capítulo três: rato no café da manhã
Isabel nunca havia sido acordada com batidas repetitivas e irritantes na porta do seu quarto.
Nunca.
Ela tinha um ótimo relógio biológico que a colocava em pé em um horário razoável, sem rodeios e sem enrolação. E caso ultrapasse o limite de uma boa noite de sono, seus pais pagavam por criadas silenciosas que abriam cuidadosamente as cortinas, permitindo que a luz solar inundasse o quarto e a acordasse naturalmente.
Depois de passar a sua vida inteira em Mariswood, um castelo antigo e fortalecido por pedras de linhagens reais, Isabel havia se acostumado com aquele quarto pequeno surpreendentemente bem. O banheiro da residência em que vivia era maior do que o quadrado claustrofóbico chamado de "dormitório", os móveis não tinham a qualidade que ela estava acostumada e suas bolsas luxuosas não pareciam combinar com a estética simplista do local, e ainda assim, ela não estava insatisfeita. Claro, La Brede havia sido construída para os ricos e contava com uma extensa lista de privilégios que escolas normais nunca sonhariam em ter, mas nada se comparava com o luxo da própria casa, dos próprios empregados e das próprias mordomias.
Isabel alisou seu cabelo com as mãos, movendo os fios rebeldes para longe da sua visão. O relógio na tela inicial do seu celular beirava às sete da manhã daquela segunda-feira, o primeiro dia de aula do semestre. Ainda estava cedo, se dando ao fato de que sua aula começaria apenas às nove horas.
Então, por que havia alguém batendo na sua porta?
Tão forte e tão repetidamente?
Isabel amarrou o robe de cetim rosa na cintura, andando até a entrada com os pés descalços. Ela suspirou fundo antes de abrir a porta.
— Bom dia! Aceita um cappuccino? Zero açúcar, sem glúten e sem lactose. Perfeito para o primeiro dia!
Cabelos castanhos passaram por ela em um piscar de olhos, desviando de Isabel e entrando para dentro do quarto como se estar ali fosse cotidiano. Constance Monroe, a garota que conheceu dois dias atrás no Temple Club, girou para encarar Isabel, estendendo um copo ecológico e abrindo um sorriso lascivo.
— O que você está fazendo aqui? — Isabel perguntou, seu humor naturalmente frio e antipático, compatível com alguém que havia acabado de ter seu sono interrompido.
— Vim te acompanhar para o primeiro dia de aula, é claro — Tess respondeu como se fosse óbvio. Quando viu que Isabel não ia pegar o cappuccino, ela levou o copo até seus lábios e tomou um gole. — Você se lembra de mim, né? Pode me chamar de Tess.
— Eu não preciso de ajuda.
Tess balançou as sobrancelhas perfeitamente modeladas e olhou ao redor do quarto.
— Você podia ter enviado alguém antes, para fazer uma decoração no quarto. Ele tá bem... sem graça.
Os olhos de Isabel se estreitaram e ela olhou de relance para as próprias mãos: nuas e com muita vontade de fazer Tess ir embora sem pestanejar.
— Assim que eu te vi, eu sabia que você ia precisar de ajuda — ela deu mais um gole na sua bebida. Seus olhos se inclinaram enquanto a estudava. — Eu posso ver a inocência no seu rosto. Confie em mim quando eu digo que o que mais tem aqui são sanguessugas. Não importa que sejam tão ricos quanto a gente. As pessoas têm uma obsessão doentia por mais poder e riqueza. Logo todo mundo vai saber que a sua família tem ligação com a família real e você vai receber tanta proposta de casamento que vai achar que voltou pro século dezenove. Todo mundo é maluco por um sangue azul.
Seu olhar deslizou sobre o copo de café e Tess cutucou o interior da bochecha com a língua, pensativa.
— Enfim, Belly... — ela deu uma pausa. — Posso te chamar de Belly, né? Isa, Bel... o que preferir. Agora que você é um de nós, não queremos que ninguém pense que você é uma excluída. Somos amigas agora.
Isabel não tinha uma palavra certa para descrever o que estava pensando da garota na sua frente. Ela parecia ser um pouco de tudo: inteligente, intrometida e arrogante. A chamou de inocente, mas a observava descaradamente, lançando olhares perspicazes a todo momento enquanto avaliava suas reações, como se estivesse desconfiada da própria inocência que pontuou. Mas isso era somente um palpite. Isabel nunca foi muito boa em ler as pessoas. A única coisa óbvia era o interesse envolvido na situação, já que Tess não parecia se esforçar muito para esconder suas intenções e em como aquilo estava ligado com o Temple Club.
— Não me chame por apelidos — Isabel encarou a garota. Embora sua voz tivesse um tom sério, ela não deu qualquer indicação de desconforto.
— Claro — Tess abriu um sorriso irônico. — Entre nós duas, eu não me importo.
Tess ficou acomodada rapidamente ao se sentar na cama de Isabel, puxando uma embalagem barulhenta e laranja de dentro de uma bolsa Bottega Veneta. Um simples pacote de hippeas escondido dentro de uma grife de alta costura.
— Quer? Não sei se tem isso na Inglaterra — ela abriu e despejou pelo menos um terço na boca. — 78 calorias nesse saquinho. Não é incrível? Vai se arrumar. Vou ficar bem aqui, te esperando.
Isabel seguiu seu olhar, confusa demais para dizer algo. Novamente, a vontade de mandá-la embora com um simples toque a tomou. Suspirou fundo — não era necessário no momento. Ainda nem sabia qual era o seu poder. Uma habilidade mental como manipulação da realidade ou ver o futuro era o suficiente para pegá-la no flagra e expulsar sua família do Temple Club. Tess poderia servir tanto quanto Jace para o seu impulsionamento no ranking. Afinal, queria se tornar uma Soberana igual a todos eles.
Quando terminou de vestir suas roupas e pentear seus cabelos, Tess estava no seu terceiro pacotinho de hippeas e comia um petisco de grão-de-bico atrás do outro. Levantou os olhos do celular, deixando sua comida e seu entretenimento de lado para observar Isabel de cima a baixo.
— Você parece uma freira. Onde arrumou essa saia longa? — sua boca se contorceu em desgosto. — Minha dica é: peça dois números mais baixos do que o seu. Fica um pouco apertado, mas nada do que cortar alguns carboidratos não te ajude a ajustar a saia no seu corpo perfeitamente.
Seus lábios se curvaram para cima e ela inclinou a cabeça em direção à Isabel.
— Além disso... os garotos ficam loucos. Você vai conseguir tudo o que quiser.
O nariz de Isabel ficou vermelho, mas não havia resquício de emoção em seu rosto.
— Eu não preciso disso para conseguir o que eu quero.
Tess brevemente apertou os olhos, fazendo uma pausa pensativa.
— Ah, é. Seu poder. É bem interessante... — ela juntou as sobrancelhas, desconfiada. — Eu agradeceria se você ficasse com suas mãos bem longe de mim.
— Estou pronta, vamos? — Isabel terminou de abotoar a camisa branca do uniforme, colocando o blazer azul e o toque final, suas luvas. Não era o primeiro comentário desagradável sobre seus poderes que escutava e sabia que não seria o último.
Os corredores de La Brede estavam cheios de olhares curiosos. Isabel não culparia ninguém pelo interesse em um rosto novo, principalmente alguém como ela ao lado de alguém como Constance Monroe. A relação era óbvia: estar com Tess significava estar com Jace. Isabel não precisou de uma percepção acima da média para entender que tudo sempre acabava no garoto de ouro.
Logo quando se aproximava, atravessando as portas grandiosas do refeitório, ela podia não somente ver Jace sentado em uma das mesas, como também todos os olhos que o acompanhavam. Inclinando-se sobre o seu celular, ele parecia não se importar. Havia uma aura proeminente ao seu redor que atraía seus espectadores em uma simples atitude fria como a indiferença.
— Isabel vai se juntar a nós! — Tess anunciou em uma voz cantarolante.
— Chegaram na hora certa — Elliot deu uma olhada rápida em Isabel e inclinou a cabeça por cima de seu ombro, com um sorriso estranhamente diabólico. — Olhem.
Isabel olhou para Tess, vendo-a girar o corpo enquanto mordia os lábios para evitar soltar uma risada. Desconfiada, ela permitiu que seu olhar desviasse e acompanhasse o vasto saguão. Ela e o restante do refeitório encontraram com facilidade quem deveriam estar observando.
O garoto que carregava uma expressão mortificada parecia ter saído de uma revista barata para adolescentes de baixa renda. Usava uma calça rasgada e um moletom preto genérico. Tinha um rosto pálido com olheiras doentes que parecia aumentar a cada segundo que ele arregalava os olhos.
Sua mão se moveu bruscamente até o prato, desequilibrando e derrubando pedaços irregulares de porcelana pelo chão. Um líquido ralo e espesso, com fragmentos escuros, acompanhava uma fatia de pão e ovos mexidos misturados ao prato quebrado. Aos poucos, Isabel conseguiu entender que o líquido era sangue e a parte escura tinha um curto rabo rosado.
— Seus malucos do caralho!
O garoto saiu com passos apressados e furiosos, desaparecendo pelas portas do refeitório.
Tess abafou uma risada escandalosa com a mão, trocando olhares divertidos com Elliot. Jace permaneceu frio, intocado e despreocupado com o fato de ter um rato morto há poucos metros dele.
— O que foi isso? — Isabel perguntou, trocando olhares entre os três e esperando por quem fosse respondê-la primeiro.
— Isso foi uma brincadeirinha — Tess explicou.
— Com um rato? — Isabel deu uma breve olhada para trás. Ninguém movia um músculo para tirar a cena nojenta do chão.
— De rato para rato — Elliot falou, elevando o canto dos seus lábios. — O garoto tem um poder imperfeito. Não devia estar aqui.
Ah. Isabel entendeu. Ratos. Ratos de laboratório. Tal comparação já havia sido título de matérias jornalísticas na Inglaterra há alguns anos, levado como debate social e nome de pesquisa científica em faculdades renomadas. Mas em todas as escolas que frequentou na vida, nunca havia visto ninguém da sua posição social se referir aos imperfeitos como ratos.
— Não precisa participar disso, se não quiser. Você pode ser como o Jace — Tess apontou, com um sorriso presunçoso puxando seus lábios.
Jace bloqueou a tela do celular e cruzou os braços sob a mesa. Seus olhos se encontraram com os de Isabel, sua expressão completamente dura de antipatia e desconfiança.
— Qual é o plano?
Isabel não esboçou reação.
— Desculpe?
— Você me entendeu. Qual é o seu plano e o da sua família?
A garota levantou as sobrancelhas, demonstrando o mínimo sorriso.
— Não tem nenhum plano.
Jace apertou a mandíbula, os olhos fulminantes diante da frustração de não ter a resposta esperada. Se levantou, deixando Elliot e Tess confusos.
— Não precisamos dela aqui — ele disse finalmente, sua voz voz carregada de desdém.
Isabel o viu lançar um olhar de advertência para os amigos. Sua rigidez era mais do que o suficiente para obrigá-los a obedecê-lo sem ter que acrescentar mais palavras. Quando Jace foi embora, eles o seguiram, deixando Isabel sozinha na mesa do refeitório.
✯✯✯
Enquanto Cole queria voltar à normalidade do primeiro dia de aula, Tyler pisava forte com o punho fechado como uma pedra. Ele estava tão raivoso que poderia explodir o rosto de qualquer riquinho mimado que expressasse o mínimo sorriso debochado em sua direção.
— Pelo menos você não comeu — Cole ofereceu um sorriso torto.
— Foram eles — Tyler repentinamente parou de andar. Olhou para o garoto, vestido em seu uniforme perfeitamente bem passado. Tyler ainda não havia sido agraciado pela vestimenta obrigatória. Seu uniforme, que seria doação de algum aluno que já havia se formado, ainda estava sendo lavado. E isso o deixava maluco. Tyler conseguia chamar ainda mais atenção dentro do exército de idiotas ricos por estar fora do padrão. — Elliot, Constance e Jace. Foram eles, de novo.
— Jace? Ele não participa dessas coisas — Cole encolheu os ombros. — Mas... eu também tenho certeza de que foi o Elliot e a Constance.
— Como você sabe que ele não participa? Ele não é o líder dos babacas? — Tyler apertou ainda mais o punho, sentindo o coração acelerado apertar em raiva. Quantas brincadeiras com ratos, vivos ou mortos, ele ainda teria que encarar até conseguir ter um ano normal? Ele estava ali há quatro dias e seria expulso na segunda semana se as coisas continuassem daquele jeito.
Rato ou não, ele não abaixaria a cabeça para aquilo.
— Você não tá entendendo, Ty — Cole colocou a mão no seu ombro, segurando uma expressão amena. — Ele não se importa com a gente. Para o Elliot e a Constance, é uma brincadeira que nunca vai perder a graça. Pro Jace, é como ver seus amigos jogando um jogo bobo no celular. Não tem porque estragar a diversão, e se o jogo não for o estilo dele, também não tem porque ele jogar. É pura indiferença.
Tyler não respondeu nada de imediato, com repulsão pelas palavras do garoto. Aqueles adolescentes estavam longe de serem normais. A maioria deles nem pareciam ser adolescentes. Eram máscaras de futuros líderes mundiais com traços de psicopatas. Fingiam ser polidos com seus dentes brancos ofuscantes mas eram almas podres. Quando Tyler olhava para qualquer um deles, ele nem via pessoas.
Via candidatos perfeitos para se tornarem Soberanos.
O que ele sequer estava fazendo ali?
— Tenho que atender isso — Cole murmurou, juntando as sobrancelhas enquanto encarava a tela do celular. — Depois a gente se fala.
Tyler suspirou fundo enquanto assentiu. Ficou parado no corredor, tentando se lembrar onde seria a sua primeira aula. Não estava muito interessado na sua grade de matérias daquele dia. A única coisa interessante e que fugia do ensino tradicional era o "Táticas e Estratégias" mas como já dizia o nome, parecia ser somente uma aula teórica e chata. E não era o que Tyler queria.
Ele estava ansioso pelo momento em que tivesse a chance de enfiar seu punho na cara de alguém. Precisava da oportunidade perfeita para que pudesse pôr em prova as habilidades que aprendeu nas ruas de Mission District. Tyler era o melhor de onde vinha. Sabia brigar e estava pronto para diminuir o ego de riquinhos que o subestimavam.
Um vulto atraiu seu olhar. Havia uma tela com as imagens do ranking logo ao seu lado. A imagem de Jace estava ao lado de um enorme número um pintado em dourado.
Jason Velmont, o primeiro colocado.
Tyler engoliu o sentimento. Algo como medo e determinação fez seu peito inchar. Não havia como Jace ser apenas um telespectador do que seus amigos planejavam bem na sua frente. Ele era tão desprezível quanto Elliot e Constance. Ele era o líder do seu culto cheio de babacas.
E ele que deveria cair.
✯✯✯
Chandler atualizou seu Instagram com uma foto usando seu uniforme no meio do campus de La Brede. Ele tinha um sorriso grande, segurando a alça de sua mochila preta caída em um dos ombros enquanto a sua outra mão fazia um "V" no ar.
"Primeiro dia de aula! Espero que vocês estudem tanto quanto eu."
Rapidamente a publicação pegou meio milhão de curtidas. As jovens eram rápidas em seus trabalhos. Republicavam a foto nos stories e a postavam nas contas de fãs no X. Faziam seu nome subir nos trendings topics e escreviam imagines no tumblr. Por causa de uma foto, seus fãs renasciam na internet. Não importava quanto meses ele passasse sem atualizar ou dar as caras, as coisas acendiam repentinamente por causa de uma pequena postagem interessante.
"Essa era a melhor foto que tinha? Achei seu sorriso meio travado rs. Me envia as opções antes de postar... só pra eu ver certinho..."
E tão rapidamente quanto seus fãs, Stanley, seu empresário irritante, enchia suas mensagens com palavras aconselháveis de um homem que não tinha mais nada a fazer além de ficar pesquisando o nome Chandler Scott no tiktok.
A parte da noite costumava ser mais cansativa para Chandler do que os estudos em La Brede. Era o momento em que seus pais gostavam de fazer longas chamadas de vídeo, onde eles não tinham nada de interessante a falarem, mas o obrigavam a participar pelo momento familiar que não tinham por conta do internato. Sua mãe, Margaret, sempre estava buscando o que dizer. Comentava até mesmo do cachorro da vizinha, que havia latido um pouco mais alto naquela manhã. Chandler obedecia, escutava e sorria. Contava os minutos para conseguir desligar o celular e aproveitar o resto da noite. Pelo menos, eles estavam longe. Pelo menos, Chandler não estava lidando com tudo aquilo pessoalmente. E quando a ligação acabava, ele tinha 24 horas até acontecer novamente.
Um gostinho de liberdade por um tempo determinado.
Rapidamente, pegou sua pochete transversal onde o seu alívio estava guardado e andou até o seu lugar preferido no campus. Era atrás do dormitório masculino, porém em um muro que ficava separado, pois era onde as funcionárias recolhiam os lixos e as roupas sujas. O cheiro meio azedo fazia a sua parte para manter outras pessoas longe dali. Chandler podia preservar seu sossego enquanto fumava escondido.
Claro, se não fosse por Constance, a garota perigosa que o descobriu no sábado à noite. No domingo, ele estranhamente a esperou aparecer novamente. Ficou até um pouco mais. Bolou um segundo baseado, caso ela resolvesse dar as caras. Mas Tess não apareceu e o dia seguinte chegou, deixando-o em dúvida: ela iria aparecer naquela noite?
— Olá, Chandler.
O seu questionamento foi respondido e o seu peito pulou forte dentro de si. Mais uma vez, ela o assustou com a sua habilidade de invisibilidade enquanto o esperava encostada na parede. Esboçou um sorriso provocativo, que já fazia parte do seu rosto bonito.
— Te assustei? — ela deu uma risadinha. — Vou me divertir com isso. Achei que você não vinha.
— Meus pais me prenderam — Chandler respondeu com um suspiro.
— Seus pais? — Tess juntou as sobrancelhas em confusão. — Eles estão aí?
Chandler balançou a cabeça, deixando um sorriso se elevar na lateral de seus lábios.
— Me prenderam em uma ligação — explicou.
Tess concordou, cruzando os braços de forma inabalável, mas ainda parecendo confusa. Chandler se incomodou com o seu silêncio, estranhando a forma como seu rosto sério se perdeu olhando para a grama. Tentou buscar na sua mente se ela ainda tinha os pais vivos, o que não fazia sentido, sendo que ela mesma havia comentado sobre eles há alguns dias.
Então, por que ela parecia triste?
— Só tem ice wax aqui — Chandler mudou de assunto, abrindo o porta beck e mostrando para Tess. Seus olhos se arregalaram levemente junto com um sorriso interesseiro.
— Onde você consegue isso? — ela perguntou, segurando o baseado na ponta dos lábios e acendendo o isqueiro.
Chandler hesitou por um momento.
— Meu empresário consegue pra mim.
Tess tragou, soltando a fumaça lentamente. Ela levantou uma sobrancelha, o observando com curiosidade.
— Seu empresário? Eu tava querendo o nome do traficante de La Brede, mas pelo jeito você ainda vai continuar me vendo.
Chandler riu, fazendo com que Tess deixasse escapar um sorriso de dentes perfeitos. A ponta do baseado queimou exageradamente quando foi a vez de Chandler puxar. Ele estava sonhando com aquele momento o dia todo e parecia querer ainda mais desesperadamente quando tinha que encarar seus pais.
— Achei que você ia aparecer ontem — ele disse, entregando o baseado para a garota. Tess segurou e o encarou, apertando os olhos lentamente. Estava claramente chapada, sorrindo de forma boba.
— Então você esperou por mim — ela travou seu olhar no de Chandler, com um sorriso autoconfiante. Ela tragou o baseado, olhando para o breu do horizonte sem esperar por uma resposta. Tess já tinha o que queria: maconha e a certeza de que havia entrado na mente de um garoto.
— Você disse pra eu estar aqui ontem... então eu naturalmente achei que você fosse aparecer — a explicação soou idiota quando Chandler disse em voz alta. Tess já estava convencida o contrário. Seria difícil para ela acreditar que Chandler tinha a necessidade em agradar as pessoas ao seu redor.
— Eu estava com Jace e Elliot — ela deu uma revirada de olhar rapidamente. — Eles queriam conversar e de repente fiquei presa enquanto eles jogavam uma partida de futebol ou sei lá o quê no videogame.
— Por que não foi embora? — Chandler perguntou. Tess inclinou a cabeça, do mesmo jeito que um cachorro costuma fazer quando está confuso.
— Idiotas carentes. Precisam que eu fique escutando e dando opinião na chatice deles.
— Tem a ver com a aluna nova? — Chandler analisou enquanto o olhar de Tess levantava, indicando que sim. — Tive uma aula com ela hoje. Ela chamou mais atenção do que o garoto que você colocou o rato no café da manhã.
Tess tentou ficar boquiaberta enquanto segurava um sorriso. Ela colocou a mão no peito, de forma dramática.
— Eu? Eu não coloquei rato na comida de ninguém — ela finalmente cedeu o sorriso cruel. — Elliot pediu pro Colin usar o poder de velocidade dele em algo útil.
— De quem foi a ideia? — Chandler perguntou, entregando o baseado que se apagou na sua mão. Ela usou o isqueiro para acender novamente.
— Elliot, é claro. Ele tem os melhores planos.
— Jace não participa dos planos?
Tess lhe deu um olhar gelado e cortante, do tipo que tinha que acompanhar um rosto fechado e uma boca reta, sem qualquer sinal de sorrisos de escárnio.
— Eu sei onde você quer chegar, Chandler — seus olhos se inclinaram enquanto ela o estudava. — Até que você demorou um pouco.
Chandler limpou a garganta, um pouco constrangido. Ele imaginou que aquilo era recorrente: se aproximar de Tess ou Elliot para obter informações do primeiro lugar. Mas era inevitável. Jace despertava curiosidade e qualquer um usaria uma oportunidade como aquela para descobrir um pouco mais sobre o garoto. Uma maneira de se infiltrar, mesmo que um pouco, entre pessoas que realmente o conheciam.
— Todos querem saber sobre Jace. Eu vou te dizer, mas só por causa da maconha gratuita — ela inclinou o baseado, com um sorrisinho no rosto. — Por incrível que pareça, ele é legal. Mais legal do que eu e o Elliot. E não participa dessas coisas.
A maneira como Tess falou era convincente, mas Chandler não podia ignorar uma sombra indecifrável em seu rosto. Ela tragou o baseado e soltou o ar tranquilamente.
— Não acho que seríamos amigos se não fosse nossos pais. Jace é muito reservado e não gosta de pessoas fora do seu círculo social. Sabe reconhecer um interesseiro de longe — um suspiro cansado saiu de seus lábios e ela encarou Chandler. — Você vai precisar de muito treino pra conseguir convencer ele. Mas você é ator, então...
Embora Chandler tenha se sentido um pouco ofendido, ele aceitou. Não havia nenhum outro motivo pelo qual se interessava pelo garoto além de seus pais obcecados pela fama e o título de Soberano. Ele tinha que escutar dia após dia os conselhos de Stanley para que ele se tornasse um amigo íntimo do Velmont. Tudo pela fama. Tudo pelas conexões familiares. Fazia sentido o garoto ser tão reservado. Era impossível se aproximar dele.
— Não acho que você consegue — Tess lhe devolveu o baseado. Chandler estava tão chapado que o apagou ali mesmo, amassando a ponta levemente contra a parede. Tess olhou um pouco decepcionada, mas não contestou. — Você devia ter tentado quando era criança. Ele era divertido naquela época. Hoje em dia é um ranzinza que não suporta ninguém novo. De qualquer jeito, boa sorte.
Chandler suspirou fundo. Estava, de certa forma, agradecido pela compreensão da garota, mas não havia adquirido nenhuma outra informação de que já não soubesse antes. Jace era reservado e não gostava de pessoas novas. Chandler precisava ser convincente e se aproximar de forma natural... mas como?
— Vou aproveitar essa brisa deitada na minha cama — Tess sorriu, os olhos avermelhados denunciando o fim daquela noite. De repente, suas sobrancelhas se levantaram sugestivamente. — Eu tive uma ideia.
— O quê?
Os lábios de Tess franziram como se ela estivesse tentando ao máximo não sorrir.
— Você vai ver. Te vejo amanhã.
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