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004

Se aquela mulher pensava que eu ia me render, ela estava extremamente enganada. Eu ia lutar! E se ela decidisse acabar com a minha vida, pois que acabasse. Não havia mais nada para tirarem de mim.

— Jamais farei o que você quer!

Ela sorriu como se a minha reação fosse previsível. Por nem um segundo sua postura foi afetada, e como imaginei, fui ignorada.

— Eu sei que não — confirmou tragando seu cigarro — Eu trabalho a muitos anos com isso minha querida, e se existe uma coisa que aprendi, é que todas as pessoas são capazes de mudar de opinião.

— Comigo isso não vai funcionar. Não vou... deitar com ninguém! — rebati novamente.

Incrivelmente ela me encarou surpresa. Parecia ter sido pega de surpresa pela minha previsão. Seus olhos se arregalaram por um momento, e então a fumaça foi solta da sua boca mirando o teto. Depois que se livrou de toda aquela nevoa tóxica, ela gargalhou e continuou como se eu não a tivesse interrompido.

— Você é uma boa garota, pelo menos foi o que soubemos, então tenho certeza que não vai querer fazer mal a ninguém, vai? — franzi o cenho, e me questionei do que ela falava — Todas que entram aqui tem uma história meu amor, talvez não como a sua, mas elas mantêm esperanças.

A mulher se levantou e ligou um projetor que estava suspenso no teto. A grande luz foi focalizada na parede suja e então se iniciou as imagens estranhas, trocadas conforme ela apertava o controle em uma das mãos, enquanto que a outra ainda se ocupava do cigarro.

Era Red... Ela estava ao lado de pessoas; pessoas que se pareciam com ela. O sorriso em seu rosto estampava todas as fotos. Aquilo parecia triste, porque nunca a tinha visto sorrir daquele jeito.

Meus joelhos tremeram e algumas lágrimas caíram. Minhas mãos estavam amarradas, e era impossível limpar as provas da minha tristeza.

— Anahí sonha em sair daqui, sempre sonhou, mas só fará isso quando quitar todas as suas dívidas.

Então aquele era o nome dela.

— Porque está me mostrando isso?

— Porque a vida dela vai depender de você.

— Não entendo.

— Eu sei que sua vida não vale nada, ninguém te espera lá fora, ninguém se importa com você, mas ainda assim é bonita; aparentemente vai nos fazer lucrar. Você é virgem, e tem pessoas que pagam bem por isso.

Engoli o salgado sabor do medo, pela primeira vez. Eu não pensei que eles soubessem daquele detalhe, muito menos que aquilo seria a minha maior qualidade naquele lugar. Andei de costas e só parei quando a parede me impediu de continuar. Eu estava assustada e queria ficar longe dela.

A mulher não tirava do rosto aquele sorriso sarcástico e amedrontador desde que começou a falar.

— Anahí tem família, e se você não fizer o que mandamos ela vai morrer, e tudo pelo que lutou será perdido.

— Isso é um jogo, ela também vale muito dinheiro, vocês não a matariam.

A gargalhada demoníaca fez minha espinha se arrepiar.

— Jogo? Você acha que isso é um jogo? — ainda gargalhando ela puxou o celular e digitou, iniciando uma ligação.

Mas antes de pôr o aparelho na orelha, ela apertou outro botão e uma serie de câmeras ficaram visíveis, inclusive uma do sótão.

Ela nos via esse tempo todo! Será que as meninas sabiam disso? Possivelmente elas deviam saber, era lógico.

— Pegue a Anahí Gustavus e arraste ela para fora. Agora.

Eu assisti toda a cena, narrada pelos comandos dela através do celular. O homem entrou no sótão e tirou ela de lá, a força. Não tinha áudio no vídeo, mas dava para ver que Red gritava alguma coisa.

— Isso — disse satisfeita — Agora dê um tiro na perna dela.

— Não! — gritei desencostando da parede.

Ela afastou o celular do ouvido e me encarou.

— Quero que entenda que minhas ordens são reais garota.

— Não faça isso. Ela não tem nada a ver comigo, nem somos amigas — rebati pensando que aquilo poderia fazê-la desistir.

— Melhor, assim pelo menos isso não te afetará. Atire!

Mesmo sem som, foi muito apavorante ver o brutamonte sacar a arma e atirar nela. No lugar onde lhe ordenaram. Eu gritei, aos prantos, vendo Red se jogar no chão desesperada após levar o tiro sem entender o porquê de tudo aquilo. Nem eu entendia.

Porque usaram ela para chegar em mim? Não era justo.

Chorando, me ajoelhei no chão, de cabeça baixa e lamentei.

— Agora chame o médico e mande ele cuidar disso.

Só assimilei que a ligação foi encerrada quando ela ficou bem na minha frente e jogou a bagana no cigarro próximos dos meus pés.

— Volte para o seu lugar e pense bem no que todos nós somos capazes, porque acredito que não sabia, até agora.

Não respondi, não falei, nem me movi dali. Só esperei ser pega e levada de volta.

***

Quando eu voltei todas as garotas falavam ao mesmo tempo, nervosas. Elas tinham ouvido o som do tiro, sabiam que alguma coisa tinha acontecido. Sem falar nada, andei para o meu lugar e me sentei como de costume. Abraçando os joelhos dobrados. Escondi o rosto deitando a cabeça em meus braços e chorei em silêncio.

Algumas horas depois, o portão abriu e Red entrou. Ela tinha a perna direita enfaixada, e não usava muletas, apenas se arrastava, manca. A onda de meninas a engoliu com perguntas e questionamentos, então decidi esperar pacientemente a poeira baixar para poder me aproximar dela, mas a garota foi mais rápida. Ela se sentou do meu lado no chão, com dificuldade, e pegou na minha mão.

Soltei o ar apenas sentindo o alívio e a felicidade em vê-la viva.

— Como você está?

— Dói.

— Mas está viva, e isso é o que importa — falei lhe dando um abraço.

Red tinha sido a única pessoa desde que cheguei, que realmente foi boa comigo, cuidava de mim, e só de lembrar como ela era feliz antes de cair naquele lugar meu ânimo sumia. Ela estava lá quando eu fiquei sozinha, não queria perdê-la. Não queria perder mais ninguém.

— Obrigada Dulce.

Me soltei dela, e a fitei pelo agradecimento inesperado.

— Porque?

— Eu sei que foi você. Madame Leonor me disse que você me poupou.

A maldita mulher já tinha me posto contra a parede, estava mesmo disposta a me forçar a fazer o que ela quisesse. E agora?! Como eu poderia decepcionar Red? Ela talvez merecesse mais do que eu, viver, e voltar para a sua família.

Novamente lembrei dos meus pais, e o choro foi involuntário. Agarrei-me nela mais uma vez, recostando a cabeça em seu ombro. Era abominável imaginar o que me aconteceria de agora em diante.

***

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