2 - Tormento
Os passos deles se misturaram ao barulho dos gritos das crianças que ecoavam pela casa, cuja luta para aguentar o frio e esquentar a todos era tão árdua quanto o esforço dos próprios moradores.
O homem se dirigiu a parte de fora após guardar as espingardas sem dizer nada a ninguém. A mulher, que levava um avental sujo na frente do corpo e olheiras profundas no rosto jovem, olhou o veado com certo desânimo.
— Só acharam isso? — A voz inerte se dirigia ao homem. Como de costume, Hector era ignorado por ela. Roger se limitou a responder que "sim" e que a neve estava muito forte. O homem caçava há tempo suficiente para reconhecer quando uma caçada era uma "causa perdida" ou não. O bicho ter aparecido no meio daquela coisa toda era uma sorte que não teriam novamente naquele mesmo dia.
O garoto, que queria impressionar a mãe, cometeu o erro de comentar com a mulher que ele quem tinha achado o animal, aguardando alguma reação positiva dela.
— Já era hora, não? — A rispidez em sua voz, seguida do afastamento para que fosse até os outros filhos fez o fundo dos olhos de Hector doerem pelas lágrimas que estavam tomando espaço. Ele subiu as escadas rápido, indo para o banheiro minúsculo da casa. Fechou a porta e abraçou a si mesmo, fechando os olhos e forçando as lágrimas a não caírem.
Por que cobravam tanto dele? Por que nunca era reconhecido? O esforço que fazia não tinha valor?
Naquela noite, não conseguiu comer direito. Estava sendo fraco por pensar tanto no bicho que já estava morto, mas era inevitável fugir da culpa. Ela já havia se instalado em seu pequeno coração.
Nos próximos dois dias, não dormiu direito e tão pouco comera. Era um misto de angústia, vergonha e rejeição que o devoravam vivo.
Sonhara com o veado nesses dois dias e novamente a imagem da bala perfurando sua carne inocente se repetia em sua mente. Só queria apagar tudo de dentro de si.
Após aquilo, o pai o chamara de novo para caçar. O vento não estava tão forte quanto naquele dia e talvez tivessem sorte novamente. Ou talvez, o pai apenas quisesse fugir da família que o consumia tanto e precisasse da desculpa de levar o garoto mais velho com ele para ajudá-lo na "caçada".
Fosse o que fosse, o garoto foi junto. Não se permitia recusar a saída mesmo que a outra o tivesse atormentado com tamanha voracidade.
Mas decidiu por algo que não podia deixar o pai saber até chegar lá. Era uma escolha firme e que, de forma surpreendente, o trouxera um pouco de brilho nos olhos. Seria um ato de amor.
Foi para fora naquele dia pisando fundo na neve ao seguir os passos do homem.
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