Capítulo 6 - Vulnerável
Beber com os amigos numa quarta-feira a noite não era algo que Eduardo fazia sempre, mas a chegada do seu irmão ao Rio merecia esse tipo de comemoração. Ele fez alguns amigos desde que se mudara pra cidade, mas os mais próximos eram Marcelo, Duda e Felipe. Os quatro foram calouros juntos na faculdade de História e permaneceram amigos pelos quatro anos que se seguiram, embora Felipe morasse em Maricá e marcar de sair com ele fosse uma tarefa praticamente impossível.
― Uma coisa que você vai aprender rapidinho é que quase ninguém se forma em quatro anos - Marcelo disse, bebendo sua cerveja e alisando sua barba, o verdadeiro amor da sua vida - Nem o seu irmão se formou em quatro anos.
― Cara, se nem o Eduardo conseguiu, quem é que consegue - Felipe concordou e todos riram na mesa.
― Só deixando claro que a culpa não foi minha - Edu se defendeu, sem saber se deveria se sentir orgulhoso ou não da imagem que os amigos faziam dele. - Culpe a UFRJ.
― Ah, coitadinho, injustiçado pelo sistema - Duda zombou, arrancando um sorriso meio tímido do Eduardo.
A primeira coisa que chamava a atenção em Duda eram os seus dreads no cabelo castanho. Ela tinha aquela cara de hippie socialista e, apesar de não ser socialista de fato, era ativa politicamente em prol dos direitos do cidadão. Mas, Deus, não ficava enfiando panfletos na cara dos alunos pelos corredores do prédio da faculdade, isso não. A garota tinha bastante bom senso.
― Você sabe que pegou meu lugar né, pirralho? - Felipe disso ao Guto, fingindo irritação. - Onde é que eu vou passar a noite agora quando quiser sair? Não tem ônibus pra Maricá de madrugada.
Guto levantou as mãos como quem se desculpa, com o sorriso dos irmãos Becker nos lábios.
― Ei piá, tu podes usar o sofá, tenho certeza que o Edu não se importa.
― Que droga, por que mesmo você tem namorada hein, Becker Junior? - Duda comentou, espirituosa como só ela, entre um gole e outro na sua cerveja. - Dois de vocês é demais pra qualquer uma.
Marcelo quase engasgou com a gargalhada que soltou.
― Segura esses feromônios aí, Maria Eduarda - ele disse. - A namorada do garoto está chegando.
― Pois eu quero muito conhecê-la, sou fã! Porque esse daqui - ela apontou para Eduardo, implicante - nunca vi mais eremita.
― Deixa o moleque se divertir - Felipe saiu em defesa do amigo, dando um aperto no seu ombro. - Não é todo mundo que já terminou o TCC antes mesmo de se formar enquanto nós, reles mortais, temos nossas almas sugadas.
― Está tudo pronto porque eu deveria ter me formado em dezembro - Edu retrucou. - E eu pesquiso com a Glória há dois anos, agora vamos parar de falar sobre mim? Nunca vi. Se eu não conhecesse vocês ia achar que os três estão apaixonados.
― Você ainda não sabe que é o nosso mozão? Eu tô ofendido - Marcelo brincou, mandando beijinho pro amigo, que riu antes de dar outro gole na sua cerveja.
― Piá do djanho - Edu praguejou.
― Lá vem - Felipe jogou as mãos pra cima, frustrado. - Volta pro português, amigão.
― Moleque chato - ele traduziu.
― Mas não importa onde tu estejas, a zuação te persegue hein irmão - Guto comentou e o irmão deu de ombros como quem diz "fazer o quê!".
Então Duda indagou ao Guto:
― Ele já era velho assim desde a adolescência?
― Sempre foi. Já nasceu com trinta e cinco anos. E as meninas todas em cima dele e ele nem percebia.
― Nossa então não mudou nada - Marcelo riu. - Podia tá comendo o Rio de Janeiro inteiro, mas fica aí chupando dedo.
― Eu acho que devo ser um excelente objeto de estudo, não é mesmo? - Eduardo ironizou. - Que tal a gente falar sobre a crise econômica?
― Pelo amor de Deus, Eduardo, a gente aqui querendo falar de mulher e você me vem com a crise? Leke, tu pede pra ser zoado - Felipe ladrou e todo mundo na mesa riu, inclusive o próprio Edu, que não podia evitar ser como era.
― Mas e você, Guto, vai estudar o que? - Duda finalmente mudou o assunto, para o alívio do amigo. Era uma boa coisa que Eduardo não gostasse de falar sobre si mesmo porque seus amigos já faziam isso por ele o suficiente. Ou talvez fosse o contrário, os amigos implicavam tanto com o rapaz justamente porque dele as palavras não saíam por conta própria.
― Vou cursar geofísica na UFF. Não achei que fosse ficar empolgado, mas não posso negar.
― Ah, Niterói! - Duda aprovou, entortando a cabeça em um raro momento de meiguice. - Eu amo Niterói, minha irmã mora lá com meu cunhado.
― Então quer dizer que você é de Exatas, Junior? - Marcelo balançou a cabeça, fingindo desapontamento. - Eu esperava mais você.
Guto apenas riu, pegando um petisco de queijo que eles haviam pedido para complementar a bebida.
― É, bem, em alguma coisa eu tinha que me sobressair. Porque com esse daí como sombra a vida inteira - ele apontou para o irmão - sempre foi muito difícil.
― Pobre, Junior!
O papo de bar foi e voltou, passando pela última garota maluca no currículo de garotas malucas que o Marcelo tinha e terminando no desespero do Felipe pra acabar logo seu TCC e a faculdade. Calíope e sua melhor amiga, uma garota chamada Helô, chegaram ao bar onde eles estavam - que sempre se esquecia de checar se os clientes eram maiores de 18 anos - uns trinta minutos depois e Duda não perdeu tempo em se apresentar pra ela como sua mais nova fã.
Ela se sentou ao lado do namorado, deixando o lugar vago para Helô ao lado do Eduardo. O que pareceria perfeitamente aleatório se Calíope e Guto não tivessem trocado um olhar cúmplice (que ninguém percebeu, diga-se de passagem).
Helô era uma garota bonita. Sua pele marrom indiana era tão sedosa que não parecia de verdade, como Cali sempre dizia. Seu cabelo castanho, liso e pesado estava jogado para o lado, deixando o outro ombro e o pescoço expostos e o perfume de lavanda exalando até o alcance de Eduardo.
Todos foram apresentados e os dois trocaram um olhar. Ela abriu um sorriso simpática para ele, os olhos um pouco provocativos, certamente interessados no que estava vendo. É claro que ele não percebeu de primeira, mas sorriu de volta e gostou do perfume dela. Avistou o olhar de Cali e Guto encarando-os, mas os dois viraram a cabeça na hora em que Eduardo percebeu e foi aí que ele se deu conta do que estava acontecendo.
Guto disse mesmo que faria isso.
Mas Edu não podia reclamar de alguém tentar juntá-lo com uma garota como Helô. Não que o rapaz estivesse interessado em romance, mas ele também não era cego. Nem feito de ferro.
― E você, Helô, vai fazer o quê da vida? - Felipe perguntou.
― Publicidade - ela respondeu com sua simpatia natural saltando de cada letra. - Apesar do meu pai resmungar todo santo dia que eu deveria fazer medicina já que ele vai ter que pagar uma fortuna de mensalidade todo mês de qualquer maneira. Mas eu fazendo medicina? - ela soltou uma risada extrovertida. - Só nascendo de novo, não suporto nem tirar sangue sem ter que me preparar psicologicamente.
― O Eduardo também odeia tirar sangue - Guto disse, assim como quem não quer nada, e Helô e Eduardo se entreolharam mais uma vez.
Dessa vez ele correspondeu ao interesse silencioso.
― É mesmo? - Helô pousou o cotovelo na mesa e a mão no queixou, mordendo a unha do seu dedo mindinho de um jeito que fez Edu quase tropeçar nas próprias palavras.
Ele deu de ombros e levou a sua garrafa até a boca. O líquido desceu pela sua garganta de um jeito que não passou despercebido a Helô. E ela gostou.
― Prefiro não ter minhas veias violadas.
― Concordo plenamente. Se é para algo ser violado, melhor que não sejam as veias.
O sorriso tímido do rapaz cresceu no canto esquerdo da boca e ele assentiu, sem saber o que dizer em seguida. Felipe revirou os olhos e Marcelo teve que conter a gargalhada. Assistir a Eduardo em um flerte era algo que eles nunca se cansariam de fazer.
Ao menos dessa vez ele estava interessado.
Ele e Helô conversaram e, quando não estavam conversando, estavam sendo empurrados um para o outro por Guto e Calíope. Não aconteceu nada naquela noite, mas o casal da mesa ficou satisfeito com o encontro planejado e considerou promissor, já que os dois candidatos a futuro ship pareceram ter se dado bem.
Já era tarde quando todos se despediram e Duda e Felipe animaram de ir para uma festa na Lapa. Os outros resolveram ir embora mesmo e Hélio - um dos irmãos gêmeos da Cali - passou para pegar as meninas porque estava por perto com a namorada.
Os irmãos Becker voltaram andando para seu apartamento, que ficava a exatas duas quadras do bar. Era legal morar numa cidade grande e mesmo assim estar perto das coisas, Augusto pensou. Os dois entraram no elevador conversando sobre como Guto e Cali haviam sido descaradamente diretos.
― Ah, mas tu não pode negar que ela é uma gata - o irmão mais novo disse e Eduardo realmente não negou.
― Ela é linda. Mas da próxima vez eu gostaria de ser consultado primeiro.
Guto fez um som com a boca, descartando essa hipótese.
― A não ser que tu tenhas uma namorada secreta, não tem porque eu ser tão cuidadoso. Tu deverias me agradecer, isso sim - ele riu.
― Pode parecer chocante pra você, mas eu não tenho problemas em conseguir garotas - Eduardo se defendeu, cruzando os braços e se apoiando na parede do elevador.
― Claramente não tem problemas em atrair a atenção delas, mas não parece muito interessado - Guto retrucou, analisando a postura defensiva do irmão. - Piá, tu tem que seguir em frente. Ninguém vai quebrar seu coração só porque você deu uns beijos.
― Não é que eu tenha perdido a fé nos relacionamentos - ele se explicou, abrindo a porta do elevador quando ele chegou ao décimo andar. Guto passou e ele largou a porta, indo atrás do irmão e vasculhando o bolso da bermuda atrás das chaves. - É que ainda não encontrei ninguém com quem eu queira... Você sabe - ele enfiou a chave na fechadura e abriu a porta do apartamento escuro. Tentou não ruborizar, mas sua pele branquela não tornava isso fácil.
Guto acendeu as luzes da sala e se jogou no sofá enquanto Edu trancava a porta de volta e ia até a cozinha pegar um copo de água. O buldogue francês preto de Eduardo veio correndo da varanda, todo feliz por ter companhia de novo - mais ainda quando ganhou um carinho do Guto.
― Tu só não parece muito aberto - o mais novo continuou. - E eu fico preocupado porque você só tem vinte e um anos e poderia estar vivendo muito mais do que se permite detrás dos seus livros de História.
― Eu faço muito mais do que estudar. Eu trabalho, eu pesquiso, saio com meus amigos...
Guto ficou olhando para ele com o ceticismo escancarado.
― Seus amigos disseram que quase não conseguem te tirar da sua rotina de trabalho e estudo constante. Não tô inventando nada.
Eduardo deu um último gole na água e deixou o copo em cima da pia, se juntando ao irmão no outro sofá marrom e gigantesco no meio da sala de estar. Ele abriu os braços e os apoiou em cima do encosto enquanto seu cachorro mordiscava a barra da sua calça de brincadeira.
― Eu estou feliz assim - garantiu, mas sem muita convicção.
― Tu estás acostumado. E devia se arriscar mais. Sair mais, conhecer outras pessoas. Sair da sua zona de conforto - Guto incentivou e ficou satisfeito porque sabia que seu irmão estava ouvindo. Talvez ele fosse a única pessoa que Eduardo ouvisse de verdade. - Não tô dizendo pra você se apaixonar, só pra não ficar observando a vida passar.
― Eu entendi.
E havia entendido mesmo. Se tinha algo que Eduardo era, era inteligente. E, no fundo, ele sabia que seu irmão estava certo em tudo, desde ele precisar seguir em frente dos seus traumas amorosos até ter que sair detrás dos livros de História. Mas é que lá, fazendo o que ele sabia de melhor, Eduardo se sentia tão seguro. Era bom poder ter o controle da própria vida, saber que era ele e o seu próprio esforço quem determinava o rumo das coisas.
Por isso se relacionar com outras pessoas era tão difícil. Não havia controle, não havia garantias, não havia unilateralidade.
Ele não sabia como ser diferente. Como se "abrir para as possibilidades" do jeito que Augusto fazia. Era difícil para Eduardo se permitir à vulnerabilidade, se deixar levar pelas situações sem medir as consequências. Mas talvez, só talvez, ele devesse tentar.
E aí, quem sabe, alguma coisa boa - e não ruim, como da última vez - pudesse acontecer na sua vida.
Hey Folks!!!! Boa #MadrugsBoladona pra gente! Tenho andado suuuuuper cansada com a volta da faculdade, mas capítulo toda quinta é prioridade hahahaha
Percebi que o capítulo passado foi polêmico né? *risada maléfica* O que posso dizer? SOP será polêmico do início ao fim. Mas espero que ao longo da história vocês captem a mensagem subliminar por trás de tudo isso hahaha Lavínia veio pra causar, se fosse pra ser pacífica ela estaria no oceano!
E outra coisa: VOCÊS VIRAM QUE SOMT CHEGOU A UM MILHÃO DE LEITURAS??????? OBRIGADA GENTE, EU TO TÃO FELIZ QUE NÃO CAIBO DENTRO DE MIM, SÉRIO, SE FUI TRISTE NÃO ME LEMBRO. VOCÊS SÃO O MAXIMO. VAMO QUE VAMO <3
Beijos e queijos, câmbio desligo.
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