
046
Possíveis erros serão corrigidos assim que percebidos.
__________
Sempre...
Christopher tinha uma razão para dizer aquela palavra com tanta designação.
Depois de se declarar ele segurou minha mão e pediu que o acompanhasse até a cama. Sentados, nossos olhares se cruzaram no escuro e uma forte onda de medo me atingiu.
— Eu dei algo a você... um colar com um amuleto como pingente. Consegue imaginar onde o guardou?
— Posso tentar.
Apenas eu me levantei, roubando a única luz, e indo até minha penteadeira revirar as caixas de joias e gavetas até encontrar um pequeno estojo quadrado com o tal colar dentro dele. O pingente era chamativo e isso o tornava fácil de detectar em meio as outras peças.
Retornei assim que confirmei ser a mesma joia que Wayne mencionou. A pedra rodopiou entre os meus dedos sendo analisada por mim como um artefato peculiar.
— Esta? — Perguntei mostrando-a a ele.
O homem deu um leve sorriso com o nariz.
— Sim. Ela mesma.
Christopher estendeu a mãos e recebeu o colar olhando-o de uma forma carinhosa. Ele apertou o pingente na sua palma e segurou minha outra mão. Não interrompi o seu olhar meigo ao admirar a peça.
Parecia ser algo importante, mas até o momento não significava nada para mim.
— Quer que eu te conte como nos conhecemos?
— Alfredo me contou algumas coisas sobre isso — me adiantei — até mesmo que não houve uma "boa primeira impressão" entre nós. Mas eu sei que foi no dia em que vocês me resgataram daquele lugar.
Ele riu outra vez e segurou o queixo num gesto clássico avaliando a minha ingenuidade.
— Não foi nesse dia, Dulce.
— Não? — Questionei — Porque está falando sobre esse assunto agora?
— Porque eu ganhei isto de você.
Franzi o cenho muito confusa com o jogo de palavras. Olhei mais uma vez para o objeto e voltei a encará-lo.
— Isso não me diz nada.
— Faz muito tempo... tempo demais.
****
Eu estava muito incomodado por ter que usar aquele terno preto e calças apertadas enquanto todas aquelas pessoas vinham na minha direção soletrando condolências sem sentido só para me lembrar que era mesmo o velório do meu pai. E como se não bastasse, eu tinha que agradecer de volta e agir como se fosse uma situação habitual.
Meu pai sentiu fortes dores no peito durante uma discursão com a minha mãe, e logo em seguida teve um infarto irreversível. A famosa morte fatídica.
Ela? Com certeza estava sentada em algum lugar bem longe dali disfarçando o fato de estar viúva e se lamentando como se fosse responsável pelo o que aconteceu.
Eu precisava dela, muito, mas depois da morte ser confirmada na nossa frente, minha mãe correu e ninguém mais a viu naquele dia.
Na hora do enterro o padre leu as mesmas escrituras e fez o seu sermão de que esta vida era apenas uma passagem para a nossa real estadia. Eu não me considerava uma pessoa muito crente em religiões, mas assim que ouvi aquilo eu realmente quis confiar que fosse verdade.
Pessoas boas deviam ter recompensas por serem assim. Certo?
Depois de algum tempo decidi que era hora de ficar sozinho saindo lentamente no meio de umas das leituras do padre e caminhando até a parte mais calma do terreno. Retirei as mãos dos bolsos da calça sacando de dentro dele uma fotografia com meu pai em uma das nossas visitas ao Canadá. A roupa de frio nos deixava mais elegantes. Ao ver isso, voltei a pesar no fato de que ele sempre me pareceu uma pessoa imortal.
Na maioria das vezes é assim que enxergamos as pessoas que amamos.
Sem acreditar naquela nova realidade, sentei na grama e chorei abraçando os joelhos por um longo tempo até o toque dos pequenos passos saltitantes no gramado vindos na minha direção me obrigarem a levantar o semblante para ver quem se aproximava. Tentei limpar as lágrimas rapidamente, mas desfiz os movimentos ao notar que era apenas uma criança.
Ela me estendeu a mão e mostrou que tinha algo escondido por entre os dedos.
— Pode pegar. Isso é para você.
— Eu não quero nada! — Neguei jogando longe a pedra azul brilhante que ela me ofertou.
A menina correu e juntou a pedra, voltando para perto de mim com o sorriso afetuoso intacto, me oferecendo mais uma vez.
— Por favor, pegue a minha pedra. Minha mãe sempre diz que ela é mágica e afasta todos os medos. Pode ajudar você.
— Se é tão importante assim porque está me dando? — Fiz o questionamento de forma áspera, mas mais uma vez ela apenas sorriu.
— Porque você precisa mais do que eu. Pode ficar com ela para sempre.
Com um sorriso infantil a menina me entregou o presente junto de um abraço apertado e verdadeiro sem nem perguntar porque eu estava chorando ali sozinho. Ela apenas viu a minha necessidade e o meu medo.
A pequena Dulce de cabelos ondulados e pele clara saiu andando com a mesma leveza que chegou sem ter a mínima noção do que acontecia ao seu redor.
Depois desse mesmo dia eu decidi segui-la com meus olhos, e sempre saber dela. Meu pai fez uma promessa em vida aos pais de Dulce, sem eu nem ao menos ter ciência disso, e neste mesmo juramento ele era um dos responsáveis legais pela garota. De certa forma a tal menina sempre vinha na minha direção, mesmo quando decidia renegar esse desejo de tê-la ao meu lado algum dia na vida por causa da nossa enorme diferença de idade.
E agora, Dulce estava ali na minha frente, grávida e oferecendo tudo de si como sempre sonhei.
A tal garota de bom coração, agora era uma mulher com as mesmas características.
****
Continuei ouvindo cada detalhe repuxando uma velha e embaçada lembrança daquele funeral que comprovaram que a história era mesmo real. Eu não tinha um rosto memorizado, muito menos sentimentos completos, mas agora sabia da existência daquele amuleto. Então era ele aquele menino que chorava incessantemente e que fez meu coração doer tanto que senti necessidade de lhe dar algo de conforto mesmo sendo tão valioso para mim.
Christopher era quem eu queria fazer parar de sofrer, mas nunca mais subi nada dele e muito menos me interessei em perguntar. Eu era apenas uma criança e dar importância a fatos isolados não é muito comum para alguém de cinco anos.
Mas, meu peito deu algumas fisgadas doloridas. Muitas.
— E- eu lembrei... Eu lembro disso! — Repeti gaguejando.
— Que bom. Então significa que pelo menos temos alguma lembrança juntos.
— Eu devia ter mais lembranças — falei torturada — Que egoísmo só você lembrar de cada detalhe nosso, de tudo o que aconteceu e da nossa... — me reprimi por um momento, envergonhada, continuando com um tom rosado no rosto — Intimidade.
— Pegue, agora é você quem precisa desta pedra de volta. Não tenha mais medo.
O objeto ganho de minha mãe me foi entregue com cuidado.
Meus olhos o enfrentavam na meia-luz a espera de alguma reação mais concisa. Entretanto, uma coisa era clara no Sr. Wayne. Ele conseguia captar muito bem os meus sinais e principalmente o que o meu corpo dizia a ele. Eu queria rir, talvez gargalhar pela ousadia daquele homem me conhecer tão bem. Como pudera tanta familiaridade ser esquecida? Como eu pude perder aquelas recordações? Até que meu riso com uma fina lágrima foram expostos. Ele imediatamente segurou meu rosto com as duas mãos puxando-me para o toque da sua boca.
Meus olhos ainda estavam abertos quando aquele beijo foi roubado na sombra da lamparina.
Wayne movimentou os lábios e me mostrou porque eu gostava tanto de beijá-lo e o porquê de mesmo sem memória aquilo mexer tanto comigo e fazer meu coração acelerar.
Não demorou muito para os meus braços envolverem aquela nuca descoberta e arrastar meu próprio corpo na sua direção. Ele me recebeu de braços abertos afagando meu corpo e o tocando sobre o tecido fino da roupa de dormir. Christopher agarrou o meu cabelo sem clemência me obrigando a olhar para o teto e expondo minha jugular pulsante. Seus dedos brincaram com meus mamilos enquanto sua boca ainda respirava dificultosa a cada nova mordida sobre o meu pescoço.
Fui deitada devagar por ele naquele chão frio confiante de que o meu calor interno era suficiente para aquecer cada pedaço da minha pele.
****
A luz do sol queimou o meu rosto juntamente com a voz autoritária do mordomo.
— Bom dia Srta. Escobar, sinto muito mas precisa se levantar.
— Que horas seria isso? — Repudiei esfregando os olhos um pouco aborrecida por ser desperta daquela maneira.
— Desculpe-me novamente, sei que gostaria de dormir mais, porém, seu café está na mesa e o patrão me deu ordens para que a senhorita despertasse ás nove.
Impulsivamente procurei um relógio por todos os lados dando-me conta de que no fim das contas aquele não era o meu quarto.
A imagem da noite anterior onde Wayne me carregava em seus braços pelo corredor, nua e sem interromper nem um beijo ou contato, me eriçou. Ele me trouxe até ali como um alucinado. Com o rosto quente, segurei os pensamentos e tentei concentrar em continuar minha procura pelo relógio.
Achei um pregado no teto acima da porta do banheiro e só aí me dei conta do quão Alfredo poderia ser fissurado com seus horários e ordens.
Faltava menos de um minuto para o ponteiro marcar nove horas da manhã.
— Sim, sou bastante obediente — ele enfatizou sem dificuldade a minha admiração sem descontinuar o seu trabalho de abrir o restante das cortinas.
— Você saberia me dizer porque Wayne me quer lá em baixo?
— Não — disse curto — Mas fico feliz de ver que voltou a chamá-lo como antes.
— Obrigada.
— Não me agradeça senhorita, apenas tenha paciência, logo tudo voltará a ser como antes.
— Eu não sei mais como era antes, lembra? — Brinquei afastando o restante do sono.
— Era bom — a voz daquele senhor parecia bem atenua agora.
Alfredo era essa mistura de comportamentos. Em um momento seu olhar era aconchegante e em outro, sério e esguio.
— Sua roupa está separada e dobrada sobre a estante do banheiro. Se vista e espere o sr. Wayne chegar.
— Ele não está aí?
— Ainda não.
— Tudo bem, vou descer.
Ainda estava inconformada com a necessidade daquele pedido.
Porque ele precisava mandar pessoas me acordarem quando ele mesmo podia fazer isso, e quem sabe até mesmo de uma maneira bem mais agradável.
Bufante, fui tomar banho para poder descer antes que meu último neurônio sonolento me obrigasse a voltar para a cama.
O macacão estampado na altura dos joelhos e a sapatilha me deixava com uma aparência muito materna. E claro, eu precisava me acostumar com essa descoberta.
Tocando minha barriga rapidamente antes de descer o último degrau dei uma leve debruçada e tentei aproximar o máximo possível o meu rosto do umbigo dizendo em voz baixa "Desculpe Ange, sua mãe está sendo um pouco lenta com a sua presença".
Aquele era o apelido sem gênero que eu resolvi doar ao bebê logo depois de ler algumas matérias sobre gravidez e a importância de ter um nome e ser chamado por ele durante a gestação.
— Eu nunca me canso de flagrar você, baby.
Espremendo os olhos em repreensão levantei a vista com um falso sorriso e um único pensamento. Christopher Wayne sempre me vê em situações constrangedoras!
— Pensei que ia demorar mais a vir.
— Alfredo não disse que eu estava perto?
— O que aconteceu para eu ter sido convocada a essa hora?
Com uma risada descontraída Wayne segurou minha mão esquerda.
— Não fique tão sedentária. Você precisa manter sua energia para o nosso Ange crescer bem.
Eu o encarei intimidada e com os olhos arregalados, recebendo mais risos de volta.
— Eu ouvi você chamando nosso bebê assim, e também conheço esse costume asiático e o seu significado.
— Não sabia que tinha alguma coisa haver com os asiáticos. Eu apenas gostei da ideia quando vi na televisão e pensei em algo na hora.
Ele me segurou mais carinhoso e deu alguns passos.
— Venha de uma vez, tenho algo a mostrar.
Caminhamos até a saída, e ao chegarmos Wayne me levou alguns metros a mais até próximo de uma garagem. Eu não entendi na mesma hora o que estava acontecendo, mas quando ele me mostrou uma chave, eu o encarei confusa até ouvir novamente a sua fala.
— Este é um presente de dezoito anos. Acho que não fiz tanto por uma data tão importante.
— O quê?! — Perguntei receando uma possível loucura daquele homem.
Ele tinha noção alguma de que o carro que estava estacionado ali era um Jaguar?
— Não gostou?
— Christopher, isso é um carro.
— Sim, é bem fácil de perceber.
— Mas eu nem sei dirigir!
— E não pretende aprender?
— Você é louco! Para pessoas normais existe uma ordem! Primeiro se tira a carteira, depois você suplica por alguma oportunidade de dirigir, e se tiver a sorte de ganhar um carro no mínimo se espera por algo velho e barulhento. Longe de um... Jaguar.
O som do riso dele era tão encantador e incansável que até mesmo eu relutei para não esquecer a minha "raiva" em ser tão subestimada e molestada por ele.
Christopher me pegou pela cintura, me girou e não parou de sorrir até nossas testas se tocarem e a nossa respiração se misturar.
— Não renegue meu presente.
— Isso não é presente, é exagero.
— Eu quero te dar tudo o que eu puder. Cada pedaço de tudo, cada pedaço meu, o que você puder levar de mim.
Ouvi-lo tão entregue me fez recuar com certa covardia. Mas as mãos dele me trouxeram de volta.
— Não tenha medo dos meus sentimentos.
Piscando repetidas vezes, soltei o ar e recostei minha testa na dele novamente.
— Eu não vou.
________________________
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro