"Oi! Essa bolsa é sua? Acho que você perdeu, quando fugiu daquele animal."
"Sim, é minha. Obrigada!
Espera, como você sabe que um animal me atacou?"
O rapaz largou a bolsa em minha mão e saiu, com uma expressão assustada, esbarrando em Chen, que vinha ao meu encontro.
" Então, está melhor? Já avisei ao Senhor Liu. Ele está nos aguardando lá fora."
"Sim, estou melhor. Chen, obrigada por me salvar. Fiquei desesperada e esqueci de agradecer."
Segurei seu braço, enquanto falava. Ele gemeu. Virei seu punho e vi uma mordida.
"Chen, o macaco te mordeu! Você está sangrando! Precisa de atendimento!"
"Não, não foi nada!" Ele puxou o braço, escondendo de mim.
Tentei segurá-lo novamente. Ele recuou.
"Não me toque!" Gritou.
Congelei.
"Eu estou bem, já disse. Vá se encontrar com o grupo, que estou indo logo atrás."
Saio andando com os olhos cheios de lágrimas. Definitivamente, Chen não tem interesse algum por mim. Como pude me enganar? Ele só estava preocupado comigo, porque tem um senso de moral e caráter. Nada além disso. Nem suportou meu toque. Precisou gritar para que eu entendesse. Como pude me iludir novamente? Acho que romantizei demais a sua aproximação.
Na embarcação, me sento bem distante de todos para não me envolver nas conversas.
Não vejo mais Chen. Ele deve ter voltado em outro transporte para me evitar.
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