Capítulo 1
Sussurros eram ouvidos por ela. Em meio à multidão, era possível sentir cada sentimento, ver cada angústia e vivênciar cada dor.
Uma das pessoas estava prestes a morrer, a dor em seu corpo era imensa. Uma mulher de pele clara e cabelos castanhos. O fio dourado da vida, estava se separando dela. Ela olhou com um olhar de medo para a pessoa que podia fazer algo por ela no momento.
Seu olhar estava fixo em uma garota franzina de rosto sujo e cabelos loiros presos em tranças. A garota estendeu a mão para a mulher mas, ela não a alcançou. Seres feitos de sombras com rosto de caveira seguravam a mulher doente.
"Chegou a sua hora." Eles disseram com uma voz profunda e amedrontadora, fazendo a mulher tremer.
A garota loira tentou chegar até ela mas, a mulher ficava cada vez mais distante. O desespero tomou conta dela, principalmente quando a mulher a fitava com lágrimas nos olhos :
"Me ajude. Me ajude."
A garota tentou ajudar mas, as sombras tomaram o corpo da mulher.
"A vida te abandonou." Eles disseram antes de ir.
E enquanto a mulher era levada em direção ao seu destino, a garota caiu na escuridão. Isso sempre acontecia naqueles momentos. Durante aqueles sonhos sombrios que ela não entendia.
A dor da mulher podia ser sentida por ela e era como se ela também estivesse morrendo.
Porém, logo depois, havia um momento de alento. Uma luz a envolvia em meio a escuridão. E uma voz suave cantarolava uma melodia que parecia uma canção de ninar. Um calor acolhedor tomava conta dela e a dor desaparecia. A garota sabia que não tinha mãe, nunca havia a conhecido e não tinha ideia de quem era ela. Mas, sabia que aquele calor era o dela. Da mulher que a gerou.
Caelyn acordou tremendo e suando frio. A sensação de morte ainda em seu corpo e as palavras da mulher que ecoavam em sua mente.
Ela abraçou os joelhos, os cabelos loiros caindo acima deles. Seus pés encostaram nos lençóis finos daquela cama simples e afundaram um pouco o colchão.
"Me perdoe. Eu não consegui." Ela sussurrou baixinho, pensando na mulher de seu sonho. "Me perdoe. Me perdoe."
E aquela garota tão jovem, que era perturbada por sonhos tenebrosos e habilidades incompreensíveis, ficou nesse loop até que seus pés e mãos formigassem e ela tivesse que acordar. Ou seja, até o sol finalmente nascer.
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A porta foi aberta por uma mulher jovem de pele marrom, cabelos negros e olhos azuis. Seu vestido branco e azul de dança, que destacava seus seios grandes e pernas torneadas, se moveu quando ela foi em direção a Caelyn, abraça-la.
"Minha bebê teve um daqueles sonhos novamente? Ja pedi para me chamar quando isso acontecer." A mulher disse com uma voz melódica e manhosa.
"Não se preocupe, irmã. Eu estou bem." Caelyn disse com um sorriso sincero. Ela já havia se acostumado com aquela situação estranha e não queria preocupar sua irmã adotiva.
"Não está não. Olhe as olheiras em seu rosto." Kaida disse em um tom irritado, quando Caelyn escorregou de seu abraço.
"Não se preocupe, sei que está ocupada com o festival de hoje. Não sou mais uma criança, irmã. Tenho 19 anos. Fique tranquila." Caelyn disse se trocando em poucos segundos, removendo a camisola branca e colocando um macacão marrom e uma camiseta vermelha.
" Estou indo." A garota disse correndo e apenas ouvindo um grito da irmã.
" Não saia sem comer. E aquele velho está te explorando."
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A cidade estava movimentada. Caelyn se moveu em meio a multidão, o barulho de conversas e o cheiro de especiarias tomava conta do local. Naquele local havia vários tipos de pessoas.
Os servos daqueles de alto escalão que eram encarregados dos afazeres de seus mestres. Costumavam ser orgulhosos e por isso, Caelyn evitava até mesmo esbarrar em algum deles para que não levassem a sua cabeça.
Os outros eram comerciantes, que costumavam tratar Caelyn muito bem e sempre lhe entregavam alguns mimos. Como a senhora Mei, de sorriso gentil.
"Aqui, Caelyn. Leve algumas castanhas, você é muito magra e parece que não tomou o café da manhã hoje." A senhora sorriu.
"Obrigada."
"Aliás, vi seu irmão indo para lá. Acho que estava indo em direção à fábrica."
"Aquele pirralho." Ela pensou em voz alta. "Obrigada,senhora Mei." Caelyn saiu correndo em direção a fábrica, Raden sabia que ela não gostava que ele trabalhasse na fábrica. Não era o momento certo ainda.
A única fábrica que ajudava o povo comum, era a que Caelyn trabalhava. Ela já tinha o trabalho da trupe mas, seu pai morreu com dívidas na fábrica e acabou sobrando para ela.
O calor pôde ser sentido ao entrar no local, pessoas fazendo vídros, vasos e ferramentas eram vistas. A garota procurou o irmão e o encontrou entre os trabalhadores, fazendo um vaso de vidro.
"Raden." Ela gritou para o menino sem camisa que mostrava o corpo magro e sem músculos.
"Pode ir para cada, Cae. Eu peguei o seu turno hoje." O garoto respondeu.
Cae se aproximou da forja e pôde sentir o calor aumentar. "Não é para você estar aqui, Rad. Esse é o meu trabalho. Você só tem 15 anos. Eu não permito que você trabalhe aqui." Ela disse o puxando pela orelha.
"Ai. Aí. Cae, para. Para. Ta doendo." Raden pediu enquanto os trabalhadores riam.
"Bem." Uma voz mais velha disse. "Não tem um dia que vocês não deixem esse lugar monótono ficar animado." O senhor riu.
O dono do local, senhor Archibald, era um velhinho simpático mas, com uma memória muito boa. Principalmente para dívidas.
"Volte para casa. Você deveria estar estudando. Sem mais desculpas." Caelyn deu seu ultimato, que Raden enfim, obedeceu, indo embora.
Quando ele saiu, Cae deu um longo suspiro e se preparou para o trabalho.
"Não fique brava com o garoto. Ele quer ajudar." Archibald tentou defender o jovem.
"Não é a idade certa para isso." A garota disse se sentando à frente da forja. Ela prendeu os cabelos em tranças, para evitar que se queimassem.
"Você sabe que garotas da idade dele já estão em casas de prazeres,não é?" O senhor disse e recebeu um olhar irritado.
"Mas, esse não é o caso de Raden. Ponto." E com essas palavras, o assunto foi encerrado.
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O suor escorria pelo rosto de Caelyn. Ela o limpou com dorso da mão e continuou soprando dentro da forja para que o vidro tomasse forma.
"Ei, Caelyn? Sabia que o príncipe estará na cidade hoje?" Duas garotas a chamaram. Uma delas, era mais jovem, 17 anos e cabelos ruivos. A outra possuía o cabelo crespo e pele negra e possuía a mesma idade de Caelyn.
"Hmm." Caelyn respondeu, continuando o seu trabalho sem muito interesse.
"Você não ouviu, Cae? Podemos ver o príncipe de perto." A ruiva disse.
"Eu duvido que permitam que plebeus pobres como nós nos aproximemos do príncipe. E além disso, tenho trabalho a fazer. Não irei perder meu tempo com isso." Cae respondeu cética.
"Você tem que se divertir e sonhar mais, Cae." Uma das funcionárias mais velha disse. "É muito jovem para viver sem isso."
"Já tenho sonhos e não gosto deles." Ela respondeu baixinho e nesse momento, senhor Archibald gritou para todo mundo voltar a trabalhar.
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No fim do expediente, Caelyn se espreguiçou e deu um longo bocejo. Não via a hora de voltar para a sua cama.
As meninas retornaram correndo contando sobre como o príncipe de longe e como ele era bonito, parecido com um Deus de cabelos brancos.
Caelyn apenas revirou os olhos, com certeza o cara era um idiota pomposo e idiota. Nobres não costumavam trabalhar muito e muito menos, dar atenção a pebleus. Do que adiantava ficar pensando nele?
Ela estava pronta para sair quando a mulher mais velha, Georgia, a chamou.
"Caelyn, venha rápido. Martha se caiu no chão. Não sei o que aconteceu."
Caelyn sentiu o corpo gelar. Quando um acidente médico acontecia, ela costumava ser chamada para ajudar, devido a alguns dons especiais.
Martha estava caída no chão, suando e delirando. Provávelmente já estava passando mau antes do ocorrido.
Caelyn colocou a mão na testa dela e chamou seu nome. Mas, ela não respondeu.
Caelyn possuia um dom, ela conseguia ver pontos de luz no corpo da pessoa, conforme estivessem apagados, significava que estavam doentes.
Ao tocar nos pontos, Martha voltou a consciência.
"Obrigada. Você é mesmo sensacional."
Caelyn apenas sorriu. Ela não sabia como possuia esse conhecimento. Mas, não era todos que conseguia ajudar. Martha teve sorte.
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Ao voltar para casa, Kaida a recebeu com um olhar desesperado. Caelyn ficou preocupada. Era raro ver essa expressão no rosto da sua irmã.
Ela entrou no quarto de Raden e percebeu que o irmão estava com febre e Kaida disse que ele havia tossido sangue.
Raden não respondia. O médico disse que ele não possuía mais tempo de vida. A maldição de Caelyn era não poder ajudar aqueles que amava.
"Rae, fique comigo por favor." Ela chorou, as lágrimas caindo no rosto dele. "Rae, não me deixe sozinha."
Caelyn conseguia ver o fio dourado de seu irmão se apagando. Segurando a mão dele, ela acabou adormecendo.
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Caelyn sonhou com uma floresta e uma pessoa incomum. Aquele ser vestia um manto preto e dourado e vestia uma máscara com chifres.
A criatura tinha um andar elegante e se aproximou da garota.
"Quem é você?" A humana perguntou com receio.
"Você já deve saber quem sou." A pessoa disse com uma voz conhecida. A própria voz de Caelyn.
E ela sabia, aquela era a Morte.
"O que deseja de mim? Chegou a minha hora?" Ela disse tentando não tremer.
"Não a sua. Mas, a de alguém que ama." A entidade sorriu.
Os olhos de Caelyn se arregalaram.
"Seus poderes únicos não podem salvar seu irmão mas, eu posso. Apenas precisamos fazer um acordo."
Caelyn pensou no irmã. Raden era tudo para ela. Não imaginava viver em um mundo sem ele.
"Certo. E o que quer de mim? Minha alma?"
A Morte riu. "Claro que não, criança. Sua alma é muito fácil de tomar. Eu quero que você mate alguém. Quero que você mate o príncipe."
Caelyn deu um passo assustado para trás. "Mas, como? Ele está fora do meu alcance. Eu não sou uma assassina."
"Você dará um jeito. É o seu destino, afinal. Ou o seu irmão ou o príncipe."
E sem pensar, Caelyn aceitou.
"Certo. Eu aceito." E apertando as mãos frias da morte, ela aceitou o seu destino.
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Quando a criança foi embora, alguém importante se aproximou da Morte . Era alguém que emanava luz, onde pisava flores nasciam e vestia um véu branco, oposto da outra.
" Então, você chegou antes. Fez o acordo que desejava?" A pessoa disse com uma voz doce.
"Claro que sim. Fui mais inteligente." A Morte riu. "Não se chateie. Eu estou apenas dando uma mão para o destino."
"Claro. Como você gosta de fazer." A outra respondeu, se aproximando. "Estou animada para saber qual de nós vencerá essa aposta." E um sorriso gentil mas, travesso tomou conta do rosto dela.
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