Capítulo 95
CAPÍTULO 95
A noite das meninas daquele 22 de setembro de 2017 fora simplesmente maravilhosa. Asia, tia de Alasca e melhor bruxa do Espírito Santo (talvez do Brasil), aceitara passar o aniversário de 47 anos com a sobrinha. Américo, já em processo de separação com Diana, viajara para Salvador um dia antes do casamento de Ginevra. Seu objetivo era acertar os detalhes da guarda de Maria Joaquina com Helionora sem a confusão usual da família Garuzzo.
Alasca e Asia conversavam sobre as estrelas e os encontros e desencontros da Astronomia e da Astrologia. Alasca lembrara a Asia que Ginevra, sua antiga rival, era astrônoma e que Simão havia traído ela com uma astróloga em ascensão.
– Astronomia e Astrologia são irmãs gêmeas: nasceram juntas, mas seguiram caminhos diferentes. – Respondeu a mãe de Gareth. – Os mais céticos chamam a Astrologia como pseudociência, mas lhe faltam entender que Astrologia é mais questão de fé do que da ciência que é permitida se ter aqui na Terra. Já a Astronomia mostra à humanidade a grandeza do universo. Como não se sentir completo imaginando tudo que sabemos que existe mesmo não podendo enxergar?
– Desculpe-me a indagação, mas a senhora se sente feliz já que ex-mulher do seu grande amor está finalmente casando novamente? – Questionou Alasca, com tom zombeteiro.
– A única coisa que me deixa feliz, além da felicidade da Gina, claramente é o grande evento astrológico de amanhã. Teremos literalmente "a mulher vestida de sol com a lua debaixo dos pés e doze estrelas sobre a cabeça". – Disfarçou a bruxa.
– Já ouvi falar sobre isso: o Sol, astronomicamente, iluminará a constelação de Virgem que carrega o planeta Júpiter em seu ventre. Logo acima está a constelação de Leão, com nove estrelas principais, somadas com os planetas Mercúrio, Vênus e Marte. Além do mais, a lua aparecerá abaixo dos pés de uma virgem imaginária desenhada. Devo temer o juízo final ou comemorar o fim iminente do mal sobre a Terra?
– Não é bem o fim apocalíptico que você se acostumou a ouvir na Igreja com seu pai. Mesmo que fosse, quem é justo não teme a chegada da justiça. – Confidenciou Asia. – Bem, meus amigos astrólogos e eu chegamos à conclusão que este deve ser o sinal do início da Era de Aquários. A Virgem dá a luz a uma nova consciência: todos devemos nos responsabilizar pelos nossos atos, não colocar a culpa em um Deus ou uma Deusa criadores de tudo. Não é me gabando, mas o Sol em Virgem representa toda a vida que brota da Terra, nossa mãe Gaia. O que pensamos, fazemos e sentimentos são sementes que serão colhidas mais a frente.
– Desculpe-me tia, mas sou obrigada a confessar que sinto uma imensa vontade de ser como você um dia. Quero ter sua sabedoria! – Contou a pisciana.
– Você será melhor do que eu. Não há sentimentos ruins que te prendam ou amores impossíveis. – Desabafou. – O esoterismo me proporcionou isso, sabe? Não sou aquela bruxa má que corre quando ver um crucifixo ou que enfeitiça qualquer pessoa que discorde um tiquinho de mim. Isso eu deixo pra Virgo. Aprendi a receber o conhecimento que a natureza que me dá, que me era limitado nas paredes de uma igreja de pessoas julgadoras e hipócrita. Não sou perfeita, mas pretendo caminhar para a Perfeição.
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Américo estava prestes a chegar à capital baiana, quando relembrou a frieza de Diana ao descobrir que o matemático teria uma filha com a herdeira mais nova de Ginevra. A sagitariana confessara não se importar com a traição e saber que o seu casamento era de fachada a algum tempo. O irmão de Asia precisou de suas habilidades lógicas para convencer Diana a aceitar o pedido de divórcio.
Chegando em Salvador, o virginiano não pode deixar de encantar-se com a beleza da ex-amante grávida. A loira, com uma barriga miúda para os oito meses, não apresentava um semblante tão furioso quando o da última vez que Américo a viu.
– Me perdoe o sentimento, me perdoe a coragem inclusive, mas não consigo compreender porque você resiste tanto à ideia de sermos uma família. – Desabafou Américo. – Eu te amo, Helionora, e acredito que o que você sinta por mim não seja apenas desejo carnal.
– Parece simples tentar um segundo casamento para quem teve um modelo de família perfeito. Você teve um, Américo, e mesmo depois que seus pais rejeitaram a nova religião de Asia, a acolheram quando souberam da existência de Gareth. – Citou a gestante. – Eu não tive um modelo de família perfeita: meus pais se separaram por motivos que até hoje não entendo. Se papai tivesse se casado com Asia, talvez hoje eu entendesse o divórcio, mas ele casou com o demônio da Maytê Mamãe só admitiu tentar a felicidade novamente 23 anos depois do divórcio. O casamento dos meus irmãos que pareciam tão bem estruturados acabaram de uma maneira trágica. Prefiro criar uma filha que saiba que foi gerado de muita paixão, mas que não tenha o seu sonho de família perfeita desfeita antes dos 12 anos.
– Não existe família perfeita, Helionora. A única que assim foi teve o seu filho morto na cruz. Você não quer isso para a nossa filha, né? – Respondeu o matemático. – Eu não quero uma família perfeita, Liô. Eu quero a mulher que me faça querer superar todas as minhas imperfeições. Eu quero você.
– Américo, não viemos aqui para discutir as ambições românticas de nenhum dos dois e sim decidir como ficará a criação de Joaquina. Pretendo ficar com ela continuamente até o sexto mês e depois podemos deixá-la por dois meses no Brasil e outros dois meses na Itália, ou um mês se você achar melhor. Como acabo meu mestrado provavelmente em junho de 2019, ficará mais fácil a partir daí de compartilhar a guarda.
– Já que você quer falar apenas da guarda, aviso que irei com a Gina para Gaeta acompanhar o parto. Gina aproveitará esse período para ter uma lua de mel atrasada com o Isaías também. Combinamos, os três, que Alasca e Marina morarão juntas durante o tempo em que estaremos distantes. – Concluiu o virginiano, com o coração em chamas.
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Graças a boa lábia de Simonetta e ao feitiço Charme de Stella, o quarteto, ainda composto por Gareth e Leônidas, conseguira parceria com algumas escolas soteropolitanas para introduzir o Domingos Retrógrados. A empresa, que nascera com caráter virtual quase que por completo, estava conseguindo expandir seus horizontes e fazer iniciativas educacionais promissoras. O ruim disso é que Gareth e Simonetta depositaram a maior parte do trabalho para ambos, mas a maior parte do lucro também entrava em sua respectiva conta conjunta. A vida financeira do casal ia de vento e poupa, o que ajudou Gareth a obter um belíssimo Chevrolet amarelo e a pagar as constantes terapias que eram submetidas à Gabriel e Olívia.
O quarteto decidiu fazer um rodízio em suas palestras, de acordo com o tema de escolha de cada um. Stella se responsabilizara em iniciar o evento falando sobre a clássica "A Divina Comédia" de Dante Aligheri. Leônidas, movido pelo hiperfoco de Gabriel em "O Pequeno Príncipe", decidira palestrar sobre o mais belo livro escrito para crianças, como dissera o tradutor Ferreira Gullar.
No terceiro domingo de setembro, Gareth palestrara sobre Simonetta Cattaneo Vespúcio, a musa do Renascimento. O geminiano ressaltou como a Simonetta renascentista representava os quatro ideias de feminilidade: santa, amante, amiga e cônjuge. "Talvez todas as Simonettas carreguem esses quatro ideais dentro de si", dissera Gareth, olhando apaixonadamente para a esposa. Movida pela declaração de amor do marido, a universitária decidira ser o quinto ideal da feminilidade: o cupido de um amor que já nascera eterno. Não fora fácil manter a imparcialidade lendo Amor de Perdição: Simão, protagonista trágico do romance, além de ter o nome de seu avô tinha a personalidade de Gareth. Além disso, a semelhança dos amores malsucedidos da família Botelho parecia uma analogia clara às histórias de amor da família Garuzzo. Porém, apesar de tamanhas coincidências, havia uma vantagem inegável da família ítalo-brasileira: o futuro ainda estava para ser escrito.
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Quando Gina se casara pela primeira vez, ela pensou que era para sempre. Não a entenda mal: Simão Garuzzo era o grande amor de sua juventude e Gina carregava em seu ventre o primeiro fruto do amor dos dois. Infelizmente aquele amor acabara vinte anos depois e Gina, agora uma mulher madura de 66 anos, fora obrigada a trair a sua versão de 23 anos. Mas ela não se arrependera de nada por nada o que passara. Ali estavam seus três filhos e a filha do seu novo amado. Ali estavam seus seis netos já nascidos e uma sétima prestes a nascer no próximo mês, no ventre de sua filha caçula. Embelezavam, também, a festa seus dois bisnetos, netos do pivô do fim do amor que julgara eterno. Asia, que completara 47 anos no dia anterior, estava com um semblante tristonho. A bruxa a pouco guardara em sua bolsa de crochê o livro Amor de Perdição, presente de aniversário que Simonetta dera à sogra. O que será que Mona planejava com aquilo?
Mesmo com tudo que sofrera, Gina não conseguia sentir rancor de Asia. Sentia apenas misericórdia, misericórdia essa aflorada pelo amor incondicional que passara a sentir naquele ano de 2017. Sua ex-rival merecia ter sido feliz naqueles últimos 23 anos. Movida pela superação e descoberta do amor incondicional, Gina se aproximara da ex-rival, dizendo carinhosamente em seus ouvidos.
– Olhe bem o meu exemplo: nunca é tarde para ser feliz! – Alertou a experiente mulher.
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