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✞︎13-Viagem/parte 2

Gael.

Embora tivesse insistido muito, meus pais me obrigaram a ir e me divertir, enquanto resolveriam os problemas, me dando um "descanso", portanto não tive como fazê-los mudar de ideia.

Para o meu azar, tive que ficar na mesma barraca que Kaylian, pois às outras já estavam cheias e eu não tinha levado a minha.

Após comermos, fomos observar o cometa passar, entretanto também teríamos que dividir o telescópio, pois era caríssimo e eu não tinha dinheiro para ter um naquele momento.

- Não estou conseguindo ver - falei, somente a mim.

Kay escutou e se aproximou.

- Está na posição errada - articulei, segurando meu braço e endireitando a altura. Não adiantou.

- Ainda não consigo ver - murmurei, perdendo a paciência e quase desistindo.

Kay soltou um suspiro preguiçoso e pôs a mão na minha cintura, levando-a para direita sutilmente, em seguida colocou as mãos longas em meu queixo, o erguendo delicadamente. Senti um frio na barriga.

- E agora? - Ergueu a sobrancelha onde ficava o piercing. Fitei seus olhos azul-oceano, sem conseguir responder.

Por mais que odiasse admitir, seria fácil se perder naqueles olhos.

- Eu vou dormir, guarda na minha mochila, já fiz as anotações - Passou a mão pelos cabelos lisos e escuros, desviando olhar.

Assenti. Logo fui entrar também, todos já tinham ido dormir, hesitei um pouco ao vê-lo deitado, sem camisa e ainda acordado no chão forrado da barraca.

- Não vou te morder Gael - articulou, erguendo os olhos azuis.

- Fica aí no seu canto - Avisei logo, deitando no espaço livre do seu lado.

- Nem que eu quisesse chegaria mais perto, embora goste de dormir agarrado com alguma coisa - Deu um sorriso ladino, esticando os braços acima da cabeça.

- Você me odeia, se fosse dormir abraçado em mim, seria para me matar enforcado no meio da noite - O fitei diretamente.

- Eu não te odeio - disse, tão baixo que quase não escutei.

- Não? - indaguei, ajeitando meu travesseiro.

- Por que acha isso? Só por que tivemos alguns desentendimentos? - Riu, virando de lado para me encarar.

- Quebrar uma guitarra nas minhas costas, tentar me matar afogado e apagar um cigarro em mim, não é exatamente desavença, você me odeia desde que nos entendemos por gente - retruquei, virando de barriga para cima.

- Só queria entender o por que? - Tive coragem suficiente de questionar pela primeira vez, as palavras praticamente pularam.

Kay levantou e saiu, fugindo da pergunta.

O segui, indo até as pedras grandes poucos metros longe das barracas e da fogueira. Talvez me arrependesse dessa decisão impulsiva, mas a vida é isso, somos feitos de tentativas e arrependimentos.

- Sempre diz o que pensa, por que se calou agora? - Simplesmente não fazia sentido. Nunca teve freio para dizer o que dava na telha quando o assunto era eu, por que motivo se calaria agora?

Fui ignorado.

- Kaylian! - Quase gritei, exigindo que respondesse.

- Inferno! Você me irrita! É esse o motivo, satisfeito? - Se apressou em dar justificativa, talvez se sentindo pressionado.

Kay pôs o cigarro entre os lábios e o acendeu tirando isqueiro da bermuda bege cargo.

- Não tem coragem de me dizer? - Insisti, sufocado pela dúvida que sempre tive.

Kaylian voltou seus olhos azuis para mim em meio ao constraste das chamas crepitantes refletindo neles e se aproximou.

- Por que quer saber? Vai mudar o que? - Estreitou os olhos, mas a raiva não se camuflava neles, era outra coisa, algo que eu não sabia distinguir.

- Isso muda tudo - Ergui a cabeça devido a nossa diferençade altura, mais perto do que pensei estar do seu rosto.

Kay abaixou a cabeça e a moveu sutilmente em negação, fazendo os fios lisos caírem sobre o rosto bem esculpido.

- A verdade é que nunca entendi bem meus sentimentos por você, então preferi os transformar em ódio - explicou, voltando a me olhar no fundo dos olhos. Aquilo desceu com gosto amargo.

Foi uma desculpa esfarrapada e mesmo não satisfeito, permaneci, a fim de escutar sua mentira até onde fosse.

Eu tinha escutado direito?

- Eu nunca gostei do seu jeito arrogante, da sua mania de querer mandar em tudo e estar sempre em primeiro lugar e... da sua blusa xadrez ridícula e cafona, mas isso não me fazia te odiar, não... era outra coisa - Continuou sem hesitar, agora mais perto.

Resisti ao cheiro ruim do cigarro só para digerir aquelas palavras.

A verdade é que muitas vezes ele era insuportável e impossível de lidar, todavia não tinha motivo para odiá-lo, na verdade, só retribuía sua implicância comigo feito duas crianças birrentas.

- Então, você me odeia por que... não sabe o que sente por mim? - Estava tão perto que meu nariz encostaria no seu por poucos centímetros.

- tem sua resposta - sibilou, encostando o nariz longo no meu e fazendo uma carícia provocante.

Coloquei a mão em seu peito descoberto, hesitante, o coração pulsando quase na boca. Pude sentir seu peito subir e descer acelerado.

- Não é suficiente - Escapou dos meus lábios, segundos antes de encostarem nos seus num selinho demorado.

Sua mão gélida encostaram na lateral do meu rosto causando arrepios, porém logo recuou e se afastou.

- Sei que não - Proferiu, ainda contemplando meus olhos com suas pupilas notavelmente dilatadas.

Ele se afastou e me deu as costas, sumindo do campo de vista.

Retornei à barraca e me deitei, sem um pingo de sono, entretanto tentei dormir até conseguir.

Acordei com o barulho da cantoria lá fora, as duas turmas se reuniram para cantar em volta da fogueira, enquanto tomavam café da manhã.

O dia lindo tomava o céu, a paz e tranquilidade ali não tinha preço, sentei do lado direito, no tronco aonde estavam Maria, Taissa e Binho, todos rindo e conversando.

Do outro lado, de regata branca expondo as tatuagens nos braços musculosos, bermuda preta curta e descalço, os cabelos presos e a expressão sonolenta, se encontrava a minha dúvida.

Mal me olhou, mantinha-se silêncio feito uma daquelas árvores ao redor.

Recebi uma mensagem de Maurício e fui verificar. Quando me dei conta, Kay já tinha saído dali.

- O que ele tem? - Rubens notou a saída do amigo.

- Não sei, pergunte a ele - retruquei, sem paciência.

- Tenho a leve impressão de que tem a ver com você - Ergueu as sobrancelhas escuras.

- Por que não cuida da sua vida? Seria bom pra variar - Fui ríspido, naquele momento tudo que menos precisava era da sua intromissão.

Binho riu sem humor.

- Quer um conselho? Não perca tempo, nunca sabemos o dia de amanhã - Aconselhou, com uma expressão excêntrica tomando seu rosto.

Apenas ignorei, pois o dia de amanhã seria pior de qualquer maneira.

- Vamos falar um pouco sobre a NASA, veremos o cometa hoje a noite e amanhã cedo arrumamos as coisas para voltar - Informou Pietro, chamando atenção de todos, especialmente de Maria.

A maneira que a olhava deixava claro que havia algo entre os dois, ou pelo menos, surgindo secretamente.

Reunidos à espera da passagem, todos pegamos os binóculos, ansiosos e inquietos, prestes a ver algo tão deslumbrante.

Binho envolveu o braço ao redor da cintura de Tai, ambos comentando sobre o astro, enquanto Mari se manteve de braços cruzados, observando o céu tomado pela imensidão azul, até que Pietro surgiu e parou ao seu lado.

Permaneci sozinho. As coisas haviam mudado e sendo sincero, não parecia bom. Ainda estavam ali, do meu lado, todavia logo não estariam mais, eu sentia.

Finalmente, o cometa apareceu no céu noturno, dando brilho e luz vital. Simplesmente perfeito.

- Sou apaixonado pelas estrelas - A voz rouca rompeu o silêncio ao meu lado.

Os olhos azuis-oceano se dirigiram a mim.

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