✞︎ 𝗣𝗿𝗼𝗹𝗼́𝗴𝗼 ✞︎
12 de março.
O sino da grande igreja bateu, assustando quem passava distraído na monótona rua daquela cidadezinha do interior. O moço avoado se assustou a ponto de quase derrubar o celular das mãos, sobressaltando devido ao badalar estridente.
Descendo mais uma viela, o rapaz começou a aumentar a velocidade dos passos, com medo de ser abordado por um ladrão, guardou o aparelho em seu bolso esquerdo da calça jeans.
A noite estava fresca, entretanto, um arrepio gelado de repente perpassou sua coluna.
Nenhum sinal de cães ou pessoas na calada da noite, tampouco bichos noturnos grilavam.
Apenas o som emitido pelos tênis do rapaz conduziam, a fim de chegar logo em sua casa e repousar, após um dia de transtorno.
Sentindo uma estranha sensação lhe invadir, o jovem olhou para cima, observou de relance as árvores que balançavam estranhamente e embora o vento estivesse quase nulo sobre sua pele, aquela movimentação das copas, era notória.
"Estranho." pensou ele.
— Rapazinho, ei rapazinho! — chamou uma voz masculina rouca e falha. Ele parou de andar e quase tropeçou nos próprios pés, feito um carro desgovernado quando freia bruscamente.
Com os músculos tensos, o jovem virou-se, a fim de ver quem o chamou no meio daquela rua deserta. Mas não viu nada, até a figura surgir em sua frente, hesitou por um breve momento.
— Sim, senhor? — Respondeu aliviado, por ver que era somente um senhor de bengala e muito corcunda devido à sua idade avançada. O velho homem de óculos quadrados e brancos, sorriu de maneira simpática, dando um passo à frente com a ajuda da sua bengala bege de madeira.
— Poderia me ajudar? Estou perdido, minha neta deu o endereço da casa dela, mas acabei entrando na rua errada. — Informou o idoso desconhecido, a voz extremamente baixa fez o rapaz avançar alguns passos, para escutá-lo melhor.
— É claro, senhor, me diga o nome da rua e te ajudo — retrucou, dando um sorriso gentil ao velhinho de estatura baixa.
Mal notou estar tão perto, à medida que apenas a bengala os separava. O velho inclinou um pouco o rosto, para vê-lo com a maior clareza possível. Um sorriso macabro que foi de uma ponta a outra da seu rosto enrugado surgiu.
— É claro que você pode — disse a voz grave e sinistra, completamente diferente da voz suave do senhorzinho.
Algo nele, transmitia ¹nictofilia.
— O senhor está bem? — Perguntou de maneira ingênua, afastando o rosto do alcance do homem que o causou arrepios dos pés à cabeça.
A criatura gargalhou, os olhos escuros e inocentes se transformaram em olhos amarelos-limão tão rápido que parecia tinta sendo derramada sobre as írises normais, brilhando como dois faróis néon.
Olhos escuros como carvão, arregalaram tanto que quase saltaram para fora da cavidade. Podia correr, se o corpo obedecesse aos comandos.
Ele estremeceu por inteiro.
— O que é isso? — balbuciou, já entrando em desespero, recuando passos desordenados para se distanciar do homem.
Feito migalhas, a criatura apertou os óculos, os quebrando, em seguida, quebrou a bengala em dois ao batê-la no próprio joelho direito.
O ar havia fugido, as palavras, somente seu corpo que não era capaz...
O velho começou a olhar para o rapaz, como uma presa prestes a ser devorada, baba escorria pela boca medonha que esbanjava agora tantos dentes pontudos e amarelados que o rapaz mal poderia contar. A garganta dele ficou seca, nem sequer piscava.
— Não seja frouxo, um pouco de diversão não mata nenhum humano imprestável — Debochou aquela voz macabra que parecia agredir a mente do moço, feito garras afiadas puxando seu cérebro de um lado para o outro como massa de pão sendo sovada.
A criatura foi crescendo e crescendo até quadruplicar de tamanho, era tão grande que cobriu a sombra da sua vítima, paralisada de pavor.
Aqueles ossos se refaziam na estrutura bestial, o som deles se quebrando era a coisa mais perturbadora que sua vítima já escutou na vida.
Era divertido e prazeroso ver aquele inocente tremendo tanto que mal se sustentava parado, ver a pele preta e revestida por pêlos com o rabo longo e fino, os pés de bode e a cabeça com dois chifres médios e grossos, sutilmente curvado, nunca havia visto nada igual em toda sua vida.
Garras que cortariam de jeito sanguinolento o seu pescoço.
— Vocês humanos só prestam para ser destroçados e usados, é patético — O demônio gargalhou lentamente, rompendo o último escudo mental que tinha o subconsciente do pobre coitado, tornando-a vulnerável suficiente para ser invadida. As córneas se encheram de lágrimas quentes, prestes a serem derramadas.
— Eu imploro! Não me leve, prefiro viver sofrendo, do que ser condenado ao inferno… — Implorou o jovem trêmulo, erguendo as mãos em súplica ao demônio, que tinha medonhos olhos amarelo-limão e cheirava enxofre e carniça pura.
— CALE ESSA MALDITA BOCA, SEU MERDA — Um tapa violento atingiu o rosto do humano indefeso, a força do golpe o arremessou por longos metros, o demônio caminhou tranquilamente pelo asfalto, fazendo suas patas animalescas arranharem no chão e fazerem ruído perturbador.
As mãos imensas e pretas daquela pele pegajosa como piche estavam prestes a agarrar os tornozelos do humano. Era tão delicioso ver tanto sofrimento e medo. Torturar.
— Por que a comida sempre foge da gente? — Perguntou o demônio com sarcasmo, já salivando para pegar sua vítima e dilacerar osso por osso, sedento e faminto feito um animal selvagem.
— Socorro! Pelo amor de Deus, socorro! — gritava desesperadamente o humano, rastejando seu corpo todo dolorido pelo asfalto frio, sangue escorria da sua boca e narinas, fazendo o rastro sobre suas roupas simples.
Àquela altura, seria difícil escapar do desconhecido profano, que tinha rosto parcialmente humano, misturado à pelagem animalesca e dentes anormais.
Ninguém escutava a súplica, parecia que o tempo havia parado ao redor daqueles dois, agonizando devido aos traumas e hemorragia interna, a presa começou a pensar na possibilidade de rezar. Era religioso assíduo e talvez…
Vupt!
— Eu tenho família! Quem é você? O que quer com alguém tão inútil como eu? — O rapaz perguntou.
Segundos após, foi pego violentamente do chão, sendo segurado pelos tornozelos, de cabeça para baixo como porco pendurado no gancho de açougue.
O hálito fétido atingia o rosto marcante do azarado, causando profunda ânsia.
— Eu também tenho — Respondeu, gargalhando com escárnio.
Uma abocanhada e decepava a cabeça pendurada.
Farejou a vítima, lambeu os lábios peludos. Era uma carne deliciosa para devorar.
— Não se preocupe, carne de terceira nunca me fez mal — falou tranquilamente com desprezo e deboche, como se aquilo fosse apenas uma simples refeição barata.
Já perdendo o oxigênio e pingando sangue nas patas peludas do maligno, ele teve a última visão do mundo, entregando-se ao perverso destino.
Longas unhas pretas e grossas, feriam a fina camada da pele fria do moço.
— Você não vai morrer agora. Será mais útil usá-lo como fantoche — A mudança de planos foi devido à uma repentina vontade de viver entre os humanos, no mundo mortal.
Já havia passado tanto tempo mofando nos confins do inferno, por que não se divertir um pouco na terra?
Largando os tornozelos feridos pela áspera mão direita dele, se distanciou um pouco, observando a qualidade do seu novo corpo.
— Isso é castigo? Meu Deus, salve a minha alma — sibilou o infeliz, estirado no chão de barriga para baixo, a pele roxa, os olhos implorando pela salvação divina. Respiração tão comprometida que virou chiado engolido pela ventania trazida pela ocasião sinistra.
Crec-Crec.
— Agora, vamos nos divertir! — comemorou o profano, sorrindo de maneira maquiavélica.
Ele ergueu o corpo do chão e o fez ficar em pé, parado como um manequim no meio da rua.
— Te devolvo depois — disse o demônio noturno, preparando sua transgressão para aquele corpo alheio que foi sacrificado..
A criatura entrou naquela estrutura parada, feito um parasita que invade a pele sem piedade.
Novo hóspede. Novo caminho.
Globos oculares reviraram, o coração voltou a bater, as veias voltaram a bombear sangue.
Crec-Crec.
Girando o pescoço em um ângulo curto, a coluna cervical emitiu ruído. Estava feito.
— Magnífico — A sensação prazerosa e jamais sentida antes de ter se apossado de um corpo humano o fez se sentir ainda mais digno de fazer tal atrocidade. Revigorado, imbatível.
Cada pedaço daquela robusteza, parecia ter sido feita para ele, para sua ideia genial e maligna.
— Vamos ver o que me espera agora — Usou da voz humana pertencente àquela pessoa.
Seguiu sorrindo muito feliz com o ato completado.
Foi como roubar doce de criança.
1-Afinidade pelas trevas ou pela noite, qualidade daquele que encontra conforto na escuridão.
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