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Possíveis erros de ortografia serão corrigidos assim que percebidos
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Vaguei pelo cemitério carregando um buquê farto de rosas vermelhas, indo em cada túmulo que me interessava. Primeiro fui até o lugar onde os meus pais estavam enterrados, demorando um certo tempo ali para vivenciar o meu luto com mais aceitação. Logo em seguida caminhei para outra lápide, uma que ainda parecia muito viva dentro dos meus pensamentos.
Estava escrita uma bela declaração no mármore, até porque eu fiz questão de escolher cada palavra que devia ter sido dita a Anna em sua vida. Pondo o restante das rosas dentro do vaso exclusivo no altar dela, deixei escapar uma lágrima agradecida, mas logo fui surpreendida ao sentir o vento frio da voz de alguém por trás de mim.
— Ela era mesmo muito teimosa.
Olhando a mulher de frente, nós nos encaramos por alguns segundos até ela voltar a se manifestar.
— Não se sinta culpada Dulce, essa idiota teria feito tudo de novo, sem arrependimentos — eu ia interrompê-la para perguntar de quem se tratava, mas se tinha algo que eu já havia me cansado era de explicar sempre a mesma coisa "estou sem memória" preferi deixa-la continuar fingindo estar ciente de tudo — Eu me senti mal nos primeiros dias, porque de certa forma ela sabia que tanto eu quanto as outras meninas sairiam dali com vida, mas hoje eu sei que estou aqui graças a ela. Essa louquinha nos devolveu a vida e a liberdade em troca da sua própria.
Eu talvez não precisasse de muito para entender que ela devia ser mais uma das vítimas daqueles mafiosos.
— Anna era um anjo — ressaltei, reprimindo a amargura.
— Devia ser parte do nosso destino você aparecer naquele dia — visivelmente ela lutava contra algum tipo de orgulho. Em nem um momento ela quis me encarar — Sem isso provavelmente nossos últimos dias de vida seriam naquele lugar.
— Não me considero tão importante assim. Muita gente se machucou por minha causa no meio desse percurso.
— Verdade, você ferrou até mesmo com a gente quando foi vendida por acidente e a Madame Leonor nos usava para descontar toda sua ira nos obrigando a ficar com mais de cinco clientes por dia.
Minha face de vergonha não parecia comovê-la. Não comovia nem mesmo a mim.
— Sinto muito — falei, horrorizada.
— Eu também sinto. Mesmo assim quero me desculpar. Não devia ter brigado com você no sótão naquele dia, mas eu amava muito a Anna e temi o pior para ela. A final, as coisas aconteceram como temi.
— Obrigada por não me consolar em um momento assim. O mínimo que eu devo e mereço sentir, é culpa.
— Não. Já falei que não deve se culpar, a escolha não foi sua, mas isso não significa que eu não queria que sinta dor ao lembrar do sacrifício dela. Lembre-se sempre disso.
— Isso é suficiente para você? — Insinuei erguendo minhas duas mãos ainda em processo de cicatrização pelas fortes queimaduras daquela noite.
Meus olhos estavam tristes, e eu quase chorei, mas optei por não fazer aquilo outra vez.
— Sim. É.
Fiquei ali, parada e sem compreender a intenção daquela abordagem tão áspera mesmo concordando com cada palavra dita por ela.
A mulher andou insinuando que ia embora, mas antes de dar quatro passos ela se virou na minha direção e exigiu um contanto visual. O primeiro.
— Eu sei da sua memória — Alegou firme — estranho você fingir que sou familiar e me deixar falar todas essas coisas. Por via das dúvidas, se um dia se lembrar, meu nome é Maria.
Dando continuidade aos seus passos, ela seguiu em frente, pondo as mãos dentro dos bolsos do casaco e de certa forma escondendo o próprio rosto. No seu caminho vinha Alfredo, em quem ela fez pareceu fazer questão de esbarrar. O mordomo a olhou critico, vindo até mim.
— Quem era essa mulher, senhorita?
— Alguém — Disse apenas, e ele não ousou me questionar por mais.
— O patrão acha melhor irmos agora.
— Eu já terminei Alfredo.
Olhando uma última vez para o túmulo, fiz uma curta prece e segui o homem até o carro estacionado há alguns metros.
Wayne estava lendo uma das folhas do jornal matinal quando entrei e me sentei no banco detrás do carro ao lado dele. Meu olhar não o procurou, naquele momento eu estava perdida em muitos pensamentos para me doar a outra coisa. Inacreditavelmente, todos pareciam respeitar meu silêncio.
Na mansão não foi diferente.
Meu quarto estava deserto, escuro, apenas aos sons dos ventos e do temporal que estava prestes a se formar do lado de fora. Naquela mesma solidão me esforcei para tentar recuperar a consciência de todas as coisas que haviam sucedido comigo, mas mais uma vez só ganhei frustração ao invés de memórias. Revoltada, comecei a golpear minha cabeça com as mãos dividindo a dor entre as duas partes machucadas. As lágrimas pareciam ter esperado a chuva começar para rolarem pelo meu rosto sem piedade da quantidade.
Christopher entrou no meu quarto segurando um pequeno foco de luz, que instantaneamente me deteve. Ele se aproximou com olhar pesaroso. Mas como não sentir pesar? Eu estava sentada no chão, recostada na parede e abraçando os joelhos como uma menina covarde.
— Você tem medo do escuro? — Ele me perguntou e eu o fitei confusa — Faltou energia e eu vim o mais rápido que pude.
A última fala dele foi abafada pelo forte trovão que ecoou fazendo o assoalho vibrar.
— Eu não percebi.
— Não?
"Não, pois as luzes já estavam apagadas antes mesmo de você chegar" eu ia explicar, porém, não queria receber mais perguntas da parte dele.
Em um movimento imprevisto, Wayne sentou-se ao meu lado, e pôs o pequeno feixe de luz um pouco a nossa frente.
— Eu sei que nos últimos dias muitas coisas aconteceram e que é obscuro na sua cabeça, mas já faz três semanas que você não fala comigo desde o hospital. Porque?
Já havia passado mesmo todo aquele tempo? Eu nem sequer analisei quando a minha preocupação foi me manter viva e respirando. Parece fácil aos olhos dos outros, mas por dentro uma tristeza sem fundos me consumia de forma gradativa. Olhei um instante para a minha barriga, notando que já existia uma discreta transformação física.
— Porque eu me apaixonei por você? — A minha contra resposta questão o deixou pasmo.
Christopher foi abordado por mim, sem acreditar, tanto que o sorriso irônico que se debruçou em seus lábios deu um tom espontâneo ao clima.
— É uma boa pergunta, Escobar.
— Você não parece um homem que faria o meu tipo.
— Devo me sentir honrado ou ofendido?
— Não sei — rebati — Eu vi seu comportamento e a forma como fala com seus subordinados. Suas atitudes rudes, seu sarcasmo, você se acha o chefe de tudo.
— Mas eu sou.
— E eu odeio pessoas assim! As abomino!
— Aonde quer chegar? — A ênfase dele me fez acuar.
— Eu não sei.
— Mas precisa saber, Dulce. Existe uma criança entre nós, um filho, e isso exige certezas e não achismos.
— Posso fazer isso sozinha. Não precisamos ficar juntos para cria-lo.
Eu engoli em seco, prevendo que seria encarada como estava sendo naquele exato momento. Wayne parecia completamente atônito e embravecido.
— Porque está fazendo isso? Eu pensei que as coisas haviam se resolvido entre nós.
— Como daria certo... eu não sei nada sobre você, ou sobre nós, ou sobre qualquer coisa. Eu me sinto uma idiota quando não estou ocupada tentando lembrar de tudo.
— Então simplesmente não lembre.
— Christopher, eu preciso entender o que sinto quando estou com você. Porque, pode ser medo de estar perdida no mundo, e de ser órfã, e isso machucaria a nós dois se for verdade.
— Eu não acho que seja verdade.
— Mas pode ser.
— Não fale por mim, Escobar.
— Você é um homem bem-sucedido, experiente, e eu tenho dezoito anos.
— Eu sei desses detalhes.
— E então?
— Dulce, acredite em mim, eu não queria ter me envolvido com você. Sempre tentei evitar isso, até te avisei para se afastar — umedecendo os lábios, Christopher tentou recobrar as ideias — Mas eu a quero.
— Me quer — Repeti percebendo um frio no estômago.
Ele não conseguia segurar a própria respiração. Wayne estava sem ar, sufocado, e encurralo de um modo não proposital. Enterrando o rosto nas mãos, senti que o homem ao meu lado compartilhava uma mesma aflição. Meus olhos o observaram, atentos, até que ele parasse de se esconder e voltasse vista para mim.
— Eu amo você... — Soltou, deixando minha saliva menos úmida — Sempre foi você.
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NOTAS
Meus amores! Feliz em revê-los...
Obs: Para quem não lembra ou simplesmente não sabe, o nome da personagem "Maite" foi mudado para "Maria". Fiz essas modificações igual com "Anahí" para "Anna".
Beijoos doces <3
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