✞︎19-Adeus
Taissa.
Acordei e abri as janelas, dia cinzento, frio, portanto vesti minha blusa de moletom e segui rumo ao banheiro e depois à cozinha.
Laura vomitava, talvez estivesse de ressaca, embora não a tivesse visto saindo noite passada quando cheguei.
— Taissa — chamou Ana, séria.
— O que mãe? — Peguei café e fui sentar à mesa.
— Com quem estava ontem? — questionou, a expressão fechada.
— Fui no enterro do pai da Maria, sabe disso — Respondi.
— Não foi isso que eu perguntei, não se faça de sonsa e responda — Exigiu, ríspida. Bebi mais café.
— Depois fui até à casa do Rubens e...
— Fez o que? — Quase gritou, arregalando os olhos por trás do óculos.
— Não tenho que falar sobre isso com você! Deveríamos ter tido essa conversa há vinte anos atrás! Mas eu não pude contar com você — Quase engasguei com o café.
— Não te quero perto desse homem! O que houve com Dahn? Por que tem sempre que se envolver com gente que eu não gosto? — Demonstrou seu nítido desapontamento.
— Dahn e eu terminamos há um tempo mãe! Será que a senhora pode superar? Eu já superei, a vida segue, e o que Rubens e Laura tiveram, é passado! — Perdi o controle.
— Eu não me conformo! Suas decisões ainda vão arruinar sua vida! Por que acabaria um relacionamento tão bonito? Vocês eram amigos de infância...
— EU NÃO AMO DAHN, NÃO IMPORTA O QUE VOCÊ E O RESTO DO MUNDI DIGA, NADA VAI ME FAZER AMÁ-LO ASSIM, EU JÁ TENTEI E NÃO CONSIGO, INFERNO! — Interrompi, querendo explodir de tanto ódio.
Nós duas nunca nos demos bem, discordavámos em várias coisas, agora se meter na minha vida? Isso eu não iria aceitar de jeito nenhum! Não quando Ana nem sequer havia me criado.
Quem tinha esse direito era Naomi, minha avó, não ela.
— Ele nunca me inspirou confiança! Será que uma vez na sua vida irá me dar razão? Tudo que eu digo a você é pelo seu bem! Pare de ser tão cega e egocêntrica Taissa! — Pôs a mão por cima da minha sobre a mesa.
— Ninguém é bom suficiente para você mãe! Essa escolha é minha, tenho idade o bastante para saber o que me faz e o que não faz, goste ou não, eu amo o Binho e vou continuar ao lado dele...
— A minha intuição de mãe me diz, tem algo de errado com ele! Eu sou sua mãe, sei o que é melhor para minhas filhas — Interrompeu, apertando meu punho
Me cortou força severa e me olhando de um jeito que nunca fez antes.
Parecia estar falando do próprio diabo.
— Sua intuição de mãe? A mesma mãe que ficou anos sem dar notícias do outro lado do mundo? Eu não preciso do seu papel de mãe agora, aliás, nunca precisei, devo tudo a minha avó! — Cuspi as palavras nela, tirando parte do que havia entalado há anos.
Ana me deu um tapa na cara por isso.
Demorei a assimilar, ela realmente tinha me batido?
— Tai, eu não... — Antes de terminar, já tinha levantado da mesa bruscamente.
Voltei ao meu quarto e puxei a mala do guarda-roupa. Nem mais um segundo suportar ficar na mesma casa que ela.
— Aonde você vai? — Akemi parou ao lado da porta.
— Embora — disse, jogando as roupas dentro da mala de qualquer jeito.
— Me leva com você? — Se aproximou, sentando ao lado da mala.
— Não posso Ake — retruquei, sentindo um aperto no peito.
— Por que não? Para onde você vai? — Insistiu, cabisbaixa.
— Depois eu te conto — murmurei, mal dando atenção.
— Para com isso, não é pra tanto Taissa! — Ana entrou em seguida, vindo até mim e tentando impedir de colocar as roupas dentro da mala.
— Se afasta! Eu não fico aqui junto de você nem mais um segundo! Se tolerei essas semanas, foi por causa do meu pai! — Contestei, afastando a mala, se não acabaria machucando ela e seria pior.
— Mãe! Não deixa a Tai ir embora! — Akemi agarrou a perna dela, os olhos marejados.
— Vai se arrepender disso! Vai ver que tenho razão e será tarde sua mau-criada! — Apontou o dedo de modo acusatório, quase rogando praga.
Terminei de fechar a mala num soco.
— Não vai! Fica aqui! — Akemi a soltou e se agarrou a mim com toda força.
Meus olhos se encheram d'água e respirei fundo. Não podia leva-la.
— Laura vai te levar para me ver, ok? Eu prometo que vou te ver todos os dias — Abaixei à sua altura e a abracei, me despedindo. Ake começou a chorar desenfreadamente. Fiquei ainda pior.
O tapa não doía como aquilo.
— Se sair por essa porta, esqueça que tem mãe! — Impôs Ana, apontado a porta do quarto. Peguei a mala e lhe dei as costas. Já havia esquecido há anos.
— Adeus, mãe — Foi a última coisa que lhe disse.
Meu pai tinha saído cedo e levado minha vó junto, portanto não me veria indo embora, de certa forma isso me aliviava. Partiria o coração dele e nem queria imaginar a reação da sua mãe, minha avó.
Recebi uma mensagem de Binho ao cruzar o portão.
— Espera! — Laura correu de pijama e descalça e me alcançou, entregando dinheiro.
— Não preciso — falei, devolvendo-lhe.
— Pega logo, não me faz falta — Persistiu, recusando e empurrando de volta a minha mão.
— Está tudo bem? Vi você passando mal — Apoiei o quadril no portão baixo.
— Sim... eu só... comi porcaria demais — Abanou a mão no ar. Assenti.
— Vou para casa do Binho, se a Ake quiser me ver, leva ela lá — Pedi.
Laura assentiu, secando os olhos pretos iguais os meus.
— Manda notícias viu — Se despediu, acenando. Sei que também ficou abalada com minha partida, porém era raro vê-la chorando. Provavelmente discutiria com Ana ao saber o motivo, era mais a sua cara.
Chamei no portão e esperei ele vir.
— Tai? Não me avisou que vinha — Tremelicou os lábios, surpreso ao me ver.
— É uma longa história... posso entrar? — Pedi, não querendo tocar no assunto.
— Claro — Abriu e me deu espaço, passando a mão na nuca. Tinha cortado o cabelo. Era uma das coisas que mais gostava nele.
— O que aconteceu? Por que estava chorando? — Apontou o sofá.
Me sentei, sentindo um nó se formar na garganta. Ouvi um ruído vindo do corredor.
— Tem visita? — indaguei.
Ele negou, pegando meu queixo e fazendo olhar diretamente para ele.
— A minha mãe e eu discutimos, ela me deu um tapa — Resumi, deixando o corpo desabar sobre seu ombro.
— Fica tranquila, pode ficar aqui o tempo que quiser, meus pais e Tamar estão viajando — Afagou meus cabelos num abraço aconchegante.
Naquele momento ele foi meu porto-seguro.
— Quero sair daqui, ir bem longe e dar um tempo de tudo, até da faculdade — murmurei, sem muita expectativa.
— Então vamos hoje mesmo, tenho um lugar maravilhoso para te mostrar — Segurou meu rosto entre suas mãos grandes. Sorri automaticamente. Não precisava dizer mais nada, pois tinha levado a sério o pedido despretensioso.
— Sério? — balbuciei, desacreditada.
— Com toda certeza, reviro o mundo de ponta cabeça por você e provo quantas vezes precisar — Me deu um selinho carinhoso. Demorei a digerir sua seriedade.
— Te adoro! Te adoro! — O puxei, dando um beijo de agradecimento.
— Não desfaz a mala, vou fazer a minha! — Avisou, dando um sorriso largo. Assenti, seguimos ao quarto dele.
Reparei em um detalhe no piso, uma mancha mal limpada.
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