Capítulo 1
"A maior arma que alguém pode usar contra nós, é nossa própria mente. Aproveitando-se de dúvidas e incertezas que ali se escondem. Somos verdadeiros com nós mesmos? Ou vivemos pela expectativa de terceiros? E se formos acessíveis e sinceros, poderemos algum dia ser realmente amados? Poderemos encontrar coragem para liberar nossos segredos mais ocultos? Ou no final, somos todos incompreensíveis até para nós mesmos?"
Revenge
Mila
Mila
Hoje era para ser um dia especial, véspera do meu aniversário de 18 anos e depois de quase um mês sem ver minha família, vou finalmente voltar para casa. Estou morrendo de saudades da minha mãe e da minha irmã caçula. Desde que fui aceita numa famosa escola de dança, mudei do Morro para um pequeno apartamento, o qual eu divido com minha amiga Carol. Nós moramos perto da escola e dividimos todas as despesas, ou melhor, minha amiga fica com a maior parte. Ela vem de uma família de classe média e sempre teve tudo que quis, até hoje seus pais pagam uma espécie de mesada para ela, o meu caso é bem diferente eu tive que batalhar muito para chegar até aqui, já que preciso matar um leão por dia para pagar sozinha minhas contas.
Apesar de todas essas facilidades, minha amiga é uma garota bem pé no chão, nem um pouco deslumbrada com o dinheiro e a ajuda da sua família. Além disso, ela é uma garota linda, tem um corpo perfeito de causar inveja a muitas mulheres, olhos verdes, cabelos castanhos e longos, se não bastasse isso, ela tem um enorme coração, está sempre ajudando as pessoas. Eu a conheci durante os testes para entrar na academia, todos os dias tínhamos que provar nosso talento para estar ali, por isso o clima competitivo estava no ar o tempo todo, ninguém queria fazer amizades naquele momento, mas a Carol é assim, simples e despretensiosa. Por isso começamos a ensaiar juntas ainda durante as audições e depois disso, viramos amigas inseparáveis.
Hoje o dia foi bem cansativo, depois de 8 horas repetindo os mesmos passos e nada de descanso estou esgotada. Entretanto, mesmo sabendo que tenho que ir de ônibus visitar a minha família não desisto, pego minhas coisas e arrumo tudo na mochila que trouxe comigo esta manhã. Logo depois aceno para as minhas colegas de ensaio me despedindo delas, no caminho dou um beijo especial na Carol e saio da academia caminhando apressada para o ponto de ônibus.
Já está anoitecendo e as pessoas estão voltando para suas casas, por isso esbarro em algumas no caminho, estou totalmente distraída lendo as mensagens no meu celular.
Nem percebo que cheguei ao local certo até que bato numa senhora que carregava algumas bolsas nas mãos.
— Oh, me desculpe. Eu estava tão distraída e acabei derrubando suas compras. Deixe-me ajudá-la? — Vou arrumando as coisas dentro das sacolas, que durante nosso encontro saíram rolando pelo chão.
— Não se preocupe minha filha eu também não estava prestando atenção na rua. — Ela se abaixa para me ajudar, mas balanço a cabeça indicando que não é necessário, já que consegui pegar todas as coisas que caíram no chão.
Depois de tudo arrumado, ajudo a senhora a carregar suas bolsas até o seu ônibus chegar. Quando chegou a vez dela, entrar no coletivo me despedi como se fossemos velhas amigas. E fiquei para trás esperando o meu ônibus, esperei em pé por quase uma hora, antes dele aparecer cheio, as pessoas estavam penduradas umas nas outras para não cair e a porta detrás nem podia ser fechada, enfim mais um dia típico no transporte público do Rio. Entretanto eu não tive outra escolha senão embarcar nessa lata de sardinha ambulante, fiz um pouco de contorcionismo para entrar, mas no final consegui um espaço para ficar num cantinho estratégico entre um banco e outro.
Eu fico a viagem toda nesse canto sem poder me mexer e quando chego ao meu antigo bairro já é bem tarde. A minha mãe nem me espera hoje, já que liguei mais cedo e disse que iria vir só amanhã. Contrariando a minha primeira ideia resolvi fazer uma surpresa, pois faz um tempo que não venho aqui, além disso, é véspera do meu aniversário e vou aproveitar o feriado e alguns dias de descanso para comemorar com a minha família. No momento que o ônibus chega próximo da minha casa, desço sem olhar para os lados, pois já conheço a rotina aqui, quanto menos chamar a atenção é melhor.
Vou caminhando pelos becos escuros e ruelas morro acima e quando estou quase chegando à casa da minha mãe ouço tiros e gritos, as pessoas descem o morro correndo, algumas se escondem outras ficam olhando sem entender o que está acontecendo e as crianças choram sem parar.
Eu ando mais rápido, passando pelos moradores e ás vezes me escondendo atrás de pequenas estruturas de tijolos para me proteger até chegar ao meu destino, porém ao abrir a porta da minha casa. Encontro a pior cena da minha vida, minha irmã e minha mãe estão caídas no chão da sala, cobertas de sangue enquanto um homem, que está de costas para mim tem uma arma apontada para elas e atira mais uma vez. O impacto é tão grande que caio para trás assustada, tento me levantar. Porém minhas pernas estão fracas, por isso vou me arrastando até um beco ao lado da casa.
— Será que ele me viu? — Sussurro com medo que ele venha atrás de mim. Depois me escondo atrás de alguns arbustos, sento no chão e encolho minhas pernas, estou tremendo de tanto medo. Morando na favela desde que nasci, já vi muitas situações de violência, mas nunca presenciei pessoas sendo mortas e ainda por cima alguém que eu conhecia e amava. Estou em pânico não sei se chamo a polícia ou uma ambulância. O que sei é que não consigo sair daqui, estou paralisada de medo, o meu corpo simplesmente não me obedece, mais.
Sinto minhas mãos tremerem sem parar, os dentes batem um no outro sem que eu tenha nenhum controle sobre isso, fico assim por horas ou minutos, não consigo calcular. A próxima coisa que vejo é uma mão me puxando, tento me mexer e impedir que me carreguem. Porém no mesmo instante me dou conta que não tenho nada, nem ninguém na minha vida para zelar por mim, sendo assim fecho meus olhos e adormeço diante do inevitável.
Quando acordo sinto uma luz forte bater nos meus olhos, será que morri? No entanto minha cabeça dói e meus braços estão dormentes acho que aqui não é o céu. Abro os olhos novamente e encontro uma enfermeira checando meu pulso, trocando o soro. Antes que eu pergunte alguma coisa, ela chama a minha atenção e diz:
— Oi, sou a Ana e vou cuidar de você hoje. Procure descansar agora, você passou por muita coisa e está tomando sedativos, mais tarde a doutora vem conversar com você e esclarecer seu quadro clínico, enquanto isso tente dormir. — Ela termina de trocar meu outro soro e aplica uma injeção direto na minha veia.
Será que tudo isso é um sonho, ou seria um pesadelo? Não tenho tempo de verificar, adormeço novamente e acordo horas depois mais consciente que estou na cama de um hospital, porém por mais que eu me esforce não consigo lembrar, como cheguei até aqui. Escuto barulhos atrás da porta e depois vozes. No começo é apenas um sussurro que não consigo identificar, porém à medida que vão se aproximando da porta consigo ouvir claramente.
— Ela precisa de ajuda. Todos estão atrás dela, vão matá-la, ela viu tudo e pode identificar o assassino.
A conversa termina e alguém entra no quarto, ainda estou zonza, mas posso identificar uma sombra alta e grande se aproximando de mim, quando a luz reflete no seu rosto, me deparo com alguém que nunca tinha visto na vida, ele é alto e forte, tem cabelos pretos precisando de um corte e o que me chama a atenção são os seus olhos azuis, estou sem palavras e nem consigo desviar meus olhos dele enquanto fala comigo.
— Mila é esse o seu nome, não é? — Ele me observa atentamente, depois chega mais perto da cama, coloca as mãos dentro dos bolsos da calça jeans e fica esperando a minha resposta.
Eu tento falar, mas a minha voz não sai, por isso balanço a cabeça concordando.
— Olha, sinto muito o que aconteceu com você, mas preciso fazer algumas perguntas. Você se lembrar de alguma coisa? Você viu alguém na casa, quando chegou? — Ele pega um bloco de papel e uma caneta e fica me encarando com aqueles olhos tão azuis que fico paralisada olhando para eles, antes de responder à sua pergunta.
— Eu não me lembro de nada, nem como cheguei aqui. — Nesse momento ele me olha confuso e sai do quarto, sem dizer nada. Alguns minutos depois uma médica se aproxima da minha cama.
— Olá, sou a doutora Valéria e gostaria de conversar um pouco com você.
— Tudo bem. — Concordo me posicionado sentada na cama para ouvi-la.
— Você se lembra o que aconteceu com você na noite passada? — Ela olha para mim e espera a minha resposta, mas apenas faço uma expressão confusa e conto o que lembro.
— Eu fiquei o dia todo ensaiando para um espetáculo de dança, quando terminei fui até um ponto de ônibus com a intenção de ir à casa da minha mãe. No entanto não me lembro de chegar lá e nem como estou aqui numa cama de hospital.
— Você bateu a cabeça em algum momento na noite passada? — A doutora pergunta anotando algo na minha ficha médica.
— Não que eu me lembre — respondo confusa — Porém, estou com muita dor de cabeça nesse momento e minhas lembranças estão ainda confusas.
— Nós fizemos todos os exames necessários quando você chegou aqui, portanto pode ficar tranquila que certamente não é nenhum quadro clínico e sim algum tipo de estresse devido ao trauma que você sofreu. Quando se sentir segura, se lembrará o que aconteceu naquela noite. — Ela anota algo na minha ficha médica, checa meus batimentos cardíacos e logo depois sai do quarto.
Fico sozinha por um longo tempo, mas não consigo dormir. Provavelmente já passou o efeito dos remédios, olho para as paredes brancas na minha frente, tentando descobrir como fui parar nesse quarto de hospital, provavelmente não foi nenhum acidente de trânsito, uma vez que não tenho nenhum machucado a não ser, a minha dor de cabeça. Entretanto minhas memórias parecem essas paredes, sou uma página totalmente em branco, pelo menos ao que se refere a noite de ontem, antes disso, consigo lembrar de tudo. As horas passam lentamente, na velocidade das gotas do meu soro, até que uma senhora entra no meu quarto e diz:
— Boa tarde sou Alice, assistente social do hospital, a doutora Valéria me avisou que você está de alta, porém precisamos conversar um pouco antes de você sair deste hospital. —Ela segurava uns papéis nas mãos quando entrou no quarto, mas agora ela coloca os numa mesinha ao lado da minha cama e se senta numa poltrona bem na minha frente.
Depois ela começa a narrar os acontecimentos da noite passada e fico paralisada, como se tivesse assistindo no jornal mais um assassinato sem justificativa nas favelas do Rio de Janeiro, só que desta vez não é mais um caso entre tantos outros que já aconteceram por lá, é a minha família. Meu pai foi morto ano passado, ele devia para um traficante que resolveu cobrar tirando a sua vida e não posso dizer que sinto saudades, pois nunca tive um pai presente e carinhoso, sempre que eu chegava em casa ele estava bêbado ou drogado e nas últimas semanas os dois.
Entretanto, minha mãe era uma guerreira e batalhava todos os dias para nos sustentar. Foi ela que me colocou numa ONG, para aprender a dançar desde que eu tinha 4 anos e era sempre a minha incentivadora, não posso esquecer da minha pequena irmã que tinha apenas 14 anos, elas não mereciam isso, mas foram assassinadas com 4 tiros cada uma. Depois de ouvir todo o relato da Alice, o desespero é tão grande que sinto que não vou aguentar mais, dói tanto que só o simples fato de respirar já me faz sufocar. Ela ainda tenta me acalmar e diz que irão cuidar de mim, serei levada para São Paulo para um programa de proteção à testemunha, uma vez que sou a única sobrevivente dessa tragédia.
Faço um esforço para entender a situação, mas a verdade é que estou anestesiada nada disso faz sentido, minha vida não me pertence mais. Sou orientada a vestir uma roupa que não me pertence e em seguida sou guiada para fora do hospital até o aeroporto e de lá embarcamos num voo para São Paulo. Eu falo embarcamos porque estou acompanhada por um investigador da Polícia Federal, ele ficou responsável por mim durante esse trajeto, não sei onde vou ficar e para ser sincera nem quero saber, minha vida não faz nenhum sentido no momento. E a ignorância é o que me mantém em pé, caminhando um passo de cada vez.
Só quando chegamos ao aeroporto de Guarulhos, que levanto a minha cabeça e me deparo com aqueles mesmos olhos azuis que vi no hospital. Nós olhamos por um tempo sem dizer nada, mas depois ele começa a mexer a boca me perguntando, alguma coisa que não sei bem o que é, até que ele toca no meu braço e repete a pergunta:
— Está tudo bem, não vou deixar você sozinha.
Depois disso ele segura minha mão e me guia até o estacionamento, entramos num carro e seguimos para fora do aeroporto, passamos por prédios alto, grandes avenidas e muitas pessoas nas ruas. Sigo olhando pela janela para me distrair, até que o carro diminui a velocidade e entramos numa garagem. Ele me ajuda a descer do carro e depois seguimos para o elevador. Ele aperta o quinto andar e saímos num corredor amplo e bem iluminado, paramos em frente a uma grande porta branca.
Ele tira algumas chaves do bolso e abre, entramos numa sala espaçosa e toda decorada, em tons preto e branco, parece uma sala de capa de revista, com um sofá de couro preto que contorna todo o espaço, um tapete no qual eu poderia dormir lá mesmo de tão fofinho que era. E no canto tem uma cozinha estilo americana linda e com acessórios que eu só vi em programas de televisão. Depois da rápida observação sou guiada até um quarto.
— Oi, você pode me ouvir? Meu nome é Nick e você ficará aqui até escolhermos um lugar para você ficar.
Depois de falar tão rápido que quase não entendi para onde eu vou, ele vira as costas e sai do quarto.
Fiquei sozinha numa cama de casal enorme, nunca dormi em uma cama tão grande assim na minha vida, sento na beirada e ela tem os lençóis mais macios do mundo. O quarto tem um banheiro com banheira, parece que estou em um hotel cinco estrelas. Eu nunca fiquei em um hotel, mas imagino que eles sejam assim. Após observar tudo, cada detalhe, sem ter mais nada para fazer, deito na cama e fecho os olhos, não porque penso em dormir, eu simplesmente não consigo. Acho que é para não ficar olhando para o nada o tempo todo, fecho os meus olhos e vejo tudo preto como o buraco que está no meu coração.
Fico deitada por algumas horas até que ouço uma batida na porta.
— Oi, sou eu o Nick. Você quer comer alguma coisa? — Ele pergunta abrindo apenas metade da porta.
— Não. — Murmuro bem baixinho porque não estou com fome, ele não insiste e se afasta fechando a porta.
Deito novamente e adormeço algumas horas depois, até que acordo chorando e sou amparada por braços fortes que me envolvem na cintura e me dão uma segurança que nunca tive. Ele mexe nos meus cabelos e fala:
— Vai ficar tudo bem, você não precisa chorar.
Estou confusa, mas quando recupero a razão e percebo que estou nos seus braços e ele está sem camisa, me afasto assustada e digo:
— Eu estou bem! Foi só um pesadelo, você não precisa se preocupar comigo, acho que vou dormir agora.
Vou me afastando dos seus braços, apesar de serem tão reconfortantes não posso ficar agarrada na cama com um cara que nem conheço. Ele parece não acreditar que estou bem, mas se levanta e sai do quarto me deixando sozinha no escuro.
Nesse momento sinto um calafrio por todo o meu corpo sem a sua presença, mas não tenho outra alternativa, preciso me acostumar a ficar sozinha. Então puxo um cobertor que estava na beira da cama e me deito, mas não durmo novamente, fico com os olhos abertos esperando o dia amanhecer.
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Depois de muitas tentativas enfim consegui atualizar esse livro!! Espero que curta ainda não está como eu gostaria mais é um começo.
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